quinta-feira, 2 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14827: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (III Parte): Morreu-me um gajo ontem

1. III Parte de "Guiné, Ir e Voltar", enviado no dia 27 de Junho de 2015, pelo nosso camarada Virgínio Briote, ex-Alf Mil da CCAV 489 (Cuntima), e Comando do 2.º curso de Comandos do CTIG (Brá), CMDT do Grupo Diabólicos (1965/67).


GUINÉ, IR E VOLTAR - III

Morreu-me um gajo ontem

Dói-te um dente, aonde, ora deixa ver.
Nada que eu possa fazer aqui, vocês pensam que vêm para aqui tratar os dentes, mal vai a guerra quando já mandam pessoal com defeito, rosnou o doutor. Só em Farim! Quando for dia de dentista, sei lá quando!
Dias depois, sentado debaixo de um enorme poilão1, em Farim, à espera da vez, o cabo enfermeiro percorria a fila dos sofredores, picando este e aquele enquanto o médico dentista, mais atrás, ia arrancando os dentes. Quando chegou a vez dele, o dentista de alicate na mão mandou-o abrir mais a boca. Dói-lhe aqui, é? Grande abcesso! Não posso fazer isto aqui, só em Bissau. E tem que tomar um antibiótico, primeiro.

Em Bissau outra vez, com menos um dente, à porta da 1.ª Rep, no QG, esperava pela guia de marcha de regresso a Farim.
Nisto, vê um jeep estacionar com estardalhaço, pó no ar, dois tipos a saltarem, um alferes e um tenente com um saco de serapilheira na mão, escadas acima. Farda de terylene amarela, lenços no pescoço, “comandos” nos ombros, no jeep também.
Então estes é que são os “comandos”!
Minutos depois vê-os descer, sorridentes.
Eu sou do BCav 490, da CCav 489, apresenta-se. Uma informação. Comandos, que tropa é a vossa, que tipo de trabalho fazem?
O que quer saber, camarada? Pormenores? Quer mesmo saber? Quer subir?
E subiu, para o banco de trás, curvado para a frente, a ouvir as respostas. Golpes de mão, guia, turra de preferência, é só o que precisamos. Operações curtas, surpresa, bater e fugir, castigá-los nas costas, fazer a guerra deles, mas melhor que eles, claro. Regressar a Bissau, dormir, banho, um frango assado no Fonseca, uma gaja boa e um banho a seguir. Que a guerra tem que ser limpa, não é?
Quer concorrer? Convém que se decida depressa, ainda ontem morreu-nos um gajo, o curso começa para o mês que vem, temos 4 vagas para comandantes de grupo e ainda só temos 9 inscritos já aprovados.
Na formação vai sempre alguém abaixo, temos que ter mais pessoal no curso. Decida-se, tem as provas de selecção para fazer, físicas e psíquicas. Psíquicas é conversa com o psiquiatra do Hospital, blá-blá, claro.
Material sempre às costas, mil metros, 20 flexões de braços, 20 suspensões da barra, 100 metros velocidade, abdominais, cangurus, provas de tiro, tudo seguido sem intervalos, que mais pá, coisas assim, vamos a isso?
Vai pensar? Interessa-nos. Porquê? Porque pensa! Pensar é também uma forma de selecção, desde que não pense demais, claro. Encontramo-nos então amanhã em Brá, 9 horas é uma hora boa.

Flexões, abdominais, 100 metros em ziguezague, elevações na barra, 4 metros de corda a pulso, salto a pés juntos em altura e em comprimento, tiro instintivo contra latas e garrafas de cerveja, vazias é claro, está quase tudo, falta pouco.
Uns minutos para respirar, já só faltam os 1000 metros, mais um pequeno esforço, meu alferes, disse o Moita, o furriel instrutor.
Como contamos a distância? Fácil, o meu alferes corre, nós vamos atrás no jeep a dar-lhe gás, quando passar 1 quilómetro no conta-quilómetros, corta a meta. Menos de 4 minutos, ganha uma cerveja, menos de 3 minutos e meio uma grade, menos de 1 minuto a fábrica, que tal? Nos comandos é assim, o Moita e o Miranda, bem dispostos, à gargalhada.
Não, não me recordo, estou aqui desde a abertura do Centro de Instrução, nunca ninguém ganhou a grade, que me lembre, pois não ó Miranda?
Pois então preparem-se. A correr por ali fora, para os lados do aeroporto, a força do calor na estrada, botas a colarem-se ao alcatrão, 1, 2, 3 quilómetros, sabia lá!
Então quantos metros ainda faltam para o quilómetro? Quantos faltam não sei, o conta-quilómetros não funciona!
Sentado na berma da estrada, esforçava-se por manter os pulmões dentro da caixa. Ainda não foi desta vez que alguém conseguiu ganhar a grade.
De regresso a Brá, apresentado ao Major Correia Dinis2, respondeu a algumas perguntas e assinou os papéis que lhe puseram à frente dos olhos. Almoçou lá, passou o resto do dia com eles e à noite, largaram-no na Amura, mais morto que vivo.

Na outra manhã quando tomava o café na messe da Amura, o subalterno de dia da PM sentou-se na mesa dele.
Eh, pá, grande guerreiro, coisa e tal. O alferes já sabia, os tambores tinham sido mais rápidos que ele. Porquê os comandos, o PM curioso. Dentro de 3 ou 4 meses o 490 vem para Bissau, o Cavaleiro vai colocar o pessoal no ar condicionado, a aguardar, tranquilo, os meses que faltam. Porquê os comandos, pá?
Difícil explicar. Nem ele sabia bem porquê. Também não tinha muito tempo para conversas, o jipe para o aeroporto estava à espera.
Ao princípio da tarde estava em Cuntima.

Casa que servia de messe e de bar

Encontraram-se todos na pista e foram até ao bar, para a sombra, beber uma cerveja, gozar a calmaria do resto da tarde. Meia hora depois, talvez, uma explosão forte, para os lados da estrada para Jumbembem, interrompeu as conversas, parou tudo, ficou o silêncio.
Foi para os lados de Jumbembem, não foi?
Um macaco que pisou uma anti-pessoal, se calhar, diz o Didi.
Ou uma mina numa viatura, arrisca outro. É melhor alguém sair e ir ver o que se passou.
Lá estás tu, pá, para quê, a esta hora, não tarda é noite!

