Guiné > Zona leste > CART 11 (Nova Lamego, Piche, Paunca, 1969/1970) > Lendo a revista brasileira "O Cruzeiro", na nossa messe em Nova Lamego, no Quartel de Baixo...Decoração a cargo furriel mil op esp Pechincha (que depois foi para o QG).
Foto (e legenda): © Abílio Duarte (2013). Todos os direitos reservados. (*)
1. Perguntou o Hélder de Sousa, em comentário ao poste P11092:
Caro camarada Abílio Duarte
Na legenda da 2ª foto está escrito "Lendo a revista brasileira "O Cruzeiro", na "nossa messe em Nova Lamego, decorada pelo furriel Pechincha".
Na legenda da 2ª foto está escrito "Lendo a revista brasileira "O Cruzeiro", na "nossa messe em Nova Lamego, decorada pelo furriel Pechincha".
Ora bem, quem era 'esse' furriel Pechincha?
A pergunta deve-se a que, quando cheguei à Guiné, em Novembro de 1970, fiquei alojado num quarto em Santa Luzia ocupado por três furriéis, dois amigos de Vila Franca e o terceiro era um tal Pechincha que tinha feito parte dos quadro duma 'companhia nativa' e que por aquele tempo desempenhava uma função qualquer no QG, na Amura.
Será o mesmo Pechincha? O nome não é assim tão vulgar...
O que eu refiro era, antes da incorporação, e ao que me foi dito, desenhador na Câmara de Lisboa e vivia em Moscavide. (**)
Abraço
Hélder S.
2. Respondeu o Abílio Duarte na caixa de comentários do mesmo poste, P11092:
Olá Helder,
É esse mesmo, o Pechincha que eu refiro, era o Furriel de Operações Especiais, da Escola de Lamego. Éramos os dois do mesmo pelotão, desde Penafiel até Nova Lamego.
Só que o malandro era desenhador, e quando chegamos ao Gabú, deram-nos o Quartel de Baixo, Como era conhecido na altura. Como aquilo estava abandonado, e não tinha muitas condições, o nosso Capitão desafiou-o a fazer uns desenhos para as casas de banho e outras, para quando fosse a Bissau ir ter com o padrinho dele, que era o Cor Robin de Andrade, para arranjar uma cunha e ter materiais de construção para nós fazermos as obras.
O que aconteceu foi que os desenhos eram tão bons que o Pechinchja foi para Bissau, e nunca mais voltou. Mas os materiais vieram. A seguir souberam que o meu Alf comdte de pelotão era Eng Civil, e foi também para os reordenamentos, e também nunca mais voltou. Nem foram substituídos. Estás a ver o filme, não estás !?,,,
O mais giro desta foto, mas não se consegue ver, é que o Pechincha nos seus desenhos punha os bonecos com frases do Spinola, e a nossa preocupação era, se aparecesse o Spinola, termos sempre uma brigada pronta para apagar as bocas do Pato Donaldo e companheiros.
É esse Pechincha que conheceste em Bissau, e garanto-te que era um artista, aí lá se era.
Um Abraço.
Abílio Duarte
____________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 13 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11092: Álbum fotográfico de Abílio Duarte (fur mil art da CART 2479, mais tarde CART 11/ CCAÇ 11, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paúnca, 1969/70) (Parte II)
(**) Vd. poste de 19 de fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2556: Estórias de Bissau (16) : O Furriel Pechincha: apanhado ma non troppo (Hélder Sousa)
(...) Pois este amigo Pechincha, que era, salvo erro, de Moscavide e trabalhava como desenhador na Câmara Municipal de Lisboa, tinha fama de estar um bocado apanhado e com uma pancada enorme, mas acho que aquilo era mais para ganhar fama e beneficiar dela.
Digo isto porque tive com ele algumas conversas, muito interessante e educativas, que me elucidaram bastante sobre a situação que se vivia e como ele pensava que se iria desenvolver, o que, no essencial, não divergiam muito do que eu pensava.
