Raul Albino, ex-Alf Mil, CCAÇ 2402/BCAÇ 2851 (Có, Mansabá e Olossato, 1968/70)
Um enfermeiro em apuros
ou Um enfermeiro com muita sorte (1)
O relato que se segue é da autoria do 1.º Cabo Enfermeiro Carlos Manuel Furtado Costa, interessante na sua forma descritiva. O curioso é que este episódio passou-se no dia em que o quartel em Có foi atacado pela segunda vez. Ou seja, é mais um testemunho, numa perspectiva inesperada, a acrescentar ao relato do Segundo Ataque a Có (2), editado recentemente no blogue.
A sorte que ele teve foi bastante superior à que ele relata e só lendo com atenção o livro Memórias de Campanha da C. Caç. 2402 que ele possui, poderá então descobrir o porquê. Na altura em que produziu o texto, o livro ainda não tinha sido editado.
Guiné> Có> A tabanca de Có, incendiada, na sequência do segundo ataque ao aquartelamento, em 12 de Outubro de 1968.
Guiné> Có> Um abrigo atingido pelo violento fogo do IN, em 12 de Outubro de 1968
Guiné> Có> Dia 13 de Outubro de 1968> Da esquerda para a direita: Cap Vargas Cardoso (CMDT da CCAÇ 2402), Gen Spínola (em visita a Có), Alf Mil Raul Albino (CMDT interino no dia do ataque) e Alf Mil Caseiro.
Eis o seu relato:
Todos nós, companheiros de armas, temos histórias interessantes para contar, a maioria de cenas no palco de guerrilha. Eu, embora vivesse os mesmos cenários, recordo algumas cenas que servirão de boa disposição.
Assim, certo dia em Có, fui fazer uma injecção à esposa do senhor Mamadu Fodé e entrei em sua casa.
Ao preparar a seringa, já a senhora desnudava a sua enorme bunda. Confesso que tremi, pois não sendo a senhora uma beldade, tinha a vantagem de ter contacto diário com água e sabão.
Comecei por executar a injecção e mais nervoso fiquei ao ouvir os gemidos da minha doente, porque se alguém ouvisse tais gemidos, de certo pensaria logo noutra forma de penetração.
Já tremia é certo, mas tremi mesmo a valer por nesse preciso momento se desencadear um forte ataque ao nosso aquartelamento, ficando eu, por força das circunstâncias, muito junto aos nossos inimigos, ouvindo-os a falar, pegar fogo às tabancas e fazer tiro.
Quando dei por mim, encontrava-me escondido na parte lateral da porta do quarto com a seringa na mão.
Quando me pareceu tudo calmo tentei regressar ao aquartelamento – era já de noite – por isso fui recebido com alguns tiros dos meus colegas.
Nunca tive tanta sorte no mesmo dia:
1º- Não caí na tentação.
2º- Entrei são e salvo no quartel.
3º- A seringa e a agulha continuaram a fazer parte do espólio da Enfermaria.
Cabo Enfermeiro Costa
Raul Albino
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Notas do co-editor CV:
(1) - Subtítulo da responsabilidade do co-editor
(2) - Vd.Post de 31 de Julho de 2007> Guiné 63/74 - P2016: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (6): O grande ataque a Có, em 12 de Outubro de 1968
(3) - Vd. Último Post da série de 29 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2071: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (9) : Incêndio de combustível perto do paiol
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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