domingo, 15 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12454: Boas Festas (2013/14) (7): Alberto Sousa e Silva, Manuel Maia, Jorge Teixeira, Giselda e Miguel Pessoa, Felismina Costa, Hilário Peixeiro, Manuel Lema Santos e Joaquim Cardoso

1. Postal de Alberto Sousa e Silva, ex-Soldado TRMS da CCAÇ 2382, Buba, 1968/70



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2. Mensagem de Natal do nosso camarada Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74:

Para o Luís Graça e sus muchachos (co-editores do Blogue...) bem como para todos os camarigos, daqui envio os votos de um Natal cheio de saúde e alegria.

Que o 2014 possa surgir no horizonte coo um ano de esperança.

Um grande abraço
MM

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3. Mensagem do nosso camarada Jorge Teixeira, (ex-Fur Mil Art, CART 2412, Bigene - Guidage e Barro, 1968/70):

Caro Carlos Vinhal, amigo.
Na altura do Natal aproveitamos sempre para desejar Boas Festas, o problema é que de há uns tempos a esta parte, as "festas" têm sido todo o ano. Infelizmente muitos, ainda correm o risco de na altura que deviam ter Boas Festas, terem "amargos de boca"!...
Apesar de tudo desejo a todos Festas Felizes... dentro do possível, claro!

Um abraço
cumprim/jteix


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4. Dos nossos camaradas da FAP, BA 12 (Bissau), ex-2SAR Enf.ª Giselda Pessoa e Cor Pilav Ref Miguel Pessoa:


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5. Mensagem da nossa Grã-Tabanqueira e Amiga Felismina Costa:

Caríssimos Amigos Luís Graça e Carlos Vinhal
Não queria deixar passar esta quadra Natalícia, sem vos desejar um tempo de advento, de alegrias e Paz.
Que à vossa volta todos se sintam irmanados no espírito da quadra, e que prevaleça esse espírito para além, sempre para além do tempo.
Estendo a todos os vossos familiares os desejos de um Feliz-Natal e envio um abraço colectivo e sincero.

Amiga para sempre
Felismina Mealha


Mensagem Natalícia:

Caríssimos amigos da Tabanca Grande
Permitam-me uma saudação Natalícia!

Nem sempre a vida nos dá dias bonitos e inspiradores, e esse tem sido o meu caso!
Porém, a minha dívida para convosco, é imensa e eterna!
Somos irmãos no tempo que vivemos e vivemos. Partilhamos ao longo da vida, uma vida comum, se bem que “per si”. Cada um de nós partilhou e tomou conhecimento da evolução e do recuo da civilização, da evolução tecnológica, que nos permite o “encontro” à distância de um clic, e o reviver do passado, sempre presente.
E nesta contemporaneidade, nesta recta, que pretendo muito longa e de fácil caminhada para todos nós, à luz do conhecimento adquirido, do respeito e do carinho que todos me merecem, estou aqui para vos desejar para este Natal, uma reunião familiar, calorosa e sincera, onde cada um de nós, dê provas e passe a mensagem do valor da família, do saber quem somos, e porque somos.
Somos a geração responsável pelo próximo futuro e até mesmo já, pelo presente!
Gostava de deixar aos nossos filhos e netos um mundo de que se orgulhassem, mas contra as melhores vontades… as menos boas!
Desejo porém, que dias mais felizes cheguem, pois convenço-me cada vez mais, que as situações são cíclicas e portanto, o ciclo positivo chegará risonho no tempo aprazado!

Até lá, amigos, desejo-vos o melhor que houver, o melhor que conseguirdes para vós e para os vossos.

Renovo os desejos de Boas-Festas e envio aquele abraço fraterno que a todos contempla e o meu eterno obrigada!

Felismina mealha
Natal de 2013

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6. Mensagem do nosso camarada Hilário Peixeiro, ex-Cap Mil da CCAÇ 2403/BCAÇ 2851, Nova Lamego, Piche, Fá Mandinga, Olossato e Mansabá, 1968/70:

A todos os meus amigos desejo um Santo Natal e um Feliz Ano Novo e uma longa vida com qualidade, desejos que através do nosso chefe de Tabanca, Luis Graça, torno extensivos a todos os camaradas tabanqueiros.

Hilário Peixeiro

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7. Postal de Natal do nosso camarada ex-1.º Tenente da Reserva Naval Manuel Lema Santos


Votos sinceros para todos os Camaradas e Amigos, extensivos aos respectivos Familiares.
Manuel Lema Santos

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7. Mensagem natalícia do nosso camarada Joaquim Cardoso (ex-Soldado de TRMS do Pel Mort 4574, Nova Lamego, 1972/74):

Caríssimos Editores e Camaradas em geral
Eis que se aproxima a passos de gigante as Festas de Natal.
De seguida, o fim deste ano 2013, estando o novo 2014, já à "espreita" para lhe tomar o lugar.
Como este Natal é o primeiro que passo no "aconchego" da tabanca, é não só, mas também por isso, que venho desejar a todos que dela fazem parte, bem como aos seus familiares, um feliz Natal e, que o Ano Novo lhes traga tudo o desejam. 

Muita saúde e Boas Festas para todos.
Castelões-Penafiel 16/12/2013
J.Cardoso
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Nota do editor

Último poste da série de 13 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12445: Boas Festas (2013/14) (6): José Martins, José Rodrigues, José Santos, Joaquim Mexia Alves e Ernestino Caniço

Guiné 63/74 - P12453: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (6): O Higino Arrozeiro e as lições de francês

1. Em mensagem de 10 de Dezembro de 2013, o nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67) enviou-nos mais um episódio da sua série Fragmentos de Memórias.


FRAGMENTOS DE MEMÓRIAS

6 - O Higino Arrozeiro e as lições de francês

Confuso andei anos e anos, no que respeitava à data da minha chegada ao K3, confusão que hoje 8 de Dezembro de 2013 se foi, pois que em conversa com um camarada da CCAÇ 1422, de quem não mais soubera desde o regresso, fui informado que teríamos ido para lá em princípios de Novembro de 1965.

Passámos a tarde recordando os amigos mas lembrámos acima de tudo e com muita mágoa, aqueles que nos deixaram, vitimados que foram pela minas colocadas por mãos assassinas inimigas. O primeiro foi o Fur. Mil. Higino, em Maio/66, mais tarde o Capitão Corte Real, em Junho/66.

Tive conhecimento do primeiro caso, aquando de férias na Metrópole e no segundo, estive presente e mesmo ali ao lado.
Qualquer DELES foram pessoas que mereceram a nossa estima e que também no-la deram e de quem temos muitas saudades.
Quer um quer outro, fizeram amizades, eram excepcionais na maneira como lidavam com todos, mereciam ter tido melhor sorte... o que lá vai lá vai , mas na nossa memória continuam por cá.

O Higino havia-me pedido prái em Fev/66 mais ou menos, para lhe ministrar umas lições de francês, língua que ele percebera que eu sabia, dadas as cartas que me vira receber duma moça francesa que se prestou para ser minha "madrinha de guerra" coisa na altura muito em voga. (e que bem fazia à rapaziada ter alguém do lado de lá, dando carinho e atenção).
Ela era de Grenoble, que nem sei onde fica, nunca nos conhecemos pessoalmente e o facto de nos correspondermos deu-se devido a mensagem sua, incerta no Paris-Match".

Dentro daquele espírito saudável da época, partilhámos uma relação cheia de boas coisas e fiquei-lhe imensamente grato pelo que me ensinou e pela paciência com que me aturou.
Dez anos mais velha do que eu, tivera um irmão na guerra da Argélia e teria sido ele próprio a incentivá-la a "amadrinhar" um combatente Português.

