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Nota do editor
Último poste da série de 15 de Novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16720: Parabéns a você (1162): António Inverno, ex-Alf Mil Op Esp do BART 6522 e Pel Caç Nat 60 (Guiné, 1972/74); Orlando Pinela, ex-1.º Cabo Reabast Material da CART 1614 (Guiné, 1966/68) e Coronel Cav Ref Pacífico dos Reis, ex-Cap Cav, CMDT da CCAÇ 6 (Guiné, 1968/70)
Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra col0onial, em geral, e da Guiné, em particular (1961/74). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que sáo, tratam-se por tu, e gostam de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 16 de novembro de 2016
terça-feira, 15 de novembro de 2016
Guiné 63/74 - P16724: Agenda cultural (516): Sessão de apresentação do livro do Paulo Salgado, 5ª feira, dia 17, às 18h30, na Fundação Portugal - África, Rua de Serralves, nº 191, Porto
Convite para a sessão de apresentação do livro do nosso camarada e grã-tabanqueiro Paulo Salgado, no próximo dia 17, 5ª feira, às 18h30, no Porto, na Fundação Portugal - África. A apresentação estará a cargo do médico pediatra José Manuel Pavão, cônsul honorário da República da Guiné-Bissau no Porto. (*)
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Nota do editor:
Guiné 63/74 - P16723: Agenda cultural (515): No passado dia 10 de Outubro, na Messe Militar do Porto, sita na Praça da Batalha, foi apresentado o livro "Quatro Rios e Um Destino" do nosso camarada Fernando de Jesus Sousa (Carlos Vinhal)
No passado dia 10 de Outubro, na Messe Militar do Porto, sita na Praça da Batalha, foi apresentado o livro "Quatro Rios e Um Destino" do nosso camarada Fernando de Jesus Sousa, ex-1.º Cabo da CCAÇ 6, Bedanda, 1970/71.
Foi uma jornada emotiva, não porque o nosso camarada precise de nós, mas antes porque ele próprio é uma força de vida e um exemplo. Somos nós que precisamos dele.
A força da amizade entre ele e o médico que o tratou em Bedanda enquanto não foi possível a evacuação, o ex-Alf Mil Médico Amaral Bernardo, ficou bem patente e sabemos que perdurará. Um misto de sentimentos fez com que a assistência se mantivesse em religioso silêncio, com algumas lágrimas a fazer arder os já gastos olhos dos Combatentes, e não só, ali presentes.
Ficámos a conhecer melhor o Fernando, a sua força de viver, aquela que todos quereríamos ter para enfrentar os mesquinhos problemas que nos surgem e que julgamos serem os mais importantes do mundo.
Quem venceu a morte e suplantou a adversidade é digno do nosso respeito e admiração.
Obrigado Fernando.
Segue-se a reportagem.
Carlos Vinhal
A sala estava composta embora o autor do livro merecesse mais audiência.
Momentos antes do início dos trabalhos, ultimam-se os pormenores.
O Coronel Belchior deu início à sessão cumprimentando a Mesa e os presentes, dando a palavra ao apresentador do livro, Prof. Dr. Amaral Bernardo que foi Alferes Médico em Bedanda, nos anos de 1970 a 1972, onde se encontrava aquando do acidente que feriu gravemente o autor Fernando Sousa.
Falar do livro e dos momentos vividos em Bedanda, pelo Fernando, nas primeiras horas a seguir ao infeliz acontecimento, foi doloroso para o nosso camarada Amaral Bernardo, que visivelmente comovido, lembrou o seu papel de médico no mato, sem as condições mínimas necessárias para assegurar a sobrevivência do ferido grave que tinha entre mãos. Fez o que pôde até que a evacuação se efectivasse, para que no hospital, com outros meios, o Fernando fosse devidamente tratado. Disse ainda, que foi com a maior emoção e alegria que, passados mais de 30 anos, o encontrou a andar normalmente e a levar uma vida plena.
Salientou o facto de o infortúnio ter criado uma amizade especial entre o médico e o doente que os unirá até ao fim dos dias.
Amaral Bernardo fala do Fernando Sousa com a maior admiração pela sua coragem e força vontade em suplantar as dificuldades.
Chegou a vez do autor, que dedicou as suas primeiras palavras ao homem a quem deve a sua vida, ao seu Alferes Médico e amigo Amaral Bernardo. Disse que a princípio não lhe ficou reconhecido pelo esforço em lhe salvar a vida porque o que queria era terminar ali mesmo a sua existência, mas que depois de ultrapassadas todas aquelas horas, e foram muitas, difíceis e dolorosas, reconhece o quanto lhe deve.
Falou do seu livro, onde descreve as horas, mais más do que boas, enquanto militar e enquanto sobrevivente e lutador, tentando viver com a maior normalidade possível face à sua deficiência de guerra.
Falou de Bedanda, localidade onde conheceu os piores dias da sua vida, a que dedicou um poema intitulado "Bedanda terra de Magia", que começa assim: Bedanda. Terra de nada, repleta de tudo / Sem ruas de avenidas despida / Onde o Tuga espera quedo e mudo / Nas entranhas de África nascida.
Podem ler o resto na página 230 de "Quatro Rios e um Destino"
Falou dos seus versos, do seu último livro "Sussuros Meus", do qual também leu alguns poemas, um dos quais em homenagem à Mulher.
O autor, Combatente Fernando Sousa, diz aos presentes o que o levou a escrever este livro.
Dada a possibilidade de intervenção aos presentes, falou em primeiro lugar o Combatente Carlos Pinto Azevedo, contemporâneo do Fernando Sousa e do Dr. Amaral Bernardo na CCAÇ 6 - Bedanda. Recordou também os momentos dolorosos que todos viveram com o acidente do autor ali presente, contando que no primeiro convívio dos bedandenses, ainda a caminho, se lembraram do Fernando e até puseram a hipótese de ele não ter sobrevivido aos graves ferimentos infligidos. Se fosse vivo, deslocar-se ia com certeza com muita dificuldade, talvez apoiado em canadianas ou até em cadeira de rodas. Quando reunidos, perguntam pelo Sousa, se estava vivo. Aparece então aquele homem caminhado normalmente. "Sem uma perna e andas assim?" - "Sem uma não, sem duas".
Espanto geral, estava ali vivo e são, um verdadeiro Combatente, alguém digno da nossa admiração.
Aqui o editor pede desculpa, mas a foto com a intervenção do Carlos não estava em condições de ser publicada.
Falou seguidamente o Presidente da ADFA-Porto, o Combatente Abel Fortuna, também ele um mutilado pela guerra da Guiné - S. Domingos.
Falou da dificuldade que os Combatentes têm, especialmente os Deficientes para quem tudo são barreiras
O camarada Abel Fortuna, Presidente da ADFA-Porto no uso da palavra.
Levantou-se também da assistência o Dr. Paulo Salgado, nosso camarada tertuliano, para saudar o autor e dizer o quanto o marcou positivamente o seu exemplo
Paulo Salgado - Ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721 - Olossato e Nhacra, 1970/72
Na fila da frente estava o Superintendente Isaías Teles, Presidente da Direcção do Núcleo de Oeiras/Cascais da LC, que falou das Tertúlias do Fim do Império e do apoio que esta iniciativa tem dado na edição ou divulgação da bibliografia da Guerra Colonial.
O Superintendente Isaías Teles falando aos presentes.
Era inevitável que não se falasse das mulheres das nossas vidas, principalmente daquelas que a seu modo, na retaguarda, viveram a guerra e sofreram pelos filhos, irmãos, maridos, namorados, afilhados de guerra, etc.
Levantou-se uma senhora que agradeceu as palavras dirigidas às mulheres presentes, e ausentes, uma mulher que já visitou a Guiné inúmeras vezes e por lá cooperou mais o marido. Estamos a falar, como documenta a foto, de Conceição Salgado, esposa do Paulo Salgado, e mãe de Paula Salgado, todos eles com publicações no nosso Blogue.
Peço desculpa pela foto, não é das melhores.
