sábado, 5 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 – P5408: Histórias do Jero (José Eduardo Oliveira) (23): Amizade nunca cederá


1. O nosso Camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/66), enviou-nos a sua 23ª mensagem, com data de 4 de Dezembro de 2009:

Camaradas,

Remeto um texto sobre a visita que fizémos a 6 cemitérios do Norte do País, para homenagear ex-Combatentes da "675".

Segue também um editorial do "Jornal de Famalicão" publicado em 4 de Dezembro.

AMIZADE NUNCA CEDERÁ


O dia 2 de Dezembro, 4ª feira, tinha sido longo.

Desde as 6 e meia da manhã que estávamos de pé. Tínhamos percorrido já uns centos de quilómetros e a noite tinha entretanto chegado.

O nosso último “destino” desse dia de peregrinação às campas de camaradas de guerra dos velhos tempos da Guiné (1964-66) estava à vista.Passámos a “placa” de Famalicão e entrámos na cidade à procura de estacionamento.

Com o Moreira ao volante desde Irijó (Rocas do Vouga) já tínhamos visitado ao longo do dia cinco cemitérios: Caldelas, São Martinho do Campo, Maia, Fânzeres e Mindelo.Faltava o Álvaro Vilhena Mesquita, o Furriel de Famalicão que tinha morrido em combate em 28 de Dezembro de 1964.Nas horas anteriores já tínhamos deposto placas da “C. Caç. 675” nas campas de António Silva Lopes – Soldado Condutor, Serafim Silva Santos-1º Cabo Rádio Telegrafista, Jerónimo Justo - Soldado Atirador e José Miranda Pereira - 1º. Cabo R. T. Condutor Auto.

Não tínhamos conseguido localizar a campa de Adriano Almeida - Soldado Atirador no Cemitério de S. Martinho do Campo mas entregámos a lápide a um vizinho do lugar, por sinal também antigo militar da “675”.

Cabe aqui dizer que chefiava esta equipa de “romagem” o antigo Alferes Belmiro Tavares, cérebro e guardião dos nomes e direcções de todos os antigos militares que tinham estado dois anos em Binta - Norte da Guiné nos idos de 60. O 3º. Mosqueteiro era o cronista da Companhia, autor destas linhas, agora também investido nas funções de fotógrafo.

Mais uns minutos e voltaríamos a estar junto do nosso amigo e camarada Mesquita.Quarenta e cinco anos depois eis nos chegados ao local do encontro com a sua irmã Teresa Mesquita.

Na praça de estacionamento frente ao Restaurante “O Tanoeiro” deu-se ao encontro. Abraçámos longamente a irmã do Álvaro.


Tinham passados tantos anos e minutos depois, a caminho do cemitério, parecia que sempre tínhamos estado por perto.O Belmiro Tavares e o autor destas linhas tinham estado naquele cemitério no 7 de Abril de 1967.A data não nos esqueceu jamais.

Tínhamos vindo de longe – um de Lisboa e outro de Alcobaça – para ir ao casamento do Figueiredo, de Monção e pernoitámos em V. N. de Famalicão para visitar a campa do Mesquita e conhecer seus Pais.Ali estávamos de novo.

O local parecia-me outro pois naturalmente o cemitério estava bastante maior.

O Belmiro Tavares, Teresa Mesquita e Luís Moreira (Foto JERO)


A Teresa conduziu-nos até à campa do seu irmão. A sua dor ouvia-se… nos soluços que não conseguia evitar.

Também nós chorámos mais uma vez o Mesquita.

Colocámos a lápide.

Registámos o momento.

Falando por mim senti-me invadido por uma paz imensa.

Dei um braço à Teresinha, como a passei a tratar desde então, e seguimos até ao jazigo de seus Pais, que também quisemos homenagear naquela visita ao cemitério de Famalicão.

Seguiu-se um convite para visitar as instalações do “Jornal de Famalicão, fundado pelo seu Pai, Rebelo Mesquita, local onde tivemos o prazer de conhecer seu filho Francisco José.


Estivemos alguns momentos em salas diferentes e a Teresinha contou-me a mim e ao Moreira uma recordação do dia morte do seu irmão, que nos abalou bastante.

