quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Guiné 63/74 - P15044: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (XII Parte): Guia em fuga; Um descapotável em Bissau e Entram os Alouettes

1. Parte XII de "Guiné, Ir e Voltar", enviado no dia 26 de Agosto de 2015, pelo nosso camarada Virgínio Briote, ex-Alf Mil da CCAV 489, Cuntima e Alf Mil Comando, CMDT do Grupo Diabólicos, Brá; 1965/67.


GUINÉ, IR E VOLTAR - XII

Guia em fuga 

O Capitão Leandro era o novo Comandante da Companhia. Trazia boas referências operacionais, tinha vindo de Sangonhã, bem lá para o sul, encostado à Guiné do Sékou Touré.
Alguém no QG teria dito que o Comandante Militar se impressionara com uma acção da Companhia1, um ataque em beleza a um acampamento IN, ao raiar de um dia. Entraram tão sorrateiros que, conta quem viu, o capitão, curioso, espreitara para uma barraca e viu um tipo lá dentro com duas bajudas ao lado. Não pediu foi licença. O comandante IN como uma mola, atirou-se com toda a honra ao capitão, engalfinharam-se um no outro, as bajudas aos gritos, até que um soldado entrou na hora, e o meu capitão com a mania de resolver isto tudo com diplomacia.

É de um capitão destes que os gajos precisam, imagina-se que terá pensado. Mande-o cá vir. O Chefe do Estado-Maior enviou um rádio para o Batalhão, que se apresentasse com urgência no QG, ao Comandante Militar.

O capitão encarregou-o de os pôr na ordem. Tomou-lhes o pulso no início, os alferes desconfiados de um capitão de outra família. Com o tempo, a competência administrativa e operacional impôs-se, ganhou ascendência, confiança, corrigiu a organização, alterou alguns procedimentos, tudo embalado em diplomacia, acompanhando os processos todos, desde a escolha e preparação das saídas, até à logística de Brá, e sobretudo moralizara o pessoal, cada dia que passava mais satisfeito com a escolha.

Menino da Luz,  tinha conhecimentos por todo o lado, sabe-se como eles são, o Brigadeiro acertou na mouche. Ficaram a dar-se bem, fricções iniciais resolvidas, era sempre com satisfação que se encontravam.

E na primeira saída de um grupo fez questão de o acompanhar.


Informações referiam a existência de um acampamento IN na mata de Sabá. O grupo, com o novo comandante como observador, deslocou-se até Mansoa em viaturas. Para evitar detecção prematura, mantiveram-se dentro das Mercedes, com as lonas corridas. A seguir, incorporou-se numa coluna da ronda, saindo de Mansoa até à extremidade da pista de aterragem, onde se apeou discretamente.

Noite de intensa luminosidade.  Permaneceram imóveis no local cerca de um quarto de hora. Depois, apoiados por um experiente Grupo de Combate adstrito ao Comando de Batalhão sediado em Mansoa, começou a progressão apeada, a corta-mato, paralelamente à estrada Mansoa-Mansabá, até atingirem Caur.

À frente, um guia com as mãos atadas atrás das costas por uma corda que rodeava a cintura de um dos homens das milícias de Mansoa. Um trilho levou-os até Mancofine. Rodeada a tabanca, seguiram para a antiga tabanca de Sabá. Passaram ao largo, em direcção à bolanha. Localizaram um ponto de cambança utilizado pelo IN. Sempre nas margens da bolanha viram outro local de cambança, com algumas tábuas desfeitas. O guia disse existir outro local de cambança mais à frente, perto do acampamento e com acesso directo. Entraram na mata, progressão difícil.
Cerca de meia hora depois, barulho, correrias, vozes, uma rajada do primeiro homem do grupo. O guia tinha-se escapado. Alguém terá aliviado as cordas que o prendiam, não havia dúvidas. A procura no local não resultou, não havia qualquer hipótese de sucesso. Às 05h30, um carreiro levou-os a atravessar a mata até voltarem a ver a antiga tabanca de Sabá. Retiraram por Mancofine até à estrada que liga Mansabá a Mansoa.
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Nota:
1 - CCaç 640

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Um descapotável em Bissau

Desde que o Toni Ramalho fora para o mato formar milícias, deixara de ser frequentador do Hotel Portugal, parava lá, de longe a longe, só na esplanada para beber qualquer coisa, encontrar-se com alguém, muito raramente jantava. A mesa continuava no mesmo sítio, as pessoas é que tinham mudado.

Da mesa antiga só o Carlos e a sua Helena, os outros eram todos conhecimentos recentes. No final de um dia, viu-os na esplanada do hotel com uma roda de machos à volta, um fuzileiro de que não percebeu o nome e um conhecido capitão de artilharia, o Capitão Marques.

Apresentaram-se e foi aí que viu pela primeira vez as caras dos novos companheiros de mesa do Carlos. Demorou-se um quarto de hora, se tanto, o tempo suficiente para ouvir de rajada relatos do capitão em batalhas que travou no Comodoro do Rossio, no famoso Ritz e na Cave da Avenida António A. Aguiar.

Então não se senta, fica de pé, o capitão a virar o pescoço, enquanto lhe vinham à lembrança os amigos de há uns tempos atrás. Mudado o carregador, o capitão virado para um felizardo a passar as últimas noites na Guiné. Então, as escadas para a cave, o salão grande, o ambiente de tango, as mesas para dois, duas gentilezas em cada, uma no balde de gelo a aguardar que a abram, a outra sentada de perna traçada à espera que alguém as destrace, o pianista de brilhantina na careca, o do contrabaixo a abanar os cabelos encaracolados até aos ombros. Era como estivesse lá, os pormenores todos.

E você, para o que se mantinha de pé, não se esqueça, tome nota, que estou a ser seu amigo. Quando regressar, reserve para si a primeira noite em Lisboa, deixe a família e os amigalhaços para depois, que vai ter tempo para eles até se chatear. Diga adeus ao Depósito de Adidos, apanhe uma boleia da Ajuda para a baixa, suba o Chiado, encoste-se à Brasileira e deixe os olhos habituarem-se, deixe-os ver o que quiserem, até não quererem mais. Jante por aí, se quiser vá até ao Pic-Nic, um filme no Condes ou no S. Jorge serve para fazer tempo, suba depois até ao Marquês, aqui já sabe, com este nome é só coisa boa à sua espera, seja para que lado vá.

Fontes Pereira de Melo acima, pelo lado esquerdo, corte para a António Augusto de Aguiar, e suba a avenida pelo passeio da direita, vá olhando até dar de caras com a Cave e um porteiro fardado, lá para o meio da avenida. Só tem que abrir a boca, diga-lhe que o Capitão Marques manda cumprimentos, aquele que está agora com os ossos na Guiné, é só o que tem a dizer, ele mete-o lá dentro, sem mais. Ao descer as escadas, preste atenção, ouça, mas não quer jantar com a malta, olhe que isto é tudo bom pessoal.

A insinuante Helena nem parecia a mesma de quando chegou, a voz mais rouca, um vestido preto, brilhante, pendurado só no peito, como é que aquele vestido consegue ficar assim, tão seguro? Os joelhos cruzados um em cima do outro, o cabelo apanhado, uns brincos aos saltinhos. O Carlos parecia-lhe mais adulto, um ar quase indiferente para os outros, e também para a Helena, pareceu-lhe. Só um sorriso para cima, envergonhado.

Já apanhara com a artilharia toda, cansado de imaginar o percurso até à Cave. Despediu-se deles, um aperto de mão para aqui e para ali, o Carlos dá cá um abraço, quando apareces para jantar?

A Helena estava alugada ao mês. O pai do Carlos convencera-a, finalmente, a fazer companhia ao filho, depois tratara de tudo com ela, o salário base, as diárias, as condições todas. A Helena fizera questão que todas as despesas em Bissau, todas mesmo, ficassem a cargo do Carlos. E ainda um carro para as deslocações em Bissau. Foram ao J. J. Gonçalves2 em Lisboa escolher a cor, a marca e o modelo ela já tinha dito qual era. Ficaram instalados no Hotel Portugal, numa espécie de suite.
Um ou dois meses depois, mais dia, menos dia, o Carlos, acompanhado da Helena, foi ao cais levantar o Austin Sprite, de um vermelho lindo. Um brinquedo, a subir devagar a Avenida, a capota para baixo, o Carlos ao volante, a brisa a cuidar dos cabelos dela, o maralhal no Bento e na avenida de boca aberta, olhos arregalados.

Depois dos primeiros tempos, em que para onde ia um, o outro ia atrás, pelo que se estava a ver, o Carlos estava a aprender depressa, mais calado ainda, mas menos submisso. Noites dentro era visto quase sempre só, quando lhe perguntavam pela companheira, se achava que o dono da pergunta merecia resposta, dizia que tinha ficado no Hotel ou em casa de alguma gente conhecida e não adiantava muito mais. Levavam uma vida cada vez mais independente e a certa altura o Carlos tirou as coisas dele do hotel Portugal e mudou-se para a base de Bissalanca. Depois, ela começou a ser vista hoje com este e com aquele amanhã.

O Gabriel, empregado do hotel, contou mais tarde que uma noite apanharam um empregado do hotel em cima de um escadote, pano na mão a passar pelo vidro, os olhos todos lá para dentro. A limpar vidro que a senhora mandou! Contaram também outras coisas, sabe-se como é.
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Nota
2 - Empresa imortadora de automóveis, nomeadamente os Austin.

