terça-feira, 15 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18636: Agenda cultural (637): Lançamento do livro "A Força Aérea no Fim do Império" (Lisboa, Âncora Editora, 2018, 480 pp.) (José Matos)

Capa do livro


1. Mensagem do nosso amigo José Matos, com data de 9 do corrente,

[Investigador independente em História Militar; tem feito investigação sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial, principalmente na Guiné; é colaborador da Revista Mais Alto, da Força Aérea Portuguesa; tem publicado também o seu trabalho em revistas europeias de aviação militar, em França, Inglaterra e Itália; é membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo cerca de 3 dezenas referências no nosso blogue]

Olá,  Luís:

Pedia-te para divulgares no blogue a seguinte obra colectiva.

“A Força Aérea no Fim do Império” é um livro que acaba de sair na editora âncora sobre a forma como a Força Aérea actuou em África durante a guerra colonial. O livro tem textos de 24 autores que abordam diferentes aspectos da actuação da FAP nos antigos territórios ultramarinos.

O livro agora editado vai ser apresentado no dia 28 de Maio, em Lisboa, e incide exclusivamente sobre a acção da Força Aérea nas três ex-colónias. Como sabemos, foi uma força que teve um papel muito importante nas acções militares, mas também no apoio logístico levando comida, correio e outras coisas a quartéis muito isolados.

O livro tem 480 páginas e já está à venda nas livrarias e custa 24€. Para além das livrarias também pode ser encomendado directamente na própria editora. Ver o sítio aqui.

Ab,  Zé


2. Palavras do presidente da Liga dos Combatentes, sobre o livro:

 «Repito e reforço esta ideia, quantos combatentes, de Terra, Mar e Ar, estão vivos e devem a vida à ação da Força Aérea? Jamais se pode falar da História da Força Aérea, sem que se enalteça o período mais brilhante, como Ramo Independente das Forças Armadas Portuguesas: a sua ação na Guerra do Ultramar, antes, durante e depois dela ter terminado. 

"Por isso aqui estamos a enaltecer, sublinhar e agradecer em nome de todos os que direta ou indiretamente sentiram o que foi a ação da Força Aérea, nessa guerra, quer em ações independentes quer na extraordinária forma como conduziu, no seu âmbito, a Cooperação Aeroterrestre. A Força Aérea, sempre ao longo de toda a sua História, tem sabido evoluir de acordo com as circunstâncias e com os recursos disponíveis. Novos combatentes cumprem novas missões nas Operações de Paz e Humanitárias. A todos desejamos os maiores êxitos.»

Joaquim Chito Rodrigues
Presidente da Liga dos Combatentes


3. Sobre os 3 autores do livro, ver as seguintes notas biográficas: 

(i) Tenente-general piloto-aviador António de Jesus Bispo

Nasceu em 1938, em Abrantes. Serviu na Guiné, nos princípios de 1963, por cerca de três meses, como tenente; de agosto de 1964 a abril de 1966, como capitão com qualificação operacional em F86F, T6-HARVARD e DO27 e comandante de esquadrilha e de esquadra; e em nova comissão de serviço, de outubro de 1970 a novembro de 1971, como major com qualificação operacional em FIAT-G91, T6-HARVARD e DO27 e comandante do Centro de Operações Aerotácticas do Grupo Operacional.

Realizou cerca de 1100 horas de voo em acções operacionais do Aeródromo Base n.º 2, depois Base Aérea n.º 12, da Guiné.

É coautor do 9.º livro da coleção Fim do Império, "Olhares sobre Guiné e Cabo Verde".

(ii) Tenente-general piloto-aviador José Armando Vizela Cardoso

Nasceu em 1941, em Torres Novas, e em 1965 foi brevetado na BA1-Sintra, depois de ter frequentado a Curso de Aeronáutica na Academia Militar e concluído o tirocínio em T-37.

Frequentou de seguida, na BA2-Ota, o Curso de Instrução Complementar para Aviões de Caça e o Curso de Instrutor, em T-33. Em 1969 chegou a oferecer-se como voluntário para servir na Guiné, e em agosto de 1972 seguiu para Moçambique, para servir no AB7-Tete, depois de completar o Curso Operacional em F-86F e Fiat G-91, na BA5-Monte Real. 

Como Capitão, no AB7-Tete, exerceu em sobreposição, as funções de Comandante da ESQ702 «Escorpiões», Oficial de Operações do GO7001, Oficial de ligação da Força Aérea com o Exército, Oficial de Segurança de Voo da Unidade e, algumas vezes, foi Comandante do GO7001 e do próprio AB7. 

De regresso a Portugal, em outubro de 1974 foi colocado na BA5 onde, entre julho de 1975 e fevereiro de 1979, foi Oficial de Segurança de Voo e comandou a ESQ 103, voando T-33 e T-38. Entre 1979 e fevereiro de 1983, serviu na Divisão de Operações, do Estado-Maior da Força Aérea. 

Entre fevereiro de 1983 e agosto de 1985 serviu na BA6-Montijo, como Comandante Intº, Comandante do GO61 e 2.º Comandante. Serviu ainda na Divisão de Operações do SHAPE-Bélgica (1985-1988) e como Chefe de Divisão de Operações do EMFA. Em 1992/1993 comandou a BA5, qualificando-se em A-7P Corsair II e, já como Oficial General,  foi Adjunto para as Operações do CEMFA, Chefe de Gabinete do CEMFA e Director do IAEFA.

Deixou voluntariamente a Força Aérea em maio de 2000, com mais de 4000 horas de voo e quase 40 anos efectivos de serviço. Tem 12 condecorações (entre elas a Medalha de Serviços Distintos, com Palma) e 14 louvores.

(iii) Major-general piloto-aviador Ricardo Carvalho Cubas

Nasceu em Lisboa em 1936. Frequentou a Academia Militar tendo obtido o seu brevê depois de completar em T33, o curso complementar de aviões de combate. Foi instrutor de pilotagem no avião T6-HARVARD e fez três comissões em África. A primeira em Angola como piloto da Esquadra 94 em Luanda, a segunda na Guiné como comandante da Esquadra 122 na Bissalanca e a terceira em Angola como comandante da Esquadra 94 em Luanda. 

Para além de mais de cerca de 3 milhares de horas de voo em helicópteros (AL-III e SA330-PUMA) voou ainda, cumprindo muitas missões operacionais nos teatros de operações da Guiné e Angola em vários aviões, nomeadamente T6-HARVARD, DO27 e PV2-HARPOON.

Foi Diretor de Instrução da Força Aérea e delegado do Chefe do Estado Maior para a cooperação técnico-militar com os Países de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), passando à situação de reserva em 1994 e posteriormente à situação de reforma.

Guiné 61/74 - P18635: Lembrete (29): Lançamento do livro de Mário Beja Santos, "Um Escafandrista nas Nuvens", Âncora Editora, amanhã, dia 16 de Maio, pelas 18 horas, no Auditório da Sociedade Portuguesa de Autores, em Lisboa

L E M B R E T E



CONVITE À TERTÚLIA DA TABANCA GRANDE

LANÇAMENTO DO LIVRO DE MÁRIO BEJA SANTOS, "UM ESCAFANDRISTA NAS NUVENS", AMANHÃ, DIA 16 DE MAIO DE 2018, PELAS 18 HORAS, NO AUDITÓRIO DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES, AV. DUQUE DE LOULÉ, LISBOA. 
APRESENTADOR, JOSÉ JORGE LETRIA.

