1. Mensagem do nosso camarada Manuel Carvalho (ex-Fur Mil Armas Pesadas Inf, CCAÇ 2366/BCAÇ 2845, Jolmete, 1968/70), com data de 11 de Abril de 2015:
Boa noite Carlos
Ao ver o poste sobre os instrumentos musicais oferecidos pelo MNF para Bambadinca(*), lembrei-me que nós CCAÇ 2366 também recebemos uma oferta semelhante em meados de 68 pouco tempo depois de chegarmos a Jolmete.
Como a população era pouca e a maioria vinha do mato e pernoitava tudo dentro do arame farpado procurávamos animar um pouco o ambiente e então os instrumentos eram fundamentais.
Fizemos um ou outro bailarico inclusive na recepção aos periquitos da CCAÇ 2585, outras vezes cantávamos e tocávamos, enfim o que era preciso era animar a malta.
Já não me lembro o que foi feito dos instrumentos, se vieram se ficaram lá.
Tenho pena destas fotos não serem vídeos com som. As baterias parecem iguais.
Carlos estás à vontade para fazeres o que muito bem entenderes com este material.
Um grande abraço
Manuel Carvalho
Fotos: © Manuel Carvalho
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Notas do editor
(*) Vd. poste de 10 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14455: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (97): José Maria de Sousa [ Ferreira, minhoto de Braga, com escola de condução no Porto], ex-sold mec aut (BART 1904 e PINT, Bambadinca, 1968/70) descobre os seus companheiros do conjunto musical, da CCS/BCAÇ 2852, a quem o Movimento Nacional Feminino ofereceu, em 1969, os instrumentos
Último poste da série de 16 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14479: (Ex)citações (271): Também estive na Op Bola de Fogo, de 8 a 14 de abril de 1968, no apoio à construção do aquartelamento de (e depois nos reabastecimentos a) Gandembel (Mário Gaspar, ex-fur mil MA, CART 1659, Gadamael, jan 67 / out 68)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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7 comentários:
Caros Camaradas
Eu, Ex Furriel Miliciano Mário Vitorino Gaspar dou os meus parabéns aos bailaricos com as boas bailarinas bajudas… E com o contributo do Movimento Nacional Feminino, na véspera do 25 de Abril, promete.
Recordo a partida para a Guiné, estou no cais de Alcântara, agora, neste momento. Aliás estou lá ainda, perdido entre capim numa bolanha talvez. É importante para todos que participem no Blogue. Façamos uma chamada… A Tabanca Grande vai responder… Vai narrar, sem medo porra.
Já que se fala no Movimento Nacional Feminino por que não narrar o passado no dia da partida da minha Companhia a CART 1659 para Gadamael Porto, e que transcrevo no Meu Livro “O Corredor da Morte”:
“… Vi pela primeira vez as senhoras e meninas do Movimento Nacional Feminino. Que prendadas!... Distribuíam medalhas da Nossa Senhora de Fátima, estampas com orações e o famigerado tabaco picado de bolor, com a marca “1X2”. Tudo era um totobola naquele momento.
Algo veio entretanto quebrar aquela monotonia, uma senhora esbelta do MNF elevada pelos saltos de sapatos também altos caiu. A cuequinha era branca. “Que boas pernas!” – Pensei eu.
Encaminhámos os passos para as escadas do Uíge. À medida que nos afastávamos continuavam os choros, os gritos. Era em coro, um cabrão de um coro, que me deixou surdo. Os meus ouvidos também choravam e os olhos, talvez mais pequenos, nem uma lágrima sequer.
Lenços brancos levantados em mãos, começavam a cobrir as cores das roupas. Tudo era branco.
No Uíge também habitava a tristeza, que transbordava pelo cais, cada vez mais pequeno. Ouvia¬ se o sussurro do Paquete, mais um choro prolongado, ele também chorava, algo parecido com as buzas das fábricas de Alhandra, que avisavam os operários da hora de entrada e de saída. Eu chorava para o interior, enquanto por momentos deixei de ouvir, sacudindo a cabeça. Era um choro comandado pelo maestro daquele paquete que com a sua batuta dirigia a orquestra sinfónica.