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Entram os Alouettes

6 de Março, domingo. Manhã quente. Carregador fora da G3, balas extraídas, um pano macio nelas. Uma a uma dentro outra vez. Os outros três carregadores cheios em cima da cama, para o cinturão. 100 projécteis ao todo, como de costume. Arma aos pés da cama. Granadas de mão, duas defensivas, uma ofensiva e uma incendiária para o cinturão, mais duas de fumos laranja para o bolso esquerdo do dólman3. Em cima da cama o camuflado e as meias. Botas de borracha junto à mesa da cabeceira. Tudo conferido outra vez. Duche.

À civil, meteu-se no ME-14-04, com o Alegre ao volante, em direcção a Bissau. Às 11 e pouco, na esplanada do Bento cheia de militares, um bolo de coco e um café. Volta a pé pelo quarteirão, olhar para o Geba, mexer pernas. De novo com o Alegre, regresso a Brá.

Camarata do grupo. O Sargento Valente e o Furriel Azevedo com as equipas conferiam o material, G3, MG 42, granadas de mão, lança-rockets, tudo a ser vistoriado e limpo.
Reunião do grupo para informação sobre a missão. Heliportagem4 de assalto a uma base IN nas imediações de Jabadá. Pertencente ao batalhão aquartelado em Tite, o destacamento de Jabadá estava a ser flagelado, há meses, quase todas os dias, às vezes mais que uma vez no mesmo dia.

13h00, Bissalanca. 30 homens em 6 Alouettes-III da esquadrilha comandada pelo Major Piloto Mendonça iam finalmente pôr em acção as práticas treinadas desde meados de Janeiro.


Minutos depois descolaram, formados em duas colunas, aos pares. Ganharam altura, sobrevoaram Bissau e começaram a subir o Geba castanho-escuro. Flectiram para a outra margem do rio, baixaram e, junto à orla, subiram o rio, a rasar as árvores.

De súbito, viraram à direita, dispuseram-se em linha, separaram-se, 3 helis para uma ponta da mata, os outros três para a outra.

Fumo a escapar-se das casas no mato em frente. Sinais do piloto, preparar para saltar. Portas abertas, olhos ansiosos. Junto ao solo, um metro para aí, saltar!


Um descampado seco, capim mais alto do que contavam. As equipas correram para a mata, em linha, torta como uma cobra a fugir.

Alguns guerrilheiros começaram a reagir. Rajadas de PPSH e Kalash, rebentamentos de morteiro, granadas, silvos de disparo de rockets, barulho das pás dos Allouettes.
Surpreendido, o IN retirou sem oferecer grande resistência, deixando baixas no terreno. Recolhidas crianças, mulheres e um velho. E algum material, meia dúzia de granadas, munições, correspondência vária, documentos.

13h45. Problemas na 2.ª Equipa. O Roberto à procura da parelha, o António Silva5. Deixara de o ver quando saltaram. Ouviam-se ainda chicotadas de disparos. A equipa do comandante do grupo voltou atrás, ao local de lançamento, a vasculhar o capim. Encontraram-no deitado, desajeitado, de barriga em cima da G3. Alguém o virou. Olhos abertos, um fio de sangue a espreitar da boca aberta e do nariz. Uma bala alojada no peito. Respiração boca a boca, uma golfada de sangue quente foi a única resposta.

Diabo Maior chama Lebre, evacuação, pediu e repetiu. Lebre chama Diabo Maior, indique local com fumo.

Até o capim estava contra, recusava-se quase sempre a arder quando lhe atiravam granadas incendiárias, agora até uma simples granada de fumos lhe pegara, o vento a empurrar-lhes as chamas, nem sabiam para onde ir, o Silva na maca improvisada, nem sabes quanto pesas, pá, desabafa um! Esgotados, meteram-no no heli, junto ao rio.


Explosões de granadas, berros, chicotadas de projécteis, crepitar do capim a arder e o barulho das pás do heli a curvar rapidamente para a outra margem do Geba, directo ao Hospital Militar de Bissau.


Soldado Comando António Alves Maria da Silva, o segundo a contar da direita

Uns dias antes, os olhos do Silva molharam-se quando o Furriel Azevedo lhe disse que não ia mais para o mato, que a comissão já estava terminada e que não queriam mais nenhuma edição do Furriel Morais dos Fantasmas, morto no sul, em Maio do ano passado, duas semanas depois de ter terminado a comissão. O alferes transigiu, a história repetiu-se.

Às 17h30 dessa tarde de domingo, o Soldado-Condutor Alegre deixava o alferes, já à civil, em Bissau frente à esplanada do Bento.

(Continua)
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Notas
3 - Casaco justo e curto que fazia parte do fardamento camuflado.
4 - Operação "Hermínia", a primeira heliportagem de assalto efectuada na Guiné.
5 - Soldado António Alves Maria da Silva, oriundo da CCaç 674, natural de Erada, Covilhã, ficou sepultado na campa 247, no Talhão Militar do Cemitério de Bissau.

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Nota do editor

Poste anterior da série de 20 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15024: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (XI Parte): Mornas e Segundo Encontro com o RDM num mês

Guiné 63/74 - P15043: Parabéns a você (953): Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2046 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 25 de Agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15037: Parabéns a você (952): Manuel Carmelita, ex-Fur Mil Radiomontador do BCAÇ 3852 (Guiné, 1971/73)

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Guiné 63/74 - P15042: O nosso livro de visitas (184): António Mário Leitão, natural de Ponte de Lima, ex-fur mil, Farmácia Militar de Luanda, delegação nº 11 do LMPQF - Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos, Angola, 1971/73

1. Mensagem de António Mário Leitão, de Ponte de Lima, nosso leitor e camarada [ex- furriel mil na Farmácia Militar de Luanda, Delegação n.º 11 do Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos (LMPQF), Luanda, 1971 a 1973]


Data: 21 de agosto de 2015 às 15:18
Assunto: 52 Heróis Limianos


Obrigado, Luís!

Em meu nome e desses 52 Heróis, muito obrigado! (*)

Fico espantado com a vossa  capacidade de trabalho! A sério, que vos admiro!

Estais a deixar para os vindouros um registo incrivelmente histórico, imensurável e cheio de sentimento sobre a Guerra!
Brasão da Farmácia Militar de Luanda.
Cortesia do portal Ultramar TerraWeb.
Delicio-me a ler os relatos dos nossos camaradas, muitos deles cheios de humor e humanidade!

Além disso, o vosso sítio é importantíssimo para os artigos que escrevo e os livros que estou a preparar.

Obrigado pela vossa  dedicação, caro Luís!

PS - Se vieres a Ponte de Lima, de dia, de noite,  ao sol ou à chuva, avisa-me, camarada! Quero conhecer-te!

Grande abraço!

Mário

2. Comentário de LG:

Obrigado, Mário, pelas tuas palavras sinceras, calorosas e fraternas. E pelo teu nº de telemóvel que vou gravar. Tens o nosso blogue sempre à tua disposição, e nomeadamente sempre que queiras evocar e honrar a memória dos limianos que passaram por (e alguns tombaram em) o TO da Guiné.

Quanto ao teu convite, terei também muito gosto em conhecer-te pessoalmente. Às vezes dou aí um salto, à tua bela terra, rica pelas suas gentes e pelo seu património (natural e cultural), quando estou no norte (Porto e/ou Marco de Canaveses).

Assim de repente, lembro-me de lá ter estado por ocasião do 8º Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima, em 7 de junho de 2012. Publiquei aqui algumas fotos... 

Na ocasião, se não erro, também descobri, maravilhado, a lagoa de Bertiandos (sobre cuja biodiversidade tens um livro de que és autor e sobre o qual gostaria que nos fizesses um curta apresentação)... Pelo vi na Net, és também membro do Lions Clube de Ponte de Lima e uma figura estimada entre a gente limiana.

Haveremos,.. por certo, de nos encontrar. Afinal, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca...é Grande! Fico feliz por seres nosso leitor assíduo e achares utilidade neste blogue como fonte de informação e conhecimento sobre a África lussófona, e em especial sobre a Guiné. Também há lugar aqui para ti, se assim o entenderes... Fica aqui o convite formal para integrares, como camarada, a nossa Tabanca Grande. Precisamos de camaradas como tu, que escrevam e saibam guardar, honrar e fazer respeitar a memória dos antigos combatentes da guerra colonial (ou do ultramar, como queiras).

Um alfabravo. Luís Graça (**).
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(**) Último poste da série > 5 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14436: O nosso livro de visitas (183): Luis Eiras, ex-alf mil, que esteve no CTIG, de abril a outubro de 1974, que passou por Caboxanque, que esteve em Vendas Novas com o Joaquim Sabido e que quer ir ao 10º Encontro Nacional da Tabanca Grande, no próximo dia 18, em Monte Real

Guiné 63/74 - P15041: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (32): O "making of" de um projeto de ajuda ao Hospital de Cumura (João Martel e Ana Maria Gala)


1. Mensagem de João Martel, com data de 19 de fevereiro de 2014, que não foi publicado na devida altura (*) e que nos parece agora relevante para perceber melhor o projeto deste jovem médico, João Martel, com quem já falei ao telemóvel duas ou três vezes... 