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"UM ALMOÇO COM OS BRAVOS DO PELOTÃO"


Na véspera, elaborara o menu, fizera compras e agora lança-se ao trabalho. Uma sopa simples, como sempre frita a cebola, esquarteja e esfarripa couves e brócolos e um alho francês, junta umas ervilhas, enfiou as batatas aos gomos, salgou e apimentou, meteu um cubo para dar gosto e muito alho, como sempre ajuntou coentros. Quem diz comida para guineenses diz arroz, fê-lo com cenoura aos bocadinhos e meteu umas ervilhas. Quem recebe guineenses tem que saber várias coisas: os muçulmanos bebem água ou sumo, os animistas ou cristãos não dispensam um copázio de vinho, ou vários, e não há prato mais apreciado que bacalhau, cozido ou na brasa, à Zé do Pipo, em cebolada, a nadar em azeite. Berto decidiu-se por uma açorda de bacalhau, tinha pão alentejano, preparou tudo a preceito. Pedira encarecidamente a todos que se juntassem no largo da igreja de S. Domingos, e que tomassem o metro do Rossio, pedia para virem juntos, para terem a comida quentinha, preparou ainda uma salada de frutas e havia depois uma tisana com bolo da Madeira.

Este almoço estava aprazado desde há meses atrás, ao tempo em que lhe fora diagnosticado o cancro, Berto convidou o seu amigo Suleimane Djaló, antigo soldado, para almoçarem e explicou-lhe que tinha uma doença grave e que podia morrer, havia ali em casa um conjunto de objetos relacionados com a Guiné que ele queria oferecer a quem com ele combatera, coisas com valor sentimental. Aquele Futa-Fula calmeirão de cabelo pintado ouvira-o silenciosamente, só interrompendo, quando Berto falava em poder morrer para dizer que Deus era grande e que nós, os homens, nada sabíamos sobre a Sua inescrutável misericórdia. E mais disse a Suleimane que tinha preparado um documento que ficava em poder dos filhos para distribuir pequenas importâncias para os mais necessitados. Vivia, por um lado, tranquilo, com aqueles que dispunham de pensões por deficiência, ao serviço das Forças Armadas, havia outros que beneficiavam de segurança social, tinham obtido a nacionalidade portuguesa, mas havia um ou dois casos que o inquietavam muito, sentia que o estado de saúde do seu antigo guarda-costas, Inderissa Mané, se estava a deteriorar e que Dauda Seidi, depois de dois graves acidentes cardiovasculares precisava de muito apoio. Em suma, desejava estar com todos aqueles que com ele combateram, mais Dauda Seidi que conhecera em criança e que acompanhava tão fraternalmente desde que ele decidira fixar-se em Portugal, fora professor primário, a pretexto de uma formação em Setúbal foi-se deixando ficar, trabalhou arduamente na construção civil, foi explorado por patrões inescrupulosos que lhe retiraram dinheiro para a segurança social, Dauda veio a descobrir, quase 20 anos depois que não existiam os seus descontos, eram um ilustre desconhecido, uma infâmia que se praticava com muita gente.
(…)
Pouco passava da uma da tarde quando soou a campainha e Berto foi feliz abrir-lhes a porta, saiu para o patamar, gostava de os ver a subir, uns mais lestos outros a acusar a idade e a dificuldade das próteses. Como sempre, abraçou-os com carinho, a uns dava mesmo beijos, àquele que ele conhecera em criança, ao seu guarda-costas que sofrera horrores nas prisões guineenses, ele que fora um simples soldado comando, e a Suleimane, a quem devia talvez a vida. O que talvez importa esclarecer o leitor.

Sentam-se e começa a algazarra, a barulheira com o sorver da sopa, as manápulas em direção ao cesto do pão, comentários com a boca cheia, para Berto há pouco contentamento maior do que este, olha enternecido para esta velhada com quem ele conviveu diariamente por mais de dois anos todos os dias, que passaram as maiores agruras finda a guerra, que viviam com as maiores dificuldades e sempre a ajudar as famílias, Berto vai fazendo perguntas a cada um, há os filhos e há os netos, há mesmo divórcios, caso de Ieró Baldé que veio para Portugal e comprou uma mulher nova em folha, anos depois, e já com três filhos, tudo deu para o torto, Cumba anunciou que não queria viver mais com Ieró, este pediu a interceção do nosso alferes, nosso alferes foi a Chelas J, viagem proveitosa para se aperceber que o mundo mudara, que uma mulher guineense, a trabalhar a dias ou em supermercados, convivendo com outra gente sacrificada mas com sonhos e ambições, a mentalidade evoluíra, era o caso de Cumba que lhe dizia sem papas na língua que não aceitava viver com aquele velho, mesmo sendo bom homem, conhecera alguém que amava, já dera conhecimento aos filhos da sua decisão, queria ser feliz.
(…)
Naquela mole humana sentada na mesa da varanda, Mamadú Camará olha-o de forma perscrutante, vai começar o jogo de perguntas e respostas sobre a sua família que vive em Belfast. Mamadú Camará de há muito que vive em Portugal, em 1972, numa operação dos Comandos em Salancaur, foi atingido num calcanhar, andou anos na cirurgia a tentar uma reconstituição, todo falhou, acabaram por lhe amputar o pé, ficou deficiente das Forças Armadas. Arranjou uma relação estranhíssima com uma cabo-verdiana que tinha morto o primeiro marido com um facalhão do talho, juntaram-se quando ela saiu do presídio, já havia dois meninos do primeiro casamento apareceram depois mais três. Segundo Mamadú, o casamento foi um inferno, o valoroso Comando aceitou encarregar-se da educação dos cinco filhos, os seus e os de Filomena Cardoso Évora. Então não é que três daqueles filhos casaram com irlandeses e vivem na região de Belfast? É com prazer que Mamadú passa a comandar a conversa, todos o ouvem com atenção, os muçulmanos arrepiados com este Fula traidor que lambe a beiça a comer ovos com bacon, quase todos os dias, que gosta de uísque e frequenta pubs. Mamadú não veste como os outros combatentes, traja fato completo, com colete, sempre bem engravatado, é um gigante que claudica um pouco, devido à prótese, mas que lhe dá um andar distinto, ele tem consciência de que traz à conversa uma abertura sobre o mundo, a Irlanda é mar ignoto na vida destes guineenses agrilhoados pelo destino, conhecem pouco de Portugal, em tempos idos da juventude chegaram a visitar o Senegal, a Guiné-Conacri, a Gâmbia ou até o Mali, com a guerra tudo mudou, embora nas conversas se fale naqueles que emigraram e que procuram melhorar as suas vidas no Senegal.

Caminha-se para o meio da tarde, há quem já olhe para o relógio, Berto sugere que passem ao seu escritório, quer mostrar-lhes aqueles papéis, dar-lhes um destino especial. Algo que jamais esquecerá é quando entrega a Dauda o mapa da região do Cuor, andava sempre com ele dentro de um revestimento de plástico, dentro de um bolso na coxa do camuflado, aquele é o chão de Dauda, para um guineense o chão é sagrado, dali se parte e ali é imperioso regressar, deve-se ajudar a família que vive no chão, lembrar os mortos que estão no cemitério, o chão é uma condicionante para toda a vida, e ter agora aquele mapa com nomes de localidades que jamais existirão mas que fizeram a grandeza do Cuor, é motivo para deixar Dauda emudecido pela forte emoção. Entregam-se os outros bens, coisas que Berto trouxe da Guiné em 1970 e que devem ficar em mãos guineenses, pois claro. Promete-se novo encontro em breve, todos sabem que faz parte da encenação, se tudo correr bem vão encontrar-se daqui a alguns anos. Em caso algum os bravos do pelotão de nosso alferes conhecem a doença de Berto, só Suleimane é que está na posse do segredo daquele cancro, nesta hora, segundo diz o médico, altamente controlado, por isso nunca se falou da visita da morte, cada um deles leva cartas para entregar, abraçam-se, e Berto fica seraficamente a vê-los partir, ouve-se um rumorejo de crioulo, é o suficiente para ele retornar à Guiné, uma das chaves elementares da sua existência. Então, qualquer dia estaremos novamente juntos, fecha a porta e sente-se cheio de saudades daquele chão onde viveu tão intensamente, daqueles cheiros penetrantes, daquele solo arenoso que se lhe colava a todas as células do corpo, daquele sol ofuscante, daquelas gentes com quem viveu dentro do arame farpado. “Não queria morrer sem voltar à Guiné”, diz para si próprio, não sabe se é promessa ou se faz parte da oração diária, da dádiva de estar vivo e intensamente lembrado dos códigos da camaradagem de guerra, que nunca se desfazem.
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17969: Lembrete (28): Para os camaradas da 23ª hora: termina à meia-noite o prazo de inscrição para o 34º almoço-convívio, em Algés, da Magnífica Tabanca da Linha... O vice-régulo Manuel Resende estava audivelmente feliz, ao telefone, há um bocado: com 72 inscrições, ía-se entrar para o livro dos recordes do Guiness!... Atenção, malta, que o cabrito do "Caravela de Ouro" é da Serra, certificado, não é o "cabrito pé de rocha, manga di sabi" que alguns de nós comemos, em sandocha, no mercado de Bandim...

