quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12395: O que é que a malta lia, nas horas vagas (7): A prestigiada revista "Vida Mundial" (Manuel Mata, ex-1º cabo, Esq Rec Fox 2640, Bafatá, 1969/71)

1. Excertos de um poste do Manuel Mata, publicado na I Série, em 5/5/2006 (*)


[Foto à esquerda: o autor, 1º cabo cav, Esq Rec Fox 2640, Bafatá, 1969/70, junto à Fonte Pública de Bafatá, construida em 1948]

22 De Novembro de 1970

A vida no Esquadrão [Esq Rec Fox 2640] decorria com toda a normalidade que era habitual, no dia-a-dia da unidade em Bafatá, não fossem as notícias que ouvi, cerca das 6 horas da manhã na rádio de Conacri, onde anunciavam com alguma ansiedade a invasão da República da Guiné e apelava aos Boinas Verdes para virem em seu auxilio, pois estavam a ser invadidos por tropas colonialistas Portuguesas.

Fiquei estupefacto e comecei a falar com a rapaziada do Esquadrão, mas todos iam ficando pensativos sem nada se conseguir relacionar. Perguntou-se ao Manuel, um ex- turra a trabalhar na padaria do Esquadrão, como padeiro, se tinha conhecimento de alguma coisa. Resposta negativa, como era óbvio. Mas para nós, ele sabia e sabia fazer muito bem o seu jogo entre as partes envolvidas, o mesmo se passou com os restantes trabalhadores guineenses do Esquadrão o Braima e o Samba.

Já isso não se verificou com o Teófilo e o seu amigo, sobrevivente do desterro e residente em Bafatá, que comentaram:
- Pura intromissão, na vida de um país vizinho, só de um Governo Fascista e Colonialista como o Português, tem que ser derrubado!.

As notícias continuaram na rádio, ficamos a saber da entrega de um dos grupos, da libertação dos nossos prisioneiros, da destruição da pista de aviação, de muitos mortos, mas nada de muito concreto. Como era fácil adivinhar, foi um momento de muita alegria ao saber-se que haviam libertado os nossos prisioneiros.

Como nada mais se sabia, pedi a familiares e amigos na metrópole que estivessem atentos às notícias e que me enviassem a prestigiada revista da altura, a Vida Mundial. Semanas mais tarde lá chegou, com uma reportagem da entrevista, na televisão, com um dos prisioneiros, mas nada de grande luz sobre a situação da invasão à República da Guiné-Conacri.

Ansiei ao longo dos anos pela verdade, como certamente todos nós, finalmente, o livro de António Luís Marinho "Operação Mar Verde", nos veio clarificar toda a preparação maquiavélica da Operação. (...)

A destruição da "Vida Mundial"

Um dos meus passatempos, na Guiné, era ler, ouvir e gravar música subversiva para os amigos que me pediam, principalmente, Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira e tantos outros, que me chegavam da Metrópole, por intermédio de um estudante universitário de Coimbra, irmão do 1º Cabo Antunes (já falecido).

O comandante [do Esq RecFox 2640, ] lá foi informado deste meu hobby. Então para me manter ocupado, andou durante algumas semanas, todos os dias, cerca das 10 horas da manhã, a visitar a arrecadação de material de guerra e aquartelamento. Entrava mudo e saía calado, deitava o material das prateleiras para o chão. Eu voltava a colocar o material nos devidos lugares, e assim foram decorrendo os dias.

Já com alguma preocupação, falei com o 2º Comandante, prometeu ir ver o que se passava, disse-me depois:
- Termina com as gravações senão vais parar a Piche!

Claro, continuei mas fora de horas... Terminada a comissão, com receio que algo pudesse acontecer, visto estar já referenciado, pedi a um amigo insuspeito que me trouxesse todo o material subversivo, onde tinha as gravações, livros, incluindo a Vida Mundial.

Este amigo, o 1º Cabo Machuqueira, como não fui na semana seguinte, da passagem à disponibilidade, levantar o referido equipamento, e com medo da PIDE/DGS, queimou todo o material, que lhe confiei. (...) (*)

Manuel Mata


2. Comentário de L.G. 

"Vida Mundial: o mundo numa semana" era uma revista semanal, propriedade da Sociedade Nacional de Tipografia, e diirigida por Francisco Eugénio Martins (desde c. 1939 até 1970). Em 1967 custava 5$00, conforme se pode ver na capa  nº 1463, de 23/6/67. [Cortesia do blogue A Lisnave].

Sete anos depois, custava os mesmos 5$00 (vd. capa da 1º edição sem censura, nº 1821, 3/5/1974; o diretor interino era o jornalista  Manuel Figueira). Por avião, cada nº custava 12$50 em Angola, 15$00 em Moçambique, 2 Francos em França, e  0, 45 dólares para o Canadá. Não sabemos qual seria o preço na Guiné, por avião.

Neste espaço de tempo, de meio século, por ela passaram muitos homens e algumas mulheres do jornalismo e das letras. A sua história está por fazer. Sabemos que houve uma renovação da revista nos últimos anos do Estado Novo. A Hemeroteca Digital (sítio da Hemeroteca Municipal de Lisboa, disponibiliza, integralmente digitalizado, um nº histórico, o 1821, de 3/5/1974, de que se apresenta aqui, à direita, a respetiva capa, com a devida vénia. (**)

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1 comentário:

Anónimo disse...

ex-camarada Manuel Mata, acaso tem noticias do ex-fur.enfº. António
Rodrigues Lisboa de Vila Real?

Obrigado.
ab