[foto á esquerda, João Martel com Ana Maria Gala; são os dois mais recentes membros da Tabanca Grande (**)]


Boa tarde, caro Luís Graça

O meu nome é João Martel.

Em primeiro lugar, e ainda sem me conhecer, aceite os meus sentimentos pela partida do Carlos Schwarz, "Pepito", para a Casa do Pai. O Senhor o recompensa já, por certo, pelas suas grandes e boas obras. A luta desse grande homem, que pude conhecer pelo seu blog, também me motivou a falar consigo hoje.

Cheguei até si pela leitura do seu blog "Luís Graça e Camaradas da Guiné" e pelo site da ENSP (já agora, perdoe-me a invasão de tantos endereços de e-mail, tentei apenas acautelar as falhas do digital).

O seu blog aparece sistematicamente em tudo o que são pesquisas sobre a Guiné-Bissau e tenho ficado cada vez mais motivado para contactar consigo, dado que tenho um interesse cada vez maior neste país e neste povo.

Mas começando do início:

Estou actualmente a terminar o curso de Medicina na FCML. Vim a aperceber-me que comecei o curso no ano de término do seu filho João, em 2008, cujo relato de Cumura também li com interesse.

Há já bastantes anos que vegeta em mim a vontade de poder aplicar algum do meu tempo (e, quiçá, saber) a um povo que sinta precisar especialmente de auxílio no esforço para o desenvolvimento. Como é próprio dos maçaricos, o tempo de partir parece que nunca chega mas circunstâncias da vida e dos estudos obrigam a um adiamento. Este tempo serve para maturar, claro, e tornar a nossa visão um pouco mais clara, mais informada, mais consciente de nós e dos outros, o que não pode ser senão positivo.

Estando actualmente a terminar o 6º ano, penso que chega a altura de soltar amarras! Mas para onde, como?

Através de alguns contactos com os Franciscanos Portugueses, soube da existência da Missão de Cumura e do trabalho do Frei Vitor Henriques, médico, na missão, durante vários períodos.

Falei o ano passado com ele, falei de raspão com a drª Alice, pediatra que também lá esteve.. As coisas foram-se ligando...

Nas pesquisas on-line, como lhe disse, o seu blog, a vossa Tabanca, aparece sistematicamente. Através dele, pude completar melhor o meu olhar sobre este país e as aventuras e desventuras de tantos que por ele tanto têm feito. Nomeadamente (e terei que usar o tom coloquial) o Carlos Schwarz e a AD Bissau, o seu filho João Graça, o Zé Teixeira e o seu filho Tiago, o dr. Francisco Silva, ortopedista e tantos outros... são personagens que, ainda que só dentro da blogosfera, já habitam a minha ideia da Guiné-Bissau e me motivam a seguir em frente.

Na verdade, falo em nome de um grupo de três pessoas, eu próprio, uma colega de medicina e uma professora do ensino primário, trio que pretende partir em conjunto, em princípio no ano de 2015, dado que ainda estamos a terminar a nossa formação base.

Não querendo maçá-lo muito mais com este testamento, gostava de lhe pedir se poderia falar consigo um pouco sobre a Guiné e algumas perspectivas para o futuro dos nossos trabalhos. Igualmente, e abusando, sem querer abusar, se poderia facilitar-me alguns contactos, que adivinho muito úteis, do seu filho João e do José e Tiago Teixeira, ou outros contactos que ache importantes para nós.

Agradeço desde já a sua atenção e, logo em primeira mão, todo o sonho que já me fez viver com as suas escritas e de tantos Tabanqueiros!

Com as minhas desculpas por este rolo de texto, com amizade

João Martel (e Ana Maria e Rita)



Guiné-Bissau > Bissau > Estrada de Prábis, a 10 km de Bissau > Cumura > Missão Católica e Hospital de Cumura > Cortesia da página da União Missionária Franciscana.


2. Resposta de Luís Graça,. com data de 24 de fevereiro de 2014:

João: Vejo que é um homem crente, com sentido de coerência, e solidário. A Guiné-Bissau precisa de todos nós, e de pessoas jovens e generosas como você e as suas amigas.

Obrigado, antes de mais, por me contactar. Obrigado pelas referências elogiosas ao nosso blogue. Terei todo o gosto em poder ajudá-lo, eu e outros amigos da GB e do seu povo que se acolhem à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande...

Espero que possa concretizar, em 2015, os seus sonhos de,, uma vez concluído o mestrado integrado de medicina, na nossa FCM/UNL [, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade NOVA de Lisboa], possa partir para a GB em missão humanitária ou de cooperação ou em regime de simples voluntariado. Vou pô-lo em contacto com as pessoas que referiu.

Para já fique com os meus contactos pessoais (...)

Um alfabravo (ABraço), em linguagem dos antigos combatentes... Luís Graça

PS - Gostaria de poder publicar um pequeno texto seu, no nosso blogue, a partir desta mensagem. Caso ache oportuno, adequado e pertinente.

3. Informação sobre os promotores do projeto:

Ana Maria Gala

Formada em Educação como professora do 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico. Com 25 anos sobre este planeta, actualmente a trabalhar no Serviço Educativo do Museu Calouste Gulbenkian. No entanto, tem como grande paixão o Ensino e desde cedo desejou fazer um período de trabalho missionário,  pondo ao serviço a sua formação.

João Martel

Formado em Medicina pela Universidade Nova de Lisboa, actualmente a realizar o Ano Comum (o antigo Internato Geral). Igualmente com 25 anos, uma boa parte deles com o sonho de ser útil na construção do diálogo entre os povos. Aceita os desafios de uma medicina pobre, com múltiplas carências básicas.

O João e a Ana veem na Acção Missionária uma forma de honrar as ligações fraternas de Portugal com o Mundo Lusófono, contribuindo para o caminho do desenvolvimento. Encontraram na Ordem Franciscana uma estrutura organizada e coerente para o fazer.

(Fonte: PPL | Crowdfunding Porttugal > Causas > Um pé na Guiné)
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 20 de maio de  2015 > Guiné 63/74 - P14640: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (31): Em busca das minhas raízes nalus / In search of my Nalu family origins (Nigel Davies, historiador britânico, originário da Serra Leoa / British historian, specialising in the study of Sierra Leone Creole people)

Guiné 63/74 - P15040: Os nossos seres, saberes e lazeres (112): Un viaggio nel sud Italia (3): Ver Nápoles por um canudo (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Julho de 2015:

Queridos amigos,
Às vezes talhamos as nossas viagens e cometemos a leviandade de querer meter o Rossio na Betesga.
Nápoles é tão jubilosa, magnífica desde o período greco-romano até às ousadias da modernidade, tem o impressionante Vesúvio, o seu peculiar bulício nas ruas compactadas de gente e trânsito, o seu museu arqueológico é magnífico, há a catedral e dezenas de igrejas e praças, que até quase sinto vergonha pela insignificância que mostro.
Espero voltar a ter outra oportunidade para acariciar Nápoles como deve ser.

Um abraço do
Mário


Un viaggio nel sud Italia (3) 

Beja Santos

Ver Nápoles por um canudo

Tivesse eu seguido à letra todas as propostas para conhecer os tesouros artísticos de Nápoles e arredores, muito provavelmente ainda lá estava, a passear-me entre palácios, igrejas, museus, catacumbas, a coscuvilhar todo o casco histórico.

Levo o “Kaputt” de Curzio Malaparte debaixo do braço, vem a propósito fazer referências a Nápoles. Malaparte encontra a princesa do Piamonte (mulher de Umberto de Itália, viveu muito tempo em Cascais, na Villa Italia) no hall da gare de Nápoles, pouco depois de um bombardeamento. E escreve: “Os feridos jaziam em cima de macas alinhadas no cais, aguardando as ambulâncias. A princesa o Piamonte mostrava no seu rosto a palidez mortal da angústia – mas não apenas da angústia: qualquer coisa de mais profundo, de mais secreto. Emagrecera, tinha umas olheiras enormes e as têmporas floridas de uma ligeira tatuagem branca de rugas. Para todo o sempre, aquele puro esplendor que a iluminava quando fora a Turim pela primeira vez, alguns dias depois do seu casamento, apagara-se. Tornara-se mais lenta, mais pesada e parecia estranhamente envelhecida”. Cumprimentam-se, a princesa procura palavras tranquilizadoras. Malaparte responde. “Nós já perdemos a guerra; todos nós perdemos a guerra. Vós também”.