Conceição Salgado falando em nome das mulheres que também sentiram a guerra
Habitual interveniente nas tertúlias da Messe da Batalha, o Coronel Manuel Ferreira da Silva, que foi Comandante o COP 5, Gadamael/Guileje, falou também da falta de respeito e consideração que algumas autarquias ainda têm pelos Combatentes, mantendo aquela distância fria, quase ignorando que existem, esperando que vão morrendo no anonimato. Ele que é um activo defensor de quem foi chamado para a guerra, que nunca se ganha pelas armas, até que o poder político a resolvesse, contou algumas peripécias, quase hilariantes, que vai ultrapassando com muita persistência.
O senhor Coronel Ferreira da Silva
Da assistência levantou-se alguém que só faltou a uma das muitas tertúlias Fim do Império que já se realizaram na Messe da Batalha, no Porto, e que nunca tinha pedido a palavra antes, o Presidente da Direcção do Núcleo de Ribeirão da LC, o Combatente José Ferreira dos Santos.
Disse que não se podia calar perante o exemplo de força de vida que era o Fernando Santos. Que ia levar um exemplar de "Quatro Rios e Um Destino" para a sua mulher ler. Que melhor homenagem lhe podia fazer?
O Combatente José Ferreira dos Santos, Presidente da Direcção do Núcleo de Ribeirão da LC.
Ainda estava reservada uma surpresa, porque quando o Coronel Belchior se levanta é para dar fim aos trabalhos e dar a palavra ao Presidente da Mesa. Mas desta feita, o Coronel Belchior levantou-se para intervir, fazendo o paralelo entre o Fernando Sousa e ele próprio, ferido duas vezes em combate. Claro que como militar profissional, tantos anos no campo de batalha, ser ferido é quase como inevitável, mas um jovem miliciano ficar mutilado é sempre uma tragédia.
O senhor Coronel Belchior falando de si e do Combatente Fernando Sousa
Como médico que é, e como Tenente Médico Miliciano em Angola que foi, o Dr. Reis Lima não podia ficar indiferente ao que ali se passou. Cumprimentou o Fernando pela coragem em ultrapassar as dificuldades que a sua deficiência lhe acarreta e pela sua escrita sentida, tanto em prosa como em verso.
Para encerrar a tertúlia da tarde, o Coronel Belchior deu a palavra ao senhor Coronel Sousa Machado, que aproveitou para dizer que também ele, apesar de não ser contemporâneo, enquanto militar, da Guerra de África, também a sua família sofreu as consequências mais funestas daqueles conturbados tempos.
O senhor Coronel Sousa Machado a encerrar os trabalhos da tarde.
Texto, fotos e legendas: Carlos Vinhal
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Nota do editor
Último poste da série de 11 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16709: Agenda cultural (508): Lançamento do livro "25 de Novembro, Reflexões", coordenação do Coronel Manuel Barão da Cunha, no próximo dia 15 de Novembro de 2016, pelas 15h00, na Livraria/Galeria Municipal Verney, Rua Cândido dos Reis, 92, em Oeiras
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Guiné 63/74 - P16722: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (22): Quem terá sido o Daniel Alves, "duplamente desertor" ? Primeiro, fugiu das nossas fileiras, possivelmente em 1967, e depois das fileiras do PAIGC... Amilcar Cabral, traído e preocupado, escreveu: "O Daniel Alves conseguiu enganar a malta (sic) e fugiu em Dacar. É um facto banal numa luta (deserção ou traição), mas pode complicar-nos muito a vida em relação aos amigos"....
(...) “A segunda má notícia é que o Daniel Alves conseguiu enganar a malta e fugiu em Dakar. É Vamos ver como é que as coisas se passarão, mas é pena que nos tenhamos deixado enganar dessa maneira, tanto mais que sempre desconfiámos do Daniel que a estas horas já deve estar com os tugas. […] Quanto ao Daniel até pode-nos servir de propaganda, mas o diabo são os amigos que têm medo de tudo”. (...)
Fonte: Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral > Documento, s/d [circa jan/fev 1969] de Amílcar Cabral, em que dá a notícia, aos seus camaradas, do desaparecimento, em Dacar, do desertor português Daniel Alves...
Citação:
(s.d.), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34366 (2016-11-8) [Excerto de documento reproduzido com a devida vénia]
1. Comentário do editor (*):
Jorge:
Cheira-me que são dois casos diferentes pelo "desfasamento" das datas... Ou será que o David Costa viveu em Dacar um ano e meio, beneficiando da "hospitalidade" do PAIGC (cama, mesa e roupa lavada ?)... Temos que esclarecer o(s) caso(s)... Também ter acontecido haver aqui uma "troca de nomes" por parte do Amílcar Cabral... que, no fundo, era um líder centralizador e que queria estar a par de tudo... (De resto, o drama do PAIGC foi o Amílcar Cabral, enquanto líder, nunca ter preparado ninguém para o suceder; ele, no íntímo, devia achar que era único e insubstituível, daí a sua dificuldade em delegar; no caso dos desertores, tomava muito a peito esse dossiê, era paternalista com eles, fazia questão de os tratar com "humanidade" mas não escondia os suas intenções, que eram pô-los ao "serviço da propaganda" do PAIG.)
De qualquer modo, este episódio do tal "Daniel Alves" só revela que éramos todos... uma camabada de "ingénuos", nós (as NT), o Amílcar Cabral, o Luís Cabral, o Mário Pádua... Uma trágica ingenuidade que nos levou, a todos, a um puta de uma guerra sem sentido, como todas as guerras...
2. Resposta de Jorge Araújo (*):
O alegado desertor que é apanhado, primeiro, pelo PAIGC, e que depois os finta todos (Amílcar Cabral, Luís Cabral, Mário Pádua...), fugindo de Dacar, será mesmo o David Costa ou será um outro caso ?...
O Amílcar Cabral chama-lhe DANIEL ALVES... Será que o David Costa lhes deu um nome falso ? Em princípio, é possível, ele deve ter fugido indocumentado, em 17 de maio de 1967...
Temos que confirmar as datas... Quando puderes... O documento que citas, em que o Amílcar Cabral dá aos seus camaradas duas más notícias, deve ser de janeiro ou fevereiro de 1969:
(i) uma é o massacre de Sagonhá (6/1/1969); e (ii) a outra é a "deserção" (desta vez das "fileiras" do PAIGC...) do tal "Daniel Alves" (sic)...
O Amílcar Cabral chama-lhe DANIEL ALVES... Será que o David Costa lhes deu um nome falso ? Em princípio, é possível, ele deve ter fugido indocumentado, em 17 de maio de 1967...
Temos que confirmar as datas... Quando puderes... O documento que citas, em que o Amílcar Cabral dá aos seus camaradas duas más notícias, deve ser de janeiro ou fevereiro de 1969:
(i) uma é o massacre de Sagonhá (6/1/1969); e (ii) a outra é a "deserção" (desta vez das "fileiras" do PAIGC...) do tal "Daniel Alves" (sic)...
Cheira-me que são dois casos diferentes pelo "desfasamento" das datas... Ou será que o David Costa viveu em Dacar um ano e meio, beneficiando da "hospitalidade" do PAIGC (cama, mesa e roupa lavada ?)... Temos que esclarecer o(s) caso(s)... Também ter acontecido haver aqui uma "troca de nomes" por parte do Amílcar Cabral... que, no fundo, era um líder centralizador e que queria estar a par de tudo... (De resto, o drama do PAIGC foi o Amílcar Cabral, enquanto líder, nunca ter preparado ninguém para o suceder; ele, no íntímo, devia achar que era único e insubstituível, daí a sua dificuldade em delegar; no caso dos desertores, tomava muito a peito esse dossiê, era paternalista com eles, fazia questão de os tratar com "humanidade" mas não escondia os suas intenções, que eram pô-los ao "serviço da propaganda" do PAIG.)
De qualquer modo, este episódio do tal "Daniel Alves" só revela que éramos todos... uma camabada de "ingénuos", nós (as NT), o Amílcar Cabral, o Luís Cabral, o Mário Pádua... Uma trágica ingenuidade que nos levou, a todos, a um puta de uma guerra sem sentido, como todas as guerras...
Luís e restantes camaradas,
Antes de mais, as minhas desculpas pelo enorme lapso que cometi e que só agora dei conta.
De facto, estamos perante dois casos distintos. Serão, certamente, dois desertores das NT, o 1.º é o David Costa, que depois de ter regressado a Bissau, foi preso e julgado em 1968 [segundo as minhas contas entre maio e junho].