Guiné 61/74 - P18634: Parabéns a você (1433): António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18620: Parabéns a você (1432): Fernando Valente (Magro), ex-Cap Mil Art do BENG 447 (Guiné, 1970/72) e Henrique Matos, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52 (Guiné, 1966/68)

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18633 Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXI: As minhas estadias por Bissau (iv): janeiro-fevereiro de 1968


Foto nº 44 A > Bissau, feveiro de 1968 > O autor, à direita, com o seu camarada Verde, junto à estátua de Diogo Cão, com as muralhas da Amura, por detrás (*).


Foto nº 44 >  Bissau, fevereiro de 1968 < Praça e estátua de Diogo Cão


Foto nº 45 > Bissau, janeiro de 1968 > Passeio de motorizada pela marginal


Foto nº 46 > Bissau,  c. janeiro de 1968 > O Virgílio Teixeira e o seu camarada Verde, em passeio com motorizada. Ao fundo, o famoso restaurante "O Solar dos Dez" que era frequentada pelas altas patentes militares do CTIG.


Foto nº 46 A > Bissau,  c. janeiro de 1968 >  Ao fundo, o restaurante "O Solar dos Dez"


Foto nº 47 > Bissau, fevereiro de 1968 > Em primeiro pleno, à direita: o alferes mil Fragateiro, do presidente do CA do BCAV 1915, ao lado Fragateiro, o alf mil Alberto Fontão, comandante de um PINT [Pelotão de Intendência]; e depois o fur mil Nelson, ajudante do Fragateiro; eu, do lado esquerdo, de óculos, e à minha direita, um furriel de quem não me lembro o nome.


Foto nº 62 > Bissau, fevereiro de 1968 > No café Bento petiscando qualquer coisa. No extremo esquerdo sou eu, no direito é o meu amigo do Porto e do  café Cenáculo, hoje  economista, o alferes Pinto Gomes, que estava na Chefia da Contabilidade. Ao lado dele está o furriel Riquito.do meu CA, e os outros dois são também oficiais da Chefia de Contabilidade. Éramos todos do Porto.


 Foto nº 54 > Bissau, 2 de fevereiro de 1968 > O N/M Funchal, ao fundo. Transportou o alm Américo Tomás, e sua comitiva na visita presidencial à Guiné, ainda no tempo do gen Schulz


Foto nº 59 > Bissau, 2 de fevereiro de 1968 > Visita do alm Américo Tomás >  Final da Av da República, hoje, Av Amílcar Cabral. A estátua que se vê era a de Nuno Tristão, erigida por ocasião do 5º centenário do seu desembarque em terras da Guiné (1446).


Foto nº 64 > Bissau, fevereiro de 1968 > Num domingo,  sentado na marginal junto ao porto cais de Bissau, com um camarada, parece-me o irmão do furriel Riquito,  do meu CA [, Conselho de Administração], mas não tenho a certeza.

Guiné > Bissau > CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69).

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já mais de meia centena de referências no nosso blogue.

Recorde-se que o Virgílio Teixeira, de acordo com o seu CV militar:

(i) entrou em Mafra, na Escola Prática de Infantaria (EPI), em 3 de janeiro de 1967, ainda antes de completar os 24 anos de idade:

(ii) como habilitações literárias, tinha já os dois primeiros anos da Faculdade de Economia do Porto (, licenciatura que completou depois da tropa);

(iii) ao fim de 9 meses, partíu de Figo Maduro,  em 20 de setembro de 1967,  num avião militar, com o comando avançado do BCAÇ 1933,  para render o outro batalhão, o BCAV 1915, que seguiu para Bula;

(iv) fez o serviço no CTIG como alferes miliciano, sendo a sua especialidade o serviço de administração militar (SAM);

(v) nessa qualidade, foi chefe do conselho administrativo (CA) do BCAÇ 1933, ou seja, o oficial mais perto do comandante de batalhão, que era um tenente-coronel;

(vi) não tendo sido um "operacional" propriamente dito, por isso, "contar muita coisa sobre operações em concreto, embora tivesse feito muitas colunas militares de reabastecimentos, quer por rio ou por estrada", além de muitas patrulhas à volta dos aquartelamentos, e vivendo muitas vezes os bombardeamentos contínuos às  posições [das NT]";

(vii) faz questão também de declarar que dá "um valor enorme ao sacrifício das nossas tropas": "conheço, por aquilo que leio agora, o que se passou e nós não sabíamos quase nada. Passaram mais de 40 anos até se perceber o que foi aquela guerra";

(viii) "esta reportagem - Bissau, parte I - pretende focar apenas a cidade e arredores de Bissau, as suas várias escapadelas, outras deslocações em serviço, as vivências e acima de tudo as loucuras da juventude, por esta cidade-capital, que, apesar de tudo, ficou marcada para o resto da vida";

(ix) "os comentários que são feitos às fotos, são apenas de memória, o que veio à cabeça, e por consulta a vários elementos escritos, em especial aquilo que está escrito nas costas das fotos";

(x) a esta parte o autor chama-lhe “As minhas Estadias por Bissau” ; deixa, para futura reportagem , o tema "Bissau – Parte II"; e aí sim, vai dar-lhe um nome sonante: “As minhas férias na Guiné”... que engloba tudo, Bissau, Nova Lamego e São Domingos, incluindo os aquartelamentos de Cacheu, Susana e as praias de Varela.


Guiné 1967/69 - Álbum de Temas: T031 – Bissau - Parte 1 > (iv) Jan / fev  1968 > Legendagem (**)

F44 – Numa praça junto ao Hotel Portugal, com a imagem de um navegador português, que vergonhosamente não me lembra o nome, (,talvez Diogo Cão? Pero Vaz de Caminha?)... Estou eu e o meu camarada Verde do BCAÇ 1932. a imitar o nosso navegador. Bissau, Fev68.

[Observação do editor Vd. poste P14211 (*)

Praça e estátua de Diogo Gomes frente à ponte cais de Bissau... Ao fundo, muralhas da fortaleza da Amura. Segundo Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura colonial do Estado Novo, o pedestal (agora vazio) da estátua do Diogo Gomes ainda lá está, tal como a inscrição, um exerto do canto VII dos Lusíadas, "Mais mundo houvera"... O pedestal é obra do Gabinete de Urbanização do Ultramar. A estátua (removida, depois da independência,  para o forte do Cacheu) deve ser da autoria do escultor Joaquim Correia, autor de monumento análogo que ainda hoje está de pé na cidade da Praia, Cabo Verde. 