Saio da gare de Nápoles e presto esta homenagem a Malaparte, nada resta desse passado, 70 anos é muito tempo e esta estação ferroviária está cercada de arranha-céus. A obra-prima absoluta de Malaparte termina em Nápoles, ele concluiu o livro em Capri, no mês de Setembro de 1943. Há bombardeamentos, multidões em pânico, fome e sede, mas essa multidão só fala no sangue, o sangue do santo padroeiro de Nápoles, San Gennaro, que se liquefaz periodicamente. Tinha-se espraiado pela cidade o boato segundo o qual uma bomba atingira a catedral e fizera desmoronar-se a cripta onde se conservam os dois relicários com o precioso sangue. E Malaparte dá-nos um parágrafo prodigioso: “Era a primeira vez, depois de quatro anos de guerra, a primeira vez no decurso da minha cruel viagem através dos massacres, da fome, das cidades destruídas, a primeira vez que ouvia pronunciar a palavra sangue com sagrado e misterioso respeito. Em todas as partes da Europa, na Sérvia, na Croácia, na Roménia, na Polónia, na Rússia, na Finlândia, essa palavra soava com ódio, medo, desprezo, alegria, horror, cruel e bárbara complacência, prazer sensual – num tom que sempre me causara horror e nojo. A palavra sangue tornara-se para mim mais terrível que o próprio sangue. Ora em Nápoles, precisamente em Nápoles, na mais infeliz, na mais esfaimada, na mais humilhada e torturada cidade da Europa, na mais desgraçada cidade da Europa, que eu ouvi a pronunciar a palavra sangue com um religioso respeito, sagrado tumor e profundo sentido de caridade, na voz clara, pura, inocente e amável que tem o povo italiano ao pronunciar as palavras mamma, bimbo, cielo, Madonna, pane, Gesú, a mesma inocência, a mesma pureza, a mesma amável candura”.
Fatalmente, e sempre a pensar em Malaparte, avancei para a catedral, três quilómetros a pé num calor insuportável e a ver as maiores montureiras que imaginar se pode, nunca vi tanto lixo na rua.


Fachada de gótico italiano, concluída por Roberto de Anjou, em 1313, muitas vezes alterada. Celebrava-se missa, sorrateiramente fui até à capela do tesouro de San Genaro, é muito faustosa, ficamos embasbacados com os enormes relicários com bustos de prata. É aqui que se expõe durante duas semanas o relicário para ocasião do milagre da liquefação. Na véspera, e durante a viagem de comboio de Salerno até aqui, angustiei-me a ler o património que a cidade oferece, só o museu arqueológico tem acervo para um dia inteiro, o melhor de Pompeia e Herculano, por exemplo, expõe-se aqui. Estava tomada uma decisão: vamos ver Nápoles pela imagem que nos dão os viajantes há muitos séculos.






O núcleo histórico de Nápoles conserva a sua antiga estrutura greco-romana e prossegue em espaços medievais e renascentistas. O comércio estava aberto, pedi licença ao quinquilheiro para mostrar a fachada da sua loja, autorizou sem hesitação. Seguem-se as ruas do umbigo da cidade, dá gosto ver a reciclagem de tudo quanto é antigo nas habitações e mobiliário urbano atuais. É pena que as imagens em certos casos não tenham som, asseguro-vos que se ouviria o bater do coração napolitano, até canções se misturam nestas ruas de trânsito caótico, com grandes fachadas de palácios, árvores, praças, sente-se uma irrecusável alegria de viver, todos se falam, param frente às montras cheias de iguarias, também eu não resisti, entrei para comer uma babá, um dos doces tradicionais da cidade. É nisto que dou com o complexo monumental de Santa Clara, ao longo da via Benedetto Croce, um sábio italiano que estudei em Teoria da História. A igreja é austera, em gótico provençal, foi bastante afetada pelos bombardeamentos de 1943, o restauro é magnífico. Quando ouvi a palavra majólica em profusão nos claustros, não resisti, entrei todo lampeiro.




Só para ver este claustro valeu a pena vir a Nápoles. É gigantesco mais harmonioso, tem uns belos jardins, as paredes estão cobertas por frescos do século XVIII, representando santos, alegorias e cenas do antigo testamento. Mas a azulejaria a toda a volta, os bancos primorosos com cenas da vida quotidiana da época que nos fazem palpitar, nada vira nesta policromia azulejar de tão belo, num edifício religioso. O cansaço era enorme, fiz dois em um, contemplava os frescos e os azulejos e aproveitei para passar pelas brasas. E depois entrei no museu, mal sabia que ia ter um encontro inesperado, inesquecível.


A Idade Média deu enorme destaque a um encontro entre a Virgem e a sua prima Isabel, é a imagem da afetuosidade familiar e da hospitalidade. Cativou-me este mármore do século XIV, a singeleza do drapejamento e as mãos a abraçarem-se, os corpos a acolherem-se. É tão tocante não preciso de saber como eram os seus rostos, que o tempo erodiu.



Estou a despedir-me de uma cidade que teve vice-reis de Espanha entre os séculos XVI e XVIII, vieram depois os Borbons e o seu reino de Nápoles até 1860, quando surgiu a Itália. Foi um simples passeio, ainda irei até ao porto e até viajarei no moderníssimo metropolitano. Vi o Vesúvio, impressionante. Fica o sabor amargo de uma pálida amostra, que teria valido a pena organizar as coisas para estar mais tempo. Agora é tarde, hei de voltar. As casas palácio têm dimensões medonhas, fiz quatro ou cinco fotografias desta entrada apalaçada, até me acocorei para que tudo coubesse na imagem, em vão, o leitor que suponha como é tudo vasto, para impressionar. E mais adiante avistei uma casa de bicos, a rivalizar com a nossa, ali no Campo das Cebolas, onde se comemora Saramago. Para que conste. A dormitar em pé, regresso a Salerno. Preparei as coisas para ter amanhã um dia agitado. Será todo o dia a percorrer a Costa Amalfitana.

(Continua)
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Nota do editor

Poste anterior da série de 19 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15019: Os nossos seres, saberes e lazeres (111): Un viaggio nel sud Italia (2): De Roma para Salerno (Mário Beja Santos)

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Guiné 63/74 - P15039: Ser solidário (187): tempo de missão em Cumura: partiremos em 10 de setembro, com regresso previsto para junho de 2016... Entretanto, e até final de corrente mês, está a decorrer uma angariação de fundos para aquisição de material médico e escolar... Um euro é muito! (João Martel, médico, e Ana Maria Gala, professora, novos membros da Tabanca Grande)


Os dois novos grã-tabanqueiros, João Martel e Ana Maria Gala, nºs 699 e 700, respetivamente. Desejamos-lhe boa saúde e muita saúde para a generosa e solidária missão que escolheram fazer na Guiné-Bissau.



Um Pé na Guiné, página do João Martel e da Ana Maria Gala para a angariação de fundos (1500 eruos, até final de agosto de 2015)


1. Mensagem do nosso leitor João Martel, médico, cooperante, com data de 14 do corrente:

 Boa tarde,  caro Luís Graça:

Espero que se encontre bem.

Lembra-se do que falámos [, em fevereiro passado,] do projecto de colaborar com a missão de Cumura?

A ideia está de pé e em marcha e a nossa partida marcada para dia 10 de setembro próximo, com estadia pela Guiné até junho de 2106.

Partirei juntamente com a minha namorada, professora primária, e com a drª Alice Ferreira, médica pediatra portuguesa que muito tem colaborado com Cumura nos últimos anos - penso até que já a conhecerá, se não me engano.

Contacto-o para que possa ter conhecimento da nossa partida e eventualmente, porque mo tinha sugerido já em tempos, fazer algum tipo de divulgação na página que gere, se considerar relevante.

Gostaria ainda de lhe fazer chegar uma campanha de "crowdfunding" que criámos para a aquisição de alguns materiais escolares e médicos. Encontra-a aqui:

http://ppl.com.pt/pt/causas/um-pe-na-guine

Se pudesse colaborar com a sua divulgação, muito lhe agradecíamos, em nome desta causa por que lutamos.

Com um abraço fraterno


João Martel



Guiné-Bissau > Bissau > Cumura > Missão Católica e Hospital de Cumura > 14 de Dezembro de 2009 &gt > 18h > Mural com as seguintes inscrições: "Obrigado, Bispo Settimio"; "X Aniversário da Morte de Dom Settimio"; "A Verdade Vos Libertará".

O missionário Settimio Arturo Ferrazzetta, da ordem franciscana, foi o 1º bispo da diocese de Bissau, criada em 1977. "Homem Grande" da Igreja Católica de África, nasceu em Itália, em 8 de Dezembro de 1924, e morreu, com fama de santidade, em Bissau, em 26 de Janeiro de 1999.


Foto: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


2. Resposta de Luís Graça, com data de 14 do corrnte:

Parabéns, João, pela persistência e concretização do seu projeto... Irei dar, com todo o gosto, a devida divulgação à sua mensaqem,,, Temos diversas séries, uma delas chama-se "Ser solidário"...Penso que é a mais adequada para inserir a sua mensagem.

 Fica desde já convidado a integrar, de pleno direito, esta "Tabanca Grande", constituída por amigos e camaradas da Guiné... Somos já sete centenas,,, Se quiser escrever algo mais sobre si e o seu projeto, e me mandar uma foto sua, terei muito gosto em apresentá-lo aos restantes grã-tabanqueiros...

Temos regras simples e de bom senso, em termos editoriais, disponíveis aqui,  no nosso "livro de estilo":

Um alfabravo (ABraço) caloroso. Luís Graça

3. Novo mail do João Martel, com data de 21 do corrnte:

Viva, caro Luís

Deixamos uma então uma curta mensagem que se poderá fazer publicar no blog:

"Saudações a todos os Camaradas da Guiné!

Após o repto e convite feito pelo Luís Graça, fazemos aqui a nossa apresentação ao membros desta Tabanca:

Somos dois jovens profissionais portugueses, um médico e uma professora do 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico, da zona de Lisboa, que desde há vários anos têm a aspiração de colaborar no desenvolvimento de África, essa África tão querida de Portugal. 