Pois o Higino Arrozeiro, queria ir para França, logo após o cumprimento do dever na Guiné a fim de poder melhor ajudar a sua mãe viúva, com quem vivia e daí o estar a pedir-me uma ajudita.

- Vamos nessa pá... tenho nisso muito gosto, vou mandar vir um livro de leitura e a gramática mas entretanto podemos já a ver os primórdios.

Num dos dias seguintes começámos e mandei-lhe para a mão uma peça de teatro que por acaso não chegou a ser representada mas que ensaiei, cujo nome era "O Visconde de Pavia Ranso" e que tinha por lá umas palavras francesas, tais como "chateau du Caramulo", "rendez-vous" e mais umas outras, que seriam reproduzidas pelo galã da peça, o visconde.
Claro que estranhou (mas ia tomando notas) que o "au" se lesse "ô"...; o "du"= "diú" ..; o "en= â...e o "ou"=" ú ".

Chegaram entretanto da Metrópole os livros pedidos.

Quando me preparava para iniciar o "je suis/tu és/ e o "avoir", tivemos a sorte de aprisionar um individuo senegalês (ao que soubemos depois) e que falava fluentemente a língua francesa. Melhor oportunidade não podia haver para que o inquiridor fosse o meu estimado aluno, que cumpriu cabalmente e até se excedeu, não conseguindo todavia a confissão que se pretendia.

O prisioneiro, foi-se recusando a dar as notícias do que sabia até que lá acabou por abrir o jogo e até sem que exercêssemos qualquer pressão, a não ser quando... enfim.

Bom, as lições lá continuaram quando possível e por pouco tempo que os afazeres não o permitiam doutro jeito e quando estávamos já para passar a outros verbos e leituras no livro seguinte, por e devido ao facto de me ter sido dada a hipótese de ir passar umas férias à Metrópole, interrompemos mas deixei-lhe trabalho de casa para fazer.

Sei que os fez que bem os vi, quando regressei, mas ele já cá não estava. Partira depois de a viatura em que seguia a caminho de Mansabá e ali nos "carreiros" local que sabíamos ser sítio perigoso, ter pisado uma mina que o levou sabe-se lá para onde.

 Veríssimo Ferreira, à esquerda, em Bissau com o seu camarada Higino Arrozeiro

Na foto, da esquerda para a direita: Gualter, Higino, (?), Simões, Corte Real e Nuno

Entretanto quase logo a seguir (inícios de Julho) fui forçado a deixar a Companhia e parti para a Secção de Funerais e Registos de Sepulturas, 1.ª Rep do Quartel General em Bissau.

Ali voltei a encontrar o meu amigo, que jazia na capela do cemitério, a aguardar trasladação. Eu mesmo o meti no Niassa embrulhado que estava o caixão, em quatro tábuas, não sem que o tenha admoestado por ir daquela forma. Antes ainda ofereci-lhe com dedicatória... a gramática... o livro de leitura e os trabalhos de casa que ele fizera, e que não corrigi.
E ali no cais do Pigiguitti, cornetim amigo tocou o Toque de Silêncio.
E eu, em sentido, acompanhei-o assobiando e tremendo, até que o barco se diluiu no horizonte.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 8 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12413: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (5): K3, Maio de 1966 - Operação Vaca

Guiné 63/74 - P12452: Conto de Natal (13): Um Menino Jesus antecipado na família Brian (Tony Borié)

1. Mensagem do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66, com data de 14 de Dezembro de 2013:

Olá Carlos.
Olha, isto é a noticia do nascimento meu neto, que estou a repartir com os meus amigos sinceros.

Um abraço,
Tony Borie.



Houve risos de felicidade, abraços, é um rapaz, “it’s a Boy”, o pai abraçava a mãe, a avó benzeu-se, o avô chorou, o telefone trabalhou de diversas e para diversas zonas, longe, mais perto. Dá cá o menino, não toques no menino, deixa ver o menino, oh, é tão lindo, é parecido com o pai, o avô, a avó, a mãe, a tia, o tio, não façam barulho, deixem o menino dormir, enfim, todas aquelas expressões normais que contêm alegria, surpresa e emoção próprias de um nascimento!


”it’s a Boy”, nasceu às 2 horas e 29 minutos da tarde, com 8 lbs. e 2 oz., e com 21 inches de comprimento!

Foi numa Sexta-feira, dia 13, no ano de 2013. Somando o total dos números da hora de nascimento, que é, 2+2+9, dá o total de 13. Somando os números do peso mais a medida de comprimento, que é, 8+2+2+1, dá o total de 13.

…Querem melhor coincidência?

Os felizes papás, Brain e Sandy, quando ainda esperavam o Anthony

O avô com o neto

Pronto a notícia está dada, “it’s a Boy”, mais uma pessoa nasceu, e vai juntar- se aos milhares de milhões já existentes neste mundo, que alguns dizem que “é de Cristo”

Oxalá possa sobreviver, seja educado com segurança e em paz, para ser útil a todos, tornando este mundo mais agradável, e que daqui a muitos anos os seus descendentes se possam orgulhar do pai que tiveram.

Tony Borie, 2,29 horas da tarde, de uma Sexta-feira 13 de um Dezembro com neve do ano de 2013.

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2. Comentário do editor

Recebi esta mensagem do camarada Tony Borié, que a título privado me dava a notícia do nascimento do seu, para já, último neto. Achei que o modo e o tempo da notícia era propícia à sua publicação pelo que lhe pedi autorização para o poste que aqui fica.

Em nome da tertúlia aqui fica um abraço de felicitações ao Tony, extensível a todos os elementos da família do pequerrucho Anthony. Especialmente aos papás, desejamos as maiores felicidades para levarem a bom porto a missão de criar e educar o seu filhote.

Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10845: Conto de Natal (12): O meu Natal de 1966 em Mansabá (Manuel Joaquim)

Guiné 63/74 - P12451: Recordações de um "Zorba" (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (1): Marcha do regresso da "Zorba"

Marcha do Regresso da “Zorba”

Recolha de  Mário Gaspar [, foto atual à esquerda]


Rapazes,  cantai cantigas
Alegres e animadas,
Acabaram-se as fadigas
Das patrulhas e emboscadas.

Bravos rapazes da “Zorba”,
Dispostos a trabalhar,
Sejam barcos ou colunas
É sempre, sempre a alinhar.

Viemos para a Guiné,
Prontos para combater,
Pica, estiva e sapa até
Tudo soubemos fazer.

Ao partirmos com saudades…
A saudade é uma mulher,.
Que tenha felicidades
Quem depois de nós vier-

Coro

Cá vai a malta da “Zorba”,
Toda alegre e sorridente,
Alegria não nos falta
Que a tristeza mata a gente.
Cá vai a malta da “Zorba”,
Corações cheios de fé,
Depois da missão cumprida,
Gadamael, Ganturé
Situadas lá no Sul,
Da província da Guiné

Ao regressarmos a casa,
Para nós a vida muda,
O cântaro perde a asa
Nós ganhamos a “peluda”.

Já vai chegando o momento
De à Guiné dizer adeus,
De acabar o sofrimento,
Voltar a abraçar os meus.

Em vinte e dois meses de glória
Cumprindo, como as primeiras,
O que há-de constar da história
Lá no RAC, em Oeiras.

Viva a Companhia “Zorba”
Que em nós deixou bem gravado
O nome de Portugal
E a honra de ser Soldado.