Enquanto todos ou quase todos choramingavam, salpicando os camuflados, mantinha¬ me aparentemente silenciado, um silêncio que me incomodava. Queria chorar, queria mesmo chorar e, cada vez estávamos mais longe, a caminho do desconhecido. No cais de Alcântara decerto que ouviam o choro bebé, também incontrolado, do barco que nos transportava. Coloquei finalmente ambas as mãos sobre os ouvidos, tapando¬ os. Já não se vislumbrava o cais. O passado ficara retido nas suas muralhas. As águas agitadas batiam com uma violência incontida no Uíge. Portugal chorava em convalescença, doente”.
Mesmo com carradas de pontapés na gramática, escrevam. Tirem o tampão da boca. Podem chamar-me de tudo, mesmo morto gostaria de saber que a nossa história, a história de cada um de nós combatentes será mesmo narrada, sem omissões, nos Compêndios e Manuais Escolares.
No Arquivo Histórico-Militar, no que se refere à minha Companhia estão erros num quarto de A4. Mas descobri mais erros, e graves. Gostaria que me ouvissem.
Dizem que no caso de não existir uma resposta para um caso apresentado, representa que se está de acordo. Será mesmo isso que se passa no Blogue, estão de acordo? Existem muitos mentirosos, apareceu-me um que me disse ser da CART 1659, e ter estado em Gadamael Porto. Mentira, quando lhe disse que não o conhecia, fugiu. Não fujam...
Meu amigo Manuel
Gostei muito do teu texto, na forma correta e escorreita com que escreves, mais clara do que a água do Douro que banha a tua terra, mais próxima da limpidez da água do Sabor, onde vais por vezes banhar o olhar em águas, montes e vales.
Gostei da tua reportagem fotografica e vi-te com um inveja antiga a dança r com as bajudas. Eu nunca tive essa sorte. Em Buba, terra de fulas, onde estive 17 meses, não havia bailes. Só havia uma bajuda balanta. As outras mulheres, cerca de vinte ou menos, eram casadas com soldados da milicia. Tinha uma lavadeira, chamada Suado, com uma tez bastante clara, com um rosto sem ser redondo, nem comprido, perfeito e simétrico, uns olhos negros, vivos, cintilantes, uns dentes alvos e perfeitos, que davam mais graça ao olhar quando sorria.
Tinha um filho de alguns meses, os soldados do meu pelotão diziam por vezes na brincadeira, que ele era filho do falecido alferes Queiroz, que eu tinha ido substituir. Não era, só pela contagem de tempos se percebia. A Suado era uma jovem alegre e divertida, tinha uma pele que ao contacto, parecia de seda, uma Xerazade islâmica, que com inteligência, sorrisos sedutores e pequenas conversas, que não chegavam a ser estórias, conservava o cliente e a amizade entre homem e mulher que é tão difícil cultivar.
Fui para Mansabá, os restantes 7 meses, já sonâmbulo e desinteressado dos movimentos da Terra, contente com o cheiro e o calor dessa África, que embala os homens como meninos, quando querem dormir.
Em Mansabá lembro-me duma bajuda, que gostava de namoriscar com todos os tropas,sem ser muito bela, não deixava de ser simpática nesse convívio divertido com a mauta. Não sei, nunca quis saber se haveria outro envolvimento, com alguns, para lá dessas chalaças, tanto do agrado dos homens e das mulheres.
Como vês amigo Manuel Carvalho, na Guiné foste um homem mais felizardo do que eu, pois foste a bailaricos e eu nunca fui.
Confesso que a meio da comissão estive 10 ou 15 dias, em Bissau, numa consulta externa, e um camarada alferes , convidou-me para ir a um baile e eu recusei. Era um baile de militares homossexuais, penso que graduados. A proposta dele era irmos para lá fazer arruaça, dar cabo daquilo tudo. Foi um grande amigo, desses meus dias, em Bissau, nunca mais o vi, já esqueci o nome dele. Já mais tarde cheguei a pensar se ele não seria homossexual. Quer fosse hetero ou homo, se porventura ele me ler e reconhecer, envio-lhe um grande abraço.
Entre homens prezo muito a lealdade, a amizade é uma lealdade mais sentida e cultivada.