De Colina do Norte (Cuntima) a Farim com Jumbembem a meio do percurso

Uma coluna que vinha de Farim, uma mina numa Daimler3 ou numa Fox, aqui perto, na estrada de Jumbembem para aqui, perto da curva da morte, parece que há feridos, o capitão a correr para eles, aos berros, não sei se devemos ir ao encontro, ou se será melhor esperar por mais informações.
Depressa, uma coluna para lá, ao encontro deles, antes que seja noite, meu capitão, um logo.
Melhor esperar, arrancar já, porquê? Sabemos lá o que se está a passar, insiste outro.
É pá, não podemos ficar aqui a ver passar os comboios, o rebentamento foi aqui perto, temos que ir ver o que se passa, prestar auxílio.
Depois de alguma hesitação, o capitão decide-se, arranque com o seu pelotão.
Cuidado, tenha atenção, nada de loucuras por aí fora, sempre a abrir, ouviu?
Pique a estrada. Tome-me conta desta rapaziada, falta-lhes pouco tempo! Conte com uma emboscada no caminho, talvez até uma mina, está a ouvir?
Bem pensado, a mina na auto-metralhadora, a viatura destruída, a maralha embrulhada com os feridos à espera de socorros, estes a irem em socorro, de Cuntima no caso, outra mina à espera destes na picada e uma emboscada, é, se for assim é bem pensado.

Pessoal da CCav 489, apeado na tal curva da picada para Jumbembem

Cuidados redobrados, picadores à frente, todo o pessoal a pé, as viaturas cheias de sacos de areia só com os motoristas, demoraram quase duas horas a encontrarem a coluna. Lixados com tamanho atraso, receberam-nos como se estivessem a vê-los regressar da praia.
Até que enfim, porra! Se não fosse a malta de Jumbembem, os feridos já tinham morrido, que caraças!
Realmente, Jumbembem também estava próximo, mas compreende-se o desespero do comandante da coluna.
Esta estava em marcha para Cuntima, sem conhecimento do comandante da companhia e, veio-se a saber depois, escoltava um grupo de comandos4 chefiado pelo sargento Mário Dias que naquela noite iria executar um golpe de mão a um acampamento da guerrilha na área da companhia lá aquartelada.

O Tenente-Coronel Cavaleiro é que não tinha achado graça nenhuma, mandou um rádio ao capitão, a exigir explicações. A coluna ficara imobilizada, pedira apoio a Cuntima e Jumbembem, porque é que a sua companhia só chegou quase duas horas depois da ocorrência? Explique-se, estou no posto de rádio à espera da sua resposta.
Que fora só o tempo de preparar um pelotão, mais o tempo da deslocação, as precauções que exigira do comandante do pelotão, até nem fora demasiado.
Com o copo a deitar por fora há muito, o Comandante do Batalhão deve ter dito borda fora com o tipo, é agora que o vou mandar pregar para outra freguesia.
Foi o que fez, um auto de averiguações, corpo de delito a seguir, uns dias de prisão. Que tomasse a Dornier para o QG, que este, certamente, lhe arranjaria um destino mais conveniente.
O capitão, desesperado, bem se defendeu por escrito, meteu como testemunha o alferes que foi socorrer a coluna, mas de nada valeu a solidariedade deste.
A demora podia ter sido menor, se pusesse as viaturas a esgalhar. No caso, não deu por qualquer perda de tempo, não se puseram a jogar as cartas, tinham percorrido a estrada com cuidado, mas nada de excessivo.

Na noite da mina, depois do jantar, a saída de mais um alferes foi assunto de conversa. Com uma garrafa de uísque em cima da mesa, cada um falou, do mais novo ao mais antigo. Esta companhia anda com galo até com os alferes, mas anda mesmo! Um ferido com mina, outro evacuado por doença grave, agora este gajo que chegou há meia dúzia de meses está de saída para os comandos!
Desaprovo totalmente, protesto contra esse pessoal! Vi-os no Como, uns tipos horríveis, sem maneiras de lidar com as pessoas, quanto mais com a população! Só querem saber da guerra, como dar tiro no coitado do negrão, mais nada! Vou-me retirar, chau, o Didi.
Até ao nosso regresso a Bissau, despediram-se oficialmente, digamos assim.
O Tenente-Coronel Cavaleiro não gostava, nem dos atrasos dos outros nem dos dele. Na primeira oportunidade, mandou preparar uma coluna e pôs-se à frente, rumo a Cuntima.
Mal viu o alferes por perto chamou-o. O alferes está cá há quanto tempo, pouco, não é? Não teve ainda tempo de reparar que não tinha um comandante, mas apenas um capitão? E assinou por baixo?

Passou uns dias à espera que o Coronel desse o ok à sua saída, o que aconteceu logo após a chegada do novo Comandante da CCav 489, um capitão miliciano, pele muito branca, suor a escorrer cara abaixo. 

Apresentação da CCav 489 ao novo Comandante

No dia seguinte foi a apresentação à companhia que, para o efeito, formou na picada que atravessava a povoação e, dois dias depois, o novo capitão quis tomar contacto com a mata aproveitando a saída de um pelotão em Cuntima num patrulhamento até às inevitáveis Faquinas.

A corta mato, rumo a Faquina Fula e Faquina Mandinga

Foi a primeira saída do capitão e a última do alferes na companhia que, dois dias depois arrancava para Bissau para frequentar o curso de Comandos.
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Notas:
1 - Árvore de grande porte
2 - Comandante do Centro de Instrução de Comandos em Brá, Guiné.
3 - A auto-metralhadora Daimler equipava os pelotões de reconhecimento e frequentemente abriam as colunas. Foram fabricadas no Reino Unido durante a segunda guerra mundial e, tal como as auto-metralhadoras Fox, estavam frequentemente inoperacionais devido a problemas mecânicos. A guarnição era composta por dois homens e estava armada com uma metralhadora ligeira.
4 - Grupo de Comandos “Camaleões”

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Dornier ferido


Campo de aviação de Cuntima. O Do 27 aterrara há pouco mais de meia hora numa nuvem de pó. Negros e brancos, soldados, cabos, furriéis e alferes, num grande alvoroço à volta da avioneta, apalpam-lhe as asas, festas na fuselagem, um tira fotos a um grupo e o homem do bar, o ‘Fininho’ a passar para as mãos do piloto uma cerveja gelada.
Saco do correio, grades de cerveja, caixa de uísque, medicamentos, o que trazia a Dornier, tudo cá para fora.

Minutos depois, abraços e mais abraços, pista desimpedida, motor a trabalhar, portas fechadas. A Dornier a dar a volta devagar para o topo do campo, a roncar com mais força, na cabeça do alferes a imagem, não sabe a que propósito lhe apareceu, do touro a raspar as patas, para os forcados.
De repente aí vai o aviãosinho, a tremer todo, aos saltinhos, a ganhar velocidade, gás no máximo, campo de futebol fora, manobra apertada a evitar as balizas e as árvores.

Adeus Cuntima, até um dia, se calhar

Não ouvira a salva de palmas mas vira da janela, não foi golo mas quase. E, pronto, adeus Cuntima, levo-te no coração, até um dia, quem sabe?

Acabados de pousar em Farim, a mesma cerimónia mas com militares mais graduados. Um alvoroço na pista, o Tenente-Cor. Cavaleiro, o Major Paixão Ribeiro, 2.º comandante, e o estado-maior do Batalhão, a trocarem impressões sobre a guerra em Canjambari5.
Então o alferes já vai para Bissau? Safa-se de boa, a boca do Tenente-Coronel, enquanto falava sobre as contínuas flagelações a que as NT continuavam a sofrer em Canjambari.
A guerrilha, nem à lei da bala, se conformava com a perda daquele santuário.