O 2.º é o Daniel Alves [se o nome for verdadeiro!?] e que terá fugido de Dacar, a exemplo do David Costa, em finais de 1968.
Baralhei-me com os nomes: David vs Daniel. (**)
Antes de mais, as minhas desculpas pelo enorme lapso que cometi e que só agora dei conta.
De facto, estamos perante dois casos distintos. Serão, certamente, dois desertores das NT, o 1.º é o David Costa, que depois de ter regressado a Bissau, foi preso e julgado em 1968 [segundo as minhas contas entre maio e junho].
O 2.º é o Daniel Alves [se o nome for verdadeiro!?] e que terá fugido de Dacar, a exemplo do David Costa, em finais de 1968.
Baralhei-me com os nomes: David vs Daniel. (**)
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 15 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16721: Notas de leitura (892): (D)o outro lado do combate: memórias de médicos cubanos (1966-1969) - Parte XII: O caso do médico militar, especialista em cirurgia cardiovascular, Virgílio Camacho Duverger [III]: o encontro, em Boké,com o médico português Mário Pádua (Jorge Araújo)
(*) Vd. poste de 15 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16721: Notas de leitura (892): (D)o outro lado do combate: memórias de médicos cubanos (1966-1969) - Parte XII: O caso do médico militar, especialista em cirurgia cardiovascular, Virgílio Camacho Duverger [III]: o encontro, em Boké,com o médico português Mário Pádua (Jorge Araújo)
(**) Último poste da série > 8 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16699: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (21): Mário Moutinho Pádua, o primeiro oficial português a desertar, em Angola, em outubro de 1961... Será, mais tarde, médico do PAIGC, no hospital de Ziguinchor, entre fevereiro de 1967 e setembro de 1969... Regressou a Portugal em novembro de 1974, e cumpriu o resto do serviço militar... Aposentou-se em 2003 como médico do Hospital Pulido Valente (Juvenal Amado)
Guiné 63/74 - P16721: Notas de leitura (892): (D)o outro lado do combate: memórias de médicos cubanos (1966-1969) - Parte XII: O caso do médico militar, especialista em cirurgia cardiovascular, Virgílio Camacho Duverger [III]: o encontro, em Boké,com o médico português Mário Pádua (Jorge Araújo)
Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral > "Guerrilheiro recebendo assistência médica" (Reprodução com a devida vénia...)
Citação:
(1963-1973), "Guerrilheiro recebendo assistência médica", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43678 (2016-11-8)
Guiné-Conacri > Boké > 1968 > Aspetos da assistência médico-cirúgica no hospital do PAIGC por onde passaram médicos cubanos como o dr. Virgílio Camacho Duverger (1934-2003), mas também o português dr. Mário Pádua (que não era cirurgião mas patologista clínico)
1. INTRODUÇÃO
Depois de na narrativa anterior [P16662] termos efectuado uma análise histórica superficial (entre o real e a ficção) ao modo como Amílcar Cabral [1924-1973] abordou /utilizou a morte em combate do cmdt Domingos Ramos, um quadro superior da estrutura militar do PAIGC e que fizera a sua formação inicial no exército português, ao concluir o 1.º Curso de Sargentos Milicianos, realizado em Bissau no ano de 1959, retomamos a publicação do nosso projecto de investigação tendo por título «d(o) outro lado do combate». (*)
Este tem a sua génese na divulgação de algumas das memórias transmitidas por três médicos cubanos que estiveram na Guiné Portuguesa [hoje Guiné-Bissau] em missão de “ajuda humanitária” ao PAIGC, na sua luta pela independência, nos anos de 1966 a 1969.
Com efeito, o presente texto corresponde ao terceiro fragmento do diálogo estabelecido com o médico militar Virgílio Camacho Duverger [1934-2003], sendo a terceira e última entrevista no alinhamento do livro escrito em castelhano pelo jornalista e investigador Hedelberto López Blanch. Trata-se de uma coletânea de memórias e experiências divulgadas pelos seus diferentes entrevistados, a que deu o título de «Histórias Secretas de Médicos Cubanos» [La Habana: Centro Cultural Pablo de la Torriente Brau, 2005, 248 pp.] ou “on line” em formato pdf, em versão de pré-publicação.
[Consulta em 30 de maio de 2016]. Disponível em:
http://www.centropablo.cult.cu/libros_descargar/historiamedicos_cubanos.pdf ]
Uma vez que estamos perante uma tradução e adaptação do castelhano, onde procurámos respeitar as ideias expressas nas respostas dadas a cada questão, entendemos não fazer juízos de valor sobre o seu conteúdo, colocando entre parênteses rectos, quando possível, algumas notas avulsas de reforço histórico ao que foi transmitido, com recurso ao vasto espólio disponível no nosso blogue e a outras referências retiradas da Net, em particular da Casa Comum, Fundação Mário Soares.
Por outro lado, e tendo em consideração as questões formuladas pelo entrevistador, estas permitiram-nos fazer a ligação com outros aspectos intrínsecos ao conflito, de que são exemplos concretos a falta de recursos básicos e as deserções militares.
2. O CASO DO MÉDICO VIRGÍLIO CAMACHO DUVERGER [III]
Virgílio Camacho Duverger, cujo nome de guerra era “Vítor Córdoba Duque”, nasceu a 29 de novembro de 1934, em Guantánamo, chegando à Guiné-Conacri nos primeiros dias de junho de 1966, a seis meses de completar trinta e dois anos e sete anos após ter ingressado no Exército Rebelde como técnico de saúde.
Depois de ter assistido à morte do cmdt da Frente Leste, Domingos Ramos, ocorrida em Madina do Boé, em 10 de novembro de 1966, faz agora cinquenta anos, o dr. Virgílio Duverger é transferido com destino à Frente Sul, por troca com o dr. Rómulo Soler Vaillant, que entretanto adoecera. Porém, durante essa permuta, é nomeado chefe do Hospital Militar de Boké, aonde se manteve durante dois meses.
Seguem-se mais alguns desenvolvimentos revelados durante a entrevista dada pelo cirurgião cubano Virgílio Camacho Duverger.
- Entrevista com 22 questões [Parte 3 > da 13.ª à 15.ª] - “Testemunhos antes da morte”
[A nota introdutória é da responsabilidade do jornalista Hedelberto López Blanch, justificando, pelo desenlace à posteriori, o titulo dado à entrevista: «testemunhos antes da morte»].
O diálogo com o médico Virgílio Camacho Duverger [1934-2003] foi realizado pelo jornalista e historiador cubano Hedelberto Blanch numa tarde de janeiro de 2003, num pequeno gabinete do Hospital [Clínico Quirúrgico] Hermanos Ameijeiras, aonde mantinha uma consulta voluntária todas as terças-feiras.
Viria a falecer dez meses depois vítima de enfarte do miocárdio.
Com efeito, o presente texto corresponde ao terceiro fragmento do diálogo estabelecido com o médico militar Virgílio Camacho Duverger [1934-2003], sendo a terceira e última entrevista no alinhamento do livro escrito em castelhano pelo jornalista e investigador Hedelberto López Blanch. Trata-se de uma coletânea de memórias e experiências divulgadas pelos seus diferentes entrevistados, a que deu o título de «Histórias Secretas de Médicos Cubanos» [La Habana: Centro Cultural Pablo de la Torriente Brau, 2005, 248 pp.] ou “on line” em formato pdf, em versão de pré-publicação.
[Consulta em 30 de maio de 2016]. Disponível em:
http://www.centropablo.cult.cu/libros_descargar/historiamedicos_cubanos.pdf ]
Uma vez que estamos perante uma tradução e adaptação do castelhano, onde procurámos respeitar as ideias expressas nas respostas dadas a cada questão, entendemos não fazer juízos de valor sobre o seu conteúdo, colocando entre parênteses rectos, quando possível, algumas notas avulsas de reforço histórico ao que foi transmitido, com recurso ao vasto espólio disponível no nosso blogue e a outras referências retiradas da Net, em particular da Casa Comum, Fundação Mário Soares.
Por outro lado, e tendo em consideração as questões formuladas pelo entrevistador, estas permitiram-nos fazer a ligação com outros aspectos intrínsecos ao conflito, de que são exemplos concretos a falta de recursos básicos e as deserções militares.