Esta e outras estátuas (Honório Barreto, Nuno Tristão, Teixeira Pinto) faziam parte de "um escrupuloso programa de 'aformoseamento' do espaço público", integrado nas comemorações do 5º centenário do desembarque de Nuno Tristão. na altura do governo de Sarmento Rodrigues (1945-48). No entanto, a colocação das estátuas destas figuras históricas da colonização só será efetuada na segunda metade da década de 1950 [Vd. Ana Vaz Milheiro - 2011, Guiné-Bissau. Lisboa, Círculo de Ideias, 2012. (Coleção Viagens, 5), pp. 32-33].


F45 – Um passeio de motorizada, num Domingo de manhã, na marginal do porto, com as palmeiras bem grandes e arranjadas, verdejantes, com pouca gente nas ruas. Bissau, Janeiro68.

 F46 – Uma volta de motorizada com o amigo e camarada Alferes Verde, na marginal, junto aos Estaleiros Navais da Marinha, com excelente e privilegiada localização, como mandam as normas da Marinha. Ao fundo fica então o famoso Restaurante ‘O Solar dos Dez’ que frequentava muitas vezes e que também era poiso habitual das altas patentes militares, incluindo o Spínola e seus convidados. Recorda-me, entre outras especiarias, a famosa Mousse de chocolate gelada, a colher espetada ficava de pé. Bissau. Foto tirada entre Jan-Março 68.

F47 – No café Bento [, a famosa 5ª Rep.] em noite quente. Um grupo de amigos e camaradas. Tem 3 elementos do CA [Conselho Administrativo]  do BCAV 1915, que eu fui render em Set67 em Nova Lamego, e encontrámo-nos depois em Bissau. Os da frente, à direita o alferes Fragateiro,  Chefe do CA do BCav1915; do lado esquerdo,  o ajudante Furriel Nelson (Já meu conhecido do Instituto Comercial do Porto); em frente outro furriel de que não sei o nome. Ao lado do Fragateiro temos o alferes Alberto Fontão, Comandante de um Pelotão Independente de Reabastecimentos e Intendência, era meu amigo antes da guerra e continua a ser, fomos colegas da Faculdade de Economia do Porto, frequentávamos o mesmo café Cenáculo desde 1961 quando inaugurou, e ainda hoje existe, por ali estudávamos à noite até muito tarde, no dia seguinte era dia de trabalho.

O Fontão vivia lá em Bissau com a mulher e uma filha pequena, visitei-o algumas vezes e levei a passear a filha Eunice, com apenas 2 anos na minha motorizada, ela ainda se lembra hoje de mim, apesar de não haver qualquer convívio posterior.

Não tive boas recordações do Fragateiro, não sei porquê, mas vê-se pela fotografia que não estamos risonhos, e apesar de ele ser também do Porto: trabalhou na propaganda médica e encontrei-o uma vez e não falámos, quase nada.  Penso que não nos entendemos lá muito bem por causa das "contas" do batalhão,  que eu recusei, eu não sabia nada daquilo, Depois ele foi para Bula e regressou uns meses antes do nosso batalhão. Dizem que nunca mais quis falar da Guiné. Bissau, Fev68.

F54 – No porto de Bissau, atracado o Paquete Funchal que transportou a comitiva da visita do Presidente Tomaz à Guiné. Sobre este acontecimento já existe uma grande reportagem com os Postes e roncos da visita. Bissau, 02Fev68.

F59 – Junto a uma estátua que não consigo identificar quem é a personagem [, é a do navador Nuno Tristão, no final da Avda República].  Captada na Praça do Império junto ao Palácio do Governador, na visita do Presidente Almirante Américo Tomaz à Guiné. Bissau, 02Fev68.

F62 – No café Bento petiscando qualquer coisa. No extremo esquerdo sou eu, no direito é o meu amigo do Porto e do café Cenáculo, hoje conomista, o alferes Pinto Gomes, que estava na Chefia da Contabilidade, tinha lá a mulher, a Acácia, e tinha como companhia na mesma casa onde viviam, a irmã Amélia, o marido, cunhado, o alferes Fontão, já com uma filha pequena, Eunice.

Ao lado do Pinto Gomes,  está o furriel Riquito.  do meu CA, e os outros dois são também oficiais da Chefia de Contabilidade. Éramos todos do Porto. Bissau, Fev68.

F64 – Num domingo sentado na marginal junto ao porto cais de Bissau, com um camarada, parece-me o irmão do furriel Riquito do CA, mas não tenho a certeza. Bissau, Fev68.
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 4 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18604: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXI: As minhas estadias por Bissau (iii): 4º trimestre de 1967

(**) Vd. poste de  2 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14211: Memória dos lugares (285): Fortaleza da Amura, estátua de Diogo Gomes, ponte cais de Bissau e edifício da Alfândega (Arménio Estorninho / Agostinho Gaspar / António Bastos)

Guiné 61/74 - P18632: (De)Caras (108): O "pilotaço" Mário Leitão, ex-fur mil farmácia (Luanda, 1971/73): tirou o brevê de piloto privado de avião (PPA) em 1977, tem 300 horas de voo e 800 aterragens... Além disso, é "cavaleiro do mar", mergulhador e instrutor de mergulho...


Monte Real > XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > 5 de maio de 2018 > A mesa dos "gloriosos malucos das máquinas voadoras"...   António Martins de Matos oferecendo o seu boné de piloto.aviador ao Mário Leitão... Dois "pilotaços"!

Foto (e legenda): © Mário Leitão (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem de Antónioo Màrio Leitão, em resposta a um pedido do nosso editor Luís Graça para explicar melhor ou comentar a sua história de vida como "piloto privado de avião" (*)

Data: 14 de maio de 2018 às 01:59
Assunto: Pilotaços!

Boa noite, Luís! Ou boa madrugada!...

Estou a escrever sob pressão, porque a tipografia já anda atrás de mim! Por isso ando calado!...

Monte Real foi lindo! Parabéns pela organização e pela tua/vossa entrega a esta causa da conservação das nossas memórias guerreiras!

É estimulante e inspirador ver tantos Camaradas irmanados pelo mesmo sentimento de fraternidade e de preocupação pelo legado que vamos deixar aos vindouros!

Aquele gesto do nosso General [António Martins de Matos, ten gen pilav, reformado], ao oferecer-me o seu boné de piloto-aviador, foi um momento alto da minha vida, acredita!

Se eu não fosse aviador, não valorizaria essa oferta para além de uma gentileza espontânea, mas como sou piloto senti muito mais do que isso! Hei-de um dia arranjar as palavras correctas para descrever a emoção que senti e o orgulho que sinto por aquele gesto!

Sim, sou piloto-aviador, embora já não voe há uns anos. Tirei o brevet no Aeroclube de Braga em 1977, pela Direcção-Geral de Aeronáutica Civil, na classe PPA [, Piloto Privado de Avião]. Voei em Cessna, Paulistinha,  Auster D5, e duas horas em DO-27.

Tenho umas trezentas horas, com umas 800 aterragens. Aterrei em Tires, Pedras Rubras, S. Jacinto, Bissaia Barreto, Palma de Maiorca, Suíça, Chaves, Vila Real, Espinho... e caí na  Serra do Alvão! (Mas continuei a voar!)

Chegou e sobrou, porque já não tinha tempo para o mergulho, de que sou instrutor por três agências internacionais, além de monitor nacional  pela Escola de Mergulhadores da Armada, e continuo "no activo".

Estou a escrever aventuras sobre isso, porque já mergulho há 42 anos e fui presidente da Assembelia Geral da FPAS [, Federação Portuguesa de Atividades Subaquáticas,]  uns 14 anos.