Já nascidos fora do alcance da Guerra Colonial (de facto, mais por alturas da queda do muro de Berlim), guardamos a impressão vívida que nos passaram os nossos avós, que viveram a África Lusa de então apaixonadamente, apesar de noutro país. Tudo contribuiu para que o sonho e as aspirações se reforçassem de forma crescente e se desenhasse, quem sabe, um futuro projecto missionário nos nossos ideais.

Durante as nossas andanças universitárias, colaborámos com a Ordem Franciscana em Portugal, onde ouvimos falar de Cumura e da Guiné-Bissau, terreno de tanto esforço e doação por parte da Ordem dos Frades Menores, como muitos saberão e Mário Beja Santos, entre outros, aqui fez notar {[,no poste t P13131], Cumura foi realmente a nossa chave para a Guiné e, desde aí, foram dois saltos até nos depararmos com esta família dos Camaradas. (aproveitamos para saudar este blogue por ser já uma plataforma on-line tão importante e significativa para a partilha e o encontro de tantos que buscam pela Guiné-Bissau).

Tendo terminado a nossa formação básica, sentimos que é o momento oportuno! Partiremos para Cumura a 10 de setembro próximo, em conjunto com a drª Alice Ferreira, pediatra portuguesa que colabora com a missão há já vários anos. Ficaremos em Cumura, a trabalhar na escola e no hospital, durante este ano lectivo, com regresso pensado para junho de 2016.

Porque acreditamos que todos os homens e mulheres de boa-vontade se devem juntar para construir um mundo mais justo e fraterno (aliás, espírito que se sente no ar que se respira nesta tabanca), queríamos partilhar com os camaradas este projecto, comprometendo-nos a fazer o devido "diário de bordo" num endereço que divulgaremos em breve. Assim, poderemos juntar algumas das nossas "pinceladas" a tantas outras que já colhemos aqui e que ajudaram a formar parte do nosso "imaginário" da Guiné, um país que nunca pisámos.

Aproveitamos também para divulgar o projecto de "crowdfunding" - financiamento colaborativo - que criámos para juntar dinheiro para alguns materiais que elegemos como prioritários para levar para a Missão. A destacar que, graças a apoio de amigos em Portugal, teremos disponível espaço em contentor seguro e confiável para levar vários materiais, principalmente livros e consumíveis sanitários, que não conseguiremos levar logo connosco.

Podem consultar a lista e o projecto aqui: http://ppl.com.pt/pt/causas/um-pe-na-guine

Desde já muito gratos a todos, deixamos aqui um abraço fraterno

Ana Maria Gala e João Martel"

Aproveitamos também para lhe dizer, Luís, que utilizámos algumas imagens retiradas do blogue no vídeo de divulgação que fizemos para a campanha (pois as imagens que se encontram de Cumura são pouquíssimas!). Referenciámos a fonte das imagens na descrição do projecto mas percebemos depois que devíamos ter pedido previamente autorização para as utilizar. Por tal pedimos desculpa e poderemos editar o vídeo se houver inconveniente.

Enviamos em anexo uma fotografia dos dois (o que se encontrou aqui no baú... ;)


Obrigado por todo o apoio!
Um abraço!

Ana Maria e João


4. Em 19 do corrente, o João Martel e a Ana Maria Gala tinham dirigido a seguinte mensagem á sua lista de contactos:



Queridos amigos(as) e benfeitores(as)

Como sabem, estamos quase a partir para um tempo de missão na Guiné-Bissau, junto da missão Franciscana de Cumura - partiremos dia 10 de setembro próximo.

Este tempo de missão, o ano lectivo que passaremos junto daquele povo, foi longamente preparado, sendo fruto do nosso contacto com os Franciscanos em Portugal, que trabalham em conjunto com a Guiné e nos desafiaram - cativaram - para realizar este tempo de serviço humanitário, tendo em conta as nossas áreas de formação.

Durante este tempo de preparação, além de economizar do nosso próprio trabalho, batemos a muitas portas no sentido de arranjar apoios e dádivas para ajudar o nosso esforço missionário. As mãos amigas não têm tardado e têm-se multiplicado sob diversas formas, o que nos tem enchido de grande alegria, mostrando-nos que este projecto é muito maior do que nós e que existe de facto uma comunidade que nos envia e nos pede que levemos a amizade de Portugal e dos Portugueses até à Guiné-Bissau, país lusófono que tanto tarda no caminho para o Desenvolvimento.

Para que o trabalho possa ser mais proveitoso e estruturado, tendo em conta as facilidades técnicas e materiais que Portugal tem face à Guiné, escolhemos em conjunto com os responsáveis da Missão uma lista de materiais prioritários a adquirir em Portugal para levarmos connosco para este ano de trabalho. Definimos um tecto de 1500€ que orçamentámos do seguinte modo:

Material escolar:

- Literatura infanto-juvenil africana (200€)

- Lápis, canetas, borrachas e material de escrita (130€);

- Cadernos diários (200€);

- Giz para quadro de ardósia (30€);

- Projector vídeo (300€);

- DVDs de filmes em português (50€).

Material médico:

- Soro fisiológico - frascos de 100 ml (100€);

- 1 Aparelho de tensão arterial (250€);

- 2 Ambu (insuflador manual) neonatal (45€ x2)

- 1 Laringoscópio para neonatologia (150 €)
(Se tiverem alguns destes itens que queiram enviar através de nós, por favor contactem-nos também!)

Se quiserem colaborar connosco em mais esta ajuda que vos pedimos, podem consultar a página de "crowdfunding" (uma forma de angariação de dinheiro para uma causa pela internet, usando uma comunidade alargada) que criámos para esse propósito aqui (estará operacional até ao final de agosto):

http://ppl.com.pt/pt/causas/um-pe-na-guine

Caso esse recurso "internautico" não seja muito familiar ou prático, podem responder a este e-mail com a vossa intenção de nos ajudar que outra hipótese será criada para o efeito, sendo a ajuda adicionada à campanha on-line posteriormente.

(Pequena nota: não se esqueçam...1 euro é muito! Se cada destinatário desta mensagem der 1 euro, facilmente chegamos ao objectivo traçado, não é preciso mais!)

Pedimo-vos ainda e principalmente que tenham presente em espírito o povo da Guiné-Bissau e esta empresa missionária (de forma mais ou menos orante conforme a visão universal de cada um), para que se possa lançar uma semente que frutifique e, desejamos, faça uma pequena diferença duradoura!

Os vossos amigos muito gratos

João Martel e Ana Maria Gala

(Brevemente vos informaremos do endereço do blogue que criámos para registar e relatar este ano de caminho. Fiquem atentos!)

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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P15038: FAP (83): Pedaços das Nossas Vidas: VI - Um ataque com "olhos azuis" - II Parte: Um ataque atípico no dia 6 de Janeiro de 1969 (José Nico, Gen PilAv)

1. Segunda parte do trabalho da autoria do General PilAv José Francisco Fernando Nico, versando a ajuda da Suécia aos Movimentos de Libertação africanos, durante a guerra colonial, enviado ao Blogue pelo nosso camarada Miguel Pessoa, Cor PilAv Ref (ex-Ten PilAv, BA 12, Bissalanca, 1972/74) em 22 de Agosto de 2015.

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PEDAÇOS DAS NOSSAS VIDAS

Cumpri muitas missões durante a minha carreira na Força Aérea Portuguesa. A comissão na Guiné, porém, sobrepôs-se a todas as outras e marcou-me indelevelmente para o resto da vida. A mim e certamente a todos os que, de algum modo, partilharam a mesma experiência. É dela ou de acontecimentos com ela relacionados, que vos irei dando conta…
José Nico
Gen PilAv



VI – UM ATAQUE COM “OLHOS AZUIS” (2)

Um ataque atípico no dia 6 de Janeiro de 1969

Naquela segunda-feira, a notícia de um ataque com canhões, ao início da manhã, a Gadamael Porto, sede da CArt 2410 deu logo a ideia de que qualquer coisa estranha estava a acontecer. Não era nada normal o PAIGC desencadear flagelações àquela hora. O que era normal era atravessarem a fronteira durante o dia, estabelecer bases de fogos e depois esperar pelo fim do dia para desencadear os ataques. Podiam depois retirar a coberto da noite, em segurança, com a certeza que, nem o Exército tinha condições para os perseguir, nem a Força Aérea para os detectar e atacar.

Na Base 12 o dia de trabalho estava a começar e o pedido de apoio aéreo que chegou através do Comando-Chefe fez os dois pilotos da parelha de alerta largar o pequeno-almoço, apanhar rapidamente o equipamento e meterem-se no jeep de apoio em direcção à linha da frente. Lembro-me de ter ouvido o que se estava a passar mas tinha outras missões para esse dia e não cheguei a envolver-me no que aconteceu depois. No entanto, num cantinho da memória persiste uma sensação de choque associada à notícia porque fiquei com a perturbante impressão de que tínhamos entrado numa nova fase da guerra.

Dos G-91 prontos na linha da frente, os dois de alerta, como era normal naquela altura, estavam configurados com tanques de combustível externo, 8 foguetes 2,75 polegadas e as 4 metralhadoras 12,7mm19. Não havendo outras informações para ajuizar a situação no terreno o que a experiência ensinara era que a presença dos aviões faria o PAIGC “encolher as unhas” e terminar o ataque. Os dois pilotos procuraram, por isso, descolar e chegar o mais rapidamente possível a Gadamael Porto.

