sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3778: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (17): O cerco que nunca existiu (António Martins de Matos)

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guileje (1 a 7 de Março de 2008) > O Cor Art Ref Nuno Rubim, entre o Cor Cav Ref Carlos Matos Gomes e o Gringo de Guileje, o ex-Fur Mil Zé Carioca, da CCAÇ 3477 (Guileje, Nov 1971/Dez 1972), explicando pormenores da sua obra-prima que foi o diorama de Guileje...

O Nuno Rubim é um profundo conhecedor de Guileje. Recorde-se que ele comandou duas das unidades que passaram por Guileje: a CCAÇ 726 (Out 1964/Jul 1966) e a CCAÇ 1424 (Jan 1966/Dez 1966). É conhecido e acarinhada ainda hoje como o Capitão Fula.

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados


1. Por sugestão minha, e na sequência da sua intervenção anterior (*), o António Martins de Matos, antigo Tenente Pil Av de Fiat G-91, na Guiné, no período de 1972/74 (e hoje Ten Gen da FAP na reserva), leu a comunicação do Nuno Rubim, Cor Art Ref, ao Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1-7 de Março de 2008), "A batalha de Guiledje: uma tentativa de reconstituição histórica em dioramas", que publicámos no nosso blogue, em quatro partes, no dia 13 de Julho de 2008 (**).

Adicionalmente, transmiti ao António Martins de Matos as seguintes informações que me foram dadas pelo Nuno Rubim, que é membro da nossa tertúlia, e que eu considero o maior conhecedor de Guileje:

(i) O Cor Art Ref Nuno Rubim é um reputado especialista em história da artilharia portuguesa, tem um currículo invejável, tem uma boa formação académica na área de história e possui, além disso, um vastíssimo conhecimento do antigo TO da Guiné e da actual Guiné-Bissau: esteve lá em duas comissões, é casado com uma guineense, passou por Guileje (duas companhias), pelos comandos, em 1964/66 e depois pelo QG, no tempo do Spínola, nos serviços de informação;

(ii) O Nuno Rubim tem acesso privilegiado a fontes de informação de arquivo e fontes pessoais (incluindo antigos dirigentes e combatentes do PAIGC). É, neste momento, o maior estudioso da guerra da Guiné: vai abrir, dentro em breve, um sítio na Net para divulgar as dezenas de Gigabites de informação sobre a guerra da Guiné (centenas de fotografias e documentos);

(iii) Em conversas com ele (funciona informalmente como nosso assessor militar em diversas matérias de que é especialista), garantiu-me que toda a artilharia do PAIGC (excepto as peças 130) estava dentro do nosso antigo território. Por outro lado, deu-me a informação de que até 1972 os Strellas já tinham abatido 52 aeronaves norte-americanas na guerra do Vietname, pelo que o Strella não era uma arma absolutamente nova quando apareceu na Guiné em Abril de 1973;

(iv) O então major de artilharia estava nessa altura a cumprir a sua segunda comissão na Guiné, colocado em Bissau, no QG, a executar uma missão ultra-secreta, e recorda-se bem dos contactos de emergência que foram feitos pela FAP com os nossos amigos americanos e aliados da NATO;

(v) Foi depois daí que a FAP passou a voar, com outro modus operandi, com as máquinas pintadas de verde azeitona (camuflagem), etc.;

(vi) Quanto aos bombardeamentos, antigos guerrilheiros do PAIGC que estiveram em Guileje, na sequência da Op Amílcar Cabral, disseram-lhe em Bissau (na altura do Simpósio Internacional de Guileje, 1-7 de Março de 2008) que as bombas, largadas pela FAP, cairam longe do alvo e e sem efeitos de maior...

(vii) Recordo-me ainda do Nuno Rubim ter escrito (e falado) a chamar a atenção para o facto de só um obus 14 estar operacional, em Guileje, e o que tiro estava regulado para a peça 11,4 - o que não é mesma coisa...

Pedi ao António Martins de Matos (que viu a guerra de Guileje, "de cima", como ele fez questão de sublinhar, na qualidade de Ten Pilav, e que veio aqui contestara ideia de "cerco do PAIGC" a Guileje) para comentar também alguns desses pontos, com o duplo objectivo de: (a) contribuir para um melhor conhecimento dos acontecimentos relacionados com a retirada de Guileje; e (b) ajudar os nossos leitores a organizar a sua informação (leitores, como eu, que, na generalidade, são leigos em muitas destas matérias, desde a artilharia à aviação).