2. O CASO DO MÉDICO VIRGÍLIO CAMACHO DUVERGER [III]
Virgílio Camacho Duverger, cujo nome de guerra era “Vítor Córdoba Duque”, nasceu a 29 de novembro de 1934, em Guantánamo, chegando à Guiné-Conacri nos primeiros dias de junho de 1966, a seis meses de completar trinta e dois anos e sete anos após ter ingressado no Exército Rebelde como técnico de saúde.
Depois de ter assistido à morte do cmdt da Frente Leste, Domingos Ramos, ocorrida em Madina do Boé, em 10 de novembro de 1966, faz agora cinquenta anos, o dr. Virgílio Duverger é transferido com destino à Frente Sul, por troca com o dr. Rómulo Soler Vaillant, que entretanto adoecera. Porém, durante essa permuta, é nomeado chefe do Hospital Militar de Boké, aonde se manteve durante dois meses.
Seguem-se mais alguns desenvolvimentos revelados durante a entrevista dada pelo cirurgião cubano Virgílio Camacho Duverger.
- Entrevista com 22 questões [Parte 3 > da 13.ª à 15.ª] - “Testemunhos antes da morte”
[A nota introdutória é da responsabilidade do jornalista Hedelberto López Blanch, justificando, pelo desenlace à posteriori, o titulo dado à entrevista: «testemunhos antes da morte»].
O diálogo com o médico Virgílio Camacho Duverger [1934-2003] foi realizado pelo jornalista e historiador cubano Hedelberto Blanch numa tarde de janeiro de 2003, num pequeno gabinete do Hospital [Clínico Quirúrgico] Hermanos Ameijeiras, aonde mantinha uma consulta voluntária todas as terças-feiras.
Viria a falecer dez meses depois vítima de enfarte do miocárdio.
(xiii) Como era o trabalho em Boké?
Em Boké [em junho de 1967] já existia uma base hospitalar com quinze camas, com uma pequena sala de operações. Depois chegou o dr. Raúl Currás [Regalado] (morreu num acidente em Angola). Ele era médico interno e tinha de fazer em certas ocasiões de anestesista. Eu tinha que administrar todos os medicamentos e material de cirurgia aos dois hospitais [de mato] da Frente Sul, no interior da Guiné-Bissau. Nestes lugares começou-se a atender a população civil e os casos mais frequentes eram as hérnias.
Chegou o momento em que houve que limitar a entrega de materiais, sobretudo de cirurgia, pois corria-se o risco de poderem fazer falta para os combatentes feridos, por se terem esgotado. Recordo dois casos que operámos e tivemos que os coser com linha doméstica. Para as operações cirúrgicas utilizávamos a técnica intravenosa Pentotal sódico na veia quando era necessário, e se não, usava-se anestesia local.
Cerca de dois meses e depois passei a um dos hospitais [no mato] na Frente Sul, aonde as acções de combate eram em maior número dos que as na Frente Leste devido à quantidade de aquartelamentos portugueses.
Desde o local aonde ocorriam os combates até ao hospital, às vezes demorava-se três ou quatro dias para se transportar os feridos e estes chegavam em muito más condições. Decidiu-se, então, organizar uma pequena enfermaria aonde se podiam fazer algumas operações, embora tivéssemos muito pouco material como fio cirúrgico e soros.
Entretanto, este pequeno grupo de médicos cubanos, em Boké, recebe, também nesta data, em julho de 1967, um reforço inesperado para a sua equipa multidisciplinar com a chegada, agora, de um português - o dr. Mário Moutinho de Pádua – que seis anos antes, em 1961, ano zero da que se convencionou chamar de «Guerra Colonial» ou «Guerra do Ultramar», decidira desertar da sua unidade militar [, BCaç 88] em Angola, optando por aderir aos objectivos dos movimentos africanos de oposição e resistência às colónias europeias, onde o PAIGC acabaria por contar com a sua colaboração.
Dos diferentes itinerários e das muitas experiências vividas ao longo de cada um deles, o dr. Mário Moutinho de Pádua decidiu publicar em livro as suas memórias a que deu o título de «No Percurso de Guerras Coloniais, 1961-1969», Edições Avante, 2011. Trata-se de um tema já abordado no Blogue da iniciativa do camarada Beja Santos que nos presenteou com as suas esclarecedoras «Notas de Leitura» [P10184].
Deste trabalho divulgado no poste supra, tomámos a liberdade de citar, com a devida vénia, alguns fragmentos, com destaque para os elementos sócio históricos que considerámos relevantes, justamente para enquadramento da presente narrativa.
Em primeiro lugar, é de referir que este cidadão português, natural de Coimbra, filho de um conhecido e respeitado advogado e notário com escritórios em Luanda nos anos cinquenta/sessenta do século passado, ficará na história da Guerra Colonial/Ultramar como sendo o primeiro oficial do exército português [alferes miliciano] a desertar em Angola, em outubro de 1961 [portanto, seis meses após o início do conflito], na companhia do [1.º] Cabo Alberto Pinto, para se juntar [em?] [não conseguimos confirmar a opção deste segundo militar] aos movimentos de libertação. [http://recordacoescasamarela.blogspot.pt/2012/07/o-passado-presente-agora-novo-jornal.html].
Para melhor entendimento do percurso narrado pelo autor sobre as suas experiências, eis uma Sinopse [https://www.wook.pt/livro/no-percurso-das-guerras-coloniais-1961-1969-mario-moutinho-de-padua/11518509]:
“O autor foi o primeiro oficial português a desertar em Angola, em 1961. Neste livro narra a sua impressionante experiência a seguir à deserção, nomeadamente as prisões e torturas de que foi alvo no Congo, a sua passagem pela [ex] Checoslováquia e o seu desencanto com vários aspectos do “socialismo real”, a sua participação na construção de uma Argélia recém-libertada do colonialismo, e por fim a sua contribuição como médico na luta travada pelo PAIGC na Guiné”.
Quanto à sua colaboração com o PAIGC, ela inicia-se com a sua chegada em 1967 a Conacri [um ano depois de ter ocorrido semelhante situação com o primeiro contingente de “internacionalistas” cubanos, do qual faziam parte nove médicos]. As suas primeiras actividades clínicas acontecem no Lar do Combatente, em Conacri, onde trata os guerrilheiros feridos e doentes.
Decorrido algum tempo [pouco] sente a necessidade de realizar outras tarefas mais consentâneas com as suas habilitações académicas, vindo a concretizar esse objectivo poucas semanas depois com a sua transferência para o Hospital de Boké [julho de 1967]. Aí trabalha em cooperação com a equipa de médicos e enfermeiros cubanos, aonde os recursos clínicos eram muito limitados.
Essas lacunas estavam já identificadas há algum tempo como prova o telegrama abaixo dirigido, em 11 de abril de 1967, ao «Comité de Solidariedade Afro-asiático Thallmann Platz, em Berlim», por Amílcar Cabral.
Com tradução do francês, eis a sua transcrição na íntegra:
Telegrama ao Comité de Solidariedade Afro-asiático Thallmann Platz 8/9 Berlim
“Face situação muito grave motivo falta total medicamentos colocando perigo vida vários combatentes feridos e elementos população vítimas bombardeamentos lançamos premente apelo envio urgente quantidades medicamentos possíveis nomeadamente álcool, mercurocromo, curativos, algodão, antibióticos, antipalúdicos (antimaláricos), antidiarreico, soro, leite STOP Confiante vossa solidariedade esperamos confirmação expedição endereço PAIGC BP [caixa postal] 298 Conacri STOP Fraternais agradecimentos
Amílcar Cabral
Secretário-geral do PAIGC
BP 298 Conacri, 11 abril 1967"
Citação: (1967), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34963 (2016-11-8)
No âmbito da sua missão, [certo dia?] o dr. Mário Pádua desloca-se a uma base guerrilheira no interior do território guineense [Frente Sul], aonde tem contacto com a enfermaria aí existente. Era uma base com uma dezena de cabanas enquadradas e camufladas pelas copas de grandes árvores, e aonde havia uma sala de operações. Ao observar o seu interior ficou surpreso com a extraordinária limpeza do solo, para além de existir uma enfermeira afugentando as moscas durante as intervenções cirúrgicas.