Apesar de andar empenhado na recuperação deste episódio há muito tempo, porque penso que deve ficar registado na nossa memória colectiva, não consegui identificar até agora um dos dois pilotos envolvidos. Por exclusão de partes e porque éramos muito poucos, penso que foi o Capitão Amílcar Barbosa20 o chefe da parelha de alerta, mas não tenho a certeza absoluta. O outro piloto está bem identificado e foi o então Tenente Balacó Moreira de quem obtive muita da informação sobre o que se passou.

Dos registos sobreviventes sabe-se que os aviões descolaram às 09H00, que a flagelação teria começado cerca de uma hora antes e visava objectivamente Ganturé, a curta distância de Gadamael Porto onde, para além de um pequeno núcleo populacional, estava destacado o 4.º grupo de combate da CArt 2410. Numa primeira fase os rebentamentos foram espaçados e compridos dando a impressão que o inimigo estava a regular o tiro21. De Ganturé a resposta estava a ser dada com o morteiro 81 operado pelo furriel miliciano Luís Guerreiro. Com o correr do tempo o PAIGC foi aumentando a frequência dos disparos até que a artilharia de Gadamael Porto também entrou em acção na tentativa de suster a flagelação mas sem resultado. O PAIGC disparava cada vez com mais intensidade mas, felizmente, as granadas passavam silvando sobre Ganturé e iam danificar o arvoredo que se estendia para lá da posição.

Em rota, a parelha de alerta conseguiu entrar em contacto rádio com Gadamael Porto que forneceu uma série de indicações sobre a direcção e distância a que entendiam estar a ser feito o ataque e até dispararam algumas granadas de fumo com o morteiro 81mm para tentar sinalizar esse local. Na carta 1:50.000 essas indicações apontavam para a antiga tabanca de Bricama a cerca de dois quilómetros a SW de Gadamael Porto. No entanto, quando os aviões chegaram à zona, ao passarem junto a Sangonhá, onde estivera instalada uma unidade do Exército até 29 de Julho de 196822, os pilotos foram surpreendidos com o que viram: o perímetro do antigo aquartelamento estava pejado de gente. Perceberam imediatamente que só podiam ser os guerrilheiros responsáveis pela flagelação a Ganturé. Mas o mais espantoso é que estavam ali, num espaço completamente aberto e sem qualquer espécie de camuflagem. Quase à vertical alguns detalhes tornaram-se então claramente perceptíveis como a presença de três armas com rodado. Uma delas, entre o perímetro do aquartelamento e a antiga pista, era uma anti-aérea ZPU-4 que abriu imediatamente fogo contra os aviões obrigando os pilotos a entrarem num circulo alargado para manter uma distância de segurança. Dentro do perímetro do aquartelamento, no meio dos destroços dos edifícios23, estavam duas peças de artilharia com um cano relativamente comprido e, na picada que saindo de Sangonhá se dirigia à Guiné-Conacri, viam-se algumas viaturas incluindo uma ambulância. Deviam ter vindo de Sansalé que era uma pequena aldeia da Guiné-Conacri muito utilizada pelo PAIGC nas suas movimentações junto à fronteira.

O que é que teria passado pela cabeça daquela gente para se expor daquela maneira? O PAIGC e os seus mentores cubanos vinham seguindo à risca a cartilha da guerra de guerrilha mantendo-se sempre encobertos e só atacando quando estavam em vantagem. Quando se sentiam em desvantagem furtavam-se ao contacto. No entanto, desta vez, estavam a fazer tudo ao contrário, de tal maneira que os dois pilotos dos G-91 tiveram dificuldade em assimilar a imagem que a vista lhes oferecia com toda a nitidez. Seria mesmo real o que estavam a ver? O ex-Tenente Balacó Moreira confessa que da sua experiência em operações quase diárias no teatro de operações da Guiné nunca tinha dado de caras com o inimigo numa situação tão vulnerável. No entanto, os aviões da parelha de alerta não estavam equipados para intervir naquele cenário. Quer os foguetes, quer as metralhadoras, para serem eficazes só podiam ser disparados a uma distância relativamente curta do alvo, bem dentro da densa e eficaz nuvem de projécteis cuspidos pelos canos da ZPU-4 à razão de 2400 tiros por minuto. Pela sua extensão e natureza aquele alvo exigia mais aviões e também munições mais capazes.

O comandante da parelha decidiu por isso abandonar a área e regressar imediatamente à BA12 para que a situação fosse ponderada e tomada uma decisão adequada às circunstâncias. Em qualquer caso, a partir desse momento era tudo urgente porque a guerrilha, tendo sido detectada, devia começar a desmobilizar e desapareceria rapidamente nas matas que rodeavam Sangonhá. Cada minuto de atraso na resposta aumentava exponencialmente as probabilidades de insucesso. Depois de informar Gadamael que iam regressar a Bissau o comandante da parelha entrou em contacto com o Centro Conjunto de Operações Aéreas (CCOA).
- Marte, Tigres chamam!
- Marte à escuta, transmita!
- Informe o Pirata24 que estamos a regressar a Bissau. A situação em Gadamael é a seguinte: flagelação a Ganturé continua a partir da pista de Sangonhá. Em Sangonhá vê-se muita gente no chão, uma quádrupla que abriu fogo quando os aviões se aproximaram, dois canhões com rodado, diversas viaturas e uma ambulância. Sugiro preparação de mais aviões com bombas. Diga se copiou.  - Afirmativo Tigres, tudo copiado vou já passar ao Pirata - respondeu o oficial de serviço.

Tinham passado trinta minutos depois da descolagem quando os dois aviões tocaram na pista de Bissalanca e iniciaram uma rolagem rápida para o estacionamento.

Furriel Miliciano Luís Guerreiro operando o morteiro de Ganturé
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Notas:

19 - Esta configuração “standard” permitia alcançar qualquer ponto do território, garantia algum tempo de permanência sobre o alvo mesmo no extremo Leste e dava alguma capacidade de intervenção se não existisse reacção AA.

20 - Cap PilAv Amílcar Barbosa, nascido em Cabo Verde e originário da Esquadra 51 de Monte Real que morreu no ano seguinte, no campo de tiro de Alcochete, ao lançar uma bomba equipada com uma espoleta experimental que funcionou mal.

21 - Não foi certeiro na fase de regulação, nem foi certeiro depois por razões que se explicam no texto.

22 - Na reestruturação do dispositivo ordenada pelo Brigadeiro António de Spínola depois de tomar posse como Governador e Comandante-Chefe, as posições de Sangonhá e Cacoca que ficavam entre Gadamael Porto e Cacine foram abandonadas.´

23 - Os edifícios foram destruídos pelo Exército quando a posição foi abandonada em 29 de Julho de 1968.

24 - Indicativo pessoal do Comandante do Grupo Operacional 1201 que na altura era o TCor PilAV Francisco Dias da Costa Gomes.

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A decisão

Assim que foi informado do que se passava, o Tenente-Coronel Costa Gomes pôs o Comandante da Zona Aérea, Coronel PilAv Diogo Neto, ao corrente da situação. Minutos depois este entrava no gabinete do Comandante do Grupo já com a caldeira a toda a pressão o que nele se percebia facilmente pela veia que no pescoço inchava notoriamente quando a tensão arterial subia. A primeira ideia que lhes ocorreu foi lançar uma operação helitransportada mas rapidamente perceberam que não só era demasiado arriscado como ia demorar muito tempo. De facto, com o número de helicópteros prontos não seria possível transportar mais que trinta paraquedistas o que era muito pouco. Não haveria surpresa e, além disso, não havia uma zona de aterragem reconhecida nem havia ideia do perímetro defensivo do PAIGC à volta de Sangonhá. A aterragem dos helicópteros teria de ser feita numa clareira ad hoc e relativamente longe do alvo não só porque não se sabia por onde andavam os guerrilheiros mas também por causa da ZPU-4. Acresce que se esta não fosse eliminada pelos G-91, o que não podia ser garantido, o apoio de fogo aos paraquedistas não seria exequível. Era também preciso reunir e preparar os homens o que iria demorar pelo menos uns 45 minutos. Finalmente, a velocidade do AL III também não ajudava. Tudo somado, mas em especial o risco de lançar trinta homens num local pejado de guerrilheiros, sem informações adequadas, fê-los desistir imediatamente da ideia.

As hipóteses de acção ficaram assim reduzidas aos G-91 e a quatro pilotos. Os dois da parelha de alerta que estava a aterrar, o Comandante da Zona Aérea e o Comandante do Grupo Operacional. Os restantes pilotos de G-91 estavam empenhados noutras missões e não estavam disponíveis. Também não havia tempo para montar a carga máxima nos aviões porque era preciso retirar os tanques de combustível e as calhas dos foguetes dos aviões que tinham ido a Gadamael e montar os suportes que permitiam levar duas bombas de 50kg em cada asa, em quatro aviões. Tudo no mínimo tempo possível. Assim, em vez de um total de 8 bombas de 200kg mais 16 bombas de 50kg foi dada ordem ao pessoal de armamento para montar apenas 8 bombas de 200kg mais 8 bombas de 50kg.