As NT imobilizadas por emboscada entre Jumbembem e Canjambari. 
Com a devida vénia ao pessoal do BCav 490.

No caminho para o interior do Oio, uma autêntica auto-estrada, para todo o tipo de reabastecimentos da guerrilha. Canjambari Morocunda, um quilómetro ou nem isso para o interior e Canjambari porto, junto ao rio.
As NT foram muito bem até Canjambari Morocunda, para entrarem em Canjambari porto foi o caraças. Levantam a cabeça para lá, lá vem prémio de morteiro. Às 6 da matina, nem precisam de corneteiro, duas morteiradas em cima para lhes abrirem os olhos, ponham-se a pé, tugas preguiçosos. E no final do dia não se esquecem, também mandam tocar a recolher com mais umas morteiradas.
Isto nunca mais chega ao fim. A comissão, que é que havia de ser? Oio, K3, Como, o Como, pá, e agora o Cavaleiro com esta merda de Canjambari, a cinco meses do fim?
Em finais de Março, quando progredíamos para Canjambari, o capitão de uma das Companhias, pela rádio, disse ao Cavaleiro que não conseguia passar a ponte. Não é que no dia logo a seguir pela manhã, o comandante se apresentou em Jumbembem, integrado no Pelotão de auto-metralhadoras do Corte-Real, virou-se para o capitão, vamos ver a ponte.
Claro, na picada de Jumbembem para Canjambari, quando chegaram à ponte, aí vai aço, morteirada para cima da maralha. O pessoal todo deitado, fogachal danado, o capitão agachado também e o Coronel de pé, encostado ao tronco de uma árvore. Capitão, vê de onde vem o fogo dos tipos aí deitado? Estou a falar consigo, ponha-se a pé, está a falar com o seu comandante! Dezanove meses de comissão! Tás a ver, pá, o Mealha todo suado de suor e cerveja.

O avião estava com a carga no limite, o capelão, com um saco de pão fresco em cima das pernas, sentara-se à frente, ao lado do piloto. Atrás, encostado à janela, um cabo enfermeiro segurava um frasco de vidro com um líquido a escorrer às gotas para o braço de um guineense, com uma perna toda entrapada. Do outro lado, o alferes proveniente de Cuntima, com o saco do correio na mão.
Tudo ok, o piloto, tenente Lemos de auscultadores. Que no trajecto para Bissau faria um desvio para a área de Canjambari, a pedido do Coronel Cavaleiro, largar os dois sacos às nossas tropas e que, quando baixasse o polegar, e repetira, só quando voltasse o polegar para baixo, deveriam lançá-los pelas janelas.

Descolagem de Farim

Dornier no ar, fumos aqui e ali a subir das matas, charcos de água a espelharem. O ferido, medo estampado nos olhos muito abertos, a farda nova ainda, verde azeitona, seria do PAIGC? O cabo maqueiro, a fazer ginástica com o frasco e com a cabeça a dizer que sim.
O capelão à frente, suor a escorrer, cara muito branca, mãos amarradas ao saco com o pão quente. Sol ainda alto, o piloto a falar com a base, olho num lado e noutro.

Rio Canjambari

Estavam na zona, em cima de Canjambari, iriam baixar. A planar, quase parado, como um milhafre, a descer lentamente, os olhos deles arregalados para a mata.
Onde é que está a nossa malta? Mais uma volta. Estão ali, debaixo daquela árvore, não? O tenente Lemos não estava certo.
Desceram mais, até alguns metros acima das copas das árvores, são eles, não são? Os outros não responderam, não paravam de olhar. São eles ou não?
Vou dar mais uma volta, força, abrir janelas, mãos nos sacos, como se já não se sentisse uma corrente de ar danada lá dentro. Nova passagem, agora é mesmo, olhem para a minha mão, atenção, polegar para baixo, agora, sacos fora já, o piloto.
O alferes num segundo viu a árvore, viu-os lá em baixo a correr, àquela altura as fardas deles pareceram-lhe iguais à do ferido que ia com eles. Quando o piloto levantou o polegar, hesitou, ficou com o saco do correio na mão.

Mesmo mais tarde, tentando rever a sucessão dos acontecimentos, não era capaz de dizer o que sentiu primeiro. Pareceu-lhe tudo ao mesmo tempo, uma rajada longa, gritos dentro da avioneta, um ciclone lá dentro, um barulho como uma câmara de ar imensa a esvaziar-se, a Dornier a balançar para cima e para baixo, para a esquerda, para a direita.
No voo para Bissau, o guerrilheiro ferido gritou o tempo todo, atingido na mesma perna, mais um tiro, soube-se dias depois, o Dornier dançou sempre, a turbulência aumentou e um cheiro a cocó borrou-os a todos.
Na pista, finalmente, deitado de costas, o alferes viu os buracos das balas que entraram pela barriga da Dornier. Dos de saída não tinha tirado os olhos, a viagem toda.
E reparou também numa grande roda escura nas calças de um dos felizes companheiros e viagem.
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Nota:

5 - A ocupação de Canjambari, operação "Ebro" foi iniciada em 22 de Março de 1965.
“Os relatórios referem terem sido feitas várias acções no itinerário Jumbembem-Canjambari e na própria região de Canjambari. Apesar de levantadas numerosas abatizes, o referido itinerário ainda se encontra com algumas árvores de pequeno porte nas imediações da bolanha que dá acesso ao pontão danificado sobre o rio Tufili (dados obtidos através do reconhecimento aéreo de 17Mar65). Parece, este pontão, de fácil transposição desde que se utilizem pranchas adequadas.
Dos contactos com o IN a reacção deste tem-se limitado a flagelações de longe, não sendo de desprezar a possibilidade de o mesmo dispor, na região, de forças importantes e, eventualmente, colocar minas nos itinerários de acesso.
O objectivo das NT é proceder à ocupação permanente de Canjambari. Elaborado o plano para a acção, foram constituídas as forças executantes, comandadas pelo próprio Cmdt do BCav 490, Ten. Cor. Cavaleiro. Às 03H00 de 22Mar65 iniciou-se o movimento, a partir de Farim. Atingido Jumbembem às 04H20, a força executante prosseguiu, rumo a Canjambari.
À passagem por Sare Tenen, um GrComb da CCav 488 apeou-se, emboscando-se de seguida junto ao caminho que cruza o itinerário. A partir daqui a equipa de sapadores encarregada da detecção de minas passou a picar a estrada nos locais mais suspeitos. Apesar das precauções, às 06H15 e a cerca de 9 kms de Jumbembem, a GMC da frente da coluna calcou um engenho explosivo, ficando a parte posterior da viatura enfiada na cratera aberta pelo engenho. Os dois homens que nela se deslocavam foram projectados, não tendo sofrido ferimentos de maior.
Passados cerca de 500 metros encontrou-se a 1.ª de uma série de cerca de 30 abatizes, algumas de grande porte, que se espalhavam numa extensão de quase 4 kms, até 1km e meio de Canjambari Morocunda, que só foi atingida já passava das 12H00. O esgotante trabalho de levantamento de abatizes durou cerca de 5 horas e meia, sob constantes flagelações do IN, que utilizou metralhadoras pesadas e morteiros. As medidas de segurança adoptadas, apesar da extensão da coluna de 30 viaturas pesadas, revelaram-se eficazes, porquanto o IN nunca conseguiu aproximar-se de modo a causar baixas às NT”. (…). Ultrapassada a zona das abatizes, a coluna prosseguiu deixando um GrCombate emboscado a dois quilómetros do cruzamento de Canjambari Morocunda. Atingiu-se a povoação de Canjambari, com o IN a assinalar a entrada das NT com tiros à distância, disparados da margem sul do rio Canjambari. Tabanca revistada, os indícios apontavam para uma retirada apressada. As casas comerciais deixaram indícios de movimento recente, praticamente até momentos antes da entrada das NT. Pelas 15H00, a coluna regressou ao cruzamento de Canjambari Morocunda. Deu-se então início aos trabalhos de instalação e organização do terreno em volta do edifício do Posto de Socorros aí existente.
Informações posteriores revelaram que o IN tivera conhecimento antecipado da acção e que tivera mesmo tempo para receber reforços de Morés e de Mansodé, que se mantiveram na zona dois dias à espera das NT, regressando mais tarde às suas bases, por coincidência no mesmo dia do início da operação das NT.”