Passadas algumas semanas abandona Boké [agosto de 1967], sendo transferido para Ziguinchor, no Senegal, e colocado no Lar do Combatente, que havia sido criado há pouco tempo.
Os meios postos à disposição do PAIGC, como já foi referido anteriormente, eram rudimentares, onde nas suas bases os guerrilheiros passavam toda a casta de provações e muitas vezes subalimentados, e onde os combatentes feridos estavam em primeiro lugar. Refere que estes logo que desembarcavam assistia-se ao espectáculo de feridas enormes, abertas, que já não se podiam suturar, dado o intervalo de tempo que decorrera após a lesão [alguns dias].
(...) "Eu [Mário Pádua] e os enfermeiros guineenses, meus colaboradores, limpávamos os tecidos infectados com água oxigenada, cortávamos os tecidos mortos e terminada a limpeza cirúrgica tentávamos aproximar os bordos esticando a pele com adesivo. Sucedeu, em feridas fundas e com pequeno orifício de entrada, que quando retirava a sonda exploratória, me vinha ao nariz o cheiro inconfundível da gangrena gasosa.
"Um dia comecei a tratar um soldado que tinha o braço direito muito destroçado embora não sangrasse. Estas limpezas cirúrgicas em geral demoravam horas. Este doente não se queixava de dores. Quando terminei, pele, músculos, vasos e nervos de um dos membros superiores tinham praticamente desaparecido. Apenas restavam os ossos completamente descarnados. Nestas circunstâncias só restava a amputação." (...)
Refere ainda que os guerrilheiros passavam literalmente fome, para além de serem anémicos. No Lar de Ziguinchor momentos houve em que a alimentação estava reduzida a arroz. Por isso valoriza o excessivo sofrimento dos combatentes.
Acrescenta que “quando os feridos demoravam dias para chegar a Ziguinchor, as larvas fervilhavam nos tecidos expostos. O que fazia parte da rotina da guerra e me deixava estupefacto era o transporte dos feridos e doentes por zonas flageladas, vinham em macas fabricadas com troncos. O esforço físico exigido dificilmente se pode conceber”.
Entretanto, durante a sua presença em Ziguinchor, o dr. Mário Pádua contabiliza duas experiências únicas, estas relacionadas com dois militares portugueses que, quis o destino, ali foram parar, por motivos diferentes: um por deserção, estratégia, improvidência, fuga voluntária para a prisão ou outra razão difícil de provar [que só o próprio saberá qual foi], o outro para sobreviver aos ferimentos em combate depois de ter sido capturado por grupo de guerrilheiros, o que veio a verificar-se… e ainda bem!
O primeiro, de nome David Ferreira de Jesus Costa [David Costa], soldado da CART 1660 (1967/1968), que um dia [17 de maio de 1967] decidiu, consciente ou inconscientemente, pôr a sua vida em risco ao abandonar, pela calada da noite, o quartel de Mansoa, vindo a ser localizado na mata por elementos do PAIGC, que o convidaram a acompanhá-los depois de ele lhes ter dito de que tinha fugido do exército português. Dirigiu-se ao Morés, seguindo-se outras bases, talvez Maqué, Naga e Sambuia, até chegar a Ziguinchor, provavelmente algumas semanas depois.
Esta história foi contada pelo próprio e publicada em livro com o título «Desertor ou Patriota», Editora Ausência, 2004, e que constava já do espólio de memórias do Blogue, por iniciativa do camarada Virgínio Briote [P3371, de 2008], do camarada Beja Santos na sua tradicional e importante coluna «Notas de Leitura» [P6776, de 2010] e do camarada Jorge Lobo, companheiro do David Costa na CART 1660 [P7351, de 2010].
Este episódio, ao ser recentemente resgatado como tema em debate da nossa tertúlia “desertores” [P16686], originando novos comentários com diferentes perspectivas, levou-me a adiar a conclusão desta narrativa, alterando-a, inclusivamente, para não ser repetitivo.
Da investigação realizada na Casa Comum, Fundação Mário Soares, encontrei umas notas de Amílcar Cabral, escritas nos primeiros dias de janeiro de 1969, onde refere:
“Depois de sair daí [passagem de ano de 1968 na Frente Sul], tive más notícias que são as seguintes:
A priemrias relatuva a baixas do PAIGC, na sequência do ataque a Gantur+é, em 6/1/1969… [a desenvolver em próxima narrativa].
“A segunda má notícia é que o Daniel Alves [será que era o nome de guerra de Daniel Costa, ou estaremos perante outro desertor com o mesmo nome próprio?] conseguiu enganar a malta e fugiu em Dakar. É um facto banal numa luta (deserção ou traição), mas pode complicar-nos muito a vida em relação aos amigos. Vamos ver como é que as coisas se passarão, mas é pena que nos tenhamos deixado enganar dessa maneira, tanto mais que sempre desconfiámos do Daniel [?] que a estas horas já deve estar com os tugas. […] Quanto ao Daniel [?] até pode-nos servir de propaganda, mas o diabo são os amigos que têm medo de tudo”. […]
Citação:
(s.d.), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34366 (2016-11-8)
O segundo, de nome Manuel Fragata Francisco [ou Manuel Fragata], soldado da CART 1690 [1967/1969], sediada em Geba, ao participar na “Op Invisível”, realizada a 19 de dezembro de 1967, na mata do Óio, é gravemente ferido, sendo aprisionado e levado para a base de Sinchã Jobel. Desta base seguiu depois, certamente, por Sará, Morés, Maqué, Naga e Sambuia, em direcção ao Hospital de Ziguinchor, onde foi recebido e tratado pelo dr. Mário Pádua.
Sobre esta ocorrência, o camarada A. Lopes Marques refere nos [P45 + P15202} que o cmdt do PAIGC, Agostinho Cabral de Almada, com nome de guerra “Gazela”, lhe contou que o soldado Fragata foi atingido pelos estilhaços de uma granada de RPG2, tendo ficado “furado” e, por consequência, impossibilitado de caminhar. Ficou prisioneiro, e levado de maca [talvez de troncos onde, certamente, a sua dor e o sofrimento seriam constantes em cada batimento cardíaco] desde a mata do Óio até ao Hospital de Ziguinchor, em Casamansa, Senegal [aonde terá chegado muito perto do Natal de 1967].
Mapa da Guiné-Bissau > Indicam-se os prováveis itinerários utilizados pelo David Costa (a vermelho) e o Manuel Fragata (a azul) até Ziguinchor.
Aí permaneceu cerca de dois meses e meio em recuperação, sob os cuidados do dr. Mário Pádua, até que em 15 de março de 1968 foi entregue à Cruz Vermelha do Senegal e repatriado, por via aérea, para Portugal, onde ficou internado no anexo do Hospital Militar Principal, na Rua Artilharia Um, em Lisboa.
Citação:
(1968), "Entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_44075 (2016-11-8)
Instituição:
Fundação Mário Soares
Pasta: 05224.000.038Título: Entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal
Assunto: Osvaldo Lopes da Silva durante a entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal, em Dakar [Eduardo Dias Vieira, José Vieira Lauro e Manuel Fragata Francisco].
Data: Sexta, 15 de Março de 1968
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo Documental: Fotografias
_________________
Chegou o momento em que houve que limitar a entrega de materiais, sobretudo de cirurgia, pois corria-se o risco de poderem fazer falta para os combatentes feridos, por se terem esgotado. Recordo dois casos que operámos e tivemos que os coser com linha doméstica. Para as operações cirúrgicas utilizávamos a técnica intravenosa Pentotal sódico na veia quando era necessário, e se não, usava-se anestesia local.
(xiv) Permaneceu muito tempo em Boké?
Cerca de dois meses e depois passei a um dos hospitais [no mato] na Frente Sul, aonde as acções de combate eram em maior número dos que as na Frente Leste devido à quantidade de aquartelamentos portugueses.
Desde o local aonde ocorriam os combates até ao hospital, às vezes demorava-se três ou quatro dias para se transportar os feridos e estes chegavam em muito más condições. Decidiu-se, então, organizar uma pequena enfermaria aonde se podiam fazer algumas operações, embora tivéssemos muito pouco material como fio cirúrgico e soros.
(xv) Recorda algum caso interessante?
A escassez era muita e por isso tínhamos de inventar. Em certa ocasião, recordo-me que a um paciente com uma ferida no abdómen, tive de lhe fazer uma pequena ressecção abdominal, e a recuperação foi com água de coco, pois não tínhamos soro para fazer venóclise [método para infundir líquidos dentro das veias], e plasma muito menos. Todos os casos evoluíram perfeitamente porque os africanos são virgens não só em relação aos antibióticos como também aos restantes medicamentos.
Outro caso que recordo e que tinha lido nos livros, foi um paciente que chegou com uma ferida torácica perto da região axilar [de axila]. Aí suspeitámos sobre o que havíamos lido, pois a explosão podia ter causado dano em algum vaso importante e estivemos vigilantes na crosta, produto da lesão produzida pela explosão do projéctil, pois se caísse poderia dar lugar a um sangramento agudo. Assim aconteceu, mas como estávamos atentos, o acudimos a tempo. Não tínhamos os instrumentos necessários, nem sangue nem plasma. Foi um dos momentos mais angustiantes por que passei, pois com a mão esquerda tinha o vaso agarrado, comprimindo-o, ou seja, eu tinha, praticamente, numa mão a vida desse combatente, e na outra o instrumental, que não era o adequado, tentando controlar a hemorragia.
Parei e depois esperei, pois o que estava descrito na literatura de consulta era que deveria esperar e observar por onde poderia gangrenar [morte local dos tecidos], uma vez que foi na artéria axilar que leva a nutrição fundamental ao membro superior.
Naquele caso, teve-se que amputar ao paciente, nada mais que uma parte da mão. Coisa rara, pois na maioria dos casos há que amputar o braço ou o antebraço. Era guineense, e fiz-lhe uma necrose distal da mão, ou seja, era uma evolução satisfatória naquele sentido.
Continua…
3. Nota de Jorge Araújo sobre o médico português Mário PáduaOutro caso que recordo e que tinha lido nos livros, foi um paciente que chegou com uma ferida torácica perto da região axilar [de axila]. Aí suspeitámos sobre o que havíamos lido, pois a explosão podia ter causado dano em algum vaso importante e estivemos vigilantes na crosta, produto da lesão produzida pela explosão do projéctil, pois se caísse poderia dar lugar a um sangramento agudo. Assim aconteceu, mas como estávamos atentos, o acudimos a tempo. Não tínhamos os instrumentos necessários, nem sangue nem plasma. Foi um dos momentos mais angustiantes por que passei, pois com a mão esquerda tinha o vaso agarrado, comprimindo-o, ou seja, eu tinha, praticamente, numa mão a vida desse combatente, e na outra o instrumental, que não era o adequado, tentando controlar a hemorragia.
Parei e depois esperei, pois o que estava descrito na literatura de consulta era que deveria esperar e observar por onde poderia gangrenar [morte local dos tecidos], uma vez que foi na artéria axilar que leva a nutrição fundamental ao membro superior.
Naquele caso, teve-se que amputar ao paciente, nada mais que uma parte da mão. Coisa rara, pois na maioria dos casos há que amputar o braço ou o antebraço. Era guineense, e fiz-lhe uma necrose distal da mão, ou seja, era uma evolução satisfatória naquele sentido.
Continua…
Entretanto, este pequeno grupo de médicos cubanos, em Boké, recebe, também nesta data, em julho de 1967, um reforço inesperado para a sua equipa multidisciplinar com a chegada, agora, de um português - o dr. Mário Moutinho de Pádua – que seis anos antes, em 1961, ano zero da que se convencionou chamar de «Guerra Colonial» ou «Guerra do Ultramar», decidira desertar da sua unidade militar [, BCaç 88] em Angola, optando por aderir aos objectivos dos movimentos africanos de oposição e resistência às colónias europeias, onde o PAIGC acabaria por contar com a sua colaboração.
Dos diferentes itinerários e das muitas experiências vividas ao longo de cada um deles, o dr. Mário Moutinho de Pádua decidiu publicar em livro as suas memórias a que deu o título de «No Percurso de Guerras Coloniais, 1961-1969», Edições Avante, 2011. Trata-se de um tema já abordado no Blogue da iniciativa do camarada Beja Santos que nos presenteou com as suas esclarecedoras «Notas de Leitura» [P10184].
Deste trabalho divulgado no poste supra, tomámos a liberdade de citar, com a devida vénia, alguns fragmentos, com destaque para os elementos sócio históricos que considerámos relevantes, justamente para enquadramento da presente narrativa.
Em primeiro lugar, é de referir que este cidadão português, natural de Coimbra, filho de um conhecido e respeitado advogado e notário com escritórios em Luanda nos anos cinquenta/sessenta do século passado, ficará na história da Guerra Colonial/Ultramar como sendo o primeiro oficial do exército português [alferes miliciano] a desertar em Angola, em outubro de 1961 [portanto, seis meses após o início do conflito], na companhia do [1.º] Cabo Alberto Pinto, para se juntar [em?] [não conseguimos confirmar a opção deste segundo militar] aos movimentos de libertação. [http://recordacoescasamarela.blogspot.pt/2012/07/o-passado-presente-agora-novo-jornal.html].
Para melhor entendimento do percurso narrado pelo autor sobre as suas experiências, eis uma Sinopse [https://www.wook.pt/livro/no-percurso-das-guerras-coloniais-1961-1969-mario-moutinho-de-padua/11518509]:
“O autor foi o primeiro oficial português a desertar em Angola, em 1961. Neste livro narra a sua impressionante experiência a seguir à deserção, nomeadamente as prisões e torturas de que foi alvo no Congo, a sua passagem pela [ex] Checoslováquia e o seu desencanto com vários aspectos do “socialismo real”, a sua participação na construção de uma Argélia recém-libertada do colonialismo, e por fim a sua contribuição como médico na luta travada pelo PAIGC na Guiné”.
Quanto à sua colaboração com o PAIGC, ela inicia-se com a sua chegada em 1967 a Conacri [um ano depois de ter ocorrido semelhante situação com o primeiro contingente de “internacionalistas” cubanos, do qual faziam parte nove médicos]. As suas primeiras actividades clínicas acontecem no Lar do Combatente, em Conacri, onde trata os guerrilheiros feridos e doentes.
Decorrido algum tempo [pouco] sente a necessidade de realizar outras tarefas mais consentâneas com as suas habilitações académicas, vindo a concretizar esse objectivo poucas semanas depois com a sua transferência para o Hospital de Boké [julho de 1967]. Aí trabalha em cooperação com a equipa de médicos e enfermeiros cubanos, aonde os recursos clínicos eram muito limitados.
Essas lacunas estavam já identificadas há algum tempo como prova o telegrama abaixo dirigido, em 11 de abril de 1967, ao «Comité de Solidariedade Afro-asiático Thallmann Platz, em Berlim», por Amílcar Cabral.
Com tradução do francês, eis a sua transcrição na íntegra:
Telegrama ao Comité de Solidariedade Afro-asiático Thallmann Platz 8/9 Berlim
“Face situação muito grave motivo falta total medicamentos colocando perigo vida vários combatentes feridos e elementos população vítimas bombardeamentos lançamos premente apelo envio urgente quantidades medicamentos possíveis nomeadamente álcool, mercurocromo, curativos, algodão, antibióticos, antipalúdicos (antimaláricos), antidiarreico, soro, leite STOP Confiante vossa solidariedade esperamos confirmação expedição endereço PAIGC BP [caixa postal] 298 Conacri STOP Fraternais agradecimentos
Amílcar Cabral
Secretário-geral do PAIGC
BP 298 Conacri, 11 abril 1967"
Citação: (1967), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34963 (2016-11-8)
No âmbito da sua missão, [certo dia?] o dr. Mário Pádua desloca-se a uma base guerrilheira no interior do território guineense [Frente Sul], aonde tem contacto com a enfermaria aí existente. Era uma base com uma dezena de cabanas enquadradas e camufladas pelas copas de grandes árvores, e aonde havia uma sala de operações. Ao observar o seu interior ficou surpreso com a extraordinária limpeza do solo, para além de existir uma enfermeira afugentando as moscas durante as intervenções cirúrgicas.
Passadas algumas semanas abandona Boké [agosto de 1967], sendo transferido para Ziguinchor, no Senegal, e colocado no Lar do Combatente, que havia sido criado há pouco tempo.
Os meios postos à disposição do PAIGC, como já foi referido anteriormente, eram rudimentares, onde nas suas bases os guerrilheiros passavam toda a casta de provações e muitas vezes subalimentados, e onde os combatentes feridos estavam em primeiro lugar. Refere que estes logo que desembarcavam assistia-se ao espectáculo de feridas enormes, abertas, que já não se podiam suturar, dado o intervalo de tempo que decorrera após a lesão [alguns dias].
(...) "Eu [Mário Pádua] e os enfermeiros guineenses, meus colaboradores, limpávamos os tecidos infectados com água oxigenada, cortávamos os tecidos mortos e terminada a limpeza cirúrgica tentávamos aproximar os bordos esticando a pele com adesivo. Sucedeu, em feridas fundas e com pequeno orifício de entrada, que quando retirava a sonda exploratória, me vinha ao nariz o cheiro inconfundível da gangrena gasosa.
"Um dia comecei a tratar um soldado que tinha o braço direito muito destroçado embora não sangrasse. Estas limpezas cirúrgicas em geral demoravam horas. Este doente não se queixava de dores. Quando terminei, pele, músculos, vasos e nervos de um dos membros superiores tinham praticamente desaparecido. Apenas restavam os ossos completamente descarnados. Nestas circunstâncias só restava a amputação." (...)
Refere ainda que os guerrilheiros passavam literalmente fome, para além de serem anémicos. No Lar de Ziguinchor momentos houve em que a alimentação estava reduzida a arroz. Por isso valoriza o excessivo sofrimento dos combatentes.
Acrescenta que “quando os feridos demoravam dias para chegar a Ziguinchor, as larvas fervilhavam nos tecidos expostos. O que fazia parte da rotina da guerra e me deixava estupefacto era o transporte dos feridos e doentes por zonas flageladas, vinham em macas fabricadas com troncos. O esforço físico exigido dificilmente se pode conceber”.
Entretanto, durante a sua presença em Ziguinchor, o dr. Mário Pádua contabiliza duas experiências únicas, estas relacionadas com dois militares portugueses que, quis o destino, ali foram parar, por motivos diferentes: um por deserção, estratégia, improvidência, fuga voluntária para a prisão ou outra razão difícil de provar [que só o próprio saberá qual foi], o outro para sobreviver aos ferimentos em combate depois de ter sido capturado por grupo de guerrilheiros, o que veio a verificar-se… e ainda bem!
Capa do livro "Desertor ou patriota" |
Esta história foi contada pelo próprio e publicada em livro com o título «Desertor ou Patriota», Editora Ausência, 2004, e que constava já do espólio de memórias do Blogue, por iniciativa do camarada Virgínio Briote [P3371, de 2008], do camarada Beja Santos na sua tradicional e importante coluna «Notas de Leitura» [P6776, de 2010] e do camarada Jorge Lobo, companheiro do David Costa na CART 1660 [P7351, de 2010].
Este episódio, ao ser recentemente resgatado como tema em debate da nossa tertúlia “desertores” [P16686], originando novos comentários com diferentes perspectivas, levou-me a adiar a conclusão desta narrativa, alterando-a, inclusivamente, para não ser repetitivo.
Da investigação realizada na Casa Comum, Fundação Mário Soares, encontrei umas notas de Amílcar Cabral, escritas nos primeiros dias de janeiro de 1969, onde refere:
“Depois de sair daí [passagem de ano de 1968 na Frente Sul], tive más notícias que são as seguintes:
A priemrias relatuva a baixas do PAIGC, na sequência do ataque a Gantur+é, em 6/1/1969… [a desenvolver em próxima narrativa].
“A segunda má notícia é que o Daniel Alves [será que era o nome de guerra de Daniel Costa, ou estaremos perante outro desertor com o mesmo nome próprio?] conseguiu enganar a malta e fugiu em Dakar. É um facto banal numa luta (deserção ou traição), mas pode complicar-nos muito a vida em relação aos amigos. Vamos ver como é que as coisas se passarão, mas é pena que nos tenhamos deixado enganar dessa maneira, tanto mais que sempre desconfiámos do Daniel [?] que a estas horas já deve estar com os tugas. […] Quanto ao Daniel [?] até pode-nos servir de propaganda, mas o diabo são os amigos que têm medo de tudo”. […]
Arquivo Amílcar Cabral > Documento, s/d, de Amílcar Cabral, em que dá a notícia do desaparecimento, em Dacar, do desertor português Daniel Costa...
Citação:
(s.d.), Sem Título, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34366 (2016-11-8)
O segundo, de nome Manuel Fragata Francisco [ou Manuel Fragata], soldado da CART 1690 [1967/1969], sediada em Geba, ao participar na “Op Invisível”, realizada a 19 de dezembro de 1967, na mata do Óio, é gravemente ferido, sendo aprisionado e levado para a base de Sinchã Jobel. Desta base seguiu depois, certamente, por Sará, Morés, Maqué, Naga e Sambuia, em direcção ao Hospital de Ziguinchor, onde foi recebido e tratado pelo dr. Mário Pádua.
Sobre esta ocorrência, o camarada A. Lopes Marques refere nos [P45 + P15202} que o cmdt do PAIGC, Agostinho Cabral de Almada, com nome de guerra “Gazela”, lhe contou que o soldado Fragata foi atingido pelos estilhaços de uma granada de RPG2, tendo ficado “furado” e, por consequência, impossibilitado de caminhar. Ficou prisioneiro, e levado de maca [talvez de troncos onde, certamente, a sua dor e o sofrimento seriam constantes em cada batimento cardíaco] desde a mata do Óio até ao Hospital de Ziguinchor, em Casamansa, Senegal [aonde terá chegado muito perto do Natal de 1967].
Mapa da Guiné-Bissau > Indicam-se os prováveis itinerários utilizados pelo David Costa (a vermelho) e o Manuel Fragata (a azul) até Ziguinchor.
Aí permaneceu cerca de dois meses e meio em recuperação, sob os cuidados do dr. Mário Pádua, até que em 15 de março de 1968 foi entregue à Cruz Vermelha do Senegal e repatriado, por via aérea, para Portugal, onde ficou internado no anexo do Hospital Militar Principal, na Rua Artilharia Um, em Lisboa.
Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral > 15 de março de 1968 > Entrega de prisioneiros portugueses à Cruz Vermelha do Senegal (Reprodução com a devida vénia...)
Citação:
(1968), "Entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_44075 (2016-11-8)
Instituição:
Fundação Mário Soares
Pasta: 05224.000.038Título: Entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal
Assunto: Osvaldo Lopes da Silva durante a entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal, em Dakar [Eduardo Dias Vieira, José Vieira Lauro e Manuel Fragata Francisco].
Data: Sexta, 15 de Março de 1968
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo Documental: Fotografias
_________________
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 18 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16613: Notas de leitura (892): (D)o outro lado do combate: memórias de médicos cubanos (1966-1969) - Parte XI: O caso do médico militar, especialista em cirurgia cardiovascular, Virgílio Camacho Duverger [II]: Estava a 3 km de Madina do Boé, em 10 de novembro de 1966, quando o cmdt Domingos Ramos foi morto por um estilhaço de morteiro da CCAÇ 1416 (Jorge Araújo)
Guiné 63/74 - P16720: Parabéns a você (1162): António Inverno, ex-Alf Mil Op Esp do BART 6522 e Pel Caç Nat 60 (Guiné, 1972/74); Orlando Pinela, ex-1.º Cabo Reabast Material da CART 1614 (Guiné, 1966/68) e Coronel Cav Ref Pacífico dos Reis, ex-Cap Cav, CMDT da CCAÇ 6 (Guiné, 1968/70)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 14 de Novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16716: Parabéns a você (1161): César Dias, ex-Fur Mil Sapador de Infantaria do BCAÇ 2885 (Guiné, 1969/71); Jacinto Cristina, ex- Soldado Atirador Inf da CCAÇ 3546 (Guiné, 1972/74) e Maria Arminda Santos, ex-Tenente Paraquedista da FAP (1961/70)
segunda-feira, 14 de novembro de 2016
Guiné 63/74 - P16719: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-al mil, CCAÇ 4740 (Cufar, dez 72 / jul 73) e Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (2) - Bolama, Centro de Instrução Militar (parte II)
Foto nº 8 > Bolama, cidade colonial
Foto nº 9 > Bolama.jardim [, com a estátua em bronze de Ulisses Grant ]
Foto nº 10 > Bolama, vestígos de tempos melhores [, quando Bolama era a capital da Guiné, desde 1879 até 1941]
Foto nº 11 > Bolama, tabanca bijagó
Foto nº 12 > Bolama, tabanca bijagó
Foto nº 13 > Bolama, destacamento
Foto nº 14 > Bolama, destacamento
Foto nº 15 > Bolama. tabanca bijagó
Foto nº 16 > Bolama, anoitecer
Foto nº 17 > Bolama, destacamento
Foto nº 18 > Bolama, destacamento
Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Luis Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro, que foi alf mil da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/73) e do Pel Caç Nat 52 (Mato Cão e Missirá, 1973/74).