1. Nova mensagem, de 9 do corrente, enviada pelo Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68 [, foto à direita, em Gadamael, antes de um operação]

Assunto - Envio de 3 Fotos e Marcha - na íntegra - da "Zorba" 

Camarada e Homem Grande da Tabanca

As fotos eram muitas, mas neste momento tenho poucas. Umas que desapareceram nos empréstimos para diversas exposições, outras que se sumiram à nascença - dois rolos desapareceram na revelação em Lisboa, deram-me o negativo em branco - uma dessas fotografias vi mais tarde numa exposição. 

Tenho pena, visto ter fotos tiradas em emboscadas no famigerado "corredor da morte". 

Tenho algumas histórias para narrar. E é pena que os nossos ministros da Educação não abram as portas à História Contemporânea, incluindo a narração da História da Guerra Colonial nos compêndios e manuais escolares, isto enquanto estamos vivos. Ainda surgem uns grandes cérebros que vão contar a Nossa História da Nossa Guerra, do modo que mais lhe agradar. 

Somos uma força, juntos muito valemos, mas cuidado porque estamos na Idade Maior, muito próximos do fim. Estamos ainda vivos, não se esqueçam que existiu uma guerra que matou as nossas mentes e os nossos sonhos. 

Éramos muito jovens, com idade de namorar. Mas porquê a guerra? A guerra mata, e quem dela sobrevive, sofre. A guerra continua dentro de mim, a guerra continua dentro de nós. Temos de falar, com mais calma sobre o assunto. Logo que tenhamos disponibilidades, havemos de nos encontrar. Não estou a ver bem onde é a Escola Nacional de Saúde Pública/UNL, na Avenida Padre Cruz. Mas vou muitas vezes a essa avenida porque sou sócio da ADFA, que sabes onde fica. Também sei a localização do Instituto Ricardo Jorge.

Um abraço do Homem Grande Mário para o Homem Grande Luís Graça.

Fotos: © Mário Gaspar (2013). Todos os direitos reservados.
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Nota do editor:

Vd. os postes do Mário Gaspar:

Guiné 63/74 - P12450: Parabéns a você (664): Francisco Santos, ex-1.º Cabo TRMS da CCAÇ 557 e Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494

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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12433: Parabéns a você (663) Francisco Palma, ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 2748 (Canquelifá, 1970/72) e Luís Dias, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 3491 (Dulombi, 1971/74)

sábado, 14 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12449: O que é que a malta lia, nas horas vagas (17): Jornais, revistas, ordens de serviço, circulares, autos, correspondência, etc (Carlos Vinhal, ex-Fur Mil Art MA da CART 2732, Mansabá, 1970/72)


Como qualquer um, eu lia mais ou menos o que aparecia. Confesso que não me mandavam nada, mas lia aquilo que os outros camaradas me emprestavam.
Diga-se em abono da verdade que passava praticamente todo o tempo que estava no quartel, a ler, porque desde o início da comissão estava "dado" à Secretaria da Companhia, função que mantive mesmo após ter passado a operacional pelo acumular das baixas nos efectivos no pelotão e não só.
Lia Ordens de Serviço, Notas e Circulares, Autos disto e daquilo, etc.
Nas horas vagas, mesmo vagas, tão poucas elas foram, lia o que aparecia, revistas, jornais, livros, etc.
Não posso esquecer a leitura da imensa correspondência que recebia. Acho que posso afirmar, sem faltar à verdade, que era o campeão da 2732. Só me vencia, às vezes, o camarada Branco do Pel Art. A minha noiva escrevia-me seis dias por semana e os meus pais uma a duas vezes. Tinha ainda uma amiga no Algarve (Portimão) e outras familiares que me escreviam regularmente. Ainda trocava correspondência com camaradas em Moçambique e noutros SPMs da Guiné.

Das leituras avulsas, lembro-me de uma notícia incluída naquelas folhas que nos mandavam de Bissau, com notícias de todo o mundo, onde aparecia um tal Vignal (ou Vignale) que tinha protagonizado um assalto ou coisa parecida em França. Claro que naqueles dias fui conotado como parente daquele sujeito nada recomendável.
Outra notícia menos abonatória ao "meu bom nome", esta vinda em revista,  foi o caso de um conhecido jogador de futebol, natural de Matosinhos, por acaso também meu contemporâneo na Escola Industrial, então atleta do clube da águia, que supostamente terá torturado uma mulher da noite lisboeta. - Eh pá, cuidado com os gajos de Matosinhos, diziam-me.

Na foto em cima, tirada de certeza num domingo, estou a ler um livro que fez parte da minha formação escolar, dos quais levei alguns para a Guiné para não esquecer o que tinha aprendido. No caso é o livro de Laboratório de Electricidade (já com capas não originais), do qual os camaradas que passaram pelo Curso de Formação de Montador Electricista, se lembrarão, tinha capas tipo cartolina encarnadas.
Este livro que foi e veio da Guiné comigo, que "resistiu" a imensos ataques ao aquartelamento de Mansabá, acabou por "morrer afogado" em Leça da Palmeira. Passo a explicar.

O escritório onde trabalhava ficava a cerca de 100 metros do mar, separado do areal por uma muralha que, supostamente, nos defenderia do mar em caso extremo.
Num temporal, de intensidade felizmente nunca mais repetido, ocorrido na madrugada do dia 13 de Fevereiro de 1979, o mar, coisa nunca vista até então, galgou toda a praia, saltou a muralha, partiu portas e janelas do edifício, entrou sem pedir licença e mudou o mobiliário da minha sala para as salas contíguas mais recuadas. Por azar meu, a minha secretária que estava situada próximo das janelas por onde a água entrou, partiu-se, sendo despejados todos os meus haveres, entre eles os meus livros técnicos escolares, e entre eles o meu companheiro de comissão de serviço. Nunca mais lhe pus a vista em cima.

Voltando às leituras na Guiné, mal cheguei a Bissau, depois de abandonarmos Mansabá, logo no dia 29 de Fevereiro de 72, comprei um livro, na época um "best-seller", que mais tarde deu origem a um filme, o "Papillon" de Henri Charrière, que, acusado de homicídio, protagonizou uma das mais fantásticas fugas da Guiana Francesa. Viria a falecer a 29 de Julho de 1973, vítima de cancro.

Para provar que além de ler, sabia escrever, anexo foto.

Carlos Vinhal
Ex-Fur Mil Art MA
CART 2732
Mansabá, 1970/72

Mansabá - Arma em repouso porque é hora de escrever à família
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12447: O que é que a malta lia, nas horas vagas (16): A correspondência que me era enviada, e os autores Ramiro da Fonseca, José Régio, Vergílio Ferreira, etc. (António Eduardo Ferreira)

Guiné 63/74 - P12448: História da CCAÇ 2679 (65): Dia da Raça em Bissau (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 12 de Dezembro de 2013:

Viva, Carlos!

Hoje vou referir-me à minha presença nos festejos militares de um dia de Camões, que se realizaram em Bissau.

Exactamente! Quando o IN mandou uns misseis para a zona da Sacor, felizmente sem terem causado danos, mas dando mostras da nossa vulnerabilidade. Por esta e por outras, muitas vezes convenço-me de que a estratégia do IN não nos queria dizimar, e fazia a guerra quase "doucement".
Mas é só para vos contar os meus episódios, irritantes, de inicio, com laracha e fortuitos acasos, depois, pelo que deixo para outros, ou para outras ocasiões a especulação que possamos fazer sobre uma "guerra amiga", ou "de baixa intensidade".

