Prezado amigo Carlos Vinhal. Submeto-te este texto para o blogue, na expectativa de merecer interesse. Um abraço, M.L.Lomba
A crise dos 3 G, na Guiné, conotada como o princípio do fim do Ultramar português, fez 40 anos em 25 de Maio p.p. e a informação sobre a mesa redonda de Coimbra, veiculada pelo blogue (*), impeliu-me a tecer um comentário. (**)
Se as crónicas e os cronistas baterem certo, Amílcar Cabral riscou com o seu punho a Operação Maimuna, de montar "cerco a Guileje", em Janeiro de 1968, porque, segundo escreveu o seu irmão Luís, a bandeira portuguesa içada em Ponte Balana irritava-o especialmente, mas meteu-a na gaveta, porque a guarnição portuguesa estava dotada de obuses, o PAIGC ainda aguardava as remessas dos "órgãos de Estaline" e dos morteiros 120, o comando português só abandonará a posição de Ponte Balana, em Janeiro de 1969 e só lhe oferecerá a "área libertada" de Madina de Boé e Beli, abandonadas em Fevereiro de 1969.
Amílcar Cabral interpretou a reunião do general Spínola com o PR do Senegal Leopold Shengor e o seu contexto como um forte indício do enfraquecimento das resistências dos portugueses e, em Julho de 1972, confidenciou a Pedro Pires, seu braço direito do Planeamento, a proximidade do fornecimento pela Rússia dos mísseis Strela, enquanto o então estudante de Economia em Moscovo, Osvaldo Lopes da Silva, tirava o tirocínio do seu lançamento, mas que o líder só envolverá na preparação das acções sobre Guileje, em Setembro desse ano.
Salvo erro ou omissão, nessa altura, o dr. Osvaldo Lopes da Silva dependia de dois superiores orgânicos - Nino Vieira e Pedro Pires. Em recente intervenção no Forum Amílcar Cabral, na cidade da Praia, este afirmou que os guineenses o haviam segregado em Conacri e impedido de velar o cadáver de Cabral, que após o funeral regressou ao Sul e só então começou a preparar com Nino Vieira as acções sobre Guileje.
O dr. Osvaldo Lopes da Silva e os que partilharem a sua narrativa, não poderão escamotear a verdade dos factos acontecimentais e as "mesas redondas" como a de Coimbra não conseguirão encobrir a sua conjuntura.
O planeamento das acções do PAIGC sobre Guileje foi supervisionado pelo capitão cubano Raul Diaz. O Sul da Guiné não se assemelhava à Sierra Maestra e a sua eficiência ficou comprovada pelo facto de os seus 200 militares defensores e os 400 civis a terem abandonado e percorrido calmamente cerca de 20 km de picada na mata, sem serem molestados, e as suas forças de assalto só terem penetrado no objectivo 3 dias após o seu abandono, com Nino Vieira metido num blindado!
O PAIGC não trabalhara a hipótese da retirada dos defensores, contara com o "general época das chuvas" para isolar Guileje de qualquer amparo de Bissau - e falhou, porque o elevado teor de humidade, atingido pelo ar, limitava a eficácia dos mísseis terra-ar Strela. O PAIGC correspondeu à temeridade do comandante do COP 5, da transumância de Guileje para Gadamael com a temeridade da transferência do seu esforço de combate, avançando-o no terreno, daquele para este.
Ao tomar a decisão de abandonar Guileje, o major Coutinho e Lima sabia que comprava a sua tormenta; mas também sabia que teria um julgamento judicial, do qual jamais sairia condenado à morte.
O dr. Osvaldo Lopes da Silva, sem embargo a sua qualidade de herói da guerra da Guiné e da independência de Cabo Verde, bem como a generalidade dos participantes dessa, de outras mesas redondas e conferências, estarão para nós, os que fomos também povo em armas pelo Ultramar, como os "velhos do Restelo", mas com 500 anos de atraso. Sob o ponto de vista racional, Portugal, porque país pequeno, com tão poucos e tão pobres portugueses, começou a perder a guerra da sua expansão no início da mesma, logo a partir de 1415. Sob o ponto de vista romântico, os portugueses tão poucos, tão bisonhos e tão pobres, ousaram e fizeram obra pelos quatro cantos do mundo. Venha o diabo que escolha...
Quando Amílcar Cabral fundou o seu exército libertador, os portugueses já andavam há 500 anos pela Guiné, Angola, Moçambique, etc, de armas na mão, desfraldando uma bandeira e envergando uma farda e jamais a História nos poderá considerar espantalhos...
Manuel Luís Lomba
(*) Vd. poste de 20 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11735: Recortes de imprensa (66): Osvaldo Lopes da Silva, então comandante do PAIGC, e um dos principais responsáveis pela Op Amílcar Cabral, sustenta, na mesa-redonda, em Coimbra, no passado dia 23/5/2013, a versão do cerco total ao quartel de Guileje e afirma que as forças sitiantes dispunham de um dispositivo (do qual teria sido utilizado menos de 10%), com condições para actuar durante um mês (AngopPress)
(**) Último poste da série > 24 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11622: (Ex)citações (221): O comandante do Comando de Agrupamento nº 2957, cor inf Hélio Felgas, o cérebro da Op Lança Afiada (8-19 de março de 1969) (Fernando Gouveia)
A crise dos 3 G, na Guiné, conotada como o princípio do fim do Ultramar português, fez 40 anos em 25 de Maio p.p. e a informação sobre a mesa redonda de Coimbra, veiculada pelo blogue (*), impeliu-me a tecer um comentário. (**)
Se as crónicas e os cronistas baterem certo, Amílcar Cabral riscou com o seu punho a Operação Maimuna, de montar "cerco a Guileje", em Janeiro de 1968, porque, segundo escreveu o seu irmão Luís, a bandeira portuguesa içada em Ponte Balana irritava-o especialmente, mas meteu-a na gaveta, porque a guarnição portuguesa estava dotada de obuses, o PAIGC ainda aguardava as remessas dos "órgãos de Estaline" e dos morteiros 120, o comando português só abandonará a posição de Ponte Balana, em Janeiro de 1969 e só lhe oferecerá a "área libertada" de Madina de Boé e Beli, abandonadas em Fevereiro de 1969.
