1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Março de 2017:
Queridos amigos,
Tenho uma dívida de gratidão com o BENG 447 inultrapassável. Recebi, em Agosto de 1968, um quartel em escombros e outro sem o mínimo de requisitos defensivos, falo de Missirá e de Finete, no regulado do Cuor. Um dia aterrou um helicóptero e dele saiu um Capitão de Engenharia que eu conheci na viagem do Uíge, em Julho de 1968, Rui Gamito, compadeceu-se daquela extrema penúria, deu instruções à secção do BENG em Bambadinca para me fornecer forte e feio, rachas de cibe, chapas de zinco, toneladas de cimento, rolos inumeráveis de arame-farpado, tesouras corta-arame, e tudo o mais o que se sabe. Com o quartel de Missirá destruído em Março de 1969, as ajudas triplicaram e aconteceu o milagre da ressurreição. Finete passou a ter abrigos dignos desse nome e uma boa proteção de arame-farpado. Fiz amizades, de tal modo que o meu padrinho de casamento é Emílio Rosa, ao tempo Alferes Miliciano de Engenharia, e meu doador de materiais, incluindo o gerador que chegou depois de eu ter partido.
São recordações pessoais, e já não falo da proteção que deu, durante um mês a fio na construção da estrada entre Xime e Bambadinca, que vi nascer, tinha um opulente cais, hoje tragado pela incúria.
Entre as imagens que extrai do livro vem o plano da Cerca Defensiva de Bissau, mostra-se uma loja do comércio tradicional para se matar saudades.
Um abraço do
Mário
A Engenharia Militar na Guiné:
O Batalhão de Engenharia
Beja Santos
“A Engenharia Militar na Guiné, O Batalhão de Engenharia”, Exército, Direção de Infraestruturas, Julho de 2014, é apresentado como um tributo aos militares portugueses e aos guineenses que fizeram parte do Batalhão de Engenharia da Guiné.
Escreve o Tenente-General António José Maia de Mascarenhas:
“Considero como fazendo parte do Batalhão os elementos as organizações que o antecederam e que estão na sua origem como foram a Companhia de Engenharia Mista (criada em 1963 por mobilização no Regimento de Engenharia n.º 1, sob o comando do então Capitão de Engenharia Perry da Câmara) e as secções de delegações dos Serviços de Fortificações e Obras Militares. O autor principal deste livro é o Coronel Tirocinado de Engenharia Alberto da Maia e Costa, o último Comandante do Batalhão. Como é timbre destas obras, dá-se um bosquejo histórico da Guiné, apresenta-se uma pequena monografia da Guiné na década de 70, incluindo elementos socioeconómicos e culturais. Quando eclode a subversão na Guiné, a estrutura da Arma de Engenharia compreendia na região: um órgão de Direcção, o Comando de Engenharia localizado em Bissau e os órgãos de execução, inicialmente a Companhia Mista de Engenharia n.º 447 e, posteriormente, o Batalhão de Engenharia da Guiné".
Dentro do historial que o autor apresenta sobre a Engenharia Militar Portuguesa na Guiné, refere-se em 1961 a criação da Direcção do Serviço de Fortificações e Obras Militares, e enumeram-se os seus responsáveis incluindo os do Batalhão de Engenharia, a partir de 1964, até ao fim da presença portuguesa na Guiné-Bissau. O autor enumera os dados relevantes da organização emissões do Batalhão de Engenharia até à data da independência, dando especial relevo às realizações da Engenharia naquele teatro de operações, veja-se, a título exemplificativo: antes de eclodir a guerra, obras em Santa Luzia e Bolama, fiscalização das obras do aeródromo de Bissau, transferência do Quartel-General de Amura para um novo aquartelamento de Santa Luzia, aquartelamentos em Nova Lamego, Buba, Farim, Bafatá, quartéis de Cacheu, Fulacunda, Sedengal e Bolama, sendo estas para o futuro centro de instrução militar.