Inexplicavelmente a Teresa, então com 18 anos de idade, teve um ataque de choro em casa de uma amiga na tarde do dia 28 de Dezembro de 1964. Também à mesma hora, em local diferente, seu Pai sentiu-se mal e teve que ter assistência hospitalar. Tiveram ambos um pressentimento.

Tinha acontecido alguma coisa de muito grave ao Álvaro. Três dias depois, no dia 31 de Dezembro, tiveram a confirmação oficial da sua morte.

Desanuviou este momento dramático a entrada na sala de seu filho Francisco (de nome completo Francisco José Vilhena Mesquita Moreira de Azevedo), que era portador de dois álbuns de fotografias de seu Tio “Varinho”, como era e é conhecido na família o “nosso” Álvaro Mesquita”. Revimos nessas fotos o “nosso” jovem Furriel.

Fur Mil Mesquita, Sargento Marques e Fur Mil Enf Oliveira
(Foto da Família Mesquita)

Uma das fotografias confirmou o que eu pensava: o Álvaro tinha sido um dos feridos na Operação Lenquetó, (6 de Julho de 1964) onde tivemos o “baptismo de fogo”.

Na foto que reproduzimos o Álvaro teve o cuidado de pedir ao fotógrafo que não apanhasse o seu ombro e braço direito.

Os nossos anfitriões convidaram-nos depois para jantar.

Fomos ao “Tanoeiro”, onde as recordações continuaram.O Álvaro esteve sempre presente nas nossas conversas.

Chegou a hora das despedidas com a promessa de nos voltarmos a encontrar em breve.

Afinal já éramos todos da família. Da Família “675”.

A noite ia longa. Chovia e tínhamos ainda muitos quilómetros para chegar à Irijó, que me lembrava nomes de outrora. À distância no tempo recordava Lenquetó, Canicó, Genicó. Guiné 1964.Que bem me fez chorar alguns momentos abraçado à irmã do Mesquita.

Não mais esquecerei este longo dia de 2 de Dezembro de 2009.A Teresa Mesquita é Directora do “Jornal de Famalicão”.

Termino reproduzindo o título do “Editorial” (e depois o texto) do seu jornal nº 4.114, Ano LX, de 4 de Dezembro de 2009.

Amizade nunca cederá.

Um abraço,
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675

EDITORIAL
«AMIZADE NUNCA CEDERÁ»



No 10 de Junho – Dia de Portugal, o meu grande amigo e famalicense de gema António Luís Araújo Brandão (filho do Zeca da Maia), teve conhecimento pela net, que um soldado do Ultramar de nome José Eduardo Reis de Oliveira, residente em Alcobaça tinha escrito o livro «Golpes de Mão’s – Memórias de Guerra».Desconhecendo-o, mas sabendo que foi tal como ele um dos muitos portugueses que heroicamente defenderam a sua Pátria no Ultramar, na passagem para Lisboa parou em Alcobaça.

Comprou o livro e foi procurar o seu autor. Tratava-se do Furriel Miliciano Reis de Oliveira da Companhia de Caçadores 675, à qual pertenceu o Furriel Miliciano Vilhena Mesquita, seu conterrâneo e amigo. O autor tinha recordado «in memoriam» Álvaro Mesquita.

Ali mesmo pediu-lhe uma dedicatória para a irmã do Furriel Mesquita. E assim, quis o destino que passado quarenta e cinco anos eu pudesse saudosamente «viver» os últimos tempos do meu irmão Álvaro Manuel.

Obrigado António Luís.Emocionada e com a voz embargada pois «as lágrimas nunca secam», entrei em contacto com o Furriel Miliciano Reis de Oliveira agradecendo ao «amigo que nunca esqueceu o amigo».

Entretanto, e mais uma vez o António Luís Brandão, comunica-me que há um Blogue na net onde os «Companheiros da 675» escreveram sobre o Varinho.

Desta vez, era o Alferes Miliciano Belmiro Tavares.

Entramos em contacto. E passados quarenta e cinco anos, na quarta-feira ao fim da tarde, debaixo de uma intensa chuva que teimosamente não parava, tive a agradável surpresa de os conhecer.

Representando a Companhia Caçadores 675, eles ali estavam com mais uma lápide aos pés do jazigo do nosso irmão Furriel Miliciano Álvaro Manuel Vilhena Mesquita.