Amílcar Cabral interpretou a reunião do general Spínola com o PR do Senegal Leopold Shengor e o seu contexto como um forte indício do enfraquecimento das resistências dos portugueses e, em Julho de 1972, confidenciou a Pedro Pires, seu braço direito do Planeamento, a proximidade do fornecimento pela Rússia dos mísseis Strela, enquanto o então estudante de Economia em Moscovo, Osvaldo Lopes da Silva, tirava o tirocínio do seu lançamento, mas que o líder só envolverá na preparação das acções sobre Guileje, em Setembro desse ano.
Salvo erro ou omissão, nessa altura, o dr. Osvaldo Lopes da Silva dependia de dois superiores orgânicos - Nino Vieira e Pedro Pires. Em recente intervenção no Forum Amílcar Cabral, na cidade da Praia, este afirmou que os guineenses o haviam segregado em Conacri e impedido de velar o cadáver de Cabral, que após o funeral regressou ao Sul e só então começou a preparar com Nino Vieira as acções sobre Guileje.
O dr. Osvaldo Lopes da Silva e os que partilharem a sua narrativa, não poderão escamotear a verdade dos factos acontecimentais e as "mesas redondas" como a de Coimbra não conseguirão encobrir a sua conjuntura.
O planeamento das acções do PAIGC sobre Guileje foi supervisionado pelo capitão cubano Raul Diaz. O Sul da Guiné não se assemelhava à Sierra Maestra e a sua eficiência ficou comprovada pelo facto de os seus 200 militares defensores e os 400 civis a terem abandonado e percorrido calmamente cerca de 20 km de picada na mata, sem serem molestados, e as suas forças de assalto só terem penetrado no objectivo 3 dias após o seu abandono, com Nino Vieira metido num blindado!
O PAIGC não trabalhara a hipótese da retirada dos defensores, contara com o "general época das chuvas" para isolar Guileje de qualquer amparo de Bissau - e falhou, porque o elevado teor de humidade, atingido pelo ar, limitava a eficácia dos mísseis terra-ar Strela. O PAIGC correspondeu à temeridade do comandante do COP 5, da transumância de Guileje para Gadamael com a temeridade da transferência do seu esforço de combate, avançando-o no terreno, daquele para este.
Mas a maior falha terá pertencido, por omissão, ao comando português.A partir da altura em que o Batalhão de Paraquedistas 12, comandado pelo tenente-coronel Araújo e Sá, obrigava o PAIGC a desamparar a loja de Gadamael e os pilav Lemos Ferreira, António Martins Matos e outros lhe desancavam as bases da retaguarda na República da Guiné com os seus Fiat, não explorou o sucesso propiciado pelo "general época das chuvas", permitido que o PAIGC retirasse o armamento pesado e as suas pesadas munições ao lombo dos seus combatentes a chafurdar, heroicamente, por aquele pantanal.
Será ou não verdade que o PAIGC mandou fuzilar o seu comandante da zona de Guileje, responsabilizando-o pelo insucesso?
Ao tomar a decisão de abandonar Guileje, o major Coutinho e Lima sabia que comprava a sua tormenta; mas também sabia que teria um julgamento judicial, do qual jamais sairia condenado à morte.
E, para concluir, não foi a panóplia do armamento sofisticado da Rússia, etc, os efectivos de internacionalistas cubanos e cabo-verdianos, a entrada sem resistência em Guileje, os bombardeamentos massivos sobre os 3 G que trouxeram a coesão e conduziram o PAIGC ao sucesso, cansado da guerra, desgastado pelas contradições internas e pela acção "Por uma Guiné Melhor"; foram aqueles que, ao longo de anos lhe infernizaram a vida e moveram uma guerra sem quartel, aos seus militares, aderentes e simpatizantes - os capitães portugueses e o seu Movimento das Forças Armadas, quando este se perfilhou como seu filho ideológico sob a sigla MFA, nascido na Guiné e extensivo aos outros teatros da guerra ultramarina à Metrópole.
O dr. Osvaldo Lopes da Silva, sem embargo a sua qualidade de herói da guerra da Guiné e da independência de Cabo Verde, bem como a generalidade dos participantes dessa, de outras mesas redondas e conferências, estarão para nós, os que fomos também povo em armas pelo Ultramar, como os "velhos do Restelo", mas com 500 anos de atraso. Sob o ponto de vista racional, Portugal, porque país pequeno, com tão poucos e tão pobres portugueses, começou a perder a guerra da sua expansão no início da mesma, logo a partir de 1415. Sob o ponto de vista romântico, os portugueses tão poucos, tão bisonhos e tão pobres, ousaram e fizeram obra pelos quatro cantos do mundo. Venha o diabo que escolha...
Quando Amílcar Cabral fundou o seu exército libertador, os portugueses já andavam há 500 anos pela Guiné, Angola, Moçambique, etc, de armas na mão, desfraldando uma bandeira e envergando uma farda e jamais a História nos poderá considerar espantalhos...
Manuel Luís Lomba
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Notas do editor: