terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11155: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (8): Casamento tradicional, família, religião, homens, mulheres, gestão de conflitos... e pesca desportiva!

1. Comentário da nossa Anabela Pires, com data de 20 de corrente, ao poste P11098:

Luís, acabei de receber o teu e-mail e estou em estado de choque. Nunca percebi de que mal padecia a Cadi mas depois de ir para o Senegal e para o hospital de Cumura nunca pensei que o desfecho fosse este. Não imaginas como lamento esta notícia. E cuidado com a menina que pouco depois da mãe adoecer também ela andava doentita. Nunca me esqueço delas até porque no dia em que a Alicinha fez 2 anos (dia da minha chegada a Cantanhez) também eu ganhei uma "afilhada" em Catesse que tem o meu nome. As nossas "afilhadas" têm exactamente 2 anos de diferença. E não esqueço a visita que recebi da Cádi, da sua mãe (lindíssima mulher também), da Alicinha e do Ansumané (irmão mais novo da Cadi). Para sempre ficarão também no meu coração. Um grande abraço para ti e para a Alice. Anabela Pires

[Foto acima, à esquerda: Anabela Pires, em Catesse, Cantanhez, Região de Tombali, Guiné-Bissau, 20012. Créditos fotográficos: AD - Acção para o Desenvolvimento]

2. Continuação da publicação do Diário de Iemberém, por Anabela Pires  (Parte VIII) (*)

16 de Fevereiro de 2012

Há seis dias que nada escrevo. Não tenho tido tempo!

Voltando mais atrás …. Aqui há dias um homem jovem deu uma surra no antigo namorado, também jovem, da mulher. A mulher fora-lhe prometida pela família, de acordo com os costumes muçulmanos. No entanto, a rapariga foi durante muito tempo namorada do filho do ex-régulo, falecido há pouco tempo. Deste namorado teve uma menina e claramente é dele que ela gosta mas chegada a hora de casar, e apesar de já ter uma filha do namorado, teve de casar com o rapaz a quem os pais a haviam prometido, levando para o casamento a sua filhinha.

Alguém a ouviu telefonar à família do antigo namorado, a dizer que ele andava doente e que cuidassem de lhe comprar os remédios, e foram contar ao marido. Este não esteve com mais – foi ter com o outro e deu-lhe uma surra que o deixou desmaiado e a sangrar dos ouvidos, boca e nariz. O rapaz foi socorrido, levado para o hospital mais próximo, onde estava o chefe da polícia que tomou parte da ocorrência.

Aqui no complexo existe um espaço aberto mas coberto que supostamente é o local de convívio dos turistas, chamada a Casa Redonda.  No entanto, este espaço é utilizado para diversos fins, e muito bem. Nele se reuniram todos os chefes de família de Iemberém, com a presença do chefe de polícia, e lá estiveram toda a tarde para discutir o incidente entre os dois jovens homens.

O objetivo destas reuniões é tentar uma reconciliação entre as partes mas sempre tem de ser determinado o culpado. Nestas reuniões não participam as mulheres, que toda a tarde mostraram uma grande preocupação com o que seria o final da estória. Foi uma longa tarde, mas no final o marido foi determinado culpado e teve de pedir desculpa ao agredido. Este aceitou as desculpas e deu-lhe o seu perdão. Tudo acabou em bem para grande alívio da população.

 O Abubacar explicou-me que a determinação do culpado é fundamental para que o agredido possa perdoar do fundo do coração pois caso contrário vai perdoar de boca mas não vai esquecer. Pergunto-me a mim própria se ele de facto perdoou do coração. A verdade é que a estória, pelo menos para já, ficou resolvida. Apesar das minhas dúvidas, não deixei de admirar este sistema de justiça em que o principal objetivo é a reconciliação entre as partes, sem processos judiciais, daqueles que nunca mais chegam ao fim, sem cadeia, sem mais delongas.

Aqui na tabanca não há cadeia mas há um armazém onde, caso alguém faça um mal muito grande, se pode prender uma pessoa até ser transferida para a cadeia mais próxima. Nas tabancas a prisão parece que só acontece em casos muito extremos mas,  se houver queixas aos régulos,  eles podem determinar castigos corporais, chibatadas. E assim se processa a justiça por aqui. É evidente que a Guiné tem sistema judicial, tribunais, cadeias, advogados, etc.. mas nas tabancas é em reunião de chefes de família que tentam resolver os conflitos.

Esta questão do casamento obrigatório é cada vez mais controversa e origina conflitos frequentes. Quando vinha de Bissau para aqui o jipe parou numa tabanca e também por lá havia um grande banzé! Uma rapariga prometida andava a fugir para ir ter com o namorado da sua escolha à tabanca vizinha. A família dela foi à outra tabanca atirar pedras ao rapaz, depois veio a família dele ao lado de cá e a discussão era acesa!

As raparigas cada vez estão menos dispostas a casar com quem os pais escolhem mas muitos pais insistem ainda neste costume. E é curioso ver a posição de pessoas diversas relativamente a este assunto.

[Já tinha falado em tempos com um casal meu amigo, os dois guineenses, obre esta questão. Ele],que apesar de muçulmano é um homem instruído e que já andou pelo mundo, é absolutamente contra este costume [, dos casamentos tradicionais arranjados pelos pais]. [Ela], bastante religiosa, achava que estava bem assim porque a religião diz que é assim, mas encontrava-lhe com frequência contradições no discurso. Ela era já a 2ª mulher dele, e para sorte dela a 1ª morreu. Apesar de ser a 2ª, também foram os pais que a ofereceram ao [atual marido], ela nunca o tinha visto quando casou com ele. Passou um mau bocado com a 1ª mulher que até uma dentada lhe deu numa orelha. Hoje tenho a sensação de que ela o ama (será? Ou não quer simplesmente confusões na sua casa?) e não quer, de modo algum, que ele tenha outras mulheres, pelo menos na mesma casa. Porque fora de casa ele [terá tido] filhos, [segundo julgo saber] (...).

Mas outras mulheres não se importam nada que os maridos tenham outras mulheres (combossas) em casa e acham até que isso é uma necessidade. É o caso da X... de Farosadjuma [...]. O marido dela tem 4 mulheres e creio que 20 filhos vivos. Vivem todos na mesma morança mais uma das mulheres do seu filho e respectivas crianças. Que grande confusão!

Mas a X... diz que não há problema nenhum e que há sempre alegria. Diz que tem de ser assim pois têm “manga” de trabalho (aqui muito é “manga”, em Moçambique é “maningue”). O marido é agricultor [...] e com tanta gente em casa há que fazer dinheiro para a todos alimentar e há muito trabalho doméstico para fazer. A X... é a 1ª mulher e a oficial, porque oficialmente só podem ter uma mulher. Parece-me que ela é quem manda nas outras todas.

Perguntei-lhe com quem é que o marido dormia e pelos vistos dorme duas noites, em rotação, com cada uma. E não chegam os sete dias da semana para uma rotação completa! E o pobre, pelos vistos, nem tem direito a descanso! Perguntei-lhe se não ficava incomodada, aborrecida, quando o marido vai dormir com as outras. Disse-me que não, que têm “manga” de trabalho. Não percebi se o que me quis dizer é que trabalhava muito e estando cansada até gostava de não ter de dormir todos os dias com o marido ou se aceita este sistema com agrado porque acha impossível terem tão grande labuta sem que o marido tenha outras mulheres.

Bom, um destes dias terei de ir a Farosadjuma dar formação à Fatu e nessa altura espero conhecer as tais mulheres de que me falaram. A Fatu tem 3 bungalows e também recebe turistas mas parece-me que por lá há grandes limpezas a fazer e muito a ensinar. Mas tem muita pose,  esta Fatu. É já mulher com 50 anos mas uma bela e forte mulher. Veio estes dias para aqui para ir vendo como se processam as grandes limpezas e aprender alguma coisa na cozinha.

No dia em que chegou estivemos aqui em casa, com a Satu também, a fazer sopa de alface e ovos verdes. Bem, o que eu me ri com as duas a provarem a sopa de alface! Até lhes tirei umas fotos! Nunca tinham comido sopa! Já outro dia tinha feito com a Satu sopa juliana, com repolho e cenoura ralada e ela adorou. Também adoraram os ovos verdes que só conseguimos fazer porque veio salsa de Bissau.