Um dia terás material engraçado para publicar, porque tenho várias aventuras aéreas e muitas subaquáticas, bem dramáticas. (**)

Já tenho os olhos a piscar, Camarada!
Boa noite! Um abraço amigo!
PS - Enviado do meu iPhone segue uma foto tirada em Monte Real, no nosso convívio do dia 5 de maio de 2018
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de maio de 2018 Guiné 61/74 - P18630: XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (26): a oportunidade do limiano Mário Leitão conhecer pessoalmente três nomes míticos da FAP que atuaram no TO da Guiné, em 1972/74: António Martins de Matos, Miguel Pessoa e Giselda Antunes Pessoa

(**) Último poste da série de 28 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18573: (De)Caras (106): A minha guerra: o 'burro do mato' e como saí daqui vivo... Canquelifá, 3 de fevereiro de 1971 (Francsco Palma, ex-sold cond auto, CCAV 2748, 1970/72)

Guiné 61/74 - P18631: Notas de leitura (1066): “Tatuagens da Guerra da Guiné”, pelo Capitão Luís Riquito; Guerra e Paz Editores, 2018 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
O então Capitão Luís Riquito desembarcou em Bissau em 1965, andou a afeiçoar a sua CCaç 816 em territórios de inequívoca dureza, entre Bissorã e Olossato, e meses depois, quando o Olossato estava no centro do furacão, coube-lhe construir e reconstruir em Olossato, Ponte Maqué, desobstruir estradas e abrir caminho, ao tempo tão intimidativo, para a base do Morés.
Para surpresa de muitos leitores, aparece em relatos em que os grupos de combate se afoitam pela floresta e tratam gente que vive sob o controlo remoto da base do Morés e grupos incidentes. Foram reagrupados e de um modo geral não voltaram a fugir para o mato.
Um relato um tanto formal onde não se escondem dolorosas e também dulcificantes situações naquele contexto tão áspero em que o PAIGC firmava posições e era crucial afronta-lo, no dia-a-dia.

Um abraço do
Mário


Nas terras do Oio, entre 1965 e 1966

Beja Santos

“Tatuagens da Guerra da Guiné”, pelo Capitão Luís Riquito, Guerra e Paz Editores, 2018, é um relato memorial de quem comandou a CCaç 816, que desembarcou em 26 de maio de 1965, o narrador dá pelo nome do Capitão Fernando Gonçalves, usa a terceira pessoa do singular e centra o essencial do seu registo em terras do Oio, mais concretamente Mansoa, Bissorã e Olossato. Para quem desconhece aquela floresta densa e fechada, o narrador fala-nos de várias campanhas de pacificação e dos seus povos. É informado das bases do PAIGC espalhadas pelo Oio: Morés, Iracunda, Cai, Cansambo, Cambajo (quatro bases de segurança periférica da base central), e de Maqué, de Biambi, de Queré e de Rua, bases regionais vocacionadas para o apoio logístico e o controlo das populações.

É uma peça de literatura memorial que obedece à estrutura de um relatório desdobrado em itens. Depois do que ele denomina treino operacional, esta Companhia independente chega em finais de setembro de 1965. Descreve o subsetor do Olossato e as missões de que está incumbida a sua Companhia. Era tudo trabalhoso e tanto, as forças do PAIGC não davam descanso: frequentes emboscadas às colunas da estrada para o Olossato; a estrada para Farim estava interdita, fora limpa e aberta em julho de 1965, não deixou de haver violência; destruição em 3 de agosto de 1965 da ponte de Maqué, onde foram implantadas minas antipessoal; abatises na estrada entre Mansoa e Bissorã, foram removidos; ataque à guarnição de Olossato, em 15 de agosto de 1965, e muito mais. Havia que reabilitar e construir infraestruturas, procurar e acolher populações transmalhadas, gerar boa convivência, patrulhar, intervir em operações, assistir e abastecer as populações dentro das suas tabancas. E tudo se descreve: a destruição de uma serração, um ponto estratégico onde as forças do PAIGC atacavam quem partia ou chegava ao Olossato; o diálogo com os Muçulmanos. E é dentro desta formalidade descritiva, um tanto seca e rígida, que surge um episódio emocionante, uma memória de Bacar Queba, este diligentíssimo combatente é atingido por uma mina, levado para a enfermaria, ficara cego, quer falar com o Capitão, e este regista a conversa pungente e transmite-nos uma dor universal:
- Esta mina era mesmo muito perigosa, Bacar, e tu conseguiste safar-te, pá. Aquela era para limpar quem apanhasse e tu safaste-te. Tiveste mesmo muita sorte, Bacar. Sabes como foi e como podia ter sido, pá! Dentro deste azar, tu sabes que tiveste muita sorte por continuares aqui a falar comigo e tens todos os teus amigos da OITO16 a rezar por ti, para que fiques bem e continuares a trabalhar por esta tua gente. Uma vez que chegaste aqui, o nosso furriel está a preparar tudo para seres transferido para o Hospital de Bissau e os médicos podem resolver e recuperar a tua vista, percebes?
- Pois é, Capitão, mas eu estou aqui sozinho mesmo, pá, e o que eu quero mesmo, mesmo, é voltar para aí! Para sentir isso aí fora, percebes Capitão? Dá cá a tua mão, para eu sentir outra vez isso aí fora, pá!

O Capitão estendeu a mão direita a Bacar que, ao segurar, a apertou com força, num cumprimento de esperança, de camaradagem e de amizade correspondida, e desabafou:
- Agora já sinto, Capitão, já sinto isso aí fora onde tu estás e estou a ver-te, mas eu estou longe, pá; mas agora assim estou melhor, já sei onde estou e a lembrar com quem estou a falar, sabes. Parece que voltei, Capitão, já sinto mesmo, pá.

Há um aspeto que seguramente emocionará o leitor, a integração das populações espalhadas pelo mato que em sucessivas ações os homens da CCaç 816 vão ao contacto, e trazem quase sempre com sucesso gente que é forçada a cultivar e a alimentar as forças do PAIGC. Um conjunto de descrições que deverá doravante merecer a atenção dos historiadores para situar naquele tempo ainda fortes debilidades no controlo remoto exercido por Morés sobre populações que viviam foram da base.

A batalha de Maqué, expressão usada pelo autor para esmiuçar todo o trabalho desenvolvido para beneficiar o destacamento e garantir a segurança da ponte de Maqué, não deixando de referir que para além destas reconstruções, a CCaç 816 foi envolvida num conjunto apreciável de operações, patrulhamentos, emboscadas a que não faltaram duros confrontos, abrindo-se caminho para ir mais destemidamente até ao núcleo central do Morés.

Luís Riquito muniu-se de informação sobre as campanhas de pacificação, leu René Pélissier, Luís Cabral, Amílcar Cabral, seguramente que guardou arquivo de todas as atividades da CCaç 816, a não ser todo este arquivo não nos poderia dar com tal grau de minúcia as intervenções no Oio e no Morés. E destaca aquela coroa de glória que foi a Operação Castor, onde intervieram a CCaç 816 com um grupo de combate da CCAÇ 1418 e Caçadores Nativos do Olossato, saíram do Olossato em 19 de fevereiro de 1966 e apanharam muitíssimo material e algumas emboscadas pelo caminho.

Em 27 de julho de 1966 a CCaç 816 deixa o Olossato e vai para Mansoa, passa a intervenção e fica-se igualmente com um relato das operações por onde andaram. A memória detalhada do Capitão Luís Riquito culmina com um grande desastre ocorrido no quartel novo de Mansoa, o Capitão procurou evitar mais graves danos humanos e materiais, houve para ali um forte litígio verbal e não-verbal com um camarada de armas.
O documento termina com a orgânica da CCaç 816, os seus mortos e feridos e louvores.