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14817: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (IIb Parte) Em Cuntima, na fronteira Norte com o Senegal (2)

Guiné 63/74 - P14826: Convívios (694): II Almoço do pessoal da Tabanca de Setúbal, Praia de Albarquel, no ido dia 27 de Junho de 2015 (Hélder Valério de Sousa)

1. Mensagem do nosso camarada Hélder Valério de Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de hoje 1 de Julho de 2015:

Caros camaradas
Finalmente!
Finalmente realizou-se o 2.º Almoço da “Tabanca de Setúbal”!

Conforme já vos tinha dito antes, durante algum tempo fui inquirido, ‘massacrado’, ‘perseguido’, pelos camaradas que queriam saber quando se realizaria este propalado 2.º Almoço. Houve até quem, com aquele seu jeito de humor cáustico, estilo “pantera cor-de-rosa”, me tivesse chegado a perguntar quando seria o “almoço comemorativo do 10.º aniversário do 1.º almoço”….
Mas finalmente conseguiram ‘reunir-se as condições’ (como em certa época se costumava dizer) para que o desejo se transformasse em realidade.

Sei que “Almoços” e “Encontros” do pessoal só costumam interessar normalmente aos participantes, mas atrevo-me a levar ao vosso conhecimento este evento porque pode de facto ter sido o precursor de um novo ‘local de encontro’ de camaradas da Guiné, a “Tabanca de Setúbal” (ou da “Arrábida”, logo se verá melhor).

Assim, ultrapassadas as dificuldades habituais para materializar este género de coisas (quem se mete nisto sabe do que falo), com a preciosa ajuda do Benjamim Durães, ocorreu então, como anunciado, no passado sábado dia 27 de Junho, num restaurante de praia, o All-Barquel na praia de Albarquel, logo à saída de Setúbal para a Arrábida, esse desejado almoço.

Para o seu êxito, já que estiveram 34 comensais, dos quais 6 acompanhantes, houve contributos significativos dos camaradas que se acolhem normalmente na “Tabanca da Linha” e isso não pode deixar de ser realçado.
Residentes, ou com moradia no Distrito, estiveram Miguel Pessoa, Giselda, Nair Antunes, Maria Arminda, Benjamim Durães, Hélder Sousa, José Silvério e esposa, José Sanchez Antunes, Lino Rei, Jorge Abreu Batista, Mário Salgado, Jorge Canhão, João Sousa, António Faneco, Fernando Sousa e José Silva.
Os ‘reforços’ foram António Maria Silva, António Marques e Gina, Jorge Pinto, António Santos e esposa, José Dinis, Jorge Rosales, Armando Pires, Manuel Resende, Manuel Joaquim e Deonilde, José (Zé) Rodrigues e Maria de Lurdes, Luís Moreira, Joaquim Vieira e João pereira da Costa.

O que se pode dizer do evento?
Que ‘correu bem’, ou seja, as pessoas ficaram contentes pelos encontros, reencontros e até descobertas, que as houve. Por exemplo, o Jorge Canhão tem casa em Setúbal e veio a descobrir que no seu prédio, dois vizinhos, o João Sousa e o José Silva eram “camaradas da Guiné”. Que o Jorge Canhão e o Armando Pires descobriram uma amizade comum.

Como foi divulgado, o almoço consistiu num rodízio de peixe, que não envergonhou ninguém, mas permito-me sublinhar o “carapau manteiga” que estava soberbo e que motivou algumas repetições…. No início (e no fim, porque ficou em ‘bar aberto’…) houve um ‘moscatel de honra’ que soube muito bem.

De salientar que o calor nesse dia originava cerca de 37ºC ali na praia com a areia a cerca de 5 metros e foi de facto heroica a presença de tantos amigos.

Ficou no ar a ideia (e o mandato) para que se possam fazer mais encontros da “Tabanca de Setúbal”, que conta agora com uma “carteira” de membros capaz de dar vida a tais eventos sendo que muitos há que ainda podem corresponder. Estavam pessoas de Sesimbra, Setúbal, Pinhal Novo, Baixa da Banheira, Barreiro e Montijo sendo que também há camaradas de Azeitão, Seixal, Almada, Caparica, etc., que podem vir a querer participar.
Vamos deitar mãos à obra e depois daremos conta.
Entretanto aqui envio algumas fotos que podem servir para ilustrar o texto.

Abraços
Hélder Sousa

À espera

A preparar

A sala em reflexo

As nossas enfermeiras

Aspecto geral

Caras novas

Comissão de arranque

Conhecem este par?

Cumplicidades, Armando Pires e José Rodrigues

Os vizinhos desconhecidos

Parecem satisfeitos

Vamos à água

Vão-se chegando
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14786: Convívios (693): 30º Encontro da CART 3494, 13 de Junho de 2015, RA-5 (Sousa de Castro)

Guiné 63/74 - P14825: Memória dos lugares (300): Rio Cacheu, o meu rio...Ia-me engolindo, em 1964, mas continuei sempre a gostar dele. (António Bastos, 1.º cabo do Pel Caç Ind 953, Cacheu, Farim, Canjambari, Jumbembem, 1964/66)


Foto nº 1

Guiné > Região do Cacheu > Rio Caboiana > 1964 > "Um afluente do Cacheu,  Coboiana, onde íamos lá muitas vezes fazer em psico... O "Pecixe" fazia o transporte de civis do Cacheu para S. Domingos... 