Ando a ver se as convenço a fazerem uma pequena horta com os legumes que aqui se derem para não estarem sempre na dependência do que pode vir de Bissau. Afinal ambas são mulheres de agricultores e o Abubacar é engenheiro agrónomo. A questão é que aqui não estão habituados a comer sopas e saladas e como tal valorizam muito pouco os legumes – usam cebola, pimentos e tomate, para fazer o tal molho e quando não têm tomate fresco substituem por massa de tomate em lata. Os legumes são todos pequeninos! Quase miniaturas! E eu que adoro trabalhar com cebolas grandes!

Hoje, para terminar, vou só relatar a minha 1ª ida à pesca no Domingo passado. Fui com o Sambajuma, que é aqui jardineiro e guarda durante o dia, que tem uns 65 anos e com quem falo francês pois só sabe esta língua e crioulo,  e o Gassimo, de quem já falei, e que é um menino adorável pela sua bondade. Fomos a pé até Camucote, tabanca pequena a que chamam porto, à beira de um largo braço de ria, todo ladeada de mangal (aqui chamado tarrafe) e com o solo de lodo e pedras e que fica a uns 2 ou 3 km daqui. Fomos todo o dia. Eu pensava que íamos pescar de terra mas afinal fomos de piroga. Enfim, 3 pessoas dentro de uma piroga, com a tralha toda da pesca e eu com uma cana de 5 metros de comprimento! 

O Sambajuma é pescador mas gosta mesmo é de pescar com rede. Só apanhei um pequeno peixe a que eles chamam barbo mas que penso ser da família da nossa faneca. O Sambajuma apanhou um esquiló, que se parece com um ruivo mas é cinzento. Apesar do fracasso desta 1ª pescaria devo dizer que adorei andar por lá todo o dia. Na 1ª piroga ainda tinha uma tábua para me sentar mas na 2ª piroga o meu banco e o do Gassimo eram pedras!

Valeu-me ter trazido as botas com que costumo andar na ria de Faro ao lingueirão pois na maré vazia o lodo é terrível. Mas a ria ou rio, como dizem aqui, é muito bonita sobretudo com a maré cheia. Tirei umas fotos e até ajudei o Sambajuma a remar. Assim que tivermos tempo vamos voltar e ele disse-me que me vai levar mais longe, até ao grande mar, que é o local onde começa o braço da ria junto ao mar. Penso que já percebeu que estou habituada a estas actividades e que não tenho medo. Para a próxima já levarei a cana adequada. 

No regresso viemos de jipe – estava cá um da AD e o Abubacar mandou-nos lá buscar. Soube bem vir de carro no regresso pois estava cansada e cheia de lodo por todo o lado! Depois foi o costume – lavar tudo e tirar o lodo de botas, mochila, etc… Mas foi um lindo dia, o dia 12 de Fevereiro. Antes de ir enviei sms de parabéns à Benilde e à Élia. Esta recebeu-a pois respondeu-me mas a Benilde não sei. O importante é que eu não me esqueci delas no dia dos seus aniversários.

Bom, tenho mesmo de me despachar para ir trabalhar.

[Fotos: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados]
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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11121: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (7): Fogo!!!.... O forno do meu vizinho padeiro, o Mumini, completamente em chamas!

Guiné 63/74 - P11154: Parabéns a você (541): João Carlos Silva, ex-1.º Cabo Especialista da FAP (1979/82)

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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 25 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11149: Parabéns a você (540): Gumerzindo Silva, ex-Soldado Condutor Auto da CART 3331 (Guiné, 1970/72)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11153: Para que a memória não se perca (2): Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (José Martins)



1. Segunda parte do trabalho de pesquisa e compilação do nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), sobre a História da Guiné na dobragem do Século XIX para o Século XX, que se irá prolongar por quatro postes. Este trabalho foi enviado ao nosso Blogue em mensagem de 13 de Fevereiro de 2013.




Para que a memória se não perca…

Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (2)

Brasão da Guiné Portuguesa 
Foto: Portal UTW


Operações em Geba em 1892
É recorrente, nas terras da Guiné, entre as diferentes etnias e/ou com as autoridades portuguesas, haver revoltas e escaramuças, quer por espírito guerreiro quer pelas razões que, por certo, a própria razão desconhece.
Mali-Boiá, régulo já conhecido das autoridades civis e militares da província, resolve, no final do ano de 1890, arrastar os seus súbditos e outros à rebelião, hostilizando aqueles que eram fiéis às autoridades provinciais.
É organizada uma coluna que, sob o comando do Capitão Carlos Augusto de Almeida Saraiva, era formada por 1 Oficial e 5 Praças, no Comando; 20 praças de artilharia com uma peça de 7 c.; 144 praças de infantaria, distribuídos por 3 pelotões com 5 oficiais; e 1822 auxiliares, em cujo número se contavam integrados 20 cavaleiros, 350 carregadores e 10 negociantes europeus, que se alistaram voluntariamente.
A coluna parte em 21 de Janeiro do Geba e, no terceiro dia o comandante é atacado por doença súbita que o vitimou, quando a força se encontrava acampada em Priano. No dia 4 de Fevereiro seguinte, assume o comando da coluna o Capitão Zacarias de Sousa Lage, que reinicia o plano de operações. Atravessando florestas e bolanhas, a força vai dando combate ao inimigo nas povoações de Gandafi, Pacôa, Ardo, Gasanti, Jenany, Córóbo, Numandu e Guanará-Dandú, onde se viria a travar o confronto mais violento.
A tabanca de Guanará estava instalada num local junto a um braço do rio Geba, que servia de protecção a três flancos, estando o flanco principal, e de maior extensão, protegida por forte paliçada.
Durante o combate os auxiliares, assustados, abandonam a carga de víveres e munições, que transportavam, em locais a que os revoltosos podiam aceder com facilidade, pelo que foi necessário alguns elementos rastejarem até junto das mesmas, ficando mais expostos, para assim as recuperarem.

Distinguiram-se e foram citados no relatório:
• Capitão Zacarias de Sousa Lage; Tenentes Estevão Gonçalves da Cruz Chaves e Antão Romão Vieira; Facultativo [médico] de 3ª classe Filomeno Francisco Xavier da Piedade e Sá; 2º Sargento Francisco de Barros Cardoso; 1º Cabo de Artilharia Felizardo Fernandes da Costa; Soldados de Artilharia João Clemente Lopes, 1º Cabo de Infantaria José Pacheco, Soldado Peio; Negociantes: Francisco Rodrigues, João José Rosa, Aníbal Gomes de Carvalho e José Duarte Ribeiro.

Guerra de Bissau em 1894 
O forte espírito tribal das gentes da Guiné e a sua forte propensão para guerrear e desafiar as autoridades, que não fossem as da sua própria etnia, aliado ao fraco dispositivo militar, muitas vezes dependente de militares sujeitos a castigos de deportação, quer da metrópole quer de Cabo Verde ou mesmo outra colónia, eram a causa, mais que natural, para haver variados confrontos com as autoridades do reino, instaladas na província.
Os gentios, das zonas de Geba e Mansoa, praticaram vários actos de pilhagem e desmandos, tentando inclusivamente investir conta a fortaleza de Bissau, provocando alarme entre os moradores.
Estes actos desprestigiavam o Governador da Província, pelo que este solicitou, à metrópole, o envio de uma força expedicionária que, em conjunto com as forças disponíveis da colónia, pudesse acabar com os desmandos.
Apoiado com as canhoneiras “Zaire”, “Lima”, “Mandovi”, “Zagala” e “Flecha”, e comandando a Companhia Expedicionária do Corpo de Marinheiros, da Companhia de Guerra da Angola e Guiné, secção de metralhadoras e bateria de artilharia, serviços de saúde e administrativos, assim como cerca de 600 auxiliares vindos de Farim e Geba, bateram os insubmissos de Bissau.

