1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de 13 de Setembro de 2011:
Caros camaradas Editor e Co-Editores
Já faz algum tempo que não contribuo com algum texto, embora procure acompanhar o Blogue e intervir ao nível do 'comentários'.
Há que dar lugar aos novos, para que também eles assumam este colectivo.
Caso vejam interesse, envio então este texto que podem inserir numa série que eu teria de ir completando e que se chegou a intitular "Histórias em tempo de guerra", com uma história verídica e que se passou ainda não tinha uma semana de Guiné, ou seja, de Bissau. Ainda era tudo novo, tudo misterioso. Depois ganha-se calo.
Peço desculpa por não poder rechear o texto com fotos a propósito, por exemplo do aparelho de rádio referido, mas é que não encontrei, nem na net. Apenas junto essa que o Vítor Raposeira me facultou e que pode servir para avaliar o formato e dimensão do aparelho em questão.
Depois acho que também devo pedir desculpa aos camaradas para quem a sua "primeira missão" não foi como a minha, mas trata-se de contar aqui a verdade. A minha foi assim.
Abraço
Hélder Sousa
HISTÓRIAS EM TEMPOS DE GUERRA (10)
A PRIMEIRA MISSÃO
Caros camaradas, amigos e outros…
Impulsionado por algumas coisas que recentemente apareceram no nosso Blogue, lembrei-me desta experiência que passo a relatar.
Ela assenta em factos reais, verdadeiros, com algumas certezas e algumas dúvidas, a saber:
Certeza: ocorreu logo depois de ter chegado à Guiné, aí à volta do dia 15 de Novembro de 1970 (cerca de uma semana antes da ‘Operação Mar Verde’).
Dúvida: não sei dizer o dia certo, mas espero que isso não seja impeditivo para o relato do desenvolvimento da acção.
Certeza: participaram dois estrangeiros, um deles Engenheiro (não sei se civil se militar) e o outro, um militar com patente de Oficial. Um era rodesiano e o outro sul-africano.
Dúvida: não sei dizer qual era o rodesiano, acho que era o Engenheiro, da Racal, mas sem certeza, nem qual o sul-africano, acho que era o Oficial, salvo erro Coronel de Engenharia ou Transmissões, mas também sem certeza.
Certeza: a operação destinava-se à realização de testes de eficácia, de prova da capacidade, de bom desempenho, de uns rádios que se pretendiam vir a equipar em breve algumas unidades do STM. Tratavam-se de versões do Racal TR-15. Não, meus camaradas, não era o TR-28, o que foi colocado à experiência era de muito maiores dimensões, cerca de 60cm de frente e para ficar assente em mesa, de que podem observar, embora só um pouco, na foto que me foi cedida pelo Vítor Raposeiro em que está em frente a um, já em Bissau.
Dúvida: tenho a ideia que a seguir à identificação TR-15 havia uma letra, não sei se um “A” se um “L”, nem me lembro agora para onde foram alguns exemplares, para além de Catió.
Fur Mil Vítor Raposeiro no seu posto de trabalho
Para a realização dos referidos testes montou-se um ‘posto director’ numa espécie de pátio que havia lá nas Transmissões, com uma tenda para evitar que o aparelho em apreciação fosse alvo da curiosidade e para o proteger das acções climatéricas (nessa altura ainda apanhei chuva nesse dia), e com a execução de uma antena dedicada ao aparelho pelo Alferes Pereira da Silva, que era um especialista nesse tipo de equipamentos.
Um outro aparelho foi montado numa das viaturas típicas das transmissões e servido apenas por uma antena ‘vertical’.
Antes de prosseguir quero aqui deixar a minha homenagem ao Alferes Pereira da Silva, que nunca mais vi nem sei o que é feito dele, mas que era “Aspirante” no BT aquando da minha passagem por lá a fazer o 2.º Ciclo do CSM, pelo que já nos conhecíamos desse tempo, um ano atrás. O Pereira da Silva era de facto uma figura típica, um bom homem, um grande especialista em antenas e muito bom em tudo o que dizia respeito a rádios e transmissões, parecendo contudo que estava sempre ’pendurado’ num cigarro que lhe saía da boca. Havia até quem apostasse que ele só acendia um cigarro por dia, os restantes acendiam-se sucessivamente, chegando a haver ocasiões que não era raro haver dois cigarros em simultâneo.