A partir da guerrilha, a Engenharia vai ser chamada a uma multiplicidade de atividades na construção de edifícios como seja a ampliação do edifício do Quartel-General, ampliação do edifício do Serviço de Telecomunicações Militares; construção de aquartelamentos, um pouco por toda a Guiné, mas também cais como o de Bambadinca, pontes, como a ponte de Maqué, a ampliação do Hospital Militar 241, asfaltagens, obras de abastecimento de água, construção de estradas, redes de arame-farpado. Foi crescendo o parque de máquinas com o seu equipamento de terraplanagem, viaturas basculantes e autotanques, era de enorme valor o parque de máquinas do Batalhão de Engenharia.
O autor destaca igualmente uma obra de grande fôlego, a Cerca Defensiva de Bissau, assim apresentada:
“A Cerca Defensiva de Bissau foi executada envolvendo o perímetro de toda a cidade e dos arredores onde se localizavam aquartelamentos e instalações militares, para impedir o acesso aberto à cidade. Consistia num perímetro minado, entre duas fiadas de rede de arame-farpado paralelas, com várias torres de vigilância e postos de controlo, servido por caminhos de serventia para ronda pelo interior. Para a sua execução houve que realizar as seguintes atividades: planeamento, desmatação, execução de estacas de madeira e de betão, lançamento de rede, colocação de rede nas bolanhas, utilização de centrais de betonagem, estudo dos avisos e da camuflagem, colocação dos avisos nas redes, lançamento das minas, construção prévia das torres, preparação das fundações das torres, montagem das torres em terreno seco e na Bolanha, executar instalações dos postos de vigilância, eletrificação dos postos, etc.”.
Dir-se-á noutro relatório:
“Durante 17 dias 1500 toneladas de materiais e 813 homens (trabalhando mais de 8 horas diárias) percorreram, em duas plataformas e 32 viaturas, 56 mil quilómetros, na construção de 20 torres de vigia e de uma rede de cintura minada com mais de 400 quilómetros de arame-farpado”.
O Batalhão de Engenharia teve uma intervenção fundamental no reordenamento de populações e organizações em autodefesa, o autor esmiúça este campo de atividades.
Todo este historial é igualmente acompanhado de histórias saborosas, informações sobre os geradores na Guiné testemunhos quem acompanhou obras de estrada, descreve-se a participação do Batalhão de Engenharia na "Operação Grande Empresa" iniciada em Dezembro de 1972, a construção em tempo recorde do quartel de Mansabá como centro de instrução de tropas africanas. Também se fala de situações dolorosas como a emboscada de 22 de Março de 1974, entre Piche e Nova Lamego, uma coluna militar foi atacada pelo PAIGC com grande efetivo, este documento incorpora o testemunho do Furriel Miliciano de Engenharia Pedro Manuel Santos, muito emotivo.
Há igualmente testemunhos como o de Nuno Nazareth Fernandes, que deu uma inestimável colaboração às atividades musicais do BENG 447.
Presta-se homenagem aos mortos, e em nota final Alberto da Maia e Costa manifesta o seu orgulho pelo serviço prestado pela Unidade de Engenharia de que ele foi o último comandante:
“A Guiné ficou a dispor de instalações militares adequadas e satisfatórias, como nenhum outro território português. O esforço feito relativamente ao abastecimento de água pela execução de furtos artesianos, montagem de depósitos e construção de redes foi digno de registo, por quanto a Guiné desfrutava, nos seus centros populacionais médios, já de água potável canalizada. Mas não foi só nestes aspetos que a Engenharia Militar deu a sua valiosa colaboração. Deu-a na montagem de centrais geradoras de energia elétrica e na construção das respetivas redes, na execução de redes de saneamento, na sua atuação do campo de construção de estradas, mercê de equipamento adequado, organização quase perfeita, tendo conseguido altos rendimentos de trabalho na execução de estradas de terra e asfaltadas e na de pistas de aviação. Desta forma as estradas construídas por si só ou com a colaboração das obras públicas, atingiram quilometragens apreciáveis, que serviram tanto as necessidades militares como as de fomento”.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 13 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20729: Notas de leitura (1272): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (49) (Mário Beja Santos)