Foram louvados os seguintes oficiais, praças e civis:
• Comando: Coronel de Artilharia Luís Augusto de Vasconcelos e Sá; Estado-maior: Capitães Zacarias de Sousa Lage e Luiz da Costa Pereira Júnior, 2º Tenente da Armada Elísio Leitão Vieira dos Santos, e Alferes Alfredo da Cunha Tamegão.
• Armada Real - Companhia Expedicionária de Marinha: 1º Tenente Pedro de Azevedo Coutinho, 2ºs Tenentes Filipe Dias de Carvalho, Alberto Carlos Aprá, Júlio Lopes Valente da Cruz; Oficial de Metralhadoras: 2º Tenente João Francisco Diniz.
• Exército de Terra - Bateria de Artilharia de Montanha da Guiné: Capitão Jacinto Isla de Santos e Silva, Tenente Miguel Lourenço de Carvalho Peres; Companhia de Guerra de Angola e Guiné: Capitão Francisco José, Tenentes Aníbal da Silveira Machado Júnior e Manuel de Almeida, Alferes José Augusto da Graça Falcão, José Augusto da Conceição Velez, Miguel António Pimentel, e José Maria Severia; 2º Sargento Belmiro Ernesto Duarte Silva.
• Serviços de Saúde: César Gomes Barbosa, António Maria da Cunha e Alves de Oliveira.
• Serviços Administrativos: Tenente de Administração Militar António Caetano.
• Irmãs Hospitaleiras do Hospital de Sangue de Bissau: Maria Romana de Jesus, Lucinda de S. José e Lucrécia de S. José.

Bivaque de Forças da Marinha
© Foto: José Henrique de Mello

Operações em Oio e Farim em 1897
Numa deslocação efectuada em finais de 1892, entre Farim e Geba, o comandante militar de Farim Tenente de Infantaria Jaime Augusto da Graça Falcão, foi abordado pelo régulo Manhau, que era nosso aliado, que se queixou contra a gente de Mabouco que se haviam apoderado de terrenos seus. Ficou a promessa da tentativa de resolução do caso.
Regressado a Farim e voltando a ser solicitada a intervenção do comandante de Farim neste caso, foi resolvido deslocar-se, a Moxés, em Fevereiro de 1897, mas, antes de iniciar a deslocação, foi informado de que as gentes de Oio pretendiam assassiná-lo durante a deslocação. Face a esta informação, fez-se acompanhar por um grupo de cerca de 20 cristãos e mandingas, além de uma parte dos militares do seu destacamento, com uma metralhadora, apesar da sua missão ser de paz.
Quando esta força chega a Moxés, são informados de que as populações de Sassamboto, Massambó, Manacá, Unfaty e Miudadú pretendiam atacar a coluna, pelo que perante este facto, adquiriu pólvora para municiar os auxiliares que o acompanhavam. Porém, ao passar por Mabano, os cristãos de Cuçafora, pediram protecção ao Tenente Falcão, já que os amotinados os pretendiam, também, atacar.
Perante a gravidade da situação, manda vir de Farim uma peça Krupp e respectiva guarnição e munições, assim como mais munições para as armas Snyder, com que avançou sobre Mindadú, pondo os seus defensores em fuga.
Quando as tropas perseguiam os fugitivos, foram atacados pelos auxiliares recrutados que, matando ou ferindo soldados, lhes retiraram as armas, enquanto a metralhadora se encravou e a peça de artilharia se danificou, por o artilheiro ter efectuado um disparo com a culatra mal fechada.
A retirada foi inevitável, com o regresso a Farim, não sem serem atacados pelas gentes do Oio, que lhes causaram cerca de 25 mortos.
De imediato, o comandante de Farim organiza nova expedição, com as forças de que podia dispor no destacamento, sendo auxiliado por uma força de Bolama sob o comando do Alferes Luiz António e de uma força da guarnição de Gebo comandada pelo Tenente António Caetano com alguns auxiliares grumetes.

Grumetes auxiliares das forças portuguesas 
© Foto: José Henrique de Mello 

A coluna inicia a marcha em Abril de 1897, a caminho do Oio, vendo a sua coluna em Infomá, reforçada com auxiliares dos régulos Mamadí-Paté e Unfaly-Soucó a quem foram distribuídas armas Snyder e respectivas munições.
Ao aproximar-se de Gussará, o Tenente Falcão dispôs as forças em três colunas, colocando à sua esquerda 4000 indígenas sob o comando do régulo Mamadi-Paté; à direita e sob o comando do régulo de Carésse igual número de indígenas; estando ao centro os restantes 1000 indígenas e comandadas pelo régulo Unfaly-Soucó, além das forças regulares com a artilharia. Antes de efectuarem o assalto à povoação, fizeram fogo sobre a mata que antecedia a localidade onde, sem saberem, estavam acoitados cerca de 12.000 rebeldes.
Quando o fumo provocado pelo tiroteio desapareceu verificaram, com perplexidade, que os auxiliares tinham fugido levando, não só as armas que lhes estavam distribuídas, mas também os carregadores de armas e munições tinham desaparecido. Num pequeno espaço de tempo, uma força de mais de 9000 combatentes, viu-se reduzida a cerca de 200, restando apenas as forças regulares e moradores de Farim que se tinham voluntariado para acompanhar o Tenente Falcão.
A força com o efectivo drasticamente reduzido, pela deserção dos auxiliares, e sem munições, e alvo fácil para os rebeldes que, entre outros atingem de morte o Alferes Luiz António e o Tenente António Caetano. O comandante da força, Tenente Falcão, é ferido gravemente e cai inanimado junto de um arbusto. Quando recupera os sentidos, arrasta-se pela mata, afastando-se do local, até ser encontrado por um fula, que o leva até Matinguei, donde mais tarde será transportado para Farim.
Por proposta do Governo da Província foram louvados o Tenentes Jaime Augusto da Graça Falcão e António Caetano, assim como os civis G. Adams e Emílio Postal.

Embarque de auxiliares na guerra de Bijagós 
© Foto: José Henrique de Mello

Operações de pequena guerra na ilha de Canhambaque em 1900
Como em muitos outros locais da colónia, Canhambaque também não reconhecia a autoridade portuguesa.
Assim, a 23 de Outubro de 1900, o governador resolve mandar ocupar a ilha, pelo que dá instruções ao 1º Tenente da Armada Bernardo Francisco Diniz Ayalla que, no comando da canhoneira “Massabi” transporta a força de auxiliares para ocupação da ilha. Na operação toma parte a canhoneira “Flecha” que, sob o comando do 2º Tenente da Armada Artur Ernesto da Silva Pimenta de Miranda, previamente bombardeou a ilha, após o qual desembarcaram os auxiliares.

Foram louvados:
• O 1º Tenente da Armada Bernardo Francisco Diniz Ayalla e o 2º Tenente da Armada Artur Ernesto da Silva Pimenta de Miranda, e César Correia Pinto, Director da Alfândega de Bolama, pelo precioso contributo na organização de pessoal e materiais.

Operações militares em Janeiro de 1901
Estando o Governador da Província, 1º Tenente da Armada Joaquim Júdice Biker, na região de Bissau e Geba, toma conhecimento de uma rebelião por parte das gentes de Jafunco, pelo que manda organizar uma coluna com auxiliares das zonas, que comandará.
Deu indicações ao comandante militar da praça de Bissau, Tenente Diogo Medeiros Correia da Silva, para recrutar grumetes e organizar a coluna.
Na vila de Cacheu, o Tenente de 2ª linha Cleto José da Costa, foram recrutados grumetes, e César Correia Pinto também se incorporou na coluna, devido ao facto de gozar de prestígio entre os grumetes.
Estas forças eram apoiadas pelas canhoneiras “Cacongo“ e “Flecha”.
A coluna teve êxito com o castigo dos sublevados.

Distinguiram-se:
Condecorado com o grau de Comendador da Ordem da Torre Espada:
• 1º Tenente da Armada Joaquim Júdice Biker;
Condecorado com o grau de Cavaleiros da Ordem da Torre Espada:
• 1º Tenente da Armada Bernardo de Melo Castro Moreira, comandante de Canhoneira “Cacongo”; 2º Tenente da Armada Artur Ernesto da Silva Pimenta de Miranda, comandante da canhoneira “Flecha”; Tenente de Infantaria do Exército do Reino Diogo Medeiros Correia da Silva e Tenente de 2ª linha Cleto José da Costa.

Louvado:
• César Correia Pinto, Director da Alfândega de Bolama.

Operações militares em Oio em 1902
A noticia de que o gentio do Oio se tinha sublevado, chegou ao conhecimento do governador, 1º Tenente da Armada Joaquim Júdice Biker, em 18 de Março de 1902, pelo que organizou uma coluna, com as tropas disponíveis, auxiliares e a colaboração das canhoneiras “Massabi”, “Cacheu” e “Flecha”, batendo os rebeldes e infligindo-lhes pesadas perdas, restabelecendo a paz na área.