Entretanto, o Comandante-Chefe já tinha sido informado do que se estava a passar e quis falar com o Coronel Diogo Neto. Este meteu-se na viatura e lá foi ao Forte da Amura explicar o que lhe parecia mais razoável e eficaz. Como era de esperar a preferência do Brigadeiro Spínola ia para o emprego dos paraquedistas mas depois de ouvir as explicações do coronel concordou e deu o seu aval ao “plano de acção”.

Na BA12 os mecânicos e o pessoal de armamento, cientes da urgência da missão, esforçavam-se para aprontar os aviões o mais rapidamente possível. Não conseguiram porém evitar que o Coronel e os outros três pilotos que entretanto tinham chegado à linha da frente, completassem as inspecções e ficassem à espera, já sentados no cockpit, que o processo de configurar os aviões com as bombas de “fins gerais” terminasse. Mal as pontas dos arames de armar as espoletas foram cortadas e o sinal de tudo pronto foi passado aos pilotos, começaram a ouvir-se, numa sequência um pouco desencontrada, os silvos dos cartuchos de arranque à medida que iam sendo disparados seguidos do ronco surdo das turbinas em aceleração.


Canhão Zis-2 AC 57 mm pronto para ser atrelado a uma viatura de reboque. Imagem provavelmente relacionada com o ataque a Ganturé cedida pela Fundação Mario Soares.



Situação geral no terreno na manhã de 6 de Janeiro de 1969

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Era impossível falhar um alvo daquele tamanho

Os quatro aviões conseguiram descolar por volta das 11H00, três horas depois do início do ataque a Ganturé e hora e meia depois do regresso da parelha de alerta. A esperança de encontrar a guerrilha ainda em Sangonhá era já muito ténue e todos tinham consciência disso. À frente, no G-91 5408, o Coronel Diogo Neto subiu logo para os 8000 pés que era a altitude standard para iniciar o bombardeamento a picar (BOP) e acelerou para 400 KIAS apontado a Cacine. Os outros três seguiam-no numa formação de marcha bastante aberta.

A rota iria permitir que os aviões passassem Cacine já escalonados para o ataque e com Sangonhá a ficar na raiz da asa esquerda de modo a garantir uma picada com o sol mais ou menos “nas costas”. Sempre que tínhamos de enfrentar fogo anti-aéreo utilizávamos este procedimento para dificultar a pontaria aos apontadores e, neste caso, também a direcção do ataque ficava próxima do eixo maior do alvo.

Como seria de esperar os quatro pilotos estavam apreensivos e como acontecia sempre em acções mais complicadas o silêncio rádio foi completo. A única comunicação que o ex-Tenente Balacó Moreira, que voava a número dois no G-91 5412, se recorda foi a ordem para armar as bombas e passar a escalão pela direita quando passaram sobre o rio junto à povoação de Cacine. Logo a seguir cada um começou a tentar vislumbrar o alvo mas só no momento em que manobravam o respectivo avião para conseguir um “poleiro” que desse um bom angulo de picada é que foi possível perceber alguma coisa do que se passava “lá em baixo”. Balacó Moreira recorda-se que a quantidade de pessoas que avistou na zona do antigo aquartelamento era muito menor do que da primeira vez e que havia viaturas em movimento.
- Estão a retirar – pensou para consigo próprio.

A seguir viu o número um “pranchar” e voltar apertado pela esquerda subindo inicialmente acima da altitude inicial e depois, continuando a aumentar o pranchamento, mergulhar desaparecendo do seu lado esquerdo. Baixou a asa desse lado para tentar seguir a trajectória mas rapidamente o avião começou a ficar cada vez mais pequenino à medida que acelerava e se afastava em direcção ao solo. Naqueles escassos segundos não viu chamas à boca dos canos da ZPU-4. Quando o Coronel Diogo Neto avisou pelo rádio que tinha acabado de largar as bombas e estava em afastamento procurou efectuar uma última correcção à posição do seu avião. Naquele momento se a ZPU-4 disparava ou não já não lhe interessava para nada. A interpretação dos instrumentos de voo e o controlo da trajectória para posicionar o avião num ”poleiro” favorável não deixavam margem para se preocupar com o inimigo. Entrou então numa picada que lhe pareceu boa e depois foi corrigindo os desvios de modo a fazer o rectículo do visor caminhar progressivamente para um ponto atrás do rebentamento das bombas do avião da frente. O carrocel de ataque estava em marcha e com reacção ou sem reacção anti-aérea tinha era que acertar com as bombas no alvo, o maior de todos os alvos que atacou durante toda a comissão. Não falhou como não falharam os outros e ninguém foi atingido.

No final, os quatro aviões reencontraram-se à vertical do objectivo, circulando pela esquerda à altitude de ataque. Lá em baixo, Sangonhá ficara obscurecida pelo fumo e pelos detritos projectados pelas explosões dando a impressão que tudo tinha sido arrasado. Imagem bem enganadora que conheciam muito bem dos ataques aos “clusters” de armas AA que o PAIGC durante o ano de 1968 tinha tentado instalar em diversos pontos do Quitafine. Desfeita a poeirada constatava-se muitas vezes que as armas AA continuavam a disparar embora relativamente perto se avistassem as enormes crateras abertas pelas bombas. O que acontecia era que a combinação bomba/espoleta que utilizávamos penetrava demasiado no solo arenoso provocando crateras enormes que deflectiam os estilhaços para o ar sem causar danos significativos no plano horizontal.

Desta vez, o solo era certamente mais consistente porque as crateras pareciam pouco profundas, com uma assinalável concentração na zona onde estava o armamento pesado. Os quatro aviões ficaram ainda alguns minutos a circular observando a metralhadora AA que era a grande preocupação mas que parecia inactiva desde o início. Lá do alto constataram que nada parecia mexer. Nenhum dos aviões tinha sobreposto o tiro ao dos outros e as dezasseis bombas tinham produzido uma cobertura relativamente densa. Só não era possível era determinar se o ataque tinha sido eficaz em termos de baixas no inimigo.

Depois, sem armamento, nada mais havia a fazer e o comandante da formação deu ordem para abandonar a área e regressar à BA12.

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O reconhecimento a Sangonhá

Três dias depois, a 9 de Janeiro de 1969, a Cart 2410 executou um reconhecimento a Sangonhá com cerca de 100 homens - militares, milícias e caçadores nativos (Gadamael e Ganturé ficaram reduzidos ao mínimo de pessoal para a sua defesa)25. A força foi comandada pelo ex-Alferes Miliciano Albino Rodrigues, que era o comandante do 1.º Grupo de Combate, ficando o Comandante da Companhia em Gadamael.

Saíram de Gadamael por volta das 6 horas da manhã, sem qualquer apoio de viaturas, normais ou blindadas. Às 08:30 descolou de Bissalanca o DO-27 3347, pilotado pelo Tenente Balacó Moreira, com a missão de apoiar a progressão no terreno e em particular coordenar o apoio de fogo se fosse necessário.

Em todo o percurso até Sangonhá não foram detectados trilhos novos, nem foram encontrados os habituais invólucros de granadas de morteiro ou de canhão S/R que os guerrilheiros normalmente deixavam espalhados no terreno após as flagelações.26

Após a passagem a vau do rio QUERUANE/AXE, e uns 200 ou 300 metros à frente, numa pequena elevação do terreno, foram encontrados os restos de uma fogueira (a noite de 5 para 6 tinha sido fria) junto a uma árvore alta com vestígios de ter sido utilizada como posto de observação, quer pelo aspecto do tronco, quer por alguns ramos partidos. Logo 3 ou 4 metros depois encontraram fio telefónico que foi seguido até ao respectivo carretel vazio. Concluíram por isso que naquela árvore teria estado um observador avançado munido de linha telefónica para orientar o tiro dos canhões A/C estacionados em Sangonhá.

Desde este local e numa extensão de cerca de 3 quilómetros, havia abrigos individuais de um lado e outro da estrada, e também resíduos de fogueiras. Logicamente, a defesa avançada do dispositivo instalado em Sangonhá estendera-se ao longo da estrada para Gadamael Porto.

Com a força já a meio caminho descolaram então de Bissalanca 2 T-6G armados com foguetes SNEB de 37mm e metralhadoras 7,7mm27. A missão era permanecer em espera um pouco a Norte de Sangonhá e actuar à ordem do PCV (DO-27) caso fosse necessário dar apoio de fogo. Depois, às 11:30, quando a força estava próximo de Sangonhá descolaram de Bissalanca dois G-91 armados com foguetes de 2,75 polegadas e quatro metralhadoras 12,7mm. Os dois T-6 foram nessa altura reabastecer tendo voltado a descolar novamente para acompanhar o resto da operação.

A primeira indicação de que estavam próximos do objectivo foi dada pela grande quantidade de abutres (os feiosos jagudis) pousados nas árvores ou voando em círculos. Ao mesmo tempo, o pessoal começou a sentir o cheiro nauseabundo de corpos em decomposição.

A força distribui-se então de modo a formar uma longa linha perpendicular à estrada e foi nessa formação que avançaram cautelosamente. O que descobriram a seguir ultrapassou todas as marcas e foi tão chocante que o pessoal descurou momentaneamente as regras de segurança que vinha a manter.

