domingo, 29 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P2996: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (18): Cacine, a voz dos abandonados (II)


Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Sector de Cacine > Cacine, na margem esquerda do Rio Cacine > 2 de Março de 2008 > Simpósio Internacional de Guileje (1-7 de Março de 2008) > Visita dos participantes ao sul > Depoimento de Armando Abasse Camará, um antigo militar das NT (1966/74), natural de (e residente em) Cacine.

Com uma comissão em Angola em 1972, voltou para Cacine onde foi escolhido como elemento de contacto das NT com o PAIGC em 25 de Abril de 1974. Como muitos outros guineenses, depois de servir Portugal e os portugueses, foi abandonado por nós. Uma história que ainda hoje nos envergonha... Poderias ter escrito a história de outra maneira ? Poderíamos, ao menos, ter feito alguma justiça a estes e outros combatentes ?

Hoje estes antigos combatentes guineenses, que serviram Portugal, nem uma mísera pensão de vinte e poucos euros recebecem, o equivalente ao salário mínimo do país (!), o suficiente até há pouco tempo para se comprar um saco de arroz de 50 quilos e alimentar (mal) a família.
O saco estava até há pouco a 12500 francos CFA (cerca de 19 euros). Devido è escassez no mercado local do alimento base, que é o arroz, resultante da conjugação de múltiplos factores (subida exponencial do preço do petróleo, escassez de combustíveis, crise cerealífera local, regional e mundial, especulação, açambarcamento, corrupção, desastre da política agrícola do FMI que impõe a ditadura do cajú aos guineenses, abandono das bolanhas, etc.), o preço do arroz não pára de aumentar... No princípio de Junho, o arroz já estava a 15 mil francos CFA o saco de 50 quilos, até desaparecer do mercado e obrigar o Goberno a intervir no mercado.

Cito o portal Notícias Lusófonas, com notícias de 24 de Junho do corrente, sobre o recente aumento de preços na Guiné-Bissau:

"O peixe e o arroz foram os principais produtos alimentares que registaram aumentos na Guiné-Bissau após a revisão dos preços dos combustíveis anunciada sábado pelo governo, mas os transportes públicos devem subir as tarifas ainda esta semana.

"Os pescadores aumentaram e nós tivemos de aumentar também, afirmou hoje à Agência Lusa o peixeiro Issiaca Nanqui, com banca no mercado central de Bissau. Segundo Issiaca Nanqui, os aumentos do preço do quilograma de peixe variam entre 250 francos cfa (0,38 euros) e 500 francos cfa (0,76 euros), dependendo do peixe. Já no mercado do Bandim, o preço do saco de 50 quilogramas de arroz varia entre os 17.500 francos cfa (26,71 euros), fixado pelo governo sábado juntamente com o preço dos combustíveis, e os 21.000 francos cfa (32 euros).

"Questionada pela agência Lusa sobre as razões para a variação do preço do arroz, uma comerciante explicou que o saco de 17.500 francos cfa é de segunda qualidade e o mais caro de primeira qualidade. Sobre as reclamações dos consumidores, Márcio Santos Cá, um outro comerciante de arroz, afirmou que 'as pessoas queixam-se do preço, mas compram'...'Os que têm dinheiro compram e os que não têm compram de segunda qualidade', disse, sublinhando que as vendas não diminuíram. Os legumes, a fruta e o óleo, muito consumido pelos guineenses, não registaram aumentos, ao contrário da carne, que aumentou nas últimas duas semanas.

" 'A carne aumentou porque neste momento as vacas são difíceis (escassas) e o preço subiu, afirmou Roberto Mendes, vendedor de carne de vaca no mercado do Bandim. Enquanto os produtos base da alimentação dos guineenses, peixe e arroz, aumentaram imediatamente, os transportes públicos aguardam as directivas do governo para procederam à regularização das tabelas. 'Os aumentos devem ser esta semana, estamos à espera que o governo decida', afirmou Miguel Binhancarem, condutor de um toca-toca (transporte público). Para já, o preço de um bilhete custa 150 francos cfa (0,22 euros). Nos táxis, a corrida varia entre 250 francos cfa (0,38 euros) e 350 francos cfa (0,53 euros) e os aumentos são esperados ainda semana.
" 'Vamos aumentar porque a situação está difícil com a subida do preço do gasóleo', afirmou o taxista Bubacar Baldé. O executivo guineense decidiu sábado aumentar o litro do gasóleo para 729 francos cfa (1,11 euros), mais 25 cêntimos, enquanto a gasolina subiu para 801 francos cfa (1,22 euros), contra os 1,02 cobrados a semana passada.

"O aumento dos combustíveis ocorreu depois de duas semanas de um braço-de-ferro entre o governo e as distribuidoras do país, que deixaram de importar combustível por estarem a perder dinheiro já que o preço dos carburantes não acompanhava o estabelecido no mercado internacional. O aumento do preço do gasóleo tem consequências directas nas condições de vida dos guineenses, porque apesar de este combustível não ser utilizado pela maior parte da população, é garante do funcionamento do país. Um guineense ganha em média o equivalente a 45,80 euros por mês. O ordenado mínimo ronda os 22,90 euros mensais. Actualmente, um guineense que ganhe um ordenado mínimo não consegue comprar um saco de 50 quilogramas de arroz, base da sua alimentação" .

Vídeo (5' 26''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojado em: You Tube >Nhabijoes
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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 29 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2994: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (17): Cacine, a voz dos abandonados (I)

1 comentário:

Rui Moio disse...

Ainda bem que ouvi e vi isto.
Vieram as lágrimas aos olhos deste combatente, olhos vermelhos, pela mágoa de uma vida desprotegida e de sofrimento devido ao abandono da Pátria. Um ex-combatente que não manifesta ódio e desprezo pelos responsáveis da derrota da Pátria-mãe de todos nós.
A nossa Pátria era feita de muitas Pátrias. Em 1974 continuou a viver na sua e nossa Guiné, governada agora pelos recém-inimigos da sua e nossa Pátria; e a Pátria-mãe abandonou-o à sua sorte.

Aconteceu isto a milhares de compatriotas e por causa da "imperiosa descolonização" morreram milhões de compatriotas devido a vinganças e guerras civis que eclodiram a seguir nas nossas terras do ultramar.

É necessário que todos os portugueses e os actuais cidadãos dos novos países irmãos africanos de expressão portuguesa saibam o que aconteceu e que poderia ter sido evitado.
Houve um holocausto e um genocídio! Não queiram continuar a branquear isto. É necessário que a verdade venha ao de cima para que, ao menos, a História se escreva com letras de verdade!
Rui Moio