Foram louvados os seguintes oficiais, praças e civis: 
• Estado-maior: Major José Mateus Lapa Valente
• Armada: 1º Tenente Alberto Carlos Aprá comandante da “Massabi”, 2º Tenente Jaime Aurélio Wills de Araújo comandante da “Cacheu”, 2º Tenente Fernando Augusto Vieira de Matos comandante da “Flecha”, Facultativos (médico) de 1ª Classe José Nunes de Carvalho Noronha.
• Exército de Terra: Capitão Possidónio José Angelino, Tenente de Cavalaria Francisco Xavier Álvares, Tenente de Infantaria Diogo Medeiros Correia da Silva, Tenente de Infantaria João de Sousa, Alferes César Júlio Loureiro e António Joaquim dos Reis. 1º Sargento de Infantaria Augusto José de Lima Júnior, 1º Sargento Cadete de Infantaria Adolfo Varejão Pires Balaga e Soldado de Infantaria Julião Exposto.

Operações na região do Xuro em Cacheu em 1904
A população da região de Xuro sublevou-se e ameaçou sublevar as populações já submetidas ao Governo da Província.
De imediato o Governador 1º Tenente da Armada Alfredo Cardoso de Soveral Martins, organizou e comandou uma coluna, que seria apoiada pelas canhoneiras “D. Luiz”, “Cacongo”, “Cacheu” e “Farim”, dominaram por completo a região sublevada.
Tomaram parte na expedição, as seguintes forças:
• Armada: Canhoneiras - “D. Luiz”: 11 oficiais, 14 sargentos e 81 praças; “Cacongo”: 5 oficiais, 6 sargentos e 24 praças; “Cacheu”: 1 oficial, 1 sargento e 10 praças; “Farim”: 1 oficial, 1 sargento e 11 praças.
• Exército de Terra: 14 oficiais enquadrando as seguintes forças - Companhia de Infantaria da Guiné: 11 sargentos e 119 praças; Secção de Artilharia: 2 sargentos e 21 praças; Companhia de Saúde: 1 sargento e 5 praças.

Pelotão de Companhia Mista 
© Foto: José Henrique de Mello 

Oficias que tomaram parte na expedição e foram citados: 
Armada:
• Canhoneira “D. Luiz” – Capitão-tenente Pedro Berquó; 1º Tenente José de Campos Ferreira Lima, 2º Tenente José Augusto da Costa Tavares; Guardas Marinha: José Vítor de Sousa Peres Murinelo, Júlio César Nóbrega Pereira Júnior, Jerónimo Weinholtz Bívar, César Augusto de Oliveira Moura Braz, Ildemundo Tavares da Silva, Médico Naval Samuel Augusto Pessoa; Maquinista Condutor Frederico Augusto Tavares, Comissário Augusto Teixeira de Aguiar.
• Canhoneira “Cacongo” – 1º Tenente Bernardo de Melo e Castro Moreira; Guardas Marinha: José Vicente Lopes, Raul Álvares da Silva, Médico Naval Adolfo de Azevedo Souto, Maquinista Condutor Luiz Maria de Carvalho.
• Canhoneira “Cacheu” – 2º Tenente Fernando Augusto Vieira de Matos.
• Canhoneira “Farim” – 2º Tenente António Emídio Taborda de Azevedo e Castro.

Exército de Terra:
• Estado-maior: Major de Cavalaria José Mateus Lapa Vicente.
• Tenentes: José da Sacramento Monteiro, José Carlos Botelho Moniz, José Francisco da Rosa e João Sousa.
• Alferes: José Lúcio da Silva Júnior, Francisco Ferreira, Othon Carlos de Gouveia Vaz, Ezequiel da Fonseca Pereira e João Carlos Lobato de Faria.
• Facultativo de 2ª Classe João de Pinho e Cruz Júnior.
• Oficiais de 2ª Linha: Tenentes Domingos Laco e Alferes Feliz Dias e David Vieira

Também foram citadas as seguintes praças: Armada: 
• 2ºs Sargentos: João Duarte, Artur Augusto, Manuel Gonçalves de Carvalho Oliveira, Vitorino Gonçalves dos Santos e Francisco Exposto;
• Contramestres: Joaquim António Martins, João José da Silva, José Luiz, Francisco Maria de Oliveira e Reginaldo Gonçalves Martins;
• Condutores de Máquinas: António Sousa Marques, António Francisco da Cunha, Francisco Alberto dos Anjos, Jaime António da Silva, António José Duarte, António dos Santos Soares, Luiz Maria de Carvalho, António Lopes de Melo Simões, Eduardo António de Matos, João de Andrade, Joaquim José da Conceição e Francisco José Pereira.

Regulo e os seus ministros 
© Foto: José Henrique de Mello 

Exército de Terra 
• Sargento-ajudante João Caldeira Marques
• 1ºs Sargentos: António Pereira da Melo, Joaquim Félix, António Flores Covo, António Isidoro Serpa e Alfredo José das Dores Traburo.
• 2ºs Sargentos: Pedro Júlio do Rosário, Salvador Cipriano Ferreira, António José Monteiro Torres, Manuel Inácio, António Joaquim Pereira, João Alves, Joaquim Pereira, Francisco Maria, Francisco da Encarnação Pereira e Manuel Rosário Rodrigues.
Civis:
• Domingos Laco (Juiz do Povo de Bissau), Félix Dias (Juiz do Povo de Bolama), David Vieira (substituto do Juiz do Povo de Bissau); Chefes da Delegação Aduaneira: de Cacheu, Manuel Sebastião Correia; de Bissau, António Augusto Vieira Lisboa; Chefe do Posto Fiscal de Arama, Augusto Domingos da Costa;
Negociantes: António Silva Gouveia, José Monteiro de Macedo, Júlio António Pereira, Jean Durac, Carlos Pachen, Marino Barbosa Vicente e Teófilo Barbosa.

(Continua)
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Nota do editor:

Vd. poste anterior de 23 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11143: Para que a memória não se perca (1): Histórias da dobragem do século XIX para o século XX (José Martins)

Guiné 63/74 - P11152: Convívios (494): II Almoço da Tabanca Ajuda Amiga, dia 28 de Fevereiro de 2013 na Cantina da Associação de Comandos, Laje - Oeiras (Carlos Fortunato)

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Fortunato (ex-Fur Mil da CCAÇ 13), dirigente da ONGD Ajuda Amiga, com data de 24 de Fevereiro de 2013:

Caros amigos e camaradas
À mais jovem "Tabanca" de amigos da Guiné, inspirada nas amizades e convívios gerados a partir do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, vai realizar o seu almoço mensal na próxima 5ª feira, dia 28/2, entre as 12h45 e as 13h00.

O almoço é realizado sempre na última 5ª feira do mês na cantina da Associação de Comandos, sediada no Regimento de Artilharia de Costa, 3ª Bataria, na Laje, em Oeiras.

O caminho para a mesma é por Paço de Arcos, pela Avenida Engº Bonneville Franco (junto à Marginal perto da Escola Naval), no fim da avenida segue-se por uma estrada de terra batida, que termina na referida antiga unidade.

É um almoço de convívio entre associados da ONGD Ajuda Amiga, associação muito ligada à Guiné, antigos combatentes e amigos da Guiné, imbuído do espírito de solidariedade que tem caracterizado estas Tabancas.

O almoço da próxima 5ª feira é Entrecosto à Saloia ou Bacalhau à Brás e tem o custo de 9 euros.

Devem ser feitas reservas o mais tardar até 4ª feira às 12h00, para o 917 248 557 Sra. Marília ou 934 125 679 Sra. Sónia, indicando o prato pretendido (para o mesmo poder estar assegurado).

As noticias sobre estes almoços podem ser consultadas: 
http://pt-pt.facebook.com/pages/Tabanca-Ajuda-Amiga/
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2013/02/guine-6374-p11056-convivios-490.html http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2013/01/guine-6374-p11019-ser-solidario-140.html
http://ajudaamiga.com.sapo.pt/noticias.html

Um alfa bravo e até 5ª feira
Carlos Fortunato

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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 22 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11136: Convívios (493): A magnífica Tabanca da Linha vai reunir no próximo dia 7 de Março em Alcabideche (José Manuel M. Dinis)

Guiné 63/74 - P11151: Notas de leitura (459): "Olhares Sobre Guiné e Cabo Verde", organização de Manuel Barão da Cunha e José Castanho (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Janeiro de 2013: 

Queridos amigos,
Chegámos ao termo da recensão do importante livro “Olhares sobre Guiné e Cabo Verde”.
Nesta reta final, destaque para os textos sobre a Força Aérea na Guiné, alguns textos avulsos aonde se fala da queda de um helicóptero no rio Mansoa, de alguém que viu quase em direto o que se passou no Pidjiquiti em 3 de Agosto de 1958 e que tinha no seu pelotão Domingos Ramos, um futuro herói do PAIGC, e também se recorda o extravagante soldado Roseta, um desertor crónico.
E coube-me a honra de resumir as grandes linhas de força da literatura da guerra da Guiné.