[Ou não será antes o Rio Grande de São Domingos, afluente do Rio Cacheu, margem direita ? A região ou regulado chama(va)-se Caboiana, e não Coboi...ana; na margem esquerda há outro rio, o Churro, e também o Rio Lenhe e outros mais pequenos... vd. aqui carta de São Domingos [Cacheu];  no nosso blogue há vários postes em que aparece o topónimo Coboiana, Coboiana-Churro, mas temos que corrigir... Não consigo localizar nenhum Rio Caboiana, muito menos Coboiana... Por mor da verdade e do rigor, temos que esclarecer e corrigir este lapso... Os nossos cartógrafos não brincavam em serviço, e é bom que se diga que prestaram um alto serviço científico e cultural ao povo da Guiné-Bissau, cartografando ao milímetro todas aquelas terras, do Cacheu ao Cacine... Ainda hoje estas cartas são altamente cobiçadas por muita boa gente!... Para nós, amigos e camaradas da Guiné,  são um extraordinário auxiliar de memória... Já há muito que nos teríamos perdido nos labirintos de memória sem estas preciosas cartas... Vd. também cartas de Pelundo e Sedengal]





Foto nº 2

Guiné > Região do Cacheu > Rio Cacheu > 1965 > Em Farim, num zebro...


Foto nº 3

Guiné > Região do Cacheu > Rio Cacheu > 1964 > "Um mergulho no Cacheu", diz a legenda nas costas da foto...



Foto nº 4

Guiné > Região do Cacheu > Rio Cacheu > 1964 > Um banho à "leão"...




Foto nº 5

Guiné > Região do Cacheu > Rio Cacheu > 1966 > No "barco turra", de regresso a Bissau, em fim de comissão...


Fotos (e legendas): © António Bastos (2015). Todos os direitios reservados [Edição: LG]


1. Mensagem, de 30 de junho último, enviada pelo António Paulo Bastos (ex-1.º cabo do Pel Caç Ind 953, Teixeira Pinto e Farim, 1964/66):


Boa tarde, companheiro Luís.

Respondendo à nossa sondagem desta semana... O meu rio na Guiné é o Cacheu.

Em 1964, ele ia me engolindo mas continuei sempre a gostar dele.

A 1ª foto é de um afluente do Cacheu é o Rio de Coboiana, onde íamos lá muitas vezes em psico.

As outras estão identificadas.

Um abraço. 

António Paulo Bastos

Pel Caç 953 (1964/66)
Cacheu, Farim, Canjambari, Jumbembem
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Nota do editor:

Último poste da série > 1 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14823: Memória dos lugares (297): O Rio Geba e o "barco turra", a caminho de Bissau, no dia em que o homem chegou à lua (20 de julho de 1969) (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)

Guiné 63/74 - P14824: Fotos à procura de... uma legenda (57): Evacuação do Uam Sambu, soldado do Pel Caç Nat 52, gravemente ferido em 1/1/1970: quem era a tripulação da DO 27 ? (Miguel e Giselda Pessoa / Rosa Serra)


Foto nº 1

Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > 1 de janeiro de 1970 > Uma enfermeira paraquedista prepara o moribundo Uam Sambu para a evacuação para o HM 241... O camarada, de costas, com o camuflado todo ensaguentado é o Mário Beja Santos, comandante do Pel Caç Nat 52.  À saída da Missão do Sono, em Bambadincazinho, nas imediações (menos de 1 km) do quartel de Bambadinca (, onde ficava todas as noites um pelotão "emboscado"), o Sambu foi vitíma de um grave acidente com arma de fogo que lhe custou a vida. Presumivelmente ele já não chegou com vida ao hospital, face ao gravíssimo prognóstico feito logo pelo médico do batalhão, o Vidal Saraiva.

A enfermeira, de costas, usa um pulseira no braço do lado esquerdo.


Foto nº 2

Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > 1 de janeiro de 1970 > Outro pormenor dos primeiros socorros prestados ao Sambu antes de ser evacuado. À esquerda do Beja Santos, sob a asa da DO 27, com a mão direita à cintuta, em pose expectante, parece-me  ser o fur mil enf da CCAÇ 12, o meu amigo João Carreiro Martins, de quem não tenho notícias há uns anos.Assinalado com um círculo a amarelo, está o piloto da DO 27, ujm jovem alferes.


Fotos: © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]


Capa do livro, "Nós, enfermeiras paraquedistas",
de que a Rosa Serra foi a coordenadora
ou editora literária (**)
1. A propósito das fotos acima, já publicadas noutro poste (*), pedimos ao Miguel Pessoa, à Giselda e à Rosa Serra, para tentar identificar a tripulação da DO 27, o piloto e a enfermeira paraquedista, que vieram fazer a evacuação:

Assunto: Fotos com a evacuação do Uam Sambu


Miguel:

Olha, pede à Giselda e à Rosa Serra para verem estas fotos... Há uma enfermeira paraquedista, de costas, debruçada sobre um soldado do Beja Santos. o Uam Sambu, que vai morrer a caminho de Bissau...Foi o primeiro e único morto do dia 1/1/1970 no TO da Guiné...

O camuflado dela era diferente dos nossos... Além disso, usa uma pulseira no pulso esquerdo, talvez de prata, e talvez manufatuara no ouruves de Bafatá,,,

Foi um estúpido acidente, ali perto do quartel de Bambadinca... O ferido veio às costas do Beja Santos...

Outros pormenores: há um alferes, com cara de puto, de perfil, do lado esquerdo da DO... Vê se consegues identificar a malta da FAP, sobretudo a enfermeira paraquedista. (...)


PS - Estive ontem, na Lourinhã com os teus amigos paras do BCP 12... Tive uma grande conversa com o maj gen PQ Hugo Borges, amigo do António Estácio, e que já esteve connosco há dois anos, em Mionte Real, no encontro nacional da Tabanca Grande. Também lá estava, a meu lado, o maj gen PQ Avelar de Sousa, o cor PQ Gaspar da Chirta e mais outros oficiais, sargenrtos e praças do BCP 12, ligados à Associação de Paraquedistas Tejo Norte... Tudo rapaziado do teu tempo. Falei também com o ten gen imf  ref Jorge Manuel Silvério, do exército (n. 1945), e que segue o nosso blogue (embora só tenha feito serviço em Moçambique e em Angola)... É meu conterrãneo mas só o conhecia de vista. O pretexto foram os 10 anos do monumento aos mortos da Lourinhã na guerra colonial.


2. Resposta da Rosa Serra, por intermédio do Miguel e da Giselda:


[, foto à esquerda, a Rosa Serra, graduada em alferes;  integrou o 6.º Curso de Enfermeiras Pára-quedistas efectuado em 1967; devido a um acidente no decorrer da sua preparação, apenas veio a completar o curso em Março de 1968, tendo sido então graduada em Alferes:; passou por diversos teatros de operações:  BA4, na Terceira/Açores, em 1968 e 1972; Guiné, BCP12/Bissalanca, em 1969; Angola, BCP21/Luanda, em 1970; Tancos/RCP, em 1971; Moçambique/Mueda, em 1973; terminou o seu contrato em março de 1974; faz parte da nossa Tabanca Grande desde 25/5/2010].