Dei depois conhecimento prévio ao Nuno da resposta do António. O Nuno acedeu, a título excepcional, responder no blogue, em público, aos comentários do António. Resposta essa que publicaremos numa próxima oportunidade. (LG)

2. Ainda Guileje e as missões (***)
por António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, Bissalanca, 1972/74)

[Revisão e fixação de texto: L.G.]


Caro amigo

Li a comunicação do Nuno Rubim (**) e não concordo com as suas (dele) conclusões.

Apenas alguns pontos:

(i) Os alcances das armas do PAIGC não estão correctos, podendo ser bastante superiores ao indicado;

(ii) Não se percebe se a Ordem de Operações que está na sua apresentação, foi ou não a indicada para o ataque ao Guilege em Maio73; a ser, está escrito “reconhecer a melhor posição junto à fronteira para colocar os morteiros de 120”;

(iii) A ordem de operações do PAIGC indica 3 pelotões de artilharia, a 3 canhões cada e 30 granadas, o que dá no total 270 granadas, 1000 kilos a serem transportados por 20 carregadores, o que estará correcto, partindo do princípio que estes são do tipo “forte e bem constituído”;

(iv) Conforme o plano, o dispositivo era 1 pelotão para Guileje, outro para Ganturé e outro para Gadamael. Ora, com estas contas, o Guileje tinha que se “haver” com 90 granadas. No entanto, é referido noutros documentos que o Guileje foi bombardeado com cerca de 1000 granadas;

(v) Poder-se-á especular que as restantes 900 munições seriam de morteiro, só que essa granadas pesariam qualquer coisa como 13 toneladas (já seriam precisos 260 carregadores dos tais fortes e bem constituídos).

(vi Das duas três, ou os ataques foram do “estrangeiro” [Guiné-Conacri], onde o PAIGC teve tempo suficiente para ir armazenando as suas munições, ou os bombardeamentos foram significativamente mais pequenos.

A meu ver, estes tópicos fazem com que a teoria do Nuno Rubim caia por terra;

O facto do militar guineense ter dito “que foi mesmo mesmo assim” só vem reforçar a minha teoria de que o cerco do Guileje não existiu e tudo foi composto à posteriori.

Atrevo-me até a especular que, se o Guileje estivesse cercado nunca teria sido abandonado, pois teria havido contacto com a nossa tropa e o pessoal teria regressado ao quartel “em passo de corrida”.

No que refere à pintura dos aviões, de referir que entre 1972 e 1974 os FIAT G-91 não tinham camuflagem, eram cinzentos, e os DO-27 eram, imagine-se, cinzento prateado com pontas vermelhas, as cores com que se pintavam os aviões de instrução.

Foi só em Março de 1974 que apareceu o primeiro (e único) FIAT G-91 pintado de verde azeitona.

Em relação ao Strella a ao apoio dado pelos americanos, ele resumiu-se única e exclusivamente na entrega de documentação com as suas características.

Com base nesse documento e após o estudo do mesmo (durante um dia não houve actividade aérea), foi a FAP que definiu e pôs em prática o seu novo modus operandi.

De referir que o Strella apenas teve êxito enquanto foi considerado uma arma desconhecida. Após o conhecimento das suas características e ao contrário do que muitos pensam, continuaram a ser as anti-aéreas as armas que mais incomodavam os aviadores.

Por fim e em relação ao Vietnam, o Strella apareceu em 1972, e, no documento que te envio [ficheiro em formato.pdf], poderás verificar as baixas americanas ao longo dos anos e por tipo.

Um abraço
António Martins Matos

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

14 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3737: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (11): Um erro de 'casting', o comandante do COP 5 (António Martins de Matos)

17 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3752: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (13): A missão de apoio aéreo de 21 de Maio de 1973 (António Martins Matos)

(**) Vd. postes de:

13 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3054: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Nuno Rubim (1): Como dar a volta aos Strella ?

13 de Julho de 2008 >Guiné 63/74 - P3055: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Nuno Rubim (2): Slides (1 a 4): O sector sul

13 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3056: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Nuno Rubim (3): Slides (de 5 a 9): Comparando os armamentos

13 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3058: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Nuno Rubim (4): Slides (de 10 a 18): Dos Strellas à Op Amílcar Cabral


(***) Vd. os três últimos (mais recentes) postes da série A retirada de Guileje...