Uma peça a considerar para o estudo da guerra da Guiné na zona crucial de Morés, entre 1965 e 1966.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18622: Notas de leitura (1065): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (34) (Mário Beja Santos)

domingo, 13 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18630: XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (26): a oportunidade do limiano Mário Leitão conhecer pessoalmente três nomes míticos da FAP que atuaram no TO da Guiné, em 1972/74: António Martins de Matos, Miguel Pessoa e Giselda Antunes Pessoa












Monte Real > XIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > 5 de maio de 2018 > A mesa dos "gloriosos malucos das máquinas voadoras"... Miguel Pessoa, António Martins de Matos, Mário Leitão e Giselda Pessoa...E por auqi também passou o paraquedista, do BCP 21 (Angola, 1970(72), Jaime Bonifácio Marques da Silva... Um quinteto de luxo


Fotos (e legendas): © Miguel Pessoa (2018). Todos os direitos reservados [Edição; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Ficámos  a saber que o Mário Leitão está longe de ser um "infilrado" na Tabanca Grande... Ele está de pleno direito na nossa Tabanca Grande: foi furriel miliciano de farmácia, em Luanda, em 1971/74... e tem estado a escrever as biografias de todos os bravos limianos (em nº 52), que morreram, no perído da guerra do ultramar, incluindo no TO da Guiné.

É um camarada generoso, caloroso e afável. Além disso, foi piloto civil, amadpr,  com 300 e tal horas de voo, até ao dia em que teve um acidente e teve de pagar uma pipa de massa por causa dos estragos da máquina.. (Ele um dia pode-nos contar melhor esta história que eu só apanhei por alto) (*)

O Mário Leitão fez questão de conhecer pessoalmente, além do António Martins de Matos, "o casal mais strelado do mundo", o Miguel e a Giselda.

Já aqui lembrámos que o nosso grã-tabanqueiro Mário Leitão, de Ponte de Lima, é hoje farmacêutico reformado, tendo sido por outro lado professor na Escola Superior de Enfermagem de Viana do Castelo. Foi piloto civil, amador  (com 300 e tal horas de voo)... Não sabemos se ainda o é, depois do grave acidente sofrido há uns anos.  Continua a ter uma grande paixão pelos aviões.  E é sobre eles que fala com os seus ocasionais companheiros de mesa, nas fotos que acima reproduzimos,,, (**)

Em Monte Real, teve agora a oportunidade de conhecer ao vivo uma das lídimas represemtantes do corpo de enfermeiras paraquedistas que estiveram em África. Neste caso, uma das mais novas... Leia-se  a dedicatória que escreveu à Giselda no exemplar do livro que lhe ofereceu, "História do Dia do Combatente Limiano":

"Monte Real, 5/maio/2018: À enfª  Giselda Antunes Pessoa, com a grande emoção de conhecer pessoalmente uma enfermeira paraquedista da guerra do ultramar. Com um abraço do Mário Leitão (Fur Mil Farmácia de Luanda,  71/73)".

Ao Miguel ofereceu o livro "Biodiversidade das Lagoas de Bertiandos e S. Pedro d'Arcos",com as seguintes palavras de dedicatória (incompleta):

Guiné 61/74 - P18629: Convívios (856): Pessoal de Bambadinca, ao tempo do BCAÇ 2852 (1968/70): Alferradeira Velha, Abrantes, 26 de maio de 2018, meio século depois do embarque para o CTIG... Organização a cargo do ex-1.º cabo escriturário José Augusto Mendes Mourão, da CCS


Lisboa > Casa do Alentejo >  13. Convívio do Pessoal de Bambadinca (1968771) > 26 de maio de 2007  > O Mourão Mendes (ex-1.º cabo escriturário da CCS/BCAÇ 2852, que vive atualmente em Torres Novas) e o Gabriel Gonçalves, o famoso GG (ex-1.º Cabo Op Cripto, CCAÇ 12, residente em Lisboa).

Foto (e legenda) © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados.. [Edição: Blogue Luís Graça & Camnarada da Guiné]


Óbidos > Restaurante A Lareira > 22/5/2010 > 16.º Convívio do Pessoal de Bambadinca 1968/71 > Os organizadores de dois convívios anteriores, o Fernando Sousa (CCAÇ 12), que é da Trofa, e o José Augusto Mendes Mourão (CCS / BCAÇ 2852), que é de Torres Novas.

Foto (e legenda) © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.. [Edição: Blogue Luís Graça & Camnarada da Guiné]



1. Pela mão do meu amigo e camarada Fernando Andrade de Sousa, ex-1.º cabo aux enf, CCAÇ 12 (Contuboel e  Bambadinca, 1969/71), adido ao BCAÇ 2852, entre julho de 1969 a maio de 1970, chega-me esta convocatória para  o 24.º convívio do pessoal de Bambadinca (1968//1). (ªª).

O evento vai realizar-se em 26 de maio de 2018, em Alferrarede Velha, Abrantes. A organização está a cargo do nosso camarada José Augusto Mendes Mourão, ex-1.º cabo, CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/0). É um "histórico" enquanto organizador destes convívios.
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de maio de 2007 >  Guiné 63/74 - P1788: Convívios (10): Pessoal de Bambadinca 1968/71: CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12, Pel Caç Nat 52 e 63 (Luís Graça)

(**) Último poste da série > 8 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18616: Convívios (855): XXXI Almoço de Confraternização, e comemoração do 46.º aniversário da chegada, dos Oficiais, Sargentos e Praças, e familiares, do BCAÇ 2879, dia 26 de Maio de 2018, em Folgosinho (Carlos Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 2548)

Guiné 61/74 - P18628: Blogues da nossa blogosfera (92): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (11): "Poema do desgaste e do contraste"


Do Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.

POEMA DO DESGASTE E DO CONTRASTE

ADÃO CRUZ


Há muito que não saía à rua
há muito que não saía fora de mim
em direcção ao meu corpo abandonado
estendido em fria paleta sem cor
sobre um manto de poemas carcomidos
ruídos de musgo e manchas de bolor.

Há muito que não saía à rua
há muito que não sentia a dor
do desprezo da poesia
feita espuma de coisas impalpáveis
escaldantes, abertas e sangrantes
no sofrido labirinto da alma vazia.

Há muito que não saía à rua
há muito que não me apercebia
um só momento
do cantar bronco do poeta
em perpétuo e estúpido invento.

Há muito que não saía à rua
há muito que não dobrava a porta
deste corpo abandonado
na escuridão de uma noite peregrina
de lacrimosas horas perdidas
em poemas de cinza em cada esquina.

Há muito que não saía à rua
há muito que não sentia o abrigo dos lençóis
e pisava o chão purulento do degredo
na lama fria dos poemas e do medo
que rompiam as cadeias do meu corpo.

Há muito que não saía à rua
há muito que as linfas secaram a felicidade
mudando o cair da noite e o nascer do dia
em matéria grosseiramente física
de versos telúricos, celulósicos, iónicos
sem poesia nem liberdade.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18308: Blogues da nossa blogosfera (91): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (10): "O meu gesto das coisas simples"

Guiné 61/74 - P18627: Blogpoesia (566): "Vi o vento irado...", "Pedras e flores...", e "Pairando no ar...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Vi o vento irado... 

Vi o vento irado com as núvens. 
Elas não se entendiam entre si. 
Umas queria seguir para norte. 
Saudosas da neve branca. 
Outras para o sul. 
Mortas por mergulhar no mar. 
Chamou a trovoada para as pôr na ordem. 
Um trovão tronitruante as estremeceu de medo. 
De repente se desfizeram em chuva tão copiosa, fez esbordar os rios. 
O mar subiu três pontos. 
As marés sumiram as praias. 
E as gaivotas, esbaforidas, grasnavam loucas por alimento. 
Foi o fim do mundo. 
Eis que o rei sol, incomodado com toda a desordem, resolveu intervir. 
O céu ficou azul. 
O calor serenou a tempestade. 
Num instante, tudo ficou em paz... 