Date: 2015-07-01 1:19 GMT+01:00
Subject: Re: Fotos com a evacuação do Uam Sambu


Boa Noite Miguel

Eu não sei quem é . Se a data estiver certa eu tenho a certeza que eu estava de serviço, pois tenho outras fotos na Base, nesse dia de ano novo escrito nelas.

Por um lado pareço eu mas não me lembro de alguma vez ter usado uma pulseira no punho esquerdo como mostra na foto. Logo que possa hei-de comparar com outras tentando ver semelhanças. Se não for eu não estou a ver quem seja com aquele estilo de costas e cabelo.

Tenho pena mas não consigo ajudar muito mais. Quando consultar as fotos da Guiné, que estão muitas fora de sitio com a história do livro e que ainda não as organizei, direi alguma coisa. (***)

Beijinhos para vocês e vou dormir que para mim já é tardíssimo. Rosa

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 29 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14806: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte III: O grave acidente com arma de fogo que vitimou o Uam Sambu, do Pel Caç Nat 52, na manhã de 1/1/1970

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14823: Memória dos lugares (299): O Rio Geba e o "barco turra", a caminho de Bissau, no dia em que o homem chegou à lua (20 de julho de 1969) (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 /CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > 20 de julho de 1969 > Efeméride: no dia que o homem chegou à Lua, eu descia o rio Geba (Bambadinca-Bissau, com passagem no célebre Mato Cão e depois na não menos temível Ponta Varela, a seguir ao Xime)...

Era um barco fretado para levar material usado da tropa. Estivemos parados várias horas: primeiro por causa da maré, depois devido a avaria no motor do barco só resolvido (desenrascado) com uma peça sacada dum carro que seguia no barco para sucata. 

Viagem inesquecível, até ao fim da minha vida!



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel &gt > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > 20 de julho de 1969, dia em que o homem chegou à lua... O Valdemar vai a caminho de Bissau, num barco civil, daqueles a que chamávamos, depreciativamente, "barco turra"...


Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: L.G.]


1. Para o Valdemar Queiroz o rio da sua tabanca só podia ser... o Geba (*).  Talvez mais o "estreito" que banhava a lindíssima e pacífica Contuboel do que o "largo", do Xime a Bissau... Mas quem vinha de Bambadinca, também ia lá muito descontraída: as curvas e contracurvas do rio e a passagem por Mato metiam respeitinho... e obrigavam a montagem de segurança por nossa parte.

A propósito da nossa sondagem, reenviou-nos estas fotos que já tínhamos publicado há um ano e tal (**).

O Valdemar Queiroz também viajou de LDG,  Geba abaixo, Geba acima... Quando foi para Contuboel (via Xime - Bambadinca - Bafatá), onde funcionava um Centro  de Recrutamento Militar... E mais tarde, quando levaram os seus "recrutas" (, pessoal do recrutamento local  a quem estavam a dar instrução militar), até Bissau para fazer o juramento de bandeira...Ele não pode precisar a data... Diz que foi "uns meses antes" da tal viagem no "barco turra", que as fotos documentam...

Desta vez a LDG partiu de Bambadinca, o que não era invulgar... "Na LDG encontrei um marinheiro conhecido de Arroios (Lisboa) e saboreei uma boa posta de peixe cozido. Quase todos os nossos soldados nunca tinham saído da zona do Gabu ou de Bambadinca. Estranharam muito. Ficamos em Brá e eles juraram bandeira no Estádio Sarmento Rodrigues com grande entusiasmo e com um empolgante discurso do Spínola."

Ora sabemos, meu caro Valdemar,  que o  juramento de bandeira dos nossos soldados do recrutamento local, que foram incorporados nas nossas duas companhias (CART 2479/CART 11 e CCAÇ 2590/CCAÇ 12), se realizou-se em Bissau em 26/4/1969, na presença do Com-chefe.  As nossas duas futuras companhias faziam parte da chamada "nova força africana" que estava então em formação e era muito acarinhada por Spínola...

Portanto, a viagem de LDG deve ter sido na véspera do juramento de bandeira ou por esses dias... 

Na história da CCAÇ 12, lê-se que os quadros da CART 2479 [futura CART 11 e depois CCAÇ 11] já tinham dado a instrução básica às  nossas praças africanas, "de 12 de Março a 24 de Maio, em Contuboel"... Pelo meio meteu-se a cerimónia do juramento de bandeira.

E continua o Valdemar: "Por lá ficámos, uns dias, a fazer seguranças na região, sem se saber a razão. Com eles a estranharem muito a zona, por não a conhecerem, ao ponto de estarem sempre, quando ficávamos de noite, de olhos bem abertos e sentados sobre os calcanhares a dizer ‘nunca se sabe’ (...)".  (**)


Solo lunar > 20 de julho de 1969 > Peugada de Buzz Aldrin, fotografada pelo próprio, cerca de uma hora depois da saída do módulo lunar. Esta foto, tirada para estudar a mecânica do solo lunar, tornou-se um ícone da conquista espacial. A alunagem foi às 22h 17m 40s, UTC, no mar da Tranquilidade.

Na América,  é no dia 20 de julho que se comemora  a chegada do Homem à Lua. Armstrong pisou pela primeira vez o solo lunar às 22h56 (hora de Nova Iorque) do dia 20 de Julho de 1969.  Mas em Portugal eram 3h56 da manhã do dia 21 de julho... Eu estava na Guiné, teinha acabado de chegar  a Bambadinca, vindo do "oásis" de Contuboel, há dois ou três dias,...   Tinha 1 mês e 3 semanas de Guiné...  E confesso que  não dei por nada,,, O nosso camarada Rui Felício, esse,  estava em Samba Cumbera, e diz que era domingo... Ah!, e lá não havia televisão (***)... (LG)

Imagem: Fonte: NASA (original upload; ALSJ (AS11-40-5877))
Autor:  NASA / Buzz Aldrin, Imagem do domínio público. Cortesia de Wikipedia > Apollo II

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 1 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14821: Memória dos lugares (296): Ganjola e o Rio Cumbijã (ex-alf mil, João Sacôto, CCAÇ 617 / BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66)

(**) Vd. poste de 3 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12790: Memórias de um Lacrau (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) (Parte IV): Passaram os quatro primeiros meses... Em Contuboel, ainda longe da guerra...