Lá vai com um abraço para o tabancal e votos de Boas-Festas natalícias
JD


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679

65 - DIA DA RAÇA

Num daqueles primeiros dias daquele longínquo mês de Junho de 1971 o capitão mandou chamar-me ao gabinete. Depois do habituais preparos numa daquelas circunstâncias, que exigia que vestisse os calções que me conferiam alguma dignidade de combatente pela Pátria, dirigi-me ao edifício do comando.

Entrei, e logo ele passou à explicação do chamamento: eu teria que partir para Bissau, a fim de participar nas cerimónias do 10 de Junho. Quase rejubilei. Afinal, a tropa ia conferir-me uma inopinada distinção militar pelos meus desempenhos ao longo da já extensa comissão. Sorri de satisfeito, e perguntei ao capitão se sabia com que medalha ia ser agraciado.

O tipo atirou, que com uma medalha de cortiça, e passou com a mão por baixo do queixo a segurar um sorriso sacana. Depois passou a uma explicação sintética, mas mais circunstanciada, referindo que eu ia a Bissau em representação da companhia.

Rebati logo, então e o pelotão? Quem sairia para o mato com o pessoal? Se para mim era tudo tão difícil por causa do reduzido quadro - eu e o furriel Feliciano Lopes, que viera da 26.ª para o grupo em finais de Março, havia só dois meses, não se encontrava outro pelotão com mais disponibilidade de quadros com vocação representativa?

Pois escusava eu de levantar problemas, já que tinha sido eu o escolhido. Além disso, numa primeira auscultação, ninguém quis tal incumbência, e eu, por ser o mais novo, teria que ir. Alto aí, o mais novo é o Feliciano. Estava bem, mas ele acabara de chegar, e não estava bem integrado no "espírito" da companhia. O diálogo andava neste diapasão, e eu não me safava de uma viagem não desejada. Logo então para representar a companhia. Do que é que isso implicaria? A que é que ficaria obrigado? Grande porra!

Mas ainda estava disposto a lutar pela minha dama, e argumentei que não tinha dinheiro, e ir a Bissau em estado "teso", era uma coisa que nem ao IN se desejava. Mas o capitão mostrou-se generoso, e prontificou-se a emprestar-me a massa. Ainda assim, não haveria um alferes disposto a lá ir? Sempre daria outra dignidade à representação.

Não, nenhum deles podia ou queria desempenhar aquela missão. E os nossos sargentos faziam muita falta na área administrativa para assegurarem que o gamanço não sofreria percalços. Era eu, e pronto!

Um dia qualquer preparei uma trouxa e preparei-me para a coluna que me levaria a Nova Lamego, onde um avião especial aguardava pela malta do leste. Grande festa, imaginei. À última da hora veio um sargento entregar-me uma maleta de madeira com o estandarte da CCaç, e eu já me sentia sacrificado à Martim Moniz.

Em Nova Lamego deixaram-me na pista, onde conheci um feliz contemplado, outro furriel, talvez de Cabuca, Canjadude, ou outro qualquer dos "lodges" que faziam a inveja do AB. Pelo caminho fui dizendo da minha revolta pela deslocação obrigatória, principalmente, porque estava teso e teria que ir para os Adidos, ou coisa parecida. Mas ele retorquiu que conhecia uma pequena pensão perto do Pintosinho, barata, onde poderíamos "acampar".

Dito e feito, para lá nos dirigimos com as maletas. Sem conhecimento do calendário das cerimónias e dos preparativos, no dia seguinte acordámos para o tarde. Comemos, e iniciámos o reconhecimento da cidade, que já assistia aos preparativos. Não falámos com quem quer que fosse, e ao fim da tarde demos conta que na Praça do Império já havia um estrado montado para suas excelências baterem pala à tropa desfilante, e para os discursos da praxe.

No dia seguinte, já não me lembro em que circunstâncias, fomos num automóvel Mercedes, dos velhos, com motorista às ordens, dar uma volta pelos arredores turísticos de Bissau, e desaguámos talvez em Nhacra, num "restaurant trés typique" onde comemos, e bebemos um monte de cervejas. No regresso, com o grupo visivelmente satisfeito, à cautela, saímos do Mercedes numa discreta rua paralela à avenida.

A curiosidade, porém, levou-nos a subi-la até à Praça e, enquanto nos deslocávamos, verificámos os postes engalanados e com altifalantes que, certamente, levariam os sábios discursos ao conhecimento do magote ansioso pelo desfile glorificador. À nossa chegada à Praça demos com muitos militares que ensaiavam a festa, e evidenciavam a preocupação de que nada falhasse. À nossa frente, um sargento do Exército português pegava num balde com cal, onde molhava uma trincha, que usava para fazer linhas equidistantes de marcações no alcatrão para que o pessoal perfilasse nelas. E que bem o fazia!

Ao mesmo tempo, na zona do palco concluíam-se as instalações eléctricas e experimentava-se o sistema sonoro. Entretanto, dois ou três oficiais com espessura de galões amarelos, entre eles o célebre Onze, comandante da Região de Bissau, ou lá o que era, perto de um microfone aberto, deitando um olhar à confusão circundante, abriu os braços e exclamou para os acompanhantes: "isto está uma merda", expressão que se repercutiu pela avenida até à baixa de Bissau. O IN, solidário na incompetência, não aproveitou a fonte.

No dia seguinte, para não darmos barraca, não nos apresentámos com os estandartes para a grandiosa festa da raça. No final fomos inquirir a um camarada que ali tinha exibido com orgulho o símbolo da sua unidade, e nos informou que ao outro dia havia avião de regresso.

Seguiram-se os trâmites do último dia, que, naturalmente, meteram comes e bebes até saciar. No regresso ao quarto fizemos conta a quanto esportulámos durante a missão, e verificámos que a massa sobrante era insuficiente para a conta da pensão.

Mas guerra é guerra, e nós andávamos lá para isso. Constatámos que não nos tínhamos identificado (afinal, naquele tempo, dois amarelejos ainda mereciam confiança), pelo que decidimos pelo óbvio, e procedemos à perigosa retirada estratégica até ao Dakota salvador.
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Notas do editor


Recorte de imprensa > Jornal O Século > s/ data > Notícia da agência noticiosa ANI [de 11 de Junho de 1971], sobre o primeiro ataque do PAIGC a Bissau, com foguetões de 122 mm, em 9 de Junho de 1971.

Imagem digitalizada por © A. Marques Lopes (2007). Direitos reservados.

Último poste da série de 28 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12096: História da CCAÇ 2679 (64): Comportamentos e decisões determinantes (José Manuel Matos Dinis)

Guiné 63/74 - P12447: O que é que a malta lia, nas horas vagas (16): A correspondência que me era enviada, e os autores Ramiro da Fonseca, José Régio, Vergílio Ferreira, etc. (António Eduardo Ferreira)

1. Mensagem do nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, MansamboFá Mandinga e Bissau, 1972/74) com data de 12 de Dezembro de 2013:

Amigo Carlos
Antes de mais votos de boa saúde, para ti e restante pessoal, como dizem os mais sensatos, há coisas que só depois de as perdermos sabemos o seu valor, talvez por isso eu agora a valorize tanto.

Falando de momentos de leitura, pela parte que me toca foram poucos, a não ser a muita correspondência que recebia e, como era importante essa leitura… ainda que não raramente chegasse bastante atrasada.

Algumas vezes, recebia também um jornal ligado à igreja que me era enviado por familiares, chamado a Voz do Domingo, de Leiria.

