Caro Carlos Vinhal
Caso assim o entendam, em anexo, envio um texto e fotografias com vista a uma possível publicação no Blog.
Um abraço
António Branquinho
A MINA, QUE SERIAM DUAS
Missirá, pelas 6 da manhã, preparação e início de mais uma operação de rotina.
António Branquinho > Enxalé em 1971
O Pelotão tinha sido “convocado” para proceder a uma operação de reconhecimento e patrulhamento, conjuntamente com outros dois grupos de combate. Tínhamos ainda como objectivo, desactivar uma mina anti-pessoal, detectada há já muito tempo.
Durante o percurso íamos passando por locais paradisíacos, com palmeiras, mangueiros, outras árvores exóticas e pequenos cursos de água. Se não houvesse guerra e tivesse dinheiro, não me importava de construir uma vivenda num daqueles locais. Maldita guerra!
Ia eu nestas cogitações, quando me dá uma valente dor de barriga. Desta situação avisei o Jorge Cabral, como comandante do Pel Caç Nat 63, informando-o que iria sair do trilho para fazer uma necessidade fisiológica. Estava eu, a preparar-me para baixar as calças, quando se ouve um violento estrondo. De imediato, ponho-me a correr em direcção à cabeça da coluna, ainda com as calças em baixo. Sabendo da existência da tal mina, corri de imediato ao encontro do Jorge Cabral, pensando que a mesma tinha sido accionada pelos elementos da frente. Por sua vez o Jorge Cabral pensou, que eu ao sair do trilho teria accionado outra mina. Encontrámo-nos ao meio do percurso, em direcções opostas, ficando ambos estupefactos e felizes por estarmos sãos e salvos.
Como seria de esperar, gerou-se uma certa confusão. Após a acalmia das “tropas” e de se averiguar a situação, constatou-se que tinha rebentado uma mina (reforçada com granada de canhão sem recuo), na retaguarda da coluna. Tendo esta provocando dois mortos e vários feridos, uns graves e outros leves.
Perante esta situação, via rádio, pediu-se a evacuação dos elementos atingidos pelos estilhaços da mina. De imediato procedeu-se à organização da segurança a prestar aos meios aéreos.
Bambadinca > À porta do Depósito de Géneros, com o 1.º Cabo Injai, do Pel Caç Nat 63.
Há já cerca de duas horas, que os grupos de combate estavam devidamente instalados, quando se ouviu o som característico dos helicópteros. Eram dois. Voando em círculos, aterraram numa clareira. Do seu interior saíram duas enfermeiras pára-quedistas para se inteirarem da situação. Verificaram que além dos feridos havia dois mortos, recusaram de imediato o transporte destes, levariam só os feridos. Comunicaram esta decisão aos pilotos, com a qual eles concordaram. Ao aperceber-me daquela decisão, pedi-lhes para que transportassem também os mortos. Mantiveram a sua posição, dizendo:
- Não levamos os mortos!.
Perante as suas atitudes drásticas, quanto ao meu pedido “passei-me”. De modo, bastante drástico e enervado, empunhei a G3 em riste, puxei a culatra atrás e vociferei:
- Levais os mortos ou… dou-vos um tiro nos c….!
Como seria óbvio, eu não daria nenhum tiro, era só “ronco”. Uma coisa é certa – levaram também os mortos.
Em consequência de todas estas peripécias, não mais me lembrei da dor de barriga. Lembrei-me sim, ao regressarmos a Missirá de beber não sei quantas “bazucas” para matar a sede.
Missirá > 1971 > A criança é filho de um soldado do Pelotão
Enxalé > 1971 > À esquerda o Fur Mil Pires do Pel Caç Nat 63. Eu à direita. Dos outros não me lembro os seus nomes.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 24 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7029: Tabanca Grande (246): António Branquinho, ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 63 (Fá e Missirá, 1969/71)
Vd. último poste da série de 13 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7278: Estórias avulsas (99): Flora e Fauna de Galomaro (António Tavares)
8 comentários:
Ora aqui está uma boa questão a pôr às nossas queridas camaradas enfermeiras pára-quedistas... Por que é que elas se recusavam a levar os mortos? Eram elas ou eram eles, os homens da FAP, os pilotos e os melec ?