Recorde-se que o nosso camarada Luís Oliveira era de rendição individual e que, vindo do Cufar, foi para o CIM de Bolama, em junho ou julho de 1973, antes de ir comandanr o Pel Caç Nat 52, no setor L1, zona leste (Bambadinca). É aí que ele irá terminar a sua comissão e extinguir o pelotão.
Esteve duas semanas no Centro de Instrução Militar de Bolama, e depois uma semana em Bissau, recebendo formação sobre usos e costumes dos povos da Guiné bem como sobre ação psicossocial e dando ainda intrução militar a "mancebos" do recrutamento local.
Esteve duas semanas no Centro de Instrução Militar de Bolama, e depois uma semana em Bissau, recebendo formação sobre usos e costumes dos povos da Guiné bem como sobre ação psicossocial e dando ainda intrução militar a "mancebos" do recrutamento local.
Dessa passsagem pelo CIM de Bolama, publicam-se mais umas tantas fotos do seu álbum, que veiram com lacónicas legendas...
Temos algumas dúvidas que ele poderá, posteriormenrte, esclarecer:
Fotos nºs 16, 17 e 18 > Quando o autor se refere ao "destacamento de Bolama", julgamos tratar-se de São João, do outro lado do "canal do porto" (que liga ao Rio Grande de Buba), e onde havia na altura (em junho/julho de 1973) um grupo de combate destacado. Pela conversa com ele ao telefone, percebi que esteve também em São João, que ficava frente a Bolama.
Sobre Bolama há mais de uma centena de referências no nosso blogue. Sobre a história e as gentes de Bolama, escreveu recentemente um livro, profusamente ilustrado, o nosso amigo lusoguineense, António Estácio, também membro da nossa Tabanca Grande.
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Nota do editor:
Guiné 63/74 - P16718: Notas de leitura (902): “Memórias boas da minha guerra”, de José Ferreira, Volume I, Chiado Editora, 2016 (Mário Beja Santos)
Capa do livro do nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689 / BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69); editado pela Chiado Editora, Lisboa.
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Novembro de 2016:
Queridos amigos,
O que o confrade José Ferreira ilumina nos seus relatos é o vigor da amizade e da camaradagem, ele registou perfis de jovens de diferentes proveniências, usos e costumes, usa com comedimento, peso e medida, a galhofa, o desentendimento, a comédia de enganos, mas também desenha casos modelares de nobreza de caráter, é bom exemplo o que nos dá da Ilda e do Neco.
É o outro lado dos bastidores da guerra, em que as personagens se movem transportando a origem e o peso da identidade. O resultado é este monumento de candura, José Ferreira move-se perfeitamente nos labirintos da sua memória e traça muito contidamente recordações irónicas naqueles palcos onde a morte e o limite do sofrimento andam perto.
Ficamos à espera de mais.
Um abraço do Mário
Quando as memórias despertam candura e partilhas de ironia
por Beja Santos
José Ferreira |
Dir-se-á que estas “Memórias boas da minha guerra”, de José Ferreira, Volume I, Chiado Editora, 2016, se distinguem por uma singeleza evocativa de gente que se encontrou nos preparativos e no teatro de guerra e que até vem a baila em reencontros de antigos combatentes, com o valioso acréscimo da candura de amizades feitas que o autor tão cativantemente sabe exaltar.
Chama-se José Ferreira, é presença contínua no blogue e fez parte da CART 1689, que deambulou por boa parte da Guiné. Agradece a Alberto Branquinho, um sério especialista no trato da galhofa e da ironia fina, também membro da nossa confraria, o empurrão dado para a confeção deste livro de memórias. Andou por Dunane que um outro escritor, Cristóvão de Aguiar, já fez crónica bem dolorosa de um soldado com braço tatuado que se matou por amores. Regista os desenrascanços na cozinha, os apetites sexuais, as risotas sobre o linguajar do Norte, pena é que um leitor impreparado no jargão não conheça o significado de morcão, isto é não sabe se estamos a falar num atrasado ou num javardo. José Ferreira faz desfilar jovens que percorrem quartéis e descobrem mundo. Cinzela rostos, desenha pessoas: “Era esquelético, alto e de cara afiada. Tinha uma boca pequena de onde se salientavam os tais dois dentes grandes. Tinha os cabelos aloirados e espetados em várias direções”. Há o retrato de uma certa Idalina que é inesquecível: “Teria mais de 65 anos, pernas muito arqueadas e escondidas com meias escuras e saia comprida. Esticava os cabelos lisos e grisalhos, arranjados em carrapito que segurava na nuca e que cobria com o lenço também escuro. Não cortava os pelos do bigode nem os da verruga. Não se lhe notavam seios nem curvas no corpo. Parecia uma tábua lisa. Usava sempre sapatos fechados, tipo homem. De altura teria, incluindo o carrapito do cabelo, cerca de um metro e meio. Sobrancelhas tipo Álvaro Cunhal”.
E assim chegamos à Guiné, estamos em Maio de 1967, em Fá Mandinga, a curta distância de Bambadinca. Em dia de folga, tira-se a roupa civil da bagagem e sobe-se ao monte de bagabaga. Há o soldado Celorico, dotado de uma memória portentosa, conhecia todos os dados dos 153 militares da CART 1689, é de uma grande ternura o apontamento que José Ferreira lhe dedica quando ele anda exuberante a ouvir no rádio o rancho folclórico da sua terra. Quando necessário, passa-se do presente ao passado e mesmo ao após, caso da história da Ilda e do Neca, um amor comovente, uma Ilda que aceitou o seu Neca tetraplégico, há paixões que superam o pior dos destroços.
Há as partidas para a guerra e muito imprevistos no termo do regresso, há pessoas que se encontram no IPO, há quem ali pratique um devotado voluntariado. Ficaram recordações muito fortes como a do Galã de Nhacra. Nos reencontros, para além dos abraços e dos minutos de silêncio por que já partiu, há a dor por certas notícias, alguém que esteja na miséria ou com graves problemas familiares, há alguém que teve em empresas prósperas e que agora conhece o revés. O Facebook ajuda a redescobrir camaradas e vem aí outras histórias. Ficam notas sobre uma homenagem póstuma a alguém que morreu num ataque em Cabedú, em 12 de Julho de 1968. O livro de memórias está profusamente ilustrado, e lá para o fim vem os relatos sobre o batismo de fogo, a CART 1689 depois de Fá Mandinga andou a treinar-se no Xime, em Ponta Varela e no Enxalé, foram depois para o Oio, aí houve tiroteio e mais adiante conta-se uma história passada na região de Cambaju em que foram obrigados a beber mijo, a sede faz-nos ultrapassar todos os limites.
Se é volume I e se a CART 1689 andou por Catió, Gandembel, Caquelifá e Bissau, se foi companhia de intervenção e se foi premiada com a Flâmula de Honra em Ouro do CTIG, é certo e seguro que vamos ter mais memórias boas da guerra de José Ferreira, em boa hora deitou mão a essa gama de imprevistos e peripécias que fazem da ironia o ingrediente contraditório de gargalhar em tempo de guerra.
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Nota do editor
Último poste da série de 11 de Novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16708: Notas de leitura (901): “Guinea-Bissau, Micro-State to ‘Narco-State’”, por Patrick Chabal e Toby Green, Hurst & Company, London, 2016 (4) (Mário Beja Santos)
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