(***) 1 de setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10313 Efemérides (108): No dia em que o primeiro homem pisou a lua... Neil Armstrong (1930-2012), um herói do nosso tempo, visto de Samba Cumbera, tabanca fula a sudoeste de Galomaro, longe do Vietname, a 400 mil km de distância do nosso satélite (Rui Felício / Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14822: Efemérides (193): Lourinhã, 28 de junho de 2015: comemoração dos 10 anos do monumento aos combatentes do ultramar - Parte I


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > Lápide com os nomes dos cinco combatentes que psuieram mãos á obra, possibilitando a construção, com o apoio da autarquia local, do monumentos aos combatentes da guerra do ultramar / guerra colonial.


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local >  A antiga comissão  posando para a fotografia, com o presidente do município, engº João Duarte: da esquerda para a direita: Jaime Bonifácio Marques da Silva (Seixal - Lourinhã); Adílio Braz F. Fonseca (Ribamar - Lourinhã); João M. Rodrigues Delgado (Vila - Lourinhã); João Duarte (CM Lourinhã): José F. Picão Oliveira (Vila -Lourinhã); e José M. Bonifácio da Silva (Seixal - Lourinhã).  (Entre parêntesis, a sua localidade de nascimento)...



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > A antiga comissão  posando para a fotografia: da esquerda para a direita: Adílio Braz F. Fonseca (Ribamar - Lourinhã); José M. Bonifácio da Silva (Seixal - Lourinhã);  João M. Rodrigues Delgado (Vila - Lourinhã);  José F. Picão Oliveira (Vila -Lourinhã); e  Jaime Bonifácio Marques da Silva (Seixal - Lourinhã)... (Entre parêntesis, a sua localidade de nascimento)...


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > Representação da Associação de Paraquedistas da Ordem dos Grifos63, criada em 1998, com sede em Vila Nova da Barquinha. [Têm página no Facebook].



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > Porta-estandartes de outras associações: fuzileiros, comandos, paraquedistas...


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > Contámos pelo menos oito associações representadas na cerimónia.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > Um ten gen ref, lourinhanense, Jorge Silvério... E um capitão de abril. Nasceu em Ribamar, em 1945... Fez comissões em Moçambique e Angola. Só o conhecia de vista. Disse-me que gosta de visitar o nosso blogue. Tem uma pequena intervençãoi nesta cerimónia que gravei em vídeo.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local >  Um convidado especial, homenageado pela AVECO e pelo município da Lourinhã: o ten cor inf ref, Marcelino da Mata.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 28 de junho  de 2015 > Comemoração dos 10 anos da construção do monumento e homenagem à comissão organizadora local > O  António Basto, da vice-presidente AVECO (*), foi mais uma vez o indispensável, prestável e eficente mestre da cerimónia.

Fotos (e legendas) : © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


1. Foi há 10 anos, em 26 de junho de 2005, que foi inaugurado, na Lourinhã, o monumento aos combatentes do Ulramar. Um dos elementos da comissão organizadora, o nosso amigo, camarada e grã-tabanqueiro Jaime Bonifácio Marques da Silva,  antigo oficial miliciano paraquedista, já aqui explicou, há dois anos atrás,  o "significado hstórico e pedagógico" desta patriótica iniciativa (**).

Dez anos depois, a AVECO - Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste, que tem sede na vila da Lourinhã, e as autarquias locais (com destaque para a Câmara Muncipal da Lourinhã e a União das freguesias de Lourinhã e Atalaia) quiseram homenagear os cinco lourinhanenses, felizmente ainda vivos, antigos combantentes, que formaram a comissão organizadora original. São eles, por ordem alfabética, (i)  Adílio Braz F. Fonseca (natural de Ribamar - Lourinhã); (ii) Jaime Bonifácio Marques da Silva (natural de Seixal - Lourinhã); (iii) João M. Rodrigues Delgado (natural da vila da Lourinhã);  (iv) José F. Picão Oliveira (natural da vila de Lourinhã); e (v) José M. Bonifácio da Silva (natural de Seixal - Lourinhã). (***)

O encontro contou com a presença de largas dezenas de uma centena de antigos combatentes,  dos três ramos das forças armadas, e de diversas associações,  oriundos de diferentes partes do país, da Covilhã a Oeiras,   incluindo sócios e dirigentes (atuais ou antigos) da Associação de Paraquedistas Tejo Norte, com sede em Oeiras: maj gen  PQ Hugo Borges (que é ou já presidente da direção), maj gen PQ Avelar de Sousa (que é ou já foi presidente da assembleia geral),  cor PQ Gaspar da Chica (que é ou já foi tesoureiro).

Esteve também presente na cerimónia o ten gen inf ref, Jorge Silvério, lourinhanense, tal como há 10 anos atrás na inauguração do monumento.

O encontro começou por volta das 9h30 com a concentração e receção dos convidados junto ao monumento dos combatentes, na Lourinhã, no Largo António Granjo.  Seguiu-se, depois, missa de acção de graças celebrada na lindíssima de igreja do Castelo, do séc. XIV, de estilo gótico. Desta vez não possível, por razões de segurança,  realizar-se a prova de saltos de paraquedas no  estádio municipal local, tal como estava previsto no programa.

O convívio prosseguiu durante a tarde com um descontraído almoço, ao ar livre,   nas tasquinhas das festas populares do São João, nas imediações do estádio municipal, que este ano, e mais uma vez,  foram um grande sucesso em termos de oferta e procura.

Temos alguns vídeos (e mais fotos) que apresentaremos num próximo poste.




Lourinhã > Estádio Municipal > Festas populares do São João >Tasquinhas > 26 de junho de 2015 >  A AVECO também esteve presente... Na foto, da esquerda para a direita, (i) o Fernando Castro (presidente); (ii)  um voluntário, natural de A-dos-Cunhados, Torres Vedras, que foi fuzileiro (, infelizmente não fixei o nome);  e (iii) o António Basto, bracarense a viver na Lourinhã  (e que,  vim eu a saber agora, foi do mesmo curso de operações especiais do nosso coeditor, camarada e amigo, Eduardo Magalhães Ribeiro).

Foto (e legenda): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]
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Notas do editor:

Guiné 63/74 - P14821: Memória dos lugares (298): Ganjola e o Rio Cumbijã (ex-alf mil, João Sacôto, CCAÇ 617 / BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66)


Guiné  > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > Destacamento de Ganjola > Rio Cumbijã > 1965 > O ex-alf mil João Sacôto, num "momento de descontração" (1)...

[Curiosa esta piroga. usada no sul da Guiné, com estabilizador ao meio e leme à popa!... Não me recordo de ver este tipo de piroga nos rios da Guiné!...] [LG]


Guiné  > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > Destacamento de Ganjola > Rio Cumbijã > 1965 > O ex-alf mil João Sacôto, num "momento de descontração"...



Guiné  > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > Destacamento de Ganjola > Rio Cumbijã > 1965 > O ex-alf mil João Sacôto, num "momento de descontração" (3)...

[Em Ganjola, na época, viva a família do velho Brandão, um "homem grande" de quem se dizia ter sido desterrado para a Guiné... Era natural de Arouca. E por lá passou, também, no destacamento de Ganjola, o meu infortunado primo José António Canoa Nogueira o primeiro lourinhanense a  morrer em combate no TO da Guiné, em 23 de janeiro de 1965;  tinha 23 anos, e era sold ap mort. Pel Mort 942 / BCAÇ 619] [LG].