Seguramente que havia "instruções de cima"... O custo de um heli era equivalente a 12 contos, na época, por HORA!, ou seja o vencimento (mensal) de dois alferes, ou o pré (mensal) de 20 soldados de 2ª classe...
De facto, a mão de obra do exército, a tropa-macaca (sem ofensa opara ninguém...), era muito mais "barata"...
No mato, para transportar, a pé, um morto, até ao aquartelamento mais próximo ou à estrada mais próxima (onde pudessem chegar as nossas viaturas) era preciso "mobilizar" um grupo de combate (30 homens) que se ia revesando... Era a tarefa mais penosa (física e psicologicamente falando) que nos podia caber, transportar, ao sol ou à chuva, um camaradda morto, em maca improvisada com paus de arbustos, impermeáveis e lianas...
Esse "calvário" está magistralmente descrito no livro do Amor Pires Mota, que eu li de um trago, a "Estranha Noiva de Guerra"...
A propósito ou talvez não.
Tenho um amigo que foi bombeiro muitos anos. Contava-me ele que nunca se recusavam a transportar um (dito) morto, porque achavam que compete exclusivamente, e sob certas condições, a um médico a declaração legal do estado de morte.
Um abraço
Carlos
António: Quero-te dar os parabéns por esta narrativa... Era uma picada que nos era, a nós, CCAÇ 12, familiar... És capaz de precisar a data em que ocorreu essa história da mina ?
Um abração. Luís
PS - Ainda está pela Covilhã ?
Desculpem meter a minha colherada mas,na minha presença,infelizmente houve por duas ocasiões Camaradas mortos na mata e não tenho ideia nenhuma de terem sido transportados por nós.
Parece-me que nas evacuações de heli os feridos tinham prioridade,como é lógico, mas se houvesse lugar transportavam tambem o cadaver,a não ser que na proximidade houvesse acesso a viaturas.
Um abraço
Luis Faria
Caros amigos
Numa narração que hoje escrevi para o blogue, que oportunamente irei enviar, durante uma emboscada tombaram no mato dois militares, também houve feridos. Pediram-se evacuações de heli, mas os mortos não foram no heli, ainda que não pertencessem à CCAÇ. 5, foram em viatura para Canjadude, onde foram amortalhados. É lógico, neste caso, se fosse só uma questão económica, teria sido mais vantajoso transportá-los no heli, a partir do local onde tombaram. Porque teve que vir meio aéreo, a Canjadude, trazer duas urnas. Posteriormente voltou a vir meio aéreo para levá-los já nos caixões, creio que para o local onde estava sediada a companhia à qual eles pertenciam. Eram duma companhia de “Paras”.
Interpreto a recusa de transportar mortos nos helis, por uma questão de utilidade e eficácia, porque durante o percurso do transporte dos feridos e mortos, poder-se-ia dar a coincidência de na mesma rota, aparecerem mais feridos e neste caso a lotação dum morto poderia impedir a evacuação dum ferido.
Um abraço
José Corceiro
Penso que a explicação do José Corceiro é a mais correcta. Pelo menos em termos lógicos.
Os nossos camaradas da FAP podiam fazer o favor de dar um jeitinho explicarem tudo tim-tim por tim-tim.
Abraço,
Carlos Cordeiro
Olá Branquinho!
Foi mesmo assim que aconteceu no dia 22 de Junho de 1971,na área de Salá.Eu já passara os 24 meses,mas ainda havia de lá voltar a 14 de Julho,quando o Pelotão já não se encontrava em Missirá.Os mortos foram Cherno Sanhá e Sambaro Embaló ambos do Pel.Caç.Nat.54. Grande Abraço. Jorge Cabral
O emblema sobre o qual está sentado o António Branquinho é do Pel Caç Nat 52, "Os Gaviões". que é bicho que eu não sei se existiria na Guiné, mas enfim!
O emblema vem ao que sei do tempo do Beja Santos, (não foi feito por ele), que tal como eu dele não gostava, sobretudo pela frase inscrita: «Matar ou Morrer".
Lembro-me no entanto que no meu tempo mandei fazer em Lisboa, vários emblemas que distribuí pelo pessoal com grande agrado de sua parte.
Iria jurar que foram feitos numa casa do Rossio que tratava de bandeiras, etc.
Um abraço para todos
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