A certa altura, não sei precisar a data, na nossa companhia todos recebemos alguns livros, creio ter sido oferta do Movimento Nacional Feminino, desses apenas recordo o título de três; o Médico em Casa, do Dr. Ramiro da Fonseca, O Vestido Cor de Fogo, de José Régio e, a Aparição, de Vergílio Ferreira, este que comecei a ler num dia à tarde, apenas fiz uma pausa para o jantar, depois continuei noite fora até chegar ao fim. Ainda hoje continua a ser um dos livros que mais gostei de ler.

Estas leituras aconteceram em Mansambo, pois em Cobumba apesar de ter muito tempo disponível, apenas lia a muita correspondência que sempre recebia, no abrigo não havia luz e, todas as noites fazíamos reforço.

Durante o dia a vontade de ler era pouca, mesmo não estando de serviço a maior parte do tempo era passado no mesmo sítio, junto ao abrigo, de preferência de ouvido à escuta. Na zona todos os dias havia “festa” quando o foguetório começava nos primeiros instantes não sabíamos quem eram os contemplados, talvez também por isso, a disponibilidade mental para a leitura não fosse a melhor.

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Notas do editor

Capa do livro Aparição do site da WOOK, com a devida vénia

Último poste da série de 11 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12430: O que é que a malta lia, nas horas vagas (15): Livros oferecidos pelo Movimento Nacional Feminino e os meus livros pessoais, tais como: Seleta Literária, História Universal, Inglês e os Lusíadas (Joaquim Cardoso)

Guiné 63/74 - P12446: Bom ou mau tempo na bolanha (39): Uma simples comparação (Tony Borié)

Trigésimo nono episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.


O Tony, ainda era madrugada, naquele silêncio profundo, que algumas têm em lugares sem muito movimento, abriu o computador, e à sorte deparou com um resumo do que foi a África, muitos anos atrás.
Vinha lá mais ou menos assim em determinada página de uma enciclopédia inglesa.
Tudo começou por volta de 1517. A troca de escravos começou a ser um bom negócio para alguns países da Europa, pelo menos três. Nos séculos dezassete e dezoito, esses países da Europa, (o Tony, não os menciona), criaram-se diversas companhias, que não eram mais do que representantes de alguns governos, (o Tony continua a não nomear), que tomaram conta do negócio de escravos, e era muito simples pois os “chefes” de tribos africanas, principalmente em oeste de África, portanto na costa atlântica, colaboravam, a troco de armas de guerra, licores variados, têxteis de algodão, utensílios em metal e outras bijutarias.


Chamavam-lhe a “primeira perna, de um triângulo de negócio de escravos”, e continuava a ser simples, capturavam as pessoas nas suas aldeias, juntavam-nas em locais junto à costa atlântica, e embarcavam-nas, atravessando o Atlântico, com destino ao “Novo Mundo”, onde alguns, quando encontravam uma oportunidade para se libertar, se atiravam ao mar, em pleno Atlântico, a essa travessia, se chamava a “segunda perna, de um triângulo de negócio de escravos”. A “terceira perna, de um triângulo de negócio de escravos”, era quando chegavam ao Novo Mundo, eram vendidos em hasta pública, para diversas plantações de algodão, tabaco e açúcar. Depois conta a história de alguns países, que deixaram de receber escravos, e começaram a fazer pressão em outros países, para pararem com este negócio, sujo e miserável.


O Tony, longe entrar em comparações, lembra-se, que quando jovem, também vivia alegre, na sua aldeia do vale do Ninho d’Águia, e era um “puto” feliz, conhecia todos os vizinhos, com quem convivia, e que nessa altura feliz da sua vida lhe chamavam-lhe To d’Agar, de onde foi “arrancado”, com a colaboração das autoridades locais, pois de outro modo era única e simplesmente preso, dado como desertor, enxovalhado perante toda a comunidade onde vivia, portanto a todo este processo podia-se chamar a “primeira perna de um triângulo de um negócio, que não sabia se era de escravos”. Juntaram-no a muitos jovens da sua idade, trouxeram-no para a costa do Atlântico, que era a capital, embarcaram-no num porão, sujo, sem qualquer ventilação, acantonado com outros jovens que eram livres nas suas aldeias, de um barco que tinha um nome de uma empresa, mas trabalhava para o Estado, viajou no Atlântico, portanto era a “segunda perna, de um triângulo do negócio, que não sabia se era de escravos”. Desembarcaram-no em África, e a partir daí, não foi mais ele, até lhe trocaram o nome, pois passou a chamarem- lhe “Cifra”, e sempre teve que obedecer a ordens e regulamentos, pois de outro modo era única e simplesmente preso. Portanto seria a “terceira perna de um triângulo, que não sabia se era de escravos”, mas na verdade, embora lhe pagassem um ordenado, que nem para lavar a roupa e alguma bebida e cigarros dava, pois como primeiro cabo, recebia, se não estava enganado 465 escudos mensais, isto em 1964/66. Se algum antigo combatente, souber exactamente o ordenado certo, por favor digam, e ainda deixava metade, para a família em Portugal. Foi “escravo” durante dois anos, mas como o tempo era outro conseguiu fugir, libertar-se, tirar as “algemas”, que era a farda com que andava vestido, para ser reconhecido, não vá ter alguma ideia de querer ser livre, e fugir, ir “no mato”, talvez para dentro de alguma bolanha, portanto, na verdade não era livre, só o foi, mas com algumas restrições, ao fim desses dois anos, e no seu caso continuou a ser perseguido, onde o tal estado que o fez “escravo”, lhe fez a “vida negra”, até emigrar.

Tony Borie, 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 7 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12406: Bom ou mau tempo na bolanha (38): Um silêncio abandonado (Tony Borié)

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12445: Boas Festas (2013/14) (6): José Martins, José Rodrigues, José Santos, Joaquim Mexia Alves e Ernestino Caniço





1. Em mensagem do dia 9 de Dezembro de 2013, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviou-nos os seus votos de Feliz Natal

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2. Mensagem do nosso camarada matosinhense José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf.º da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72) com data de 10 de Dezembro de 2013:

Caros Editores do Blogue
Caros Camaradas ex-combatentes da Guiné
O “Postal” que agora vos dirijo, enviei-o à minha família quando estava na Guiné no ano de 1971, provavelmente por estas altura do ano e a propósito da quadra natalícia que se aproximava.
Apesar da simplicidade dos meios e do resultado final, atrevo-me a usar esta “obra prima” para enviar a esta Grande Família do Blogue os meus mais calorosos votos de Festas Felizes.

FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO, PARTICULARMENTE GENEROSO EM SAÚDE PARA TODOS OS CAMARADAS

José Martins Rodrigues
CART 2716
XITOLE, 1970/72


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3. Mensagem do nosso camarada José Santos (ex-1.º Cabo Aux. Enf.º da CCAÇ 3326, Mampatá e Quinhamel, 1971/73), com data de 11 de Dezembro de 2013:

FELIZ NATAL E UM 2014 RECHEADO DE TUDO BOM

JOSÉ SANTOS



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4. Mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves (ex-Alf Mil Op Esp/Ranger da CART 3492/BART 3873, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73),  com data de hoje, 13 de Dezembro de 2013:

Meus camarigos
aqui vão os meus:

Votos de Natal e Ano Novo para a Tabanca Grande

Que a paz esteja contigo
No amor e sem quezília
Um feliz Natal, camarigo
Para ti e tua família.

E passados sete dias
Os votos que eu renovo
De boas novas e alegrias
Trazidas p’lo Ano Novo.

