[Foto à esquerda, de Carlos Vinhal, uma mina anticarro]
Chamam-lhe o "soldado tranquilo", ou o "soldado silencioso (...) (*)
A carga explosiva pesa escassos gramas ou alguns quilogramas. É feita de metal ou de plástico. Grande e pesadona ou pequena e ligeira. Fabricada na China, na Rússia, nos Estados Unidos, em Israel e em dezenas de outros países à superfície da Terra. É fácil e simples de fabricar. Barata, eficaz e mortal.
O preço de uma mina é baixo. As organizações de combate às minas calcularam que o custo de uma “unidade” pode ir de menos de um dólar até cento e cinquenta dólares. Mas a remoção de cada mina pode ascender a mil e quinhentos dólares!
Por isso, converteu-se na arma ideal dos pobres. Perante as bombas atómicas, os aviões evasivos, as bombas “inteligentes” comandadas a laser, os míssei9s balísticos, perfila-se a mina pequena e barata. Os que a utilizam não precisam de ser pilotos competentes ou técnicos diplomados. Nem precisam de saber ler e escrever. As instruções elementares do manejamento vão desenhadas na embalagem.
Nem sempre é necessário dar-se ao trabalho de a ocultar debaixo de terra. Em países com clima tropical quente e húmido, pode-se simplesmente espalhar as minas nos campos à volta da aldeia remota. A chuva e a erosão farão o resto e a camponesa que sai para cuvar a sua leira, não vai reparar no “soldado” que lá está escondido.
A mina não discrimina homens ou mulheres, nem distingue civis de militares. As crianças são um alvo permanente. Ao contrário das bombas “inteligentes” que deverão atingir alvos previamente definidos, as minas não são pretensiosas e quem as coloca não ambiciona que o seu planeamento seja preciso e sofisticado. Assim, também não têm de confessar que erraram.
Esta arma é absolutamente desprovida de ideologia. Esteve ao serviço dos Estados Unidos e da União Soviética, da China comunista e da Africa do Sul do apartheid. Todos a usaram nas suas guerras contra todos, por vezes, na mesma nesga de terra do mesmo país.
Ocorreu-me, mais do que uma vez, que a mina é tão irritante, precisamente por não obedecer às ordens variáveis de que quem as usa. Generais vêm e vão, polítcios substituem-se – mas ela mantem-se. Desde o momento que é posta no chão, é autónoma no terreno.
Durante a Segunda Guerra Mundial falou.-se muito em “campos de minas” – terrenos definidos e assinalados em mapas pormenorizados, Nas guerras do Terceiro Mundo não existem, hoje em dia, mapas, mas campos há muitos. Os campos de inofensivos agricultores, os pátios das escolas rurais e os adros de igrejas. E também, é claro, aeroportos, linhas de caminho de ferro, estradas e pontes. Já não há guerras entre exércitos regulares, mas conflitos de todos contra todos.
É um tema nos órgãos de comunicação. A muitos é comum a moda de condenar esta arma terrífica. Comos se os outros tipos de armamento fossem menos condenáveis. Há alguns anos, foi finalmente decidido pô-la fora da lei. Uma convenção internacional foi solenemente assinada em Otawa, no Canadá. Proibe a venda, o fabrico, a exportação, e o uso de minas. A convenção também exorta à desmontagem de minas onde quer que se encontrem. A convenção está em vigor, mas os grandes fabricantes – à frente dos quais os Estados Unidos – ainda não a ratificaram.
Especialistas definiram um grupo de países onde a praga das minas é mais grave. À frente – Cambodja, Afeganistão, Angola e Moçambique. Disse-se sobre Angola que tem o maior número de minas por habitante e a taxa mais elevada de crianças atingidas. Todos concordam em que ninguém sabe o número de minas dispersas pelo mundo fora.