 O ex-Alferes Miliciano José Barros Rocha, comandante do 2.º grupo de combate, recorda desta maneira o que viu e sentiu:

“…na antiga pista [de Sangonhá], armas destruídas e pedaços de corpos de negros e brancos e 13 sepulturas. Uns dias depois tivemos a informação de 36 mortos confirmados e muitos feridos.
" O aspecto do local era medonho! A terra, cuja cor natural é avermelhada, tinha a cor cinza! O intenso cheiro a putrefacção! Os abutres (jagudis) às dezenas! As árvores queimadas! Enfim..." (...).
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“…recolhemos 3 carretéis carregados de fio telefónico e um vazio, uma mina A/P, uma ferramenta para aperto de rodas, invólucros de granada do canhão A/C 57mm, meia pistola, munições intactas da A/A de calibre 14,5mm, bonés, chapéus tipo colonial, uma bandeira, uma caixa de ferramenta, e mais algumas bugigangas..”.

A força permaneceu em Sangonhá cerca de duas horas tendo regressado a Gadamael entre as duas e as três da tarde. Quando já estavam perto do quartel o Tenente Balacó Moreira aterrou o DO-27 em Gadamael e ficou a aguardar a chegada da força. Foi ele que levou para a BA12, em primeira mão, os resultados provisórios do bombardeamento no qual tinha participado. Levou também a óptica do aparelho de pontaria da ZPU-4 que lhe foi oferecida pelo comandante do 2.º grupo de combate e que ele entregou depois ao Tenente Coronel Costa Gomes.

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Notas:

25 - Testemunho do ex Alferes Miliciano José Barros Rocha da Cart 2410. [In blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné > 23 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2574: Estórias de Guileje (9): O massacre de Sangonhá, pela Força Aérea, em 6 de Janeiro de 1969 (José Rocha) b]

26 - Indicação muito forte de que a flagelação do dia 6 teria sido efectuada apenas com os canhões AC estacionados em Sangonhá.

27 - Esta configuração era muito eficaz para o apoio de fogo à forças terrestres. Cada avião estava municiado com 72 foguetes SNEB de 37mm e podia também utilizar as quatro metralhadoras 7,7mm.

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A razão para o suicídio do PAIGC em Sangonhá

Depois do reconhecimento a Sangonhá ficou por decifrar o que teria levado o PAIGC a efectuar aquela acção suicida. A prática normal da guerrilha não se ajustava, de modo nenhum, ao que acontecera no dia 6 de Janeiro de 1969. Não tinha sido apenas a hora a que foi desencadeada a flagelação, de manhã em plena luz do dia, mas também o facto do armamento e o pessoal estarem em campo aberto e serem facilmente detectáveis pelos aviões. Era ainda o recurso às peças anticarro na flagelação como se fossem obuses ou morteiros28.

Havia certamente uma justificação para este comportamento anómalo mas nenhum de nós imaginava qual poderia ser.

No dia 19 de Janeiro de 1969 coube-me efectuar no DO-27 3341 ”o sector de Buba” o que me deu a oportunidade de falar com os oficiais da CArt 2410. Foi nessa ocasião, pelo testemunho dos que tinham, de facto, posto os pés no que fora o “nosso alvo”, que me apercebi pela primeira vez da dimensão do desastre que o PAIGC tinha sofrido. Foi também nessa ocasião que o Alferes Barros Rocha teve a gentileza de me oferecer quatro munições da ZPU-4 que estivera instalada em Sangonhá e que tinha feito fogo contra os dois primeiros (pelo menos) G-91 que descolaram para tentar suster a flagelação a Ganturé. Destas quatro munições, como referi no início, ainda guardo uma comigo e, por arrastamento, a memória deste episódio.

Por acaso tudo se aclarou alguns dias mais tarde ao ler um relatório da DGS que chegou ao gabinete do Comandante do Grupo Operacional 1201. Para mim foi uma espécie de relâmpago que tudo iluminou e desvendou, num instante, a lógica daquele comportamento estranho do PAIGC. Não consegui agora encontrar nenhum registo desse documento mas o facto é que me marcou tanto que nunca mais esqueci o essencial do que li. Resumidamente, a DGS dava conta de que o ataque se tinha enquadrado numa acção de propaganda promovida pela Suécia. Na minha opinião, muito provavelmente a pedido do próprio Amílcar Cabral, resolveram aproveitar o abandono de Sangonhá para simular a tomada do aquartelamento pela guerrilha. O cenário não podia ser mais perfeito. Antes de abandonar a posição, as instalações do aquartelamento tinham sido destruídas pelo Exército e essa imagem podia ser facilmente mostrada em fotografia e filme como sendo consequência dos ataques do PAIGC. Depois, a posição “acabada de conquistar” podia ser utilizada para mostrar o poder de fogo do PAIGC contra as posições que se preparavam para conquistar a seguir: Ganturé e Gadamael. Uma equipa de repórteres, incluindo fotógrafos e cineastas deslocou-se para esse efeito à Guiné-Conacri onde se juntou aos guerrilheiros. Um total de 400 pessoas terão estado envolvidas em toda a operação segundo as informações do régulo Abibo de Ganturé.

Ficou assim explicado porque razão o PAIGC se tinha exposto em pleno dia a levar com as bombas da aviação. É que não era possível fotografar nem filmar sem luz. Também não fazia sentido estarem escondidos quando tinham acabado de derrotar e afugentar o inimigo. Tinham, é claro, a noção de que iam correr um grande risco e por isso o terem levado a ZPU-4 para se defenderem. Mas cometeram um segundo erro, este gravíssimo. Foram detectados e em vez de embalarem a trouxa e rumarem novamente à Guiné-Conacri deixaram-se ficar. Pessoalmente penso que, como os dois primeiros aviões não abriram fogo, assumiram que, ou os tinham atingido, ou os tinham dissuadido e resolveram continuar a fazer a “fita”.

Faltava explicar a utilização das peças anti-carro porque, como já foi dito, não eram, nem armas de guerrilha, nem adequadas às flagelações aos aquartelamentos. Não há mesmo conhecimento de terem sido utilizadas em qualquer outra ocasião.

Uma explicação muito credível ocorreu-me quando descobri algumas fotos dessas armas no arquivo Amílcar Cabral da Fundação Mário Soares. Fiquei até convencido que respeitam à acção do dia 6 de Janeiro de 1969. Passo a explicar.

O objectivo da operação era produzir propaganda, como referiu a DGS no seu relatório. Havia, por isso, necessidade de mostrar grande capacidade militar e poder de fogo, factores esses que estariam a determinar avanços do PAIGC no terreno nomeadamente a conquista de posições ocupadas pelos portugueses. Acontecia que aquelas peças anti-carro tinham um reparo longo, tinham rodas e um cano comprido. As eventuais audiências alvo da propaganda ficariam certamente muito mais impressionadas se o ataque fosse feito com estas peças de artilharia em vez dos tradicionais morteiros ou dos canhões sem recuo que eram armas relativamente pequenas. Só uma razão desta natureza os poderá ter levado a não utilizar o armamento tradicional nesta flagelação a Ganturé: nenhuma granada rebentou no perímetro do destacamento.

A título de curiosidade não devo terminar sem mencionar o único documento conhecido do PAIGC referente a este ataque. Trata-se de um bilhete enviado em 6 de Janeiro de 1969 por um dos mais celebrados comandantes do PAIGC, Pansau na Isna29, e dirigido a Aristides Pereira que estava na base mais próxima, Boké, na Guiné-Conacri. Na missiva para além de empolar a prestação da guerrilha, aparentemente para agradar ao chefe, solicita o envio de mais trezentas granadas para os canhões A/C e mais gasolina para continuar a atacar Ganturé “no duro”, o que não chegou a acontecer. Alguma coisa lhe terá quebrado o ânimo…

Bilhete enviado por Pansau na Isna a Aristides Pereira enquanto decorria o ataque a Ganturé. Documento cedido pela Fundação Mario Soares.

Concluindo, ironicamente pelo menos desta vez, a bondosa ajuda humanitária sueca cujo objectivo foi soprar “os ventos da história” contribuindo para a derrota militar dos portugueses não conseguiu infligir baixas às nossas forças. Ao invés, provocou um número substancial de mortos, feridos e incapacitados entre os guerrilheiros e, muito provavelmente, também entre os apoiantes cubanos, repórteres, fotógrafos e cineastas suecos. Que foram encontrados diversos despojos de pele branca é um facto mas nunca se conseguiu saber a quem teriam pertencido. O PAIGC e o governo sueco, em escrupulosa obediência às regras da propaganda nunca revelaram, nem durante a guerra, nem depois, este desastroso embate…
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Notas:

28 - As peças anticarro Zis-2, de 57mm, tinham sido projectadas para destruir os blindados alemães durante a II GG em tiro directo e mostraram-se tão desadequadas neste caso que nenhuma das dezenas de granadas disparadas caiu dentro do perímetro de Ganturé.

29 - Pansau na Isna não morreu em Sangonhá mas acabou por ser morto, no final do ano seguinte, pelos fuzileiros, a Norte de Bissau.

FIM
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Nota do editor

Vd. poste anterior de 24 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15035: FAP (82): Pedaços das Nossas Vidas: VI - Um ataque com "olhos azuis" - I Parte: "O ideal missionário do povo sueco" e "A escapatória ética da ajuda humanitária sueca" (José Nico, Gen PilAv)