Um abraço do
Mário


Olhares sobre Guiné e Cabo Verde (3)

Beja Santos

“Olhares sobre Guiné e Cabo Verde”, com organização de Manuel Barão da Cunha e José Castanho Paes, DG Edições e Caminhos Romanos, 2012, é uma iniciativa singular para a qual convergiram, nomeadamente, antigos combatentes dos três ramos das Forças Armadas. Em textos anteriores, fez-se referência a considerações genéricas na envolvente da luta armada, ventilaram-se as atividades terrestres da Guiné, incluindo as forças de intervenção. E iniciou-se a exposição referente ao papel da Marinha na Guiné, que pela sua organização e rigor é um dos “pratos de substância” desta obra coletiva.

Recorda-se um destemido comandante, o Comodoro Francisco Ferrer Caeiro, chegado à Guiné em Setembro de 1974, assim apresentado: “Era tido como um militar exigente tanto para consigo próprio como para os outros. De carácter reto e firme mas também emotivo, tão temido quanto respeitado pelos seus subordinados, era, em suma, um líder inato”. Fez questão de acompanhar os Fuzileiros nas suas operações, comunicou este seu desejo aos respetivos comandantes, mas impondo condições como a de os comandantes dos destacamentos durante a operação serem eles, ele ficaria na posição de mero observador. Era muito cioso da sua preparação física e numa dessas preparações aconteceu que o Comodoro se meteu pela berma da estrada que liga Bissau ao Aeroporto, passou uma viatura militar que abrandou e alguém fez-lhe esta generosa oferta: “Ó velhote, queres uma boleia?”. São mencionadas as operações Tridente, Tulipa, Tornado e Remate, foi na operação Tulipa que se deu um lamentável incidente em que um piloto de um avião T6 supôs ter referenciado um grupo inimigo e lançou rockets sobre a posição dos Fuzileiros. A Operação Via Láctea entroncou uma lógica da contra-penetração iniciada em 1968 por Spínola ou seja, o estabelecimento de operações de longa duração sobre as principais linhas de penetração, provindas do Senegal e da Guiné-Conacri. Os Fuzileiros a partir do rio Cacheu dirigiram-se a Jagali Balanta para intersectar grupos vindos do Senegal. Tratou-se da primeira operação do então primeiro-tenente Vieira Matias, hoje almirante, que narra este seu batismo de fogo com espírito de humor. O mesmo Vieira Matias irá descrever uma operação no santuário de Sambuiá e seguidamente a Operação Grande Colheita onde se fez a apreensão de uma quantidade impressionante de munições. Descreve-se e comenta-se mais adiante a Operação Mar Verde e faz-se o reparo para as consequências negativas que a mesma teve no isolamento de Portugal.

Depois de este bem documentado dossiê sobre o papel da Marinha na guerra da Guiné. Segue-se a explanação sobre o desempenho da Força Aérea. Permite-se ao leitor não iniciado ficar a conhecer a evolução nos anos 1960 e 1970 das bases e aeródromos, o tipo de aviões utilizados e o golpe duro que foi a retirada dos aviões F-86, obrigando a uma solução alternativa. Explica-se o papel da artilharia antiaérea inimiga e como a nossa Força Aérea pode calar este armamento. Quanto às zonas de intervenção, refere-se, o acompanhamento dos comboios fluviais, as atividades que lhe eram cometidas nas zonas de livre intervenção para a Força Aérea (ZLIFA), as operações helitransportadas.

Mais adiante retoma-se a questão da artilharia antiaérea que passara a ser uma realidade a partir de 1967. A primeira artilharia foi instalada no Cantanhez. Em Março de 1968 é avistada pela primeira vez uma quádrupla ZPU-4 de 14.5mm, com outras armas à volta, na zona de Cassebeche. Foi destruído no dia seguinte. O próximo episódio irá acontecer junto ao Corredor de Guileje, em Junho de 1968, foi detetada uma zona pejada de artilharia antiaérea. Em Março de 1969 irá descobrir-se que a zona de Cassebeche, no Quitafine, estava novamente pejada de armas, foram progressivamente eliminadas. Em Maio de 1970, o PAIGC, através de militares cubanos trouxe de Kandiafara canhões, que se supõe de 37mm, fez-se nova operação e dias depois concluiu-se que as armas ou que delas restavam tinham sido levadas para Kandiafara. A componente radical serão os mísseis Strela que chegarão à base naval soviética em Conacri em número de 44, com uma recomendação muito especial “que os portugueses nunca fiquem na posse de nenhum”, pois tal arma só tivera uso no Vietname. A resposta portuguesa foi a encomenda dos mísseis franceses terra-ar Crotale, para defesa aérea de Bissau e estava também planeada a aquisição de uma esquadra de aviões Dassault Mirage V. Os mísseis Strela impuseram algumas restrições de voo. O autor escreve a propósito do Strela: “Queria referir um pormenor que me parece digno de nota e está relacionado com a apresentação voluntária, vulgo deserção, de um dos operadores do Strela que se apresentou numa instalação militar em Tite, tendo sido transportado para a Base Aérea de Bissalanca, a fim de ser interrogado. A sua colaboração foi preciosa e tudo o que nos transmitiu refletiu-se numa ajuda que complementou os dados que já tínhamos. A restrição na operação do míssil Strela, dada pela curta duração das pilhas de Mercúrio que alimentavam o mecanismo de disparo, foi ele que a forneceu”. O autor refere-se ainda às conversações tidas em Cap Skirring entre Spínola e Senghor e outras dirigentes senegalesas, bem como à morte do prestigiado Cherno Rachide Djaló, à última troca de prisioneiros, em Setembro de 1974 e por fim à comemoração da independência da Guiné-Bissau, em 24 de Setembro de 1974.

Finda a exposição da Força Aérea, seguem-se outros olhares sobre a Guiné, em que o repórter Fernando Farinha narra a sua experiência na queda do helicóptero no rio Mansoa, em Julho de 1970, ele seguia no helicóptero atrás, bem sofreu com a agitação provocado pelo tornado que pôs o helicóptero aos saltos e refere as conversas havidas nessa manhã fatídica com os deputados Leonardo Coimbra, Vicente de Abreu, Pinto Leite e Pinto Bull; o coronel José da Câmara Vaz Serra conta o que viveu, em 1959, com o chamado massacre do Pidjiquiti, os dados que obteve foi de que tinha havido entre 10 e 12 mortos, responsabilidade da polícia, constituída por elementos nativos, seguramente mal enquadrada e incapaz de sangue-frio diante de tanta agitação. Lembrem-se de Domingos Ramos que era o porta-guião do Centro de Instrução Civilizados e mais tarde herói do PAIGC; e refere com bonomia as peripécias do Roseta porventura o mais persistente desertor que tivemos, fugia, dava-se mal no país de acolhimento, voltava e desertava novamente. O médico João Sequeira conta a história de um velho mandinga, um prisioneiro que foi posto à sua guarda, nunca mais esqueceu o olhar que o ancião lhe deitou quando foi levado para interrogatório.

Finalmente, depois de esclarecidos olhares sobre Cabo-Verde, matéria que não pode ser objeto desta recensão, chega-se a um punhado de considerações de minha autoria sobre a literatura da guerra da Guiné, desde 1963 à atualidade, são apreciações que remetem para o meu livro “Adeus, até ao meu regresso”, publicado pela Âncora Editora, em 2012. Tudo começa com "Tarrafo", de Armor Pires Mota, e o diário de Jero, sobressai nomes, nesta fase inicial, como Barão da Cunha, alguns repórteres do regime, como Amândio César e um importante ensaio “Guerra na Guiné”, de Hélio Felgas. No fim da década desponta uma figura incontornável, Álvaro Guerra. A seguir ao 25 de Abril, veio a irreverência e o formidável "Lugar de Massacre", de José Martins Garcia. Seguem-se os anos de 1980, chegou a primeira hora da intimidade dos relatos: Álamo Oliveira, José Brás e Cristóvão de Aguiar, a seguir abre-se larga margem para a literatura de memórias, talvez o filão mais rico de toda esta literatura. Mas há a História, a reportagem, escassa poesia, alguns diários. Surgiu uma obra-prima da literatura: "Estranha noiva de guerra", do escritor mais persistente, Armor Pires Mota. No novo século perfilaram-se três livros de memórias, documentos importantíssimos, saídos do punho do Comando Amadú Djaló, do sargento-mor Talhadas e do coronel para-quedista Moura Calheiros.