Mas também não deixava a sua fama por mãos alheias e logo na noite de 11 para 12 de Dezembro fui testemunha privilegiada duma dessas situações.
Nessa noita comemorava-se o S. Martinho. Eu fui portador para os amigos vilafranquenses de alguns quilos de castanhas e de um garrafão de água-pé (por sinal, bem forte!), além de outros mimos. Com um bidão, em frente às camaratas onde os quartos se encontravam, fez-se o assador e então vá de comer chouriços assados, salsichas e castanhas, tudo bem regado com a dita água-pé e outras bebidas estranhas, em grandes misturadas (cerveja, uísque, coca-cola, etc.), tudo a animar uma simulação de uma emissão de rádio protagonizada pelos camaradas das Transmissões com jeito para a coisa, como por exemplo o Furriel Roque.
Com o avançar das horas era tempo de serenar, descansar os corpos e retomar forças para o dia seguinte. Acontece é que, como sempre sucede em situações semelhantes, nem todos estavam pelos ajustes e com a previsão para breve da viagem de regresso do Carvalho Araújo havia alguns, cujos nomes não ficaram registados na minha memória, que integrariam essa viagem final para a peluda, como diziam, e estavam dispostos a prolongar a sua festa, até com atitudes menos próprias e profundamente negativas, principalmente para quem tinha fortes experiências no mato, como seja arremessar as garrafas vazias para cima dos telhados de zinco dos quartos o que, como calculam, a mim ainda não produzia efeito mas para quem já tinha reflexos condicionados era bastante aborrecido.
Ora o nosso bom Pechincha avisou solenemente os meninos que ou paravam imediatamente a graçola ou tinham que se haver com ele à sua maneira. Dada a fama que tinha, que não regulava lá muito bem e que era bem capaz de usar arma, os ânimos serenaram quase de imediato e na generalidade mas, também como sempre sucede, há sempre alguém que procura forçar a sorte e um deles, que também me disseram que estava apanhado (afinal, quem é que não estava?, acho que dependia do grau) resolveu irromper no nosso quarto com uma panela na cabeça e a bater com duas tampas como se fossem pratos duma banda de música.
Entrou, com ar de quem estava muito contente da vida e satisfeito por desafiar as ordens, mas o que eu vi de imediato foi o nosso amigo Pechincha, que estava estendido sobre a sua cama e que era logo a primeira à entrada, estender o braço sobre a cabeceira da cama, agarrar numa espécie de um dos dois machados nativos que estavam lá a enfeitar e sem mais explicações nem argumentos arremessou-o para o intruso, acertando-o na panela que estava na cabeça, deixando-o com o ar mais aparvalhado de perplexidade que vi até hoje, deixar o quarto a tremer e a balbuciar "este gajo está de facto mais apanhado do que eu!". (...)
Abraço
Hélder S.
2. Respondeu o Abílio Duarte na caixa de comentários do mesmo poste, P11092:
Olá Helder,
É esse mesmo, o Pechincha que eu refiro, era o Furriel de Operações Especiais, da Escola de Lamego. Éramos os dois do mesmo pelotão, desde Penafiel até Nova Lamego.
Só que o malandro era desenhador, e quando chegamos ao Gabú, deram-nos o Quartel de Baixo, Como era conhecido na altura. Como aquilo estava abandonado, e não tinha muitas condições, o nosso Capitão desafiou-o a fazer uns desenhos para as casas de banho e outras, para quando fosse a Bissau ir ter com o padrinho dele, que era o Cor Robin de Andrade, para arranjar uma cunha e ter materiais de construção para nós fazermos as obras.
O que aconteceu foi que os desenhos eram tão bons que o Pechinchja foi para Bissau, e nunca mais voltou. Mas os materiais vieram. A seguir souberam que o meu Alf comdte de pelotão era Eng Civil, e foi também para os reordenamentos, e também nunca mais voltou. Nem foram substituídos. Estás a ver o filme, não estás !?,,,
O mais giro desta foto, mas não se consegue ver, é que o Pechincha nos seus desenhos punha os bonecos com frases do Spinola, e a nossa preocupação era, se aparecesse o Spinola, termos sempre uma brigada pronta para apagar as bocas do Pato Donaldo e companheiros.