Roses, 8 de Maio de 2018 
9h7m 
Jlmg

********************



Pedras e flores... 

O mundo, como a vida,
é tecido de pedras e flores. 
Calcamos um chão de abrolhos,
sorrimos à cor das cores. 
Há sempre um bem para cada mal. 
Uma fonte pura que mate a nossa sede. 
A nossa fé e a nossa esperança. 
É infinito o céu azul. 
Não têm conta as estrelas que só de noite brilham. 
Não tem limites o poder da nossa imaginação. 
É divina a arte do fulgor das sinfonias
como a de combinar as cores num quadro belo de pintura. 
Brilham no tempo os versos geniais de Virgílio e de Homero. 
Ainda hoje, desafiam o poder dos deuses as pirâmides colossais que há no mundo. 
Quisesse o homem e teríamos já o céu aqui na terra... 

ouvindo "Adágios Russos"
Roses, 9 de Maio de 2018 
9h5m
Jlmg

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Pairando no ar... 

Como gaivota, pairando no ar,
vejo os salpicos brotando das ondas. 
Cardumes bailando a alegria da água,
descrevem bailados, num silêncio sem fim. 
Desafio as nuvens paradas no céu,
zombando de mim. 
O vento tardou. 
Abandonadas, ficaram ali como o destino traçou. 
E o pequenino farol, implantado ao fundo,
parece tão triste,
esperando nevoeiro para tocar. 
No casario ao longe, do lado de lá,
reluzem janelas de vidro, fechadas. 
Bate-lhes o sol, reflectem o céu,
emitindo faíscas. 
As gaivotas em bandos, disputam os cardumes ocultos,
mal sabem o risco que correm. 
Pela estrada, entre a praia e as casas,
zumbem os carros num frémito veloz. 
Enquanto as camionetas de carga,
paradas na berma,
descarregam os géneros que atiça o comércio. 
E penso: Que sou eu tão minúsculo,
no meio de tudo? 
Oiço esta música bem linda e sonho... 

ouvindo "Adágios Russos" 
Roses, 10 de Maio de 2018 
9h33m 
dia cinzento
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18603: Blogpoesia (565): "Sombras nos olhos", "Hora das acácias...", e "O sabor das coisas...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P18626: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 47/48/49: "Quero dizer-te que só em quinze dias os turras derrubaram cinco aviões"


Fiat G-91. O primeiro a ser abatido por um Strela foi em 25 de março de 1973, sob os céus de Guileje.. Era pilotado pelo nosso camarada Miguel Pessoa, então tenente piloto aviador.

Foto de arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


1. Continuação da pré-publicação do próximo livro (na versão manuscrita, "Em Nome da Pátria") do nosso camarada José Claudino Silva [foto atual à esquerda] (*) 

(i) nasceu em Penafiel, em 1950, "de pai incógnito" (como se dizia na época e infelizmente se continua a dizer, nos dias de hoje), tendo sido criado pela avó materna;

(ii) trabalhou e viveu em Amarante, residindo hoje na Lixa, Felgueiras, onde é vizinho do nosso grã-tabanqueiro, o padre Mário da Lixa, ex-capelão em Mansoa (1967/68), com quem, de resto, tem colaborado em iniciativas culturais, no Barracão da Cultura;

(iii) tem orgulho na sua profissão: bate-chapas, agora reformado; completou o 12.º ano de escolaridade; foi um "homem que se fez a si próprio", sendo já autor de dois livros, publicados (um de poesia e outro de ficção);

(iv) tem página no Facebook; é avô e está a animar o projeto "Bosque dos Avós", na Serra do Marão, em Amarante;

(ix) é membro n.º 756 da nossa Tabanca Grande.

2. Sinopse dos postes anteriores:

(i) foi à inspeção em 27 de junho de 1970, e começou a fazer a recruta, no dia 3 de janeiro de 1972, no CICA 1 [Centro de Instrução de Condutores Auto-rodas], no Porto, junto ao palácio de Cristal;

(ii) escreveu a sua primeira carta em 4 de janeiro de 1972, na recruta, no Porto; foi guia ocasional, para os camaradas que vinham de fora e queriam conhecer a cidade, da dos percursos de "turismo sexual"... da Via Norte à Rua Escura;

(iii) passou pelo Regimento de Cavalaria 6, depois da recruta; promovido a 1.º cabo condutor autorrodas, será colocado em Penafiel, e daqui é mobilizado para a Guiné, fazendo parte da 3.ª CART / BART 6250 (Fulacunda, 1972/74);

(iv) chegada à Bissalanca, em 26/6/1972, a bordo de um Boeing dos TAM - Transportes Aéreos Militares; faz a IAO no quartel do Cumeré;

(v) no dia 2 de julho de 1972, domingo, tem licença para ir visitar Bissau, e fica lá mais uns tempos para um tirar um curso de especialista em Berliet;

(vi) um mês depois, parte para Bolama onde se junta aos seus camaradas companhia; partida em duas LDM para Fulacunda; são "praxados" pelos 'velhinhos' (ou vê-cê-cês), os 'Capicuas", da CART 2772;

(vii) faz a primeira coluna auto até à foz do Rio Fulacunda, onde de 15 em 15 dias a companhia era abastecida por LDM ou LDP; escreve e lê as cartas e os aerogramas de muitos dos seus camaradas analfabetos;

(viii) é "promovido" pelo 1.º sargento a cabo dos reabastecimentos, o que lhe dá alguns pequenos privilégio como o de aprender a datilografar... e a "ter jipe";

(ix) a 'herança' dos 'velhinhos' da CART 2772, "Os Capicuas", que deixam Fulacunda; o Dino partilha um quarto de 3 x 2 m, com mais 3 camaradas, "Os Mórmones de Fulacunda";

(x) Dino, o "cabo de reabastecimentos", o "dono da loja", tem que aprender a lidar com as "diferenças de estatuto", resultantes da hierarquia militar: todos eram clientes da "loja", e todos eram iguais, mas uns mais iguais do que outros, por causa das "divisas"... e dos "galões"...

(xi) faz contas à vida e ao "patacão", de modo a poder casar-se logo que passe à peluda; e ao fim de três meses, está a escrever 30/40 cartas e aerogram as por mês; inicialmente eram 80/100; e descobre o sentido (e a importância) da camaradagem em tempo de guerra.

(xii) como "responsável" pelo reabastecimento não quer que falte a cerveja ao pessoal: em outubro de 1972, o consumo (quinzenal) era já de 6 mil garrafas; ouve dizer, pela primeira vez, na rádio clandestina, que éramos todos colonialistas e que o governo português era fascista; sente-se chocado;

(xiii) fica revoltado por o seu camarada responsável pela cantina, e como ele 1º cabo condutor auto, ter apanhado 10 dias de detenção por uma questão de "lana caprina": é o primeiro castigo no mato...; por outro lado, apanha o paludismo, perde 7 quilos, tem 41 graus de febre, conhece a solidariedade dos camaradas e está grato à competência e desvelo do pessoal de saúde da companhia.