Joaquim Mexia Alves
Monte Real, 13 de Dezembro de 2013

Um abraço amigo do
Joaquim Mexia Alves

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5. Mensagem do nosso camarada Ernestino Caniço (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Rec Daimler 2208, MansabáMansoa e Bissau, 1970/72), com data de hoje, 13 de Dezembro de 2013:

Amigo Carlos
Anexo os meus votos de Boas Festas para todo o pessoal da Tabanca.
Não sei fazer de outra maneira.

Um abraço
Ernestino Caniço


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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12440: Boas Festas (2013/14) (5): De Macau, com saúde, paz e amor, os ingredientes para a felicidade (Virgílio Valente, ex-alf mil, CCAÇ 4142, Gampará, 1972/74)

Guiné 63/74 - P12444: Últimas Memórias da Guiné (Armor Pires Mota) (9): Aerogramas para a Lili (2)

ÚLTIMAS MEMÓRIAS DA GUINÉ - 9 

Por Armor Pires Mota (ex-Alf Mil da CCAV 488/BCAV 490, Bissau e Jumbembem, 1963/65)

Aerogramas para a Lili (2)


Foto: Belarmino Sardinha - Editado por CV


“Jumbembem, 6 de Janeiro de 1965
Querida Lili:
(…)
Há notícias que varam uma pessoa e a deixam bloqueada. Esta que soube ontem à tardinha é uma delas. Ontem tropas do nosso Batalhão foram fazer uma operação, uns por terra, outros de barco. No barco pequeno que ia atrelado a outro maior, que o rebocava, a grande velocidade, seguiam 22 homens. Perto do sítio, marcado para desembarque, o barco começou a desequilibrar-se e virou-se. Resultado: oito mortos. Não sabiam nadar, o rio era fundo e, além disso, com o material de guerra que levavam… Tudo isto dói. Num momento, tantas famílias de luto. A guerra é horrível, Lili, terrível, só o diabo a poderia inventar. Mas por quê e para quê os homens se odeiam? Só para fazeres uma pequena ideia do que é a guerra, repara só nestes dados. O meu batalhão (600 homens) já tem 16 mortos e muito perto de 150 feridos, alguns deles irrecuperáveis. E era o mundo tão belo se todos se dessem bem e vivessem em paz. Olha, minha Lili, reza por mim. Só com a ajuda de Deus podemos vencer e só por Deus podemos regressar à terra.
Olha, hoje baptizou-se um soldado negro do meu pelotão. Gostaria de ser o seu padrinho, mas como o capitão também gostava, dei-lhe a preferência. É um moço esperto, inteligente, que quer ir para paraquedista. Eu já lhe disse que, se fosse para Tancos (Santa Margarida), gostaria que ele fosse a minha casa”.

[Os oito mortos integravam o Pelotão de Morteiros 980 do Batalhão, constituído por 33 homens, comandado pelo alferes de infantaria José Pedro Cruz. Iam participar na operação “Panóplia”, dia 5 de Janeiro de 1965, que se realizava na península de Sambuiá, entre o rio do mesmo nome e o rio Talicó. Os soldados embarcaram em dois barcos de borracha da Marinha, carregados com todo o material bélico. Um transportava 25 soldados, mais o comandante, rebocado pela LFG Orion, tal como acontecia com o outro, por um cabo de aço que ia ligar pela parte debaixo aos barcos, amarrado a um ferro existente no fundo do barcos. O desembarque estava previsto que fosse feito próximo do objectivo e junto do rio Cacheu. Só que aconteceu o imprevisto, o cabo partiu-se. A solução encontrada foi que os soldados suportassem nas mãos um cabo mais forte. Só que a ondulação, provocada pela Orion, fazia entrar água pela proa. Os homens tinham sido avisados de que, em caso de emergência, o cabo deveria ser solto de imediao. Foram ainda avisados que o barco de borracha tinha a tendência para baixar a proa, havendo a conveniência em se chegarem mais à ré. Só que, recomeçada a marcha, a ondulação, provocada pela Orion fazia entrar água pela proa. Foi nesse momento que alguns homens que iam na ré, assustados, se haviam de levantar. O alferes ainda os mandou sentar, mas o barco já se achava desequilbrado de um dos lados, acabando por afundar-se. Como alguns não sabiam nadar, rapidamente o pânico se instalou. Foi enorme. O alferes nadou para junto do barco e colocou-o direito, içando-se de seguida. Então, já auxiliado por um soldado, ajudaram outros camaradas a subir para dentro, mas nem todos vieram à tona da água, um única vez. Talvez o peso do material bélico tenha concorrido para tal desfecho. Entre estes oito mortos, dois sabiam nadar, mas também não foram felizes. Repescados todos os que foi o possível salvar desta enorme tragédia (dois dos que se salvaram não tinham largado o cabo), foram levados para a Orion e começaram as buscas em todos os sentidos, mas o que se recolheu então foi apenas algum material que ficara a boiar.
Vítimas desta tragédia, que vitimou tantos quantos os soldados a batalha do Como, eram dois primeiros cabos e os restantes 6 eram soldados. Foi uma madrugada negra na vida do Batalhão].


“Jumbembem, 11 de Janeiro de 1965
Querida Lili:
(….)
Tivemos um fim de ano muito triste, más saídas. Nessa maldita estrada [Canjambari] que dá tantas dores de cabeça à malta, houve mais porrada. É certo quando lá vamos. Houve vários feridos e um Fula, o guia, morreu no helicóptero a caminho do hospital. A mulher que vive aqui connosco, caiu em lágrimas, quando viu o marido na maca. Tive pena sobretudo do filho que chora que nem um louco. São os horrores de uma guerra que não perdoa a ninguém. O homem andava com azar, havia sido ferido aqui há tempos. Azarento e triste fim de ano. Os chefes até parece que têm gosto em fazer estas coisas nestes dias…”

Jumbembem, Janeiro de 1965 - Meninas limpando, aos sábados, a "parada" da CCAV 488
Foto: © Armor Pires Mota (2013). Todos os direitos reservados

“Jumbembem, 30 de Janeiro de 1965
Querida Lili:
(…)
Depois de acordar e ler o que me dizias, não mais adormeci. Estava nervoso, não devido às tuas palavras, mas porque, às 3 horas, tinha que sair para uma operação. Por Deus, correu muito bem, apesar do tiroteio de parte a parte. Queimámos uma aldeia muito grande, montes de arroz e milho e mataram-se os gados todos. Quando estava quase tudo pronto, “os tiços” deram-nos combate violento, instalados na orla do mato. Não sei nem como nem porquê, a malta irritou-se com aquilo e alguns começaram a gritar: “vamos a eles!” Pois, não queiras saber. Levaram uma surra e foram obrigados a fugir, à medida que os perseguíamos, ficando alguns no terreno. Enfim, foi um pé de lume e uma coragem de nos atirarmos a eles, o que poderia ter dado mau resultado, pois foi quase por inconsciência, que nunca vi. Claro, ao fim e ao cabo, ficámos todos partidos, pois fazer 16 kms a pé já não é para nós que estamos fartos disto. Tivemos um ferido que seguiu dali mesmo para o hospital num helicóptero que foi buscá-lo”.


