quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10517: História da CCAÇ 2679 (53): "Ataque" muito certeiro (Jose Manuel M. Dinis)

Vista aérea de Bajocunda
Foto: © Amílcar Ventura, com a devida vénia

 
1. Em mensagem do dia 9 de Outubro de 2012 o nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), enviou-nos mais um pouco da história da sua Unidade, desta vez um perigoso ataque à Messe de Bajocunda.


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (53)

"ATAQUE" MUITO CERTEIRO AO EDIFÍCIO DA MESSE EM BAJOCUNDA

O edificio da messe em Bajocunda, era uma antiga casa colonial, que ainda abrigava a enfermaria e os quartos da furrielada. Ficava a uns cem metros, a partir das traseiras (norte), da vedação de arame. Algumas árvores frondosas o alguns arbustos, escondiam o edificio do exterior do aquartelamento. A frontaria (sul) dava para a parada, e era contigua à entrada principal para a zona aquartelada, delimitada por uma precária protecção de arame. Sob o alpendre do limite oeste da área militarizada, funcionava a messe, conquanto as refeições fossem preparadas longe, na cozinha. Do lado oposto à messe, funcionava a enfermaria, e junto a ela a oficina mecânica e o abrigo dos auto-rodas. Depois deste, situava-se o morteiro 60, protegido por um muro-abrigo. Depois, num alinhamento a 90 graus, surgia a capela, um espaço aberto, com um pequeno altar e uma cruz. Seguiam-se os edificios da cantina e transmissões, e a secretaria. Do lado sul da parada, de forma afunilada, situavam-se os quartos dos oficiais, e o edificio onde funcionava a secção de armamento. Uma vedação de arame, acompanhava a rua principal até à entrada principal, já assinalada. No meio ficava o pau de bandeira e o submarino, designação de um paiol pela semelhança com um submersível.

Depois desta descrição parcial sobre a urbanização bajocundense, vamos à estória.

Em Africa o sol põe-se cedo e quase regularmente pelas dezoito horas. Era a hora do jantar, apesar de não ter sido prática o horário inglês. Às vezes atrasava-se a manja, quando o pessoal operacional se atrasava um pouco no regresso ao aquartelamento. Sem luz durante a maior parte das noites, mas com candeeiros de pitrol, o pessoal recolhia cedo, na medida em que pelas seis da manhã já fervilhava o dia.

Uma noite, pelo menos eu e o Pedro, ficámos à conversa despreocupadamente e sem cuidar das horas. Tenho a dúvida sobre a eventual participação de um terceiro. Da conversa, nem a mínima recordação. Nos quartos, os furriéis ali presentes já dormiam. Até que surgiu uma extraordinária ideia, a de desencadearmos um ataque à messe, e pregarmos um cagaço aos dorminhocoss. Se bem pensado, e logo decidido, foi melhor executado. No essencial, consistiria no arremesso de garrafas para o telhado de zinco, que reproduziria metalicamente os ruídos dos impactos, enquanto um de nós atravessaria os quartos gritando que era um ataque. Pensávamos nós que a barulheira e os gritos, induziriam o pessoal na busca de protecção.

Fomos então recolher algumas garrafas vazias que, em ambiente de grande respeito pela naturaza, estavam espalhadas por toda a parte. Reunimos um municiamento adequado, mas, entretanto tinha-me ocorrido uma paródia suplementar, um cagaço de prémio aos mais queridos camaradas, que eram aqueles que estavam mais a jeito, em sono profundo e descontraído. Consistiu a iniciativa em atar os pés aos pés das camas. Não era obviamente com a ideia de os estropiar, antes para aumentar a ansiedade de cada um, e ampliar a confusão. Tudo pronto, faltava a ordem de ataque. Quando eu começasse a lançar as garrafas, o Pedro daria o alarmante alerta. Andavam ali mãozinhas de turras. Fiéis à sua combinada ideologia de um por todos , todos por um, os atacantes não se pouparam a esforços, deram tanta intensidade ao ataque quanto possível, e... os resultados revelaram-se diferentes: uns levantaram-se indignados com a brincadeira e mandavam-nos passear, para Espanha, para a Côte d'Azur, e para outros sítios normalmente muito agradáveis. Eram os de sono leve, que distinguiam bem a saída de uma granada, da explosão de uma garrafa. Outros levantavam-se em cuecas, e apresentavam-se de armas em punho, prontos a fazer frente a qualquer afronta. Eram os mais perigosos, daqueles que poderiam abater o inimigo, qualquer que fosse, dentro das instalações do quartel. Finalmente, havia uns gajos, pró mal educado, que berravam no bréu dos quartos, compelidos pelo instinto de defesa, mas, também, sem a necessária consideração pelos camaradas que lhes facultavam a título gracioso um treino tão necessário quanto oportuno. Depois, feitos mariquinhas, ainda se mostravam zangados por, às escuras, verem uns vergões à volta dos tornozelos, em resultado da teimosia de quererem sair sem se libertarem previamente das guitas. Não lhes posso perdoar. Esse registo, por ser absolutamente impróprio a narrativas neste espaço, recuso-me a relatá-lo.

Do evento não resultaram baixas, nem para as NT, nem para o humaníssimo IN. Felizmente, não houve ocasiões posteriores para comprovar a oportunidade do exercício de treino, como a apreensão da melhor forma de reagir naquelas circunstâncias. E voltaram a dormir, os calinas!

Houve mais tarde um episódio quase familiar com este, mas teve origem em delírios paranóico-etílicos. Acho que o relatarei um dia.

Bajocunda > Tabancas ardidas durante flagelação

Bajocunda > Roquetadas entre portas

Bajocunda > Roquetada no telhado mesmo edifício
Fotos de  Pedro Nunes
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10339: História da CCAÇ 2679 (52): Vietnam (José Manuel M. Dinis)

5 comentários:

JD disse...

Camaradas,
Se a primeira fotografia de uma vista aérea do Bajocunda, que é da propriedade do A.Ventura, as restantes três fazem parte de um lote pertencente ao Pedro Nunes, com quem estive a almoçar no dia da remessa de 2 textos que nos envolvem. Hoje foi publicado um deles. Fica ainda um stock de retratos para acompanhar o outro texto.
O seu a seu dono.
Ao Carlos peço desculpa por estas confusões editoriais que cá o nabo lhe arranja.
Abraços fraternos
JD

Carlos Vinhal disse...

Caro José
Não houve confusão nenhuma. A vista aérea de Bajocunda foi de minha iniciativa apresentá-la. As 3 últimas estão referenciadas como sendo do teu, e nosso, camarada Pedro Nunes.
Abraço
Carlos Vinhal
Co-editor

Luis Faria disse...

Amigo José Dinis

Pelo que depreendo,o exercício de treino com ataque garrafal surtiu efeito,já que a reacção por palavras(na certa mais palavreado) e actos ao feroz ataque terá levado o verdadeiro IN a inibir-se a tal proeza no futuro.

Um abraço
Luis Faria

Luis Ramos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luis Ramos disse...

Caros Senhores.

Fico contente por ter encontrado através das maravilhas da internet, uma extensa história sobre a CCAÇ 2679, da qual o meu pai pertenceu. Ainda mais quando as fotos aqui publicadas, relatam momentos que ele também viveu. Felizmente ele completou um álbum de fotos, da qual lhe irei pedir para partilhar com antigos camaradas. Até lá os meus melhores cumprimentos.

Luis Ramos, filho de José Luis Ramos (Soldado Transmissões)