Às vezes parece uma literatura semiclandestina, edições de autor que escapam ao circuito das livrarias. Certo e seguro, há que contar com mais surpresas, como escrevi no final do meu texto: “Até ao lavar dos cestos, até estar vivo o último militar que combateu na Guiné, há que contar com as surpresas da vindima, não há mês que não surja um título, um depoimento, um olhar sobre aquela guerra que se travou enquanto se caminhava na farroba de Lala, entre cipós e tabás, a patinhar no tarrafo, nas emboscadas montadas em florestas secas densas, militares apoitados atrás do baga-baga, a resistir à fúria das emboscadas, ou dentro dos aquartelamentos, imprecando em noites de flagelação destruidora. Fiquemos descansados, haverá surpresas, este género literário está muito longe de ter fechado para obras e muito menos para mudança de ramo”.
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Nota do editor:

Vd. postes anteriores de:

18 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11111: Notas de leitura (457): "Olhares Sobre Guiné e Cabo Verde", organização de Manuel Barão da Cunha e José Castanho (1) (Mário Beja Santos)
e
22 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11134: Notas de leitura (459): "Olhares Sobre Guiné e Cabo Verde", organização de Manuel Barão da Cunha e José Castanho (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11150: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (1): O meu diário (José Teixeira, ex-1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Parte I): Buba, julho de 1968




Guiné > Região de Quínara > Buba > Maio de 1969 > A povoação (à esquerda) e o aquartelamento (à direita) vistos de helicóptero... Buba, a sul do Rio Corubal, forma um triângulo com Xitole e Fulacunda, nos outros dois vértices. É banhada pelo Rio Grande de Buba.  Buba era posto administrativo. Circunscrição (ou concelho): Fulacunda. Era também sede de batalhão. Foto do álbum do Zé Teixeira.

Foto: © José Teixeira (2005). Todos os direitos reservados.



[Foto à esquerda: Vila Nova de Gaia, Madalena, véspera de Natal de 2005: da esquerda para a direita, LG, A. Marques Lopes, Zé Teixeira, Albano Costa, Hugo Costa e Xico Allen]


1. O nosso blogue vai fazer 9 anos no dia 23 de abril de 2013. Vamos comemorar essa efeméride, solicitando o envio de novos textos, fotografias e documentos inéditos, mas também republicando outros que merecem nova visibilidade... É o caso do "diário" do Zé Teixeira...

O Zé Teixeira não precisa de apresentações: é um dos rostos da solidariedade dos ex-combatentes da guerra colonial em relação a essa terra, verde e vermelha, que se chama Guiné, e ao seu povo, humilde e maravilhoso, de quem continuamos amigos e irmãos. O Zé é um dos "homens grandes" da Tabanca de Matosinhos, e um dos animadores do seu blogue, cujo primeiro poste foi publicado em 19 de novembro de 2008.

Se não erro - e eu não confio muito na minha memória -, conheci-o, na Madalena, Vila Nova de Gaia, nas vésperas do Natal de 2005, quando ele foi fazer-me uma visita à casa dos meus cunhados onde costumo passar o Natal, com a Alice, a Joana e o João. Por acaso ele também tem (ou tinha) um cunhado que vive por aquelas bandas. Ele, que mora em São Mamede de Infesta, Matosinhos, vinha acompanhado de mais camaradas da primeira hora: o A. Marques Lopes, o Xico Allen e o Albano Costa (mais o seu filho Hugo). Estava aqui o embrião da futura Tabanca de Matosinhos, só faltava o Álvaro Basto, que é hoje o "régulo"...


[Foto à direita: O Zé Teixeira, em Empada, 1969. Um 1º cabo aux enf, devidamente equipado: a G3 numa mão, a fita da HK 21 a tiracolo e a mala de primeiros socorros às costas]


Na altura da criação da Tabanca de Matoisnhos escrevi o seguinte, em apoio a esta iniciativa que foi, historicamente, o ponto de partida para a criação de outras tabancas, nascidas a partir da nossa Tabanca Grande:

20/11/20008:

Álvaro e demais amigos e camaradas da Tabanca de Matosinhos: Assumimos com grande alegria a paternidade da criança, mas as mães são...vocês, seus grandes malandros!... Nem sequer houve barrigas de aluguer nem foi precisa a inseminação artificial!... Tudo muito natural, à moda em antiga, sem parteira, só com aparadeira... 

O parto correu bem e a criancinha é perfeitinha, é isso que se deseja. Só espero que seja muito melhor do que o pai... e as mães...

Tenho que reconhecer que vocês são mesmo um caso sério, um verdadeiro 'case study', estudo de caso, como dizem os nossos gestores. Os campeões da convivialidade e da camaradagem! E mais: uma tabanca a valer,onde há portistas, leixonenses, boavisteiros, benfiquistas, sportinguistas, e até belenenses, ao que sei!

Que o vosso belo exemplo se multiplique por mil... e que a vida seja generosa para todos vós, camaradas da Tabanca de Matosinhos, de modo a poderem ver a criancinha andar, falar, escrever, crescer, e por aí fora... Aguentem-na (e aguentem-se...) pelo menos até à idade de ela... ir às sortes. E que tenha mais sorte que a vossa/nossa, nessa idade...

Prometo no Natal celebrar o acontecimento, aí no novo reordenamento do Milho Rei... Não sei se consegurei estar aí no dia 19, mas que vai ser festa de arromba, vai, a avaliar pelo anúncio que li... Vou passar a Consoada na Madalena e depois sigo a 26 para a Madeira... (...)

 
Um Alfa Bravo para todos. Luís Graça. (...)

2.  Entre finais de 2005 e princípios de 2006, o Zé Teixeira [, foto á esquerda, ] começou a escrever com regularidade no nosso blogue (I Série, que vai de 23 de abril de 2004 a 1 de junho de 2006, e onde se publicaram 825 postes). O nosso destaque vai para a série "O meu diário" que voltamos a reproduzir,  já que a grande maioria dos amigos e camaradas da Guiné (hoje mais de 600, seis vezes mais do que na época)  não tiveram oportunidade de conhecer as venturas e desventuras do Zé por terras de Quínara e Tombali (*)... È bom que se diga que foi o primeiro diário de guerra que chegou ao blogue, e que logo publicámos (em 19 postes), no 1º trimestre de 2006.


 Escrevemos na altura: (...) "Além de ser um notável documento humano - escrito por um homem dos serviços de saúde militares, um enfermeiro de campanha, que estava sujeito aos mesmos riscos que qualquer operacional -, [este diário] tem um grande interesse documental para melhor se conhecer o quotidiano dos militares portugueses no sul da Guiné:

"Fui enfermeiro de campanha na CCAÇ 2381. Fui para a Guiné em fins de Abril de 1968 e regressei em Maio de 1970. Estacionei cerca de 3 meses em Ingoré, no Norte, onde a companhia fez o seu treino operacional. Seguimos depois para Buba e fixámo-nos em Quebo (Aldeia Formosa), [no final de Julho de 1968].

"Aí a CCAÇ 2381 teve como missão fazer escoltas de segurança às colunas logísticas de abastecimento entre Aldeia Formosa/Buba e Aldeia Formosa/Gandembel, ao mesmo tempo que garantia a autodefesa de Aldeia Formosa, Mampatá e Chamarra.

"Regressámos a Buba, em Janeiro de 1969, para servirmos de guarda às equipas de Engenharia que construiram a estrada Buba/Aldeia Formosa. Face ao desgaste físico/emocional fomos enviados, a partir de 1969, para Empada onde vivemos os últimos meses de Comissão". (**)


3. O meu diário (José Teixeira, 1º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba e Empada, 1968/70) (Parte I): Buba, Julho de 1968 

 PRÓLOGO

Buba, 20 de Julho de 1968

Após dois meses e vinte dias de vivência em estado de guerra na Guiné, inicio o meu DIÁRIO que não é "diário". Nele apontarei somente os casos ou situações mais importantes do meu dia a dia para a história da minha vida .