“Jumbembem, 11 de Março de 1965
Querida Lili:
(….)
Estive a arranjar a trouxa para ir até Bissau. Arrumei tudo o que tinha para arrumar e pus abaixo as velhas barbas (até fiquei uma rapazinho!).
Até que enfim, Lili, vou até Bissau. Custou, mas agora parece que é mesmo verdade, se, à última hora, não houver nenhum contratempo. Deus queira que não. Vou amanhã para Farim de onde irei, no sábado, de avião para a capital. Mas, para despedida, ainda esta manhã, tive mais uma operação. Por sinal. correu muito bem. Aconteceu uma coisa que que há muito já não acontecia, não houve tiros. Eles que “brinquem” com os macacos, mas connosco não, estamos fartos. Isto está cada vez pior por toda a província, à beira do precipício.
Agora, começou o azar a bater à porta dos alferes. Há dias, com o intervalo apenas de um dia, morreram dois no sul, um dos quais já tinha 22 meses de missão cumprida. Como vês, as balas não escolhem postos nem tempo de comissão”.

[Em 21 de Novembro já estava eu a contar ir a Bissau tratar da saúde e aliviar as tensões no início de 1965. Para ir à consulta era necessário o médico fazer uma proposta, que teria de ir ao hospital, a fim de ser assinada, autorizada e marcada a data. Mas a assinatura levava por vezes três meses. A minha estava a atingir esse tempo. Era compreensível. O hospital era tão pequeno e tão poucos os médicos que os doentes não eram atendidos, quando deveriam ser, excepto, claro, se estivessem em perigo de vida. Primeiro, estavam os feridos graves e os mais ligeiros, que chegavam de toda a parte. Outra razão que não me havia permitido ir em Novembro, é que o capitão Arrabaça regressava de novo ao hospital e, além disso, andava lá em tratamento outro alferes, dizia eu noutro aerograma de 21 de Novembro de 1964. O remédio era esperar e, como por Deus, não estava assim tão abalado na saúde e não podia inventar doença grave para demorar por lá mais tempo…
Como o capitão Arrabaça havia sido hospitalizado, nos meados de Outubro, tinha mais trabalho: tinha que sair quando calhava o meu pelotão ter de ir para o mato, para a porrada, e tinha que sair, quando saíam os outros dois, como comandante de companhia interino. A porta da guerra ainda estava longe de ser fechada e ainda não tínhamos destruído aos terroristas os planos da pólvora…]

[Noutro aerograma, datado de 13 de Março de 1965, escrevia à Lili a dizer que “a primeira bicharada” já havia desaparecido com o tratamento, mas havia feito mais uma análise e acusava outra espécie menos perigosa e em menor quantidade. Deveria desaparecer. Mesmo assim, não eram tão resistentes, obedeciam à medicação. Dava ainda a notícia do que o nosso conterrâneo Manuel Quintas havia sido operado a um quisto sem importância, enquanto o Victor Santos, ferido numa perna, já tinha tido alta. Disse-me que ia fazer ronha, que não podia andar muito bem. Já tinha uma recordação. Também aguardava pelo conterrâneo, João Barreiras, que enconrei da guerra do Como e me havia dito que vinha passar um mês a Bissau.]


“Hospital Militar, 7 de Abril de 1965
Querida Lili:
(…)
Sabes, já comprei o meu “folar” para os soldados do meu pelotão: vinho do Porto, bolos, amêndoas, que já mandei para o mato. Assim, sempre se lembrarão que, no dia 18, é Dia de Páscoa. Além disso, na minha ausência, tem-se portado à altura, apanhando em combate mais material aos terroristas. Coitados, estão sempre à espera que eu vá… Confesso que tenho saudades dos moços (não da porrada, claro), mas também para ser franco, prefiro estar longe, em Bissau. Aquilo lá está muito mau, péssimo. O médico escreveu-me hoje. Estão muito desanimados. Não sei se já te disse, mas dos três moços feridos, um [negro] foi sepultado na quarta-feira e há outro que está mesmo muito mal".

[Nesta altura, o meu grupo de combate que era de 40 homens, desses apenas vinte estavam válidos, operacionais. Quem comandava o pelotão era um furriel, o único que então tinha dos quatro que inicialemte me pertenciam. Apesar disso e de não ter havido feridos, as operações continuavam].


“Bula, 22 de Julho de 1965
Querida Lili:
(…)
Como já deves ter reparado – e já deves saber pelo Quintas [Manuel Pires de Oliveira] – encontro-me, de novo, no mato. Isto “até ao lavar dos cestos é vindima”, diz-se na nossa terra. Isto é guerra e está tudo dito. Estou certo de que só estou seguro, quando puser o pé em casa. Também é verdade que não me pertencia estar aqui, pois sou o mais antigo alferes ao serviço da companhia. Mas já te digo os motivos. Não vim para lamber as botas a alguém, detesto ser ”engraxador”; não vim porque goste da guerra, detesto a guerra e os seus efeitos, mas vim por estas razões: 1) tinham que vir soldados do meu pelotão e sempre gostei de os acompanhar; 2) porque, devido ao que te contei, não suporto homens com duas caras; 3) porque o lugar onde estamos é razoável. O quartel fica numa vila, Bula. Há tanta diferença entre este e o de Jumbembem…
Isto aqui é quase uma “cidade”. Até se pode sair do arame farpado e dar um passeio, coisa que nunca me aconteceu. O trabalho é que é um pouco chato, porque, noite sim, noite não, temos de guardar um cais. Dormir, não se dorme. Depois, há a praga infernal dos mosquitos e, para refrescar, a chuva. É uma noite perdida. Também dia sim, dia não, lá passamos um dia inteiro a ver chegar e partir embarcações. Só custa menos, porque ora pescamos, ora caçamos ou dormimos… Também veio comigo, voluntário, um colega, o alferes Bretão. Por isso, querida, não te preocupes. A zona onde trabalho, é calmíssima, comparada com as zonas onde tenho estado. Imagina tu que até tem ruas iluminadas…”

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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12432: Últimas Memórias da Guiné (Armor Pires Mota) (8): Aerogramas para a Lili (1)

Guiné 63/74 - P12443: Notas de leitura (543): "Guiné - Guerra e Poesia - Canjadude e Bolama", de José Martins Gago (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Julho de 2013:

Queridos amigos,
Se há domínio na literatura de guerra onde se encontra a singularidade do confessional é o diário.
José Martins Gago traz uma especificidade: o dia-a-dia, a rotina, os acontecimentos fatídicos, o retrato ao espelho, a observação do meio, cultiva a sinceridade que por vezes arrepia. Há para ali imenso sofrimento físico, cedo irrompem as perturbações gástricas que só são tratadas convenientemente no final da comissão. Chega a pisar uma mina, vê o rebentamento de uma GMC, vive os seus dias da ira. Dedica-se a uma horta, deslumbra-se com o Corubal.
O homem soldado é por vezes mais forte que o disciplinado contra-guerrilheiro e dá-nos a saber que poeta e lemos toda a sua poesia, desse tempo.
Recomendo José Martins Gago, um abraço do
Mário


O diário de Canjadude e Bolama, por José Martins Gago (1)

Beja Santos

Nisto de surpresas diaristas, podemos estar certos e seguros que elas podem chegar a qualquer momento, o alforge dos diários de guerra parece ainda ter muitos papéis íntimos que nos chegam repentinamente às mãos. É o caso de “Guiné, Guerra e Poesia”, Canjadude e Bolama”, Chiado Editora, 2012.

José Martins Gago comandou um pelotão da CCAÇ 5, sediado em Canjadude, no exato momento em que, após a retirada de Beli, Cheche e Madina do Boé, o PAIGC ganhou espaço de manobra e começou a aproximar-se dos destacamentos mais próximos, Cabuca e Canjadude.