Um grande abraço para ti meu grande amigo.
Francisco Baptista
Bailes, em 1968/1970/1974 de militares graduados, homossexuais, em Bissau. Interessante! Nunca tinha ouvido
falar.
Tema inovador, talvez a desenvolver em textos futuros.
Abraço,
António Graça de Abreu
Amigo Xico Baptista
Acabei de chegar das nossas terras de Mogadouro fui "ramar" o abubo às oliveiras como lá dizem.Pois é em Jolmete para além de outras coisas também se dançava e de várias maneiras, que me lembre foram duas ou três vezes e uma delas que as duas primeiras fotos documentam foi a recepção aos periquitos da 2585 e podemos ver a rapaziada nova até muito bem integrada no ambiente.A população de Jolmete era pouca e a maioria foi apanhada no mato e dormia tudo dentro do arame farpado.Uma das moças que está a dançar ainda o ano passado estava em Jolmete e vivinha da silva.Um pormenor veem aquele encerado a tapar a janela na 3ª e 4ª foto atrás do homem da concertina para evitar uma canhoada directa pela janela.
Caros camaradas para além dos tiros e das morteiradas também fizemos outras coisas mais agradáveis.
Um abraço
Manuel Carvalho
Caros Combatentes:
Claro que nem todas as companhias tinham condições para organizar estes bailaricos. Esta companhia do meu irmão, logo que chegou a Jolmete, agarrou-se a pás e picaretas e preparou instalações do melhor que havia no mato, onde até um salão de baile foi construído. Além disso, havia ali alguns espertalhões que andavam sempre pela tabanca a escolher a fruta melhor...e nada escapava.
Não eram nada morcões.
Um abração
Carvalho de Mampatá
Caros amigos na ultima foto estou com o meu amigo Mamadu Só, um dos grandes Milícias de Jolmete, era muitas vezes o homem da frente por vontade própria, um dia surgiu-lhe no trilho um grupo IN e ele foi mais rápido a disparar e teve pontaria, tendo o resto do grupo debandado.Já no tempo da 2585 do Manel Resende ficou sem uma perna numa mina anti-pessoal. Se ainda andar por aì envio-lhe um grande abraço.
Manuel Carvalho
Caros camaradas
Este 'post' mostra-nos uma faceta das nossas vivências (nossas, quero dizer, de quem as teve, de facto, mas do 'nosso colectivo) que revela como em face das diferentes circunstâncias foi possível criar, ou recriar, os ambientes a que se estava habituado e que no fundo também serviam para manter a ligação mental e emocional às origens.
Foi muito bem aproveitado, pelo que se vê das fotos!
Quanto à questão que o Francisco Baptista refere de um alegado "baile de militares homossexuais" eventualmente graduados, e que o Graça de Abreu, com a sua subtileza considera ser "interessante", "nunca ter ouvido
falar" e ser um "Tema inovador, talvez a desenvolver em textos futuros", devo dizer o seguinte:
Como é sabido (julgo eu, pelo menos ao tempo da minha comissão assim era) era normal haver em Bissau os chamados "delegados do Batalhão" que eram os elementos que em Bissau tratavam de desbloquear as requisições e outros assuntos que os comandos solicitavam a Bissau. Ou seja, havia o Batalhão no mato e "delegados" em Bissau.
Ora, como durante a minha estadia em Piche dizia-se que havia um militar que teria essas particularidades, de ser 'homossexual', e como circulava entre a sede do Batalhão, em Piche, e os locais das outras Companhias, Buruntuma e Canquelifá, assim ia tomando o nome pelo qual era referenciado o "Silva de Piche", o "Silva de Buruntuma", etc., fiquei a pensar se, relativamente a esses 'gostos alternativos' não haveria um "Batalhão em Bissau e delegados no mato"...
Algures no tempo (aí em finais de 1971, durante 1972, já não sei precisar), um dos militares com que trabalhava participou numa "festa" (não posso dizer que era um "baile", pois não foi assim referido) e disse "que se tinham divertido muito".... e que estavam lá também "gente graúda"....
Nessa ocasião fiquei com a ideia que a minha especulação do "Batalhão em Bissau e delegados no mato" era capaz de estar certa...
Hélder S.
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