NOITE

Buba, 20 de Julho de 1968

Noite escura...
A chuva cai fortemente,
Atiçada pelo vento impiedoso.
O capim dobra-se
Em homenagem àquele grupo de valentes
Que, esgotados pela longa espera,
Sedentos e esfomeados,
Aguardam impacientes
A ordem de retirar.
Os donos da selva surgem,
Traiçoeiros, em massa.
Por largos momentos, o matraquear das automáticas,
O rebentar das granadas.
Os gritos de algum ferido.
Tudo fazem esquecer.
Trava-se uma luta de vida ou de morte.
Até que as armas se calam.
O Inimigo foge,
Protegido pela escuridão.
... E vinte jovens,
Valentes, decididos,
Dedo firme no gatilho,
Ouvido atento,
Lá se vão a caminho do Quartel,
Com mais uma missão cumprida.


Buba, 21 de Julho de 1968

Agora me lembro, hoje é domingo... Saí às cinco da manhã em patrulha de reconhecimento à estrada de Aldeia Formosa. Voltei a Buba onde assento desde ontem pelas treze e trinta, depois de uma marcha de cerca de vinte quilómetros debaixo de sol abrasador. O resto da tarde foi para dormir, estava completamente esgotado.

Buba, 22 de Julho de 1968


Começou a guerra a sério para mim. Ainda esgotado pelo esforço de ontem, saí às seis da manhã para esperar a coluna vinda de Aldeia Formosa (Quebo). Às oito embosquei junto à "ponte interrompida" e por volta das doze recebi ordem para avançar. A coluna aproximava-se. Ouvi dois rebentamentos e fiquei preocupado... Será que a coluna foi atacada ?...

Cerca das dezassete deu-se o encontro de forças e soube então que detectaram cinco minas anticarro, duas das quais rebentaram.

Todos alegres, voltamos a Buba com o simples café, a camisa molhada de chuva e suor à mistura.
Ainda mal tinhamos chegado quando o IN apareceu a baptizar a Companhia, atacando de canhão sem recuo, morteiro e "costureirinha" [, PPSH]. Tentou durante alguns minutos arrasar Buba, o que não conseguiu por fraca pontaria ou porque não quis.

Deitado na vala e a aguentar uma tempestade de chuva, completamente nu (,fui apanhado a tomar banho,) assim esperei que acabasse a "festa", para ir jantar.

Que espectáculo! Centenas de corpos (,muitos deles nus,) encharcados, mas alegres, saíam das valas... Mais uma vez escaparam...

Encontrei três colegas da recruta. À noite, vieram-me procurar. Encharcados pela chuva, cansados da coluna, com receio de novo ataque, queriam dormir e não tinham onde...

Também eles estão nesta guerra. Nove meses já se passaram, a meta final aproxima-se, mas quantos sacrifícios lhes vão ser exigidos ainda ?

(Continua)




Guiné > Região de Quínara > Mapa de Xitole (1955) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Buba (quartel e aquartelamento, sede de batalhão)... e estrada Buba - Mampatá - Quebo.


Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

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Notas do editor:

(*) Vd. I Série, o último poste de 19 postes > 14 Março 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVI: O meu diário (Zé Teixeira) (fim): Confesso que vi e vivi

(**) Vd I Série, poste de 15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXIII: CCAÇ 2381 (Buba e Empada, 1968/70) (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P11149: Parabéns a você (540): Gumerzindo Silva, ex-Soldado Condutor Auto da CART 3331 (Guiné, 1970/72)

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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 24 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11144: Parabéns a você (539): Manuel Henrique Quintas de Pinho, ex- Marinheiro Radiotelegrafista das LDM 301 e 107 (Guiné, 1971/73)

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11148: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (5): "Alfero di canhão"

1. Mensagem do nosso camarada Vasco Pires (ex-Alf Mil Art.ª, CMDT do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72), com data de 17 de Fevereiro de 2013:


FANTASMAS DO FUNDO BAÚ


5 - "Alfero di canhão"

Caros Luís Graça/Carlos Vinhal,
Chegaram algumas fotos de São Paulo, mal armazenadas, não estão em boas condições.
Tentei recuperar umas poucas. Acredito que esta foto foi tirada poucos dias depois da minha chegada. Em primeiro plano o então Capitão de Artilharia Rodrigues Videira, que muito me ajudou nestes primeiros tempos de guerra. Acredito que o segundo, da esquerda para a direita, atrás, é o oficial que eu fui substituir. Foi tão rápido o nosso contacto, que não posso ter certeza. 

Nós, oficiais e sargentos da Artilharia da Guiné, nos considerávamos injustiçados, pois, o restante da tropa ia para casa ao fim de vinte e um meses, e muitos de nós ultrapassávamos os vinte e quatro, à espera de substituto, foi o caso deste oficial de Artilharia, que já tinha mais de vinte e quatro meses. Assim quando eu cheguei, ele foi no primeiro voo.

Um periquito em Gadamael... e a velhice da CART 2478

Quanto à praxe, foi suave, acredito que foi fundamental a ajuda do meu saudoso amigo Augusto Pereira Alegre, que era um dos donos das Caves Monte Crasto, ele tinha sido da Companhia de Comandos do então Capitão Neves, conhecia pois as agruras africanas. Deu ordem à Casa Gouveia, para me entregar uma caixa de espumante, foi pois em "espécie líquida" que "paguei" o meu pedagio (portagem) de entrada nesse "paraíso" às margens do Rio Sapo. Um longo caminho, Mafra, Vendas Novas, Figueira da Foz, Bissau, e enfim Gadamael!!!

Foi também nessa data que soube, que o pessoal da EPA tinha-se enganado sobre o meu posto, o correto era "Alfero di Canhão"!

Sendo informado que o meu posto era "Alfero di Canhão"!

Forte abraço
Vasco Pires
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Nota do editor

Vd. último poste da série de 31 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11033: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (4): Quem vem lá?

Guiné 63/74 - P11147: Memória dos lugares (218): Olossato, anos 60, no princípio era assim (4) (José Augusto Ribeiro)

1. Quarta série de fotos do Olossato que o nosso camarada José Augusto Ribeiro (ex-Fur Mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal,  Outubro de 1963 a Julho de 196464) e Guiné (Olossato) (Julho de 1964 a Outubro de 1965), nos enviou em mensagem do dia 13 de Fevereiro de 2013.


MEMÓRIA DOS LUGARES

OLOSSATO - O princípio (4)


Foto 121 > Sem legenda

Foto 122 > Sem legenda

Foto 123 > Sem legenda

Foto 153 > Alferes e furriéis do 1.º GCOMB

Foto 154 > Furriel e Cabos de uma Secção do 1.º GCOMB

Foto 155 > Uma sardinhada

Foto 156 > Depois da sardinhada vem a limpeza

Foto 157 > Refeitório dos Sargentos

Foto 158 > Um pombo verde deu origem a um petisco

Foto 159 > Equipa de futebol

Foto 160 > Depois do futebol reina a boa disposição

Foto 161 > Obus

Foto 162 > Obus

Foto 163 > Sem legenda

Fotos: © José Augusto Ribeiro (2013). Direitos reservados
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Nota do editor:

Vd. poste anterior de 22 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11137: Memória dos lugares (216): Olossato, anos 60, no princípio era assim (3) (José Augusto Ribeiro)

Vd. último poste da série de 23 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11139: Memória dos lugares (217): Cameconde, Cacoca, Sangonhá e Ganturé, em 1968, ao tempo da CART 1692 (António J. Pereira da Costa)

Guiné 63/74 - P11146: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (26): 27.º episódio: Memórias avulsas (8): Alto e pára a guerra

1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 5 de Fevereiro de 2013, enviou-nos mais esta história para publicar na sua série "Os melhores 40 meses da minha vida".


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA (26)

GUINÉ 65/67 - MEMÓRIAS AVULSAS (8)

ALTO E PÁRA A GUERRA

A partir de 17/5/1966, primeira data trágica para a CCAÇ 1422, ficou esta como que hibernada durante um mês. As ordens vindas do Comando do Batalhão sediado em Bula e não do nosso 1858, que andava lá por baixo em Catió, foram bem claras: nada de saídas para o mato; dediquem-se a terminar a construção do aquartelamento (havia sido iniciada pela CCAÇ 1421); patrulhamentos só de protecção às colunas de abastecimentos - mas não passem para lá dos carreiros - local a 3 Km na "estrada" para Mansabá e onde o horror se havia dado.