«Os amigos de sangue» que viram o seu a ser derramado naquela terra de África, estavam presentes para lhe dizer: «Amizade nunca cederá».

Que lição, patriótica e de valores, o Alferes Miliciano Belmiro Tavares e os Furriéis Miliciano José Eduardo Reis de Oliveira e Luís Moreira acabavam de dar!

Tinha prometido ao António Luís Brandão que lhe comunicaria para quando esse encontro, mas a visita foi inesperada e tal não aconteceu.
Perdoa António Luís pois foi graças a ti que «este passado foi terrivelmente presente».

Neste reencontro dos companheiros vivos com o que já partiu, o «coração de todos sangrou muito…». E em pensamento mais uma vez responderam à chamada – Presente!

Nesta transcendência de «Vida e Morte» momentos foram vividos pelos presentes e ausentes.

Jamais os esquecerei.

Em meu nome e da Família Rebelo Mesquita o nosso obrigado aos «Bravos Soldados da Companhia de Caçadores 675».

Foi há quarenta e cinco anos que escrevi uma «Carta Para o Céu» ao meu irmão Varinho.

Hoje, aqui te envio esta, com um até sempre.

Maria Teresa Vilhena Mesquita


Fotos: José Eduardo Oliveira (2009). Direitos reservados.
___________
Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

5 comentários:

Anónimo disse...

Varinho:
Jamais esquecerei esse dia de Dezembro, teu irmão, o Manuel, foi a nossa casa com a terrível notícia da tua morte em combate. Entre o como(?) e o quando(?), lágrimas de todos nós selavam a triste novidade. Á noite, em tua casa na Bandeirinha, teu pai pouco mais era que um farrapo humano, a sua dor era indescritível. Nunca me esquecerei as suas palavras “ … António Luís, saiu-me a lotaria negra …” com muitas lágrimas, muitos cigarros e muito sofrimento. A pátria exigiu e recebeu o teu sacrifício, depressa te esqueceu. Esteja onde estiveres, um abraço.
António Luís
(António Brandão)

RúbenCardoso disse...

Boas tarde
Encontrei este site porque andava com esperanças de encontrar informaçoes sobre o Soldado Atirador Jerónimo Justo(1964-66)
Ele faleceu mês passado..
E nao contou muito sobre esses 2 anos..
E Eu gostaria de saber mais sobre esses 2 anos..
Eu sou o neto dele!
Agradeço muito pela atenção!
E respondam o Quanto antes!
Obrigado

Anónimo disse...

Boa tarde António Brandão
Já falámos hoje ao telefone mas não deixei de ficar impressionado com a tua recordação sobre a "lotaria negra" de que então falou o Pai do nosso saudoso amigo"Varinho".Quanto ao esquecimento da Pátria que referes todos nós sabemos com o que contámos ao longo dos anos...Felizmente que os ex-combatentes são de boa memória e não esquecem.Como escreveu a Teresa Mesquita "Amizade nunca cederá".
Boa tarde Ruby
Estou à tua inteira disposição.Estivémos no Cemitério de Fanzeres na passada 4ª. feira e conhecemos então a tua avó, que ficou com a morada do ex-Alferes Belmiro Tavares.Existem 2 livros sobre a a C.Ca. 675.Um escrito em 1965 que o teu Avô Jerónimo devia ter em casa.Se não o encontrares poderei arranjá-lo em fotocópias. E há um mais recente que foi editado em Maio de 2009.Deixo-te os meus contactos.Telem. 963147683.E-mail "jotajero@sapo.pt".Fico a aguardar as tuas notícias.
Um grande abraço,
José Eduardo Reis de Oliveira(JERO).

RúbenCardoso disse...

Agradeço imenso a sua resposta e atenção.
Vou tentar localizar o livro que supostamente estará em casa do meu avô.
Caso nao consiga agradecia-lhe então as cópias que me podesse facultar, pelo que entrarei novamente em contacto.
Grato uma vez mais
Deixo-lhe um abraço

victor justo disse...

sou filho do soldado atirador jeronimo justo enfelizmente ja faleceu gostava de saber se alguem que andou com ele na guine tem algumas fotos com ele alguma recordacao para poder partilhar comigo e meus irmaos agradeço para contactar comigo tlm.914234833 ou para o mail. justo400_@hotmail.com obrigado a familia agradece