(xiv) em 8/11/1972 festejava-se o Ramadão em Fulacunda e no resto do mundo muçulmano; entretanto, a companhia apanha a primeira arma ao IN, uma PPSH, a famosa "costureirinha" (, o seu matraquear fazia lembrar uma máquina de costura);

(xv) começa a colaborar no jornal da unidade (dirigido pelo alf mil Jorge Pinto, nosso grã-tabanqueiro), e é incentivado a prosseguir os seus estudos; surgem as primeiras dúvidas sobre o amor da sua Mely [Maria Amélia], com quem faz, no entanto, as pazes antes do Natal; confidencia-nos, através das cartas à Mely as pequenas besteiras que ele e os seus amigos (como o Zé Leal de Vila das Aves) vão fazendo;

(xvi) chega ao fim o ano de 1972; mas antes disso houve a festa do Natal (vd. capº 34º, já publicado noutro poste); como responsável pelos reabastecimentos, a sua preocupação é ter bebidas frescas, em quantidade, para a malta que regressa do mato, mas o "patacão", ontem como hoje, era sempre pouco;

(xvii) dá a notícia à namorada da morte de Amílcar Cabral (que foi em 20 de janeiro de 1973 na Guiné-Conacri e não no Senegal); passa a haver cinema em Fulacunda: manda uma encomenda postal de 6,5 kg à namorada;

(xviii) em 24 de fevereiro de 1973, dois dias antes do Festival da Canção da RTP, a companhia faz uma operação de 16 horas, capturando três homens e duas Kalashnikov, na tabanca de Farnan.

(xix) é-lhe diagnosticada uma úlcera no estômago que, só muito mais tarde, será devidamente tratada; e escreve sobre a população local, tendo dificuldade em distinguir os balantas dos biafadas;

(xx) em 20/3/1973, escreve à namorada sobre o Fanado feminino, mas mistura este ritual de passagem com a religião muçulmana, o que é incorreto; de resto, a festa do fanado era um mistério, para a grande maioria dos "tugas" e na época as autoridades portuguesas não se metiam neste domínio da esfera privada; só hoje a Mutilação Genital Feminina passou a a ser uma "prática cultural" criminalizada.

(xxi) depois das primeiras aeronaves abatidas pelos Strela, o autor começa a constatar que as avionetas com o correio começam a ser mais espaçadas...


3. Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 47/48/49



O autor faz questão de não corrigir os excertos que transcreve, das cartas e aerogramas que começou a escrever na tropa e depois no CTIG à sua futura esposa. E muito menos fazer autocensura 'a posterior', de acordo com o 'politicamente correto'... Esses excertos vêm a negrito. O livro, que tinha originalmente como título "Em Nome da Pátria", passa a chamar-se "Ai, Dino, o que te fizeram!", frase dita pela avó materna do autor, quando o viu fardado pela primeira vez. Foi ela, de resto, quem o criou. ]


47º Capítulo  > FELICITAÇÕES


Todas as gerações são diferentes. A minha foi, indiscutivelmente, a mais diferente de todas.

Começa meia dúzia de anos após a 2ª guerra mundial, atravessa metade do século XX e entra pelo século XXI, talvez no período em que o mundo mais rapidamente evoluiu.

Orgulho-me de ter vivido este tempo. Sem grandes meios financeiros, consegui ter uma vida. Não fora a minha falta de tacto familiar, poderia ter sido um exemplo para muitos. É bem verdade que não há bela sem senão.

Pelos outros, lamento não ter a imagem que gostavam que eu tivesse. Por mim, vindo de onde vim, fiz mais que alguma vez sonhei fazer.

(28 De Setembro de 2017. Quinta-feira 19H00.

Há quarenta e cinco anos escrevi para uma pessoa que hoje comemora 65 anos:

“Queridinha do meu coração. Neste dia do teu aniversário que tem um significado especial para mim, te escrevo com redobrado amor, pois quero que este dia, que passaremos muitas vezes juntos, esteja sempre radioso de felicidade e que o nosso amor continue sempre forte como agora é.”

As circunstâncias da vida alteraram-se o que não me impede de manter os desejos de feliz aniversário a uma mulher que, se não fosse ela, estes textos não existiriam. Chama-se Maria Amélia Moreira Mendes. Ainda hoje é a minha esposa. Perdoem-me esta pequena lembrança mas, como estou a escrever no dia do seu aniversário, é a minha pequena homenagem à mãe dos meus filhos e avó da minha querida neta Catarina.)


48º Capítulo  > ABATERAM UM AVIÃO


Estranhamente, e sendo um leitor de vários géneros literários, como já frisei, faço um discurso completamente obscurantista. Quero acentuar que os meus estudos se resumiam ao 2º grau (4ª Classe). O que sinto, quanto mais avanço na leitura do que naquele tempo escrevi é que vou lentamente alterando a minha forma de pensar. Espero não ter grandes surpresas de comportamento, mais lá para diante. Para já, trata-se dum avião.

“Querida lamento que andes constipada, podia perguntar ao médico que remédio devias tomar mas quando o aéro aí chegasse, decerto já estarias curada, sabes que nem sempre a avioneta vem buscar correio. Penso até que decerto vai piorar, os “turras” abateram um avião nosso e morreu o piloto, como vês não somos só nós que matamos às vezes também sofremos baixas e agora devem ter melhores armas pois até aviões abatem”

Peço desculpa pela violência das palavras e confesso-me, de facto, preocupado que no restante correio que tenho de ler se me deparem piores situações. Continuarei a escrever, desdobrando um a um cada aerograma ou carta que imediatamente colocarei no computador. Uma coisa continuo a garantir-vos: 90% do que escrevi até ao dia 31 de Março de 1973, é amor, ternura e carinho.

“Hoje fiquei contente porque o Sr. Padre do batalhão que é o alferes capelão pediu-me para eu escrever alguns artigos para o jornal de Tite. Ainda vou ser famoso. Ah ah ah”

No dia seguinte, por ser domingo, mandei uma quadra duma canção de Dércio Marques. Título: “Vim de Longe”

Sou o riso das lavadeiras,
Aroma das madrugadas,
Sou o silêncio das eiras,
Sou a raiva das enxadas.

Nessa semana, soubemos que íamos ser aumentados. Seria verdade? No dia seguinte ou poucos dias depois, já confirmaria.


49º Capítulo  > ABATERAM CINCO AVIÕES


Dizia eu, mais atrás, não saber se com a morte de Amílcar Cabral, dirigente máximo do PAIGC, iria melhorar ou piorar a situação bélica na Guiné, mas em Abril eu escrevia:

“Quero dizer-te que só em quinze dias os “turras” derrubaram cinco aviões, aliás três avionetas e dois aviões. Por isso já podes ver que desde que morreu o Amílcar Cabral que era o chefe deles isto em vez de melhorar piorou. Nós felizmente temos tido sorte e espero que a sorte nos continue a proteger para regressarmos todos sãos e salvos.

Um amigo meu que está em Manpatá escreveu-me a dizer que na companhia dele já houveram três mortos e bastantes feridos. Nós graças a Deus ainda nenhum ferido tivemos.

Agora outro assunto. Saiu na ordem de serviço que eu passo a ser o único responsável pelas contas da cantina. Que merda. Até agora era um alferes mas o esquema foi alterado. Acontece que as contas da cantina nunca batiam muito certas e numa primeira análise parece que continua assim. Já viste? Vou passar a lidar com mais ou menos cinquenta contos por mês e se há algum desvio de dinheiro? Até aqui só lidava com papéis. Creio que vou estar à altura do encargo e hoje mesmo vou pedir ao 1º Sargento para fazer um balanço às contas. Se não estiver tudo direito não aceito nem que me castiguem. Fiquei contente por saber que o Castro e o teu primo regressaram bem”.


Na carta seguinte em que só falava de amor, talvez pelo título, aproveitei para mandar uma letra duma canção do Roberto Carlos – “Escreva uma carta, meu amor”

Nos dias seguintes, começámos a perceber que as avionetas já não viriam com tanta frequência.
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