Fez em Mafra a recruta e a especialidade, seguiu para a Carregueira, onde deu instrução, quando já julgava não ser mobilizado notificaram-no para a rendição individual. No Cais da Rocha do Conde de Óbidos, embarcou no Alfredo da Silva. Confessa que esteve indeciso sobre a publicação do seu diário, considerou que devia expurgar o registo das informações que acumulou em cadernos de apontamentos e nos aerogramas que enviou à mulher, retirando-lhe referências muito pessoais. Depois tomou a decisão de dar a este livro a forma de um diário para que presentes e vindouros tenham acesso ao dia-a-dia de uma comissão na Guiné, entre 1969 e 1971.

É a observação pessoal que vai pesar neste livro de mais de 650 páginas. José Martins Gago vai passar a sua comissão a falar de perturbações gástricas, má convivência com a comida do rancho, com o excesso de trabalho que envolve abertura de valas, inventário da cantina, patrulhamentos incessantes, o envio diário de aerogramas para a mulher, faz poemas, tem que recorrer a sedativos para dormir, cultiva extremosamente uma horta. Antes de partir, foi até à Feira da Ladra onde comprou uma farda já coçada, não queria fazer o número do periquito pronto a debutar em Canjadude, onde chega no fim de Março de 1969.

Canjadude é constituído por uma tabanca Mandinga e pelo quartel assim formado: “Um barracão onde dormem alguns dos graduados, uma espécie de barraca que serve de messe, uma parte para soldados e uma cantina para oficiais e sargentos e por quatro abrigos subterrâneos ainda não acabados e por isso não habitados; falta arranjar o seu interior que está imundo de sujidade de toda a espécie”, ali perto corre o rio Nhanhasse, ali perto fica a fonte. Logo lhe chamou a atenção a horta, encontrou pimentos, melancias, salsa e abóboras. E escreveu o comentário: “Tudo estava muito pobremente tratado e cheio de ervas. Via-se que ninguém ali percebia do assunto e seria algo a que deitaria mão logo que me fosse oportuno” e acrescenta: “A terra era boa, nutritiva e arenosa com humidade suficiente para possibilitar o desenvolvimento rápido das plantas. Mas muito mais se pode fazer e sem dúvida se fará, quando eu estiver mais apto a contribuir com o meu trabalho de iniciativa".

Sabe que a missão é a defesa deste território até ao rio Corubal, não está disposto a facilitar absolutamente nada no aspeto da segurança operacional. A partir de 25 de Março, e com raras exceções, consagra-se de alma e coração à escrita. No primeiro dia diz que descansou à sombra de uma frondosa mangueira, tirou algumas fotografias para mandar à mulher, arranjou lavadeira e tece a primeira das muitíssimas críticas que irá fazer à comida. Ao jantar, foi servido um esparguete que, “com tanta gordura que deixava a boca a saber a toicinho, mas não fiquei sabendo se era toicinho, se azeite ou óleo, mas lá comi depois de lhe ter acrescentado água". No dia seguinte, mais considerações sobre a comida: “Comi chouriço que tinha trazido, com ovos mexidos e depois um prato de arroz bem atestado com bastante carne de vaca, que se estivesse bem confecionado seria um repasto, mas mesmo assim não lhe perdoei”.

Segue-se a primeira coluna a Nova Lamego, fala dos seus soldados e de aspetos da vida social. Entrou no ramerrão, voltou a espreitar a horta, faz propósitos de alterar a cozinha e os menus. A segurança do quartel preocupa-o, Canjadude é agora o quartel mais a sul, não tem ilusões contra o avanço do PAIGC. No fim do mês já fez patrulhas e descobriu a sede, o cansaço, os pés cheios de bolhas. Tal é o sofrimento que um dos soldados se ofereceu para lhe levar a espingarda. Um mal nunca vem só, ouve-se um grande alarido e os soldados gritam: baguera! baguera!, surgira um ataque de abelhas.
Começa a estudar os colegas, começa pelo Sousa: “É um doce de pessoa mas não nasceu para fazer guerras ou sequer vivê-las. É um espírito dedicado à música, com uma sensibilidade acima da violência. Não devia ter sido colocado nesta especialidade e só a ausência de preocupação com a vida alheia permitiu que o tivessem aqui colocado”. Impressionou-o tanto o cantil que lhe dedicou um poema. É muito interveniente, descobre que os seus soldados não sabem preparar a cal, lá foi ensiná-los e explica: “Por sorte sei como se fazem todos estes trabalhos, na província e no Alentejo especialmente toda a gente caia as casas uma vez por ano, normalmente no Outono e eu sempre convivi com esta e outras realidades, que agora me estão sendo úteis”.

No interior do quartel, procurar dar vazão às múltiplas tarefas. Em Abril, vai em coluna até Bambadinca buscar as provisões, os soldados protestam por descarregar do barco e carregar as viaturas, e com o estômago a bater horas. Descreve ao detalhe o fadário das colunas até ao Gabu, a porção da estrada que se pica. É manifestamente religioso. Sucedem-se os patrulhamentos e a vigilância à volta do quartel. Em Abril, já anda a plantar couves na horta: “Estou a tornar-me um autêntico cavador, um bom comerciante e um aprendiz de advogado, além de guerrilheiro”. Está sempre irrequieto, tenta fazer uma fisga para ir aos pássaros mas não conseguiu arranjar a forqueta. Descobre a alegria da chegada do correio. E a 13 de Abril começam os problemas do estômago que o acompanharão toda a comissão.

Cabuca é entretanto flagelada. Estende-se invulgarmente no seu diário de 14 de Abril, se é verdade que se está na última fase da guerra de guerrilhas é de admitir uma maior frontalidade nos combates, é premonitório: “Mas tudo pode mudar de um momento para o outro, basta que as forças IN arranjem maneira de dominar o ar, ou impedir o nosso domínio e a guerra para nós estará perdida. Terminarão as evacuações dos feridos, o que levará a mais mortes, ficarão impossibilitadas as represálias em combate e até os reabastecimentos será irremediavelmente afetados. Será o fim!”.
Num patrulhamento vão até ao rio Corubal, onde antes estava o destacamento do Cheche, deslumbra-se com o rio, a magnífica paisagem, o facto de ser uma região de rara frescura. Já não vive incomodado com a rotina, quando não tem coluna ou patrulhamento dedica-se à limpeza do quartel, combate a imundice, faz exercícios de fogo real. Regista os rebentamentos sucessivos em Dara e Fassilima, o primeiro perto de Nova Lamego o segundo a vinte quilómetros de Canjadude, pelas suas contas é este o próximo aquartelamento a ser flagelado. O que o preocupa mais são as precárias instalações de defesa.

Em fins de Abril, num patrulhamento, vai até Canjadude Delta, uma tabanca queimada, quase se cruzam com uma patrulha IN, esta resolveu não dar luta. Regista no seu diário o prazer de chefiar os seus homens: “Dá gosto andar com eles, somos um grupo coeso, formamos uma peça única”. E escreve entusiasmado: “Eu não queria louvores, queria sim um grupo de combate senhor da guerra, que eu pudesse conduzir no mato com a segurança e a certeza de que minimizaria sempre o número de baixas no nosso grupo e infligiria o máximo de perdas ao inimigo. Eu não queria ser o melhor operacional da Guiné, mas queria ter razões para não me sentir um falhado, que morre e deixa morrer aqueles que dependem de si”.
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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12417: Notas de leitura (542): "Na Nha Manera Di Odja", de Fernando Antunes (Mário Beja Santos)