Fotos (e legenda): © João Sacôto (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


1. João Sacôto, ex-alf mil da CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66): 

[foto à esquerda, em Ganjola, 1965, tendo por detrás a LDM 309, a manobrar para atracar; 
nome completo: João Gabriel Sacôto Fernandes; Sacôto é o nome pelo qual, entre amigos e profissionalmente, é conhecido]:

(i) assentou praça em Mafra, em agosto de 1962 após dois anos de adiamento, por ele pedidos, em virtude de estar a estudar no então ISCEF (Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras);

(ii) ficou bem qualificado no curso de oficiais milicianos (COM);

(iii)  foi colocado no RI 1 - Amadora;

(iv) foi mobilizado dois anos depois, em 1964,  para a Guiné;

(v) já era casado,  com vinte e cinco anos, com uma filha que fez 2 anos exatamente no dia 8 de janeiro de 1964, data do embarque para a Guiné no T/T Quanza;

(vi) levou consigo um herói, o cão Toby, de raça boxer,  cuja folha de serviço já foi publicada;

 (vii) está hoje reformado da TAP onde foi piloto e comandante de avião (1970-1998);

(viii) em 1980, voltou à Guiné-Bissau  em "romagem de saudade";

(ix) tem página no Facebook

(x) nasceu em 1938; é tio, pelo lado materno, do nosso camarada e grã-tabanqueiro João Martins.
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Guiné 63/74 - P14820: Memórias da CCAÇ 1546 (Domingos Gonçalves) (12) - Reportagens da Época (1967): Coluna a Farim

1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68) com data de 18 de Junho de 2015:

Prezado Dr. Graça:
Saúde. Mais uma vez tomo a liberdade de remeter um pequeno texto que poderá ser publicado.

Com um abraço amigo,
Domingos Gonçalves



MEMÓRIAS DA CCAÇ 1546 (1967)

REPORTAGENS DA ÉPOCA

12 - Coluna a Farim

Dia 19 de Junho de 1967

Parti de Binta com o meu grupo de combate, e alguns nativos armados, numa escolta rotineira, como tantas outras que temos feito até Farim.
A coluna seguiu normalmente, e sem incidentes, até Canicó.
Ao atravessar essa tabanca abandonada, quando a estrada começa sensivelmente a descer, vi, não muito longe, levantar-se nos ares uma nuvem de fumo negro, e estranho.
Naquele local nada justificava o aparecimento daquele fumo.
Mandei parar a coluna de viaturas, deixei ficar metade do pessoal a manter a segurança dos camiões, e avancei pela estrada adiante, com os restantes soldados, para averiguar as causas daquele fumo insólito.

Binta, localizada na margem direita do Rio Cacheu, próximo da estrada Farim-Bigene. Vd. Carta da Província da Guiné - Escala 1:500.000

Ao fim de algumas centenas de metros, os homens que seguiam mais à frente vieram dizer-me:
- É uma viatura que está a arder.
- Uma viatura?
- Sim, uma viatura. - Confirmaram-me.

Segui adiante com bastante apreensão, e com todas as cautelas possíveis.
A dado momento começámos a ouvir gemidos, vindos ainda de certa distância.
Seguimos adiante.
O primeiro vestígio concreto de que algo de anormal se tinha passado, foi metade do pneu de uma viatura, desfeito no meio da estrada.
Algumas dezenas de metros, mais à frente, estava uma viatura, a arder.
De quando em quando, no meio do fogo detonavam munições.
Cautelosamente, fomo-nos aproximando.

Sob a viatura incendiada jazia, totalmente carbonizado, o corpo de um soldado, que só com muita dificuldade me apercebi de que era de um branco.
Ao lado da estrada, jaziam os corpos de três pretos mortos.
A gemer, desfeito em dores, encontrei o furriel H., do pelotão de morteiros, com o corpo todo coberto de pó, e desfeito pelos estilhaços.
Ali perto, escondidos entre as palmeiras, alguns nativos armados a manter a segurança.
Tropa branca, não se via nenhuma.

Depois, quando se aperceberam da nossa presença, apareceram alguns soldados brancos, bem como o alferes, comandante da coluna, que se dirigia para Binta.
O que ali estava não era uma força organizada, ou a escolta de uma coluna de viaturas, mas um grupo de homens vencidos, desmoralizados, que os turras, se o tivessem tentado, teriam dizimado, sem dificuldades, ou mesmo feito prisioneiros.
Mas ninguém decidia nada.

Perante aquele cenário, mandei avançar para junto do local, com toda a precaução, os meus soldados, que tinham ficado a guardar as viaturas, informei, via rádio, o comando do batalhão, sobre o que se tinha passado, recolhi os feridos, que mandei, de imediato, a toda a velocidade para Farim, e mandei carregar noutra viatura os cadáveres.

Entretanto, os meus homens passaram a pente fino todo o terreno à volta da estrada, e detectaram ainda uma mina anti-carro, que se fez explodir no local.
A mina que rebentou sob o rodado da viatura, bem com a que, depois, se detectou, era comandada à distância, através dum engenhoso sistema de fios.
Afinal, se eu tivesse saído de Binta alguns minutos antes, seria eu a sofrer a emboscada, e os efeitos da mina.

Entretanto, chegaram ao local os “roncos” de Farim, e um pelotão da companhia 1585, com a finalidade de verificar donde tinham vindo os turras, e efectuar a perseguição do grupo.
Quando tudo ficou resolvido dei ordem de marcha aos meus homens, e seguimos para Farim.
Regressei a Binta, fazendo a pé quase todo o percurso, e picando a estrada.
Estou, no entanto, horrorizado.
Doido.

Nunca tinha visto, nem me passava pela mente ver, um quadro humano tão horrendo, e sinistro.
Esta guerra mostra-nos todos os dias cenas diferentes, terríveis, que jamais se apagarão das nossas memórias.
Mas há momentos, que são demasiado sinistros, que escapam às leis da racionalidade, que todos preferiríamos não ter vivido.
Ainda hoje, a companhia de intervenção vai realizar uma operação, que terá por objectivo seguir o trilho que os turras deixaram no capim quando se retiraram, no fim da emboscada.
Só que, a esta hora, eles já estão bem longe, no interior do Senegal, a delirar de satisfeitos, com todo este sofrimento.
A vida não passa de uma grande loucura.

No regresso de Farim, dei escolta aos homens da secção de cinema, do Quartel-General, que vieram dar umas sessões em Binta, e em Guidage. À noite exibiram, efectivamente, um filme, mas não fui assistir. Estava ainda demasiado impressionado com as cenas reais, que de manhã tinha contemplado.
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14698: Memórias da CCAÇ 1546 (1967) - Reportagens da Época (Domingos Gonçalves) (11): Buruntuma