Nesta operação calhou-me a mim e ao Furriel Nelson Batalha fazer o trabalho na viatura, onde havia um condutor, os dois Furriéis recém-chegados, o ‘Oficial’ estrangeiro e creio que também um ‘operador’ de grafia. No ‘posto director’, para além do Alferes Pereira da Silva no apoio técnico, ficaram vários ‘quadros’ das Transmissões entre os quais os Capitães Cordeiro e Oliveira Pinto, bem como outro pessoal relacionado com o STM, nomeadamente o Sargento Taveira.
A seguir ao almoço (a montagem dos equipamentos ocupou a manhã) lá seguimos com a nossa viatura por vários e diversos caminhos e locais, que para mim na altura pouco ou nada diziam. Fomos para Antula, depois para o lado oposto, para a zona do aeroporto, também seguimos para o caminho de Quinhamel, embora não chegando lá.
As comunicações entre os dois rádios, quer em fonia, quer em grafia, foram satisfatórias, pelo menos assim foi dito. Mérito do rádio? Mérito da antena? Há um comentário do nosso camarada Carlos Filipe que refere uma máxima “é preferível um mau emissor com uma boa antena, que o inverso.” Estou convencido que foi de todo o conjunto: o rádio era bom, a antena também e as condições de ensaio foram favoráveis.
Contudo a experiência não ficou por aqui. Era necessário saber como era o comportamento em situação nocturna, com condições atmosféricas desfavoráveis. Vai daí, havia que repetir a experiência da tarde mas agora com ida a Prabis e depois Quinhamel.
Foi aqui que a ‘coisa’ se tornou caricata. O condutor e o operador, já com a viatura a circular por Bissau, disseram que não era nada aconselhável nem ‘saudável’ aventurarmo-nos pelos referidos caminhos, de noite, sem protecção, que o Comandante não tinha a noção do perigo, ainda para mais com um equipamento novo, que não estavam para se arriscar por causa ‘deles’, pelo que inquiridos sobre qual era a sugestão que faziam, sem se falhar o ensaio nem se entrar em desobediência, ficou entendido avançar-se um bocado na estrada de Prabis e depois recuar, avançar novamente e depois voltar a recuar: faziam-se os testes, faziam-se os quilómetros, e tudo correria bem. Ainda de noite fomos depois também para junto de um local que me lembro de terem dito ser a Missão Católica e tornear várias vezes o edifício e voltar a haver os avanços e recuos.
No meio destas cenas o Oficial estrangeiro que nos acompanhava ‘percebeu’ a situação, piscou o olho numa prova de entendimento e meneou afirmativamente a cabeça pois também não se tinha revelado muito confortável com a situação. Afinal, tudo aquilo ‘corria a favor’ dos testes….
Como conclusão posso adiantar que os testes foram positivos, o rádio agradou em pleno, a encomenda seria feita seguidamente, os ‘vendedores’ do produto saíram satisfeitos e nem percebi porque na despedida o Oficial completou a saudação com um cumprimento e novo piscar de olho. Os homens da viatura ficaram também contentes e eu e o Batalha confortados pelo êxito da nossa primeira missão.
Um abraço para toda a Tabanca!
Hélder Sousa
Fur Mil Transmissões TSF
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 22 de Julho de 2011 >
Guiné 63/74 - P8587: O Mundo é Pequeno e o nosso Blogue... é Grande (44): Aqui e ali, prossegue a recuperação da memória.... (Hélder Sousa)
Vd. último poste da série de 15 de Fevereiro de 2010 >
Guiné 63/74 - P5821: Histórias em tempos de guerra (Hélder Sousa) (9): A Presse Lusitana