20 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3764: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (16): As CCAV 8350 e 8351: Tão perto e tão longe (Vasco da Gama)

19 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3760: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (15): A minha homenagem aos que viveram a Guerra da Guiné. (J. Mexia Alves)

17 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3754: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (14): Pode não ser-se herói e dar provas de coragem (José Manuel Dinis)

3 comentários:

Anónimo disse...

Boa noite Amigos,serà Que as explicaçoes dadas pelo Sr Antpnio Martins Matos nao serao as Mais corretas ? sobre Guilege.Concerteza que o SR; Nuno Robim devia conhecer muito a Guiné da secretaria em Bissau. josé Piche Bart 2857 68/70

Luís Graça disse...

José (que diz ser ter estado em Piche, no BART 2857, 68/70):

Tu, não sei quem és: nunca se apresentaste (nem mostraste interesse em fazê-lo) aos camaradas que fazem parte deste blogue.

O Nuno Rubim é "só" um dos militares mais condecorados, dos que passaram pela Guiné, tendo comandado duas companhia em Guileje, a as CCaç 726 e a 1424, além da primeira companhia de comandos que surgiu na Guiné, na sua comissão de 1964/66...

Ainda hoje é conhecido (e amado, como eu testemunhei) como o "Capitão Fula", pelas gentes de Guileje (que hoje vivem em Mejo)

O respeito uns pelos outros e o respeito pela verdade são duas regras fundamentais no nosso blogue... Como editor, tenho que zelar por elas... Dou-te, por esta vez, o devido desconto. É uma frase gratuita, leviana, insultuosa, o teu comentário: "Concerteza que o Sr Nuno Robim [sic] devia conhecer muito a Guiné da secretaria em Bissau"...

Só posso deduzir que não lês o nosso blogue nem sabes quem é o Nuno Rubim, que de facto é um senhor, além de um grande (e sempre discreto) camarada que honra o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (de resto como todos os outros que fazem parte da Tabanca Grande).

Quero também com isto dizer que tens uma porta aberta (ou entreaberta): nós não somos de ressentimentos mas somos filhos de boa gente... Aparece, camarada, dá a cara, junta-te a nós, conta as tuas histórias... Quando conheceres então o Nuno Rubim, não vais concerteza ter a lata de lhe dizer na cara que ele só conhece a Guiné de secretaria...

Vd. poste de

26 de Março de 2008
Guiné 63/74 - P2687: Cemitério militar de Bissau: homenageando os nossos 350 soldados, uma parte dos quais desconhecidos (Nuno Rubim)

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2008/03/guin-6374-p2686-cemitrio-militar-de.html

Anónimo disse...

Com o devido respeito pelo Sr Nuno Rubim e por todos deste blog.
O que tenho a dizer é que eu estava em Gadamael quando tudo aconteceu eu era cond auto da ccaç4743 conheço muito bem a picada Gadamael Guilege
Meus amigos, todos esses estudiosos podem ter estado em Guilege centenas de vezes mas se estivessem na semana antes da 8350sair de Guilege, Ai piavam doutra maneira.
aquele material de guerra não foi transportado as costas de ninguem.
durante a noite quando tudo estava no silencio, ouviamos viaturas como que atoladas na lama mal imaginavamos o que andavam a preparar.
Esses senhores os tais de secretaria sabiam que aquela porcaria se ia dar, duas ou tres semanas antes fomos digo fomos porque eu tambem fui a Bissau e trouxemos ou foi 6 berliets e 4 obuses 14 ou então 6 obuses e 4 berliets, não estou certo, sei que foi parte para Guilege, uma coluna enorme tudo novo em folha.
e ninguem sabia de nada?
Bull Sheat! havia na Guine muitos oficiais corruptos, toda a gente sabe.
Éra como é houje com estes politicos cada qual enrriquece como pode.
Que me perdoem os que não estão de acordo comigo, mas Deus de muitos anos de vida ao senhor que ordenou a saída de Guilege, esse sim sabia o que estava a fazer.
o resto são os caga sentenças. não sabem a realidade mas falam e sabem de tudo.
Ficamos por aqui.


Jose Sales

ex Cond. Auto CCAÇ 4743