É esse Pechincha que conheceste em Bissau, e garanto-te que era um artista, aí lá se era.
Um Abraço.
Abílio Duarte
____________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 13 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11092: Álbum fotográfico de Abílio Duarte (fur mil art da CART 2479, mais tarde CART 11/ CCAÇ 11, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paúnca, 1969/70) (Parte II)
(**) Vd. poste de 19 de fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2556: Estórias de Bissau (16) : O Furriel Pechincha: apanhado ma non troppo (Hélder Sousa)
(...) Pois este amigo Pechincha, que era, salvo erro, de Moscavide e trabalhava como desenhador na Câmara Municipal de Lisboa, tinha fama de estar um bocado apanhado e com uma pancada enorme, mas acho que aquilo era mais para ganhar fama e beneficiar dela.
Digo isto porque tive com ele algumas conversas, muito interessante e educativas, que me elucidaram bastante sobre a situação que se vivia e como ele pensava que se iria desenvolver, o que, no essencial, não divergiam muito do que eu pensava.
Mas também não deixava a sua fama por mãos alheias e logo na noite de 11 para 12 de Dezembro fui testemunha privilegiada duma dessas situações.
Nessa noita comemorava-se o S. Martinho. Eu fui portador para os amigos vilafranquenses de alguns quilos de castanhas e de um garrafão de água-pé (por sinal, bem forte!), além de outros mimos. Com um bidão, em frente às camaratas onde os quartos se encontravam, fez-se o assador e então vá de comer chouriços assados, salsichas e castanhas, tudo bem regado com a dita água-pé e outras bebidas estranhas, em grandes misturadas (cerveja, uísque, coca-cola, etc.), tudo a animar uma simulação de uma emissão de rádio protagonizada pelos camaradas das Transmissões com jeito para a coisa, como por exemplo o Furriel Roque.
Com o avançar das horas era tempo de serenar, descansar os corpos e retomar forças para o dia seguinte. Acontece é que, como sempre sucede em situações semelhantes, nem todos estavam pelos ajustes e com a previsão para breve da viagem de regresso do Carvalho Araújo havia alguns, cujos nomes não ficaram registados na minha memória, que integrariam essa viagem final para a peluda, como diziam, e estavam dispostos a prolongar a sua festa, até com atitudes menos próprias e profundamente negativas, principalmente para quem tinha fortes experiências no mato, como seja arremessar as garrafas vazias para cima dos telhados de zinco dos quartos o que, como calculam, a mim ainda não produzia efeito mas para quem já tinha reflexos condicionados era bastante aborrecido.
Ora o nosso bom Pechincha avisou solenemente os meninos que ou paravam imediatamente a graçola ou tinham que se haver com ele à sua maneira. Dada a fama que tinha, que não regulava lá muito bem e que era bem capaz de usar arma, os ânimos serenaram quase de imediato e na generalidade mas, também como sempre sucede, há sempre alguém que procura forçar a sorte e um deles, que também me disseram que estava apanhado (afinal, quem é que não estava?, acho que dependia do grau) resolveu irromper no nosso quarto com uma panela na cabeça e a bater com duas tampas como se fossem pratos duma banda de música.
Entrou, com ar de quem estava muito contente da vida e satisfeito por desafiar as ordens, mas o que eu vi de imediato foi o nosso amigo Pechincha, que estava estendido sobre a sua cama e que era logo a primeira à entrada, estender o braço sobre a cabeceira da cama, agarrar numa espécie de um dos dois machados nativos que estavam lá a enfeitar e sem mais explicações nem argumentos arremessou-o para o intruso, acertando-o na panela que estava na cabeça, deixando-o com o ar mais aparvalhado de perplexidade que vi até hoje, deixar o quarto a tremer e a balbuciar "este gajo está de facto mais apanhado do que eu!". (...)