sábado, 11 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20844: Os nossos seres, saberes e lazeres (385): Uma memorável visita ao mundo albicastrense (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Setembro de 2019:

Queridos amigos
Enquanto o viandante se encaminha para o esplendoroso Centro Cívico, um espaço assombroso de fruição e lazer no centro da cidade de Castelo Branco, dá-lhe para recordar o que era esta região há cerca de cinquenta anos, as chamadas acessibilidades eram mínimas, aqui se chegava de comboio ou de camioneta, atravessar o Zêzere só pela velha ponte filipina, vinha-se então por Cernache de Bonjardim. Contava-lhe o carpinteiro que lhe refizera a casa de Casal dos Matos, em Pedrógão Grande, que saía do Batalhão de Caçadores 6, aqui instalado, e para chegar a sua casa no lugar de Figueiró dos Vinhos era uma odisseia de boleias e caminhadas a pé por montes e vales. Como tudo mudou em cinquenta anos, felizmente, há sopros de interioridade, e são bem álgidos, ameaças de despovoamento, mas Castelo Branco é uma verdadeira pérola na Beira Baixa, há para aqui bons artífices de planeamento urbano e as imagens que se seguem são um hino à vida.

Um abraço do
Mário


Uma memorável visita ao mundo albicastrense (2)

Beja Santos

Custa sair do jardim episcopal, nova espiada, aproveita-se para tirar estas imagens, e depois atravessa-se para o jardim em frente. É um espaço de apaziguamento, para ser sincero o viandante acha tudo nos conformes para zona de lazer, mas terá uma surpresa, lá para o fundo aparece aquele belo poema de João Roiz de Castelo Branco, eram obrigatório na disciplina de Português dada a sua formosura estética e esplendor clássico:

“Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.

partem tão tristes os tristes,
tão fora de esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.”

Diversas obras de João Roiz, poeta quinhentista, constam do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende. Sabe bem encontrar este belo poema de devoção amorosa, que Amália Rodrigues tão bem cantou, num aprazível jardim de Castelo Branco.





No amplo espaço da Devesa temos o Centro Cívico, pontuado por verde, espaçosas esplanadas de cafés e restaurantes, como o tempo está contado, o viandante detém-se na fachada do Cineteatro Avenida, impossível não ir bisbilhotar depois o Centro de Cultura Contemporânea. Este cineteatro impressiona pelo seu traço moderníssimo. Inaugurado em 1954 foi devorado por um incêndio em meados dos anos 1980. Está requalificado, é este primor, já não é o cinema de antigamente mas não deixa de ser uma ativíssima casa de cultura.


Castelo Branco teve várias unidades militares, o viandante para frente ao portão do que foi o Regimento de Cavalaria 8, agora é um centro de atendimento, felizmente está bem conservado, os seus edifícios complementares estão devidamente ocupados. Dá-se a volta ao edifício para tirar uma imagem de bela azulejaria constante da entrada, alusiva aos atos de incorporação e de licenciamento.



Fica-se de boca aberta, o Centro de Cultura parece querer levantar voo, para lá caminha afanosamente o viandante, ainda por cima está anunciada uma exposição de Ângelo de Sousa. Toca a descer para depois subir.



Há uma frase do artista Ângelo de Sousa que se deve reter antes de usufruir dos seus trabalhos. Ele pretende “o máximo de efeitos com o mínimo de recursos, o máximo de eficácia com o mínimo de esforço e o máximo de presença com o mínimo de gritos”, seja no desenho, na pintura ou na escultura. A exposição a que se vem intitula-se “Ângelo de Sousa: Quase tudo o que sou capaz”, num programa de exposições e apresentação de obras da coleção de Serralves. Moçambicano por nascimento, foi no Porto que este artista fez a sua educação artística e construiu a sua obra. O que a exposição permite ver é despojamento, experimentalismo, depuração. Escreve-se na publicação alusiva à exposição: “Em termos estritamente iconográficos, Ângelo de Sousa sempre se socorreu daquilo que tinha à mão, mesmo à frente dos seus olhos, desenhando, pintando, fotografando e filmando objetos emotivos que todos vemos quotidianamente e a que já não prestamos demasiada atenção: plantas, flores, mãos, céus, nuvens. Nos seus desenhos pode observar-se esta vontade de trabalhar com elementos simples, nomeadamente uma declinação de signos primordiais sobre fundos neutros, que depois dará origem a exercícios abstrato-geométricos que correspondem à fixação de cores geometrizadas em formas fechadas ou à mera repetição de elementos essenciais do desenho, como linhas e pontos”.



Saudado o mestre, sobe-se e desce-se para gozar o esplendor das entranhas do edifício. O arquiteto catalão esmerou-se e ganhou a aposta, o viandante já se comprometeu consigo próprio na próxima visita, seja quando for (espera-se que seja em breve) aqui se sentará a contemplar, sem a pressão do tempo, esta escadaria que não tem rival.
E daqui se parte para o Museu de Francisco Tavares Proença Júnior.


(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20811: Os nossos seres, saberes e lazeres (384): Uma memorável visita ao mundo albicastrense (1) (Mário Beja Santos)

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