Não queria dizer contudo, que não fossem destacadas uma ou duas Secções para acompanhar grupos que nos viessem ajudar a pacificar os campos circundantes, que foi o que se deu, como descrito na anterior crónica "Inventámos o Santo António".

O acontecimento que narramos abaixo, passou-se precisamente no regresso desse passeio pedreste. Já com a bolanha cheia pela maré e em local desabrigado, e como tal propício a vários perigos dada a exposição, atravessou-se à minha frente, um não menos perigoso individuo do sexo masculino (como mais tarde confirmámos), grande... escamoso e a quem chamavam "o crocodilo".

Ele ia... e roçava-se pelo meu belo camuflado à prova d'água; ele vinha... de boca aberta e reincidia no roçar-se; e repetiu... repetiu... repetiu, até que me enervei e pedi à rapaziada amigalhaça para que me segurassem os canhões, e fui-me à fera, desarmado e tudo e nem faca de mato usei, creiam.

Só lhes disse, ao voluntariar-me, heroicamente, confesso:
-Este gajo tenciona morder-me, coisa de que não gosto, e assim sendo a primeira dentadinha serei eu a dar.

Qual intrépido acagaçado, apanhei o anfíbio pela lombada e rodopiámos nas sujas e lamacentas águas... ora eu por baixo, ora ele por cima (sic), mas que venci a besta reptiliana... lá isso... venci e os aplausos foram a demonstração para quem tivera as coragem e valentia, para enfrentar tão temível e bera sáurio, quiçá com risco da minha própria vida... disse.

O bicharoco era enorme, prái uns 60 centímetros e ainda mamava.
Considerado foi, prisioneiro de guerra e para além dum burro, era o meu segundo troféu.

Aberta uma piscina ao lado da minha suite, ali o prantei e todos o mimámos, dando-lhe também do leite condensado que fazia parte das refeições matinais, usando um biberão com tetina apensa no bocal da garrafa, evidentemente. Viveu apaparicado até ao fim da época das chuvas, desaparecendo depois vitimado sabe-se lá do porquê e foi com tristeza que o esventrei, salguei e sequei ao sol e hoje ainda me acompanha transformado que está em cinto.

Com poucos afazeres a não ser os triviais e dentro daquela languidez com que agora vivíamos, entretivémo-nos também a prestar atenção à vida selvagem dali.
Tanto assim que acolhemos umas cabras, conhecidas por "isso do mato" e que seriam resultantes do cruzamento de gazelas, com bodes compíscuos.

Tal miscibilidade deu origem a uns belos assados em forno de lenha, ou em brasas de lume, não sem que antes marinassem 12 horas e fossem esfregadas com manga de piri-piri e chaibéu.

Com as fressuras, criámos um prato típico conhecido lá na zona, por "chanfana à Saliquinhedim". E para que aos outros "comíveis" nada parecesse mal, também lhes permitíamos que convivessem com as nossas frigideiras e vai daí, tadinhos dos pombos verdes... das cinzentas rolas... dos coelhitos, quando se atreviam a passar pelo ponto de mira de qualquer vulgar G3.

Ficaria mal não falar dos macacões , qu'os havia de várias cores e tamanhos. Os mais pequeninos viviam agarrados às mães o que significava serem presa fácil para os predadores humanos que nelas atiravam para os surripiar. Depois era só domesticá-los o que acontecia se levassem porrada.
Vi e nem acreditava, mas na verdade o estilo era mesmo esse do "quanto mais me bates mais gosto de ti".

Dos "crocodis" esqueci-me de mencionar que os seus bifes são um petisco de se lhe tirar o chapéu, Provei em Bissorã e comi dezenas deles em Farim, onde os caçavam diariamente, mesmo ali às bordas do rio, mais propriamente para lhes aproveitarem as peles que alguns de nós, e ao regressar, trazíamos para ofertar às queridas. Por mim falo, que trouxe uma com 5 metros que me custou mil e quinhentos pesos, ou seja o equivalente a trinta garrafas de "Cavalo Branco" ou a quinze serviços de café casquinha d'ovo.

(continua)

OBS: - A foto retirada da internete para ilustrar a estória do nosso camarada Veríssimo Ferreira, não deslustra de modo nenhum a prova da sua coragem e valentia aqui relatada.
O editor
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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 3 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11047: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (25): 26.º episódio: Memórias avulsas (7): 13 de Junho de 1966, inventámos o Santo António

Guiné 63/74 - P11145: O nosso livro de visitas (163): Sónia Miranda, filha do nosso camarada, já falecido, Francisco Pacheco Miranda, ex-1º cabo, presumivelmente da CCAÇ 274, mobilizado pelo BII 18, Ponta Delgada (Fulacunda, 1962/64) (José Martins)



1. Texto do nosso colaborador permanente José Marti8ns [, foto à direita]:

Da leitora Sónia Miranda e datado de 22 Fevereiro, pouco após as 22 horas, foi recebido pelo Administrador o seguinte e-mail:

“Boa tarde,
Hoje deparei-me com o seu blog. Fiquei muito emocionada porque o meu pai 1º Cabo Francisco Pacheco Miranda - S. Miguel Açores - embarcou para a Guiné a 17/01/1962 Companhia de Caçadores 244 (salvo erro) e foi ferido gravemente a 05/08/1963. Sendo que foi Deficiente das Forças Armadas até 07/10/2012,  dia em que faleceu com um tumor cerebral na zona onde foi ferido na guerra.Temos algumas fotos em casa que depois posso digitalizar e enviar-lhe. Que continue o bom trabalho de manter viva a memória de todos os Ex-Combatentes, e que para nós filhos fará parte sempre da nossa história.

O meu bem haja!”


2. Menos de 24 horas depois, este e-mail caía na minha caixa de correio:

"Zé: Vê se descobres a companhia... Da CCAÇ 244, não temos ninguém... Dá uma resposta à menina, como tu sabes fazer... É para publicar... Um abração. Luís” 

3. Pois bem. Vamos avançar para uma informação à nossa amiga, filha de um dos nossos camaradas de armas, que já pertence ao “Batalhão Celeste”!

Não existindo a Companhia de Caçadores nº 244, tentei encontrar uma outra unidade cujo número fosse o “DOIS-QUATRO-QUATRO”.

Trata-se do Destacamento de Manutenção de Material nº 244, mobilizado na Companhia Divisionária de Manutenção de Material, aquartelado no Entroncamento, que iniciou a sua comissão de serviço em Janeiro de 1962 e terminou a mesma em Novembro de 1963, tendo estado estacionado em Bafatá.

Quanto a Companhias de Caçadores, existem duas companhias: a 273 do Batalhão Independente de Infantaria (BII) nº 17 de Angra do Heroísmo e a 274 do BII nº 18 de Ponta Delgada, ambas embarcadas a 17 de Janeiro de 1962 e com regresso em 17 de Janeiro de 1964, com a missão cumprida.

Como nos nossos registos consta que estas unidades não têm história no Arquivo Histórico Militar, mesmo querendo, era impossível obter mais dados.

Encontramos uma referência ao Francisco Pacheco Miranda no livro do nosso, também saudoso, camarada de armas Fernando de Sousa Henriques, no seu livro “No Ocaso da Guerra do Ultramar", na página nº 405, incluído na listagem dos portadores de deficiência adquirida na guerra e inscritos na ADFA-Açores.

As unidades referidas, encontram-se mencionadas no post 11018 - 23 de Janeiro de 1963 - O Fim do Principio ou o Principio do Fim - 50 anos depois (II Parte).

Sugere-se a nossa amiga Sónia Miranda que, junto da “papelada” que o seu pai deve ter deixado ou junto da ADFA tentar saber qual a unidade a que o pai pertenceu, afim de tentarmos encontrar alguém da mesma unidade e, com as fotos que não deixará de nos enviar para publicação, prestarmos a nossa homenagem a mais um camarada de armas que partiu.

Guiné 63/74 - P11144: Parabéns a você (539): Manuel Henrique Quintas de Pinho, ex- Marinheiro Radiotelegrafista das LDM 301 e 107 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 23 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11138: Parabéns a você (538): José Carlos Pimentel, ex-Soldado TRMS da CCAÇ 2401/BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)