As minas de Angola chegaram aos cabeçalhos dos jornais graças à princesa Diana. Quarenta e oito horas passou a bela princesa em território deste ferido país, e uma fotografia dela, na companhia de um menino sem membros, fez mais por consciencializar as pessoas para o perigo das minas, do que milhares de fotos só de crianças destroçadas. Todo o mundo já leu e assistiu a relatos infindos. Mas nunca bastam.
Os anos da minha estada em Angola foram à sombra de minas. Não há domínio que mais me tenha ocupado. Esteve no âmago da minha actividade e mesmo quando terminei a missão, permaneci em Angola, para continuar a contribuir com todas as minhas capacidades.
No ano transacto, como noticiado, foram removidas e deflagradas trinta mil minas em Angola. No terreno ficaram uns dez milhões. Talvez mais, talvez menos.
As estatísticas continuam a assustar. As tentativas de lutar contar esta praga são limitadas, os êxitos escassos - e os malogros imensos.
In: Tamar Golan e Tamar Ron – Encontros em Angola: o homem e a natureza na sombra da guerra. Luanda: Caxinde; Lisboa: Prefácio. 2007, pp. 67/69. [Reproduzido com a devida vénia...]
TG [ Tamar Golan] (**) (***)
O preço de uma mina é baixo. As organizações de combate às minas calcularam que o custo de uma “unidade” pode ir de menos de um dólar até cento e cinquenta dólares. Mas a remoção de cada mina pode ascender a mil e quinhentos dólares!
Por isso, converteu-se na arma ideal dos pobres. Perante as bombas atómicas, os aviões evasivos, as bombas “inteligentes” comandadas a laser, os míssei9s balísticos, perfila-se a mina pequena e barata. Os que a utilizam não precisam de ser pilotos competentes ou técnicos diplomados. Nem precisam de saber ler e escrever. As instruções elementares do manejamento vão desenhadas na embalagem.
Nem sempre é necessário dar-se ao trabalho de a ocultar debaixo de terra. Em países com clima tropical quente e húmido, pode-se simplesmente espalhar as minas nos campos à volta da aldeia remota. A chuva e a erosão farão o resto e a camponesa que sai para cuvar a sua leira, não vai reparar no “soldado” que lá está escondido.
A mina não discrimina homens ou mulheres, nem distingue civis de militares. As crianças são um alvo permanente. Ao contrário das bombas “inteligentes” que deverão atingir alvos previamente definidos, as minas não são pretensiosas e quem as coloca não ambiciona que o seu planeamento seja preciso e sofisticado. Assim, também não têm de confessar que erraram.
Esta arma é absolutamente desprovida de ideologia. Esteve ao serviço dos Estados Unidos e da União Soviética, da China comunista e da Africa do Sul do apartheid. Todos a usaram nas suas guerras contra todos, por vezes, na mesma nesga de terra do mesmo país.
Ocorreu-me, mais do que uma vez, que a mina é tão irritante, precisamente por não obedecer às ordens variáveis de que quem as usa. Generais vêm e vão, polítcios substituem-se – mas ela mantem-se. Desde o momento que é posta no chão, é autónoma no terreno.
Durante a Segunda Guerra Mundial falou.-se muito em “campos de minas” – terrenos definidos e assinalados em mapas pormenorizados, Nas guerras do Terceiro Mundo não existem, hoje em dia, mapas, mas campos há muitos. Os campos de inofensivos agricultores, os pátios das escolas rurais e os adros de igrejas. E também, é claro, aeroportos, linhas de caminho de ferro, estradas e pontes. Já não há guerras entre exércitos regulares, mas conflitos de todos contra todos.
É um tema nos órgãos de comunicação. A muitos é comum a moda de condenar esta arma terrífica. Comos se os outros tipos de armamento fossem menos condenáveis. Há alguns anos, foi finalmente decidido pô-la fora da lei. Uma convenção internacional foi solenemente assinada em Otawa, no Canadá. Proibe a venda, o fabrico, a exportação, e o uso de minas. A convenção também exorta à desmontagem de minas onde quer que se encontrem. A convenção está em vigor, mas os grandes fabricantes – à frente dos quais os Estados Unidos – ainda não a ratificaram.
