1. Em 17 de Março de 2008, José Teixeira, recém chegado da Guiné-Bissau, onde acompanhou o Simpósio Internacional de Guiledje, enviava-nos esta mensagem
Caríssimos editores.
Ao assaltar o blogue, logo após a minha chegada da Guiné, deparei com o Desabafo do Mário Dias (1), contestando um artigo meu, resultante de uma conversa com o Raúl Fodé (2), sobre a sua justificação para não se dedicar à agricultura.
Se possível, gostava que o texto em anexo fosse publicado, não como uma justificação, mas muito mais como um obrigado ao Mário, pela reposição legal dos factos.
Com votos de uma boa Páscoa
J.Teixeira
2. O Desabafo do Mário Dias
Por José Teixeira
Como não podia deixar de ser, o desabafo do Mário Dias, mereceu de minha parte uma leitura atenta e uma reflexão profunda.
Reconheço-lhe autoridade para melhor que ninguém repor a verdade dos factos, que eu de algum modo, sem intenção, poderei ter adulterado ao tentar expor o pensamento do Raúl Fodé, no que respeita à exploração de que eram vítimas os indígenas no período antes da eclusão da guerra colonial.
De facto, o Mário, melhor que ninguém pode falar sobre estes assuntos. Bem haja pela sua atitude esclarecedora.
Por mim devo apenas dizer que tentei passar ao papel, o sentimento que me ficou após uma conversa passada há cerca de 39 anos com o Raúl. Logicamente distorcida pelo tempo que passou e pela possível traição da memória.
Posso afirmar que na altura, sensível como era a injustiças sociais, por estar ligado à Juventude Operária Católica (JOC) fiquei perturbado com a descoberta, a qual de algum modo vinha dar razão à luta do PAICG.
O que retive da dita reflexão, foi que a diferença entre o preço de venda ao comerciante e a margem de lucro deste, era de um para quinze e utilizei a linguagem figurada, para melhor me fazer entender.
Também é evidente para mim, que anda meio mundo a tentar enganar o outro meio. No comércio, muitas vezes ganha o mais esperto e o africano também tem esperto no cabeça.
Os testemunhos do Mário reflectem uma vida intensa na Guiné, uma experiência de comerciante, que não me deixa margem para dúvidas.
Só tenho a agradecer ao Mário Dias o esclarecimento objectivo, da verdade legal, sem esquecer que nem sempre e sobretudo nem todos os comerciantes eram, como em tudo, sérios e honestos. Que a máquina estatal colonizadora protegia o colonizador e estava interessada, naturalmente, em obter os produtos agrícolas a preços baixos.
Continua a escrever, melhor que qualquer um de nós, pois podes contribuir para a História da relação entre estes dois povos, que hoje mais que nunca, se sentem irmãos.
Zé Teixeira
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Notas dos editores:
(1) - Vd. post de 15 de Março de 2008> Guiné 63/74 - P2644: Economia colonial: O preço da mancarra no meu tempo (Mário Dias, empregado da NOSOCO, em 1955/59)
(2) - Vd. post de 5 de Fevereiro de 2008> Guiné 63/74 - P2507: Estórias do Zé Teixeira (24): Raúl Fodé (José Teixeira)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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