Especialistas definiram um grupo de países onde a praga das minas é mais grave. À frente – Cambodja, Afeganistão, Angola e Moçambique. Disse-se sobre Angola que tem o maior número de minas por habitante e a taxa mais elevada de crianças atingidas. Todos concordam em que ninguém sabe o número de minas dispersas pelo mundo fora.
As minas de Angola chegaram aos cabeçalhos dos jornais graças à princesa Diana. Quarenta e oito horas passou a bela princesa em território deste ferido país, e uma fotografia dela, na companhia de um menino sem membros, fez mais por consciencializar as pessoas para o perigo das minas, do que milhares de fotos só de crianças destroçadas. Todo o mundo já leu e assistiu a relatos infindos. Mas nunca bastam.
Os anos da minha estada em Angola foram à sombra de minas. Não há domínio que mais me tenha ocupado. Esteve no âmago da minha actividade e mesmo quando terminei a missão, permaneci em Angola, para continuar a contribuir com todas as minhas capacidades.
No ano transacto, como noticiado, foram removidas e deflagradas trinta mil minas em Angola. No terreno ficaram uns dez milhões. Talvez mais, talvez menos.
As estatísticas continuam a assustar. As tentativas de lutar contar esta praga são limitadas, os êxitos escassos - e os malogros imensos.
In: Tamar Golan e Tamar Ron – Encontros em Angola: o homem e a natureza na sombra da guerra. Luanda: Caxinde; Lisboa: Prefácio. 2007, pp. 67/69. [Reproduzido com a devida vénia...]
TG [ Tamar Golan] (**) (***)
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 1 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10215: Guiné 63/74 - P10215: Passatempos de verão: Hoje quem faz de editor é o nosso leitor (4): O soldado tranquilo, o soldado silencioso...
(**) Tamar Golan [, foto à esquerda, cortesia do sítio da Embaixada de Israel em França,] foi a primeira embaixadora de Israel em Angola (1995-2001), por nomeação pessoal do então primeiro ministro Yitzhak Rabin. Foi depois consultora, por parte da ONU, do Governo angolano na instituição da Comissão Nacional Intersectorial de Desminagem e Assistência Humanitária (CNIDAH). Conheceu África, pela primeira vez, em 1961. Nesse ano, perdeu o marido, num acidente, na Etiópia. Era doutorada em Ciências Políticas e Administração, pela Universidade de Colúmbia, N.Y., com especialização em Assuntos Africanos. Foi jornalista. Viveu em Israel, onde foi professora na Universidade Ben Gurion, no Neguev. Morreu em Israel, aos 78 anos, em 30 de março de 2011. Escreveu, entre outros, este belíssimo livro, "Encontros em Angola", a quatro mãos, com a sua amiga e compatriota Tamar Ron, bióloga e igualmente consultora do governo angolano, em 2000-2004, para a conservação da biodiversidade.
(***) Último poste da série > 9 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10243: Passatempos de verão: Hoje quem faz de editor é o nosso leitor (7): Como se chamam estes frutos secos, três dos quais são usados para fazer saborosos sumos ?...
1 comentário:
Na verdade assim é.Todo o mundo fa_
brica minas e Israel também.No TO
onde cumpri a minha comissão,não se
escapava ao pesadelo destes engen_
hos.No meu caso nem engenhos lhes chamo.Chamo-lhes artefactos,
visto serem de fabrico artezanal e
ainda mais"sujos"que as minas,eram
os fornilhos.De tudo(muito)que acionamos ou conseguimos"levantar"
nem uma mina se nos deparou,eram só"brinquedos" em cunhetes de ma_
deira com petardos de TNT que,pesa_
vam de sete a dez quilos.A Zona es_
tava bem acompanhada por "consel_
heiros"chineses que estavam a construir a linha férrea,Zâmbia-
Tânzania.Falava-se também de pesso_
al treinado em Israel?.
Carlos Nabeiro.
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