segunda-feira, 20 de abril de 2015

Guiné 63/734 - P14495: História da CART 3494 (6): RECORDANDO A 1.ª EMBOSCADA NA PONTA COLI EM 22ABR1972 E A MORTE DO FURRIEL BENTO - A única baixa em combate da CART 3494 (Jorge Araújo)


1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 20 de Abril de 2015: 

Camaradas

Com a presente narrativa procuro recuperar duas das principais memórias do nosso percurso militar como ex-combatentes no CTIGuiné [1972-1974], ambas ocorridas no mês de Abril, mas com dois anos de intervalo, e que ficarão para sempre na historiografia do contingente da minha CART 3494/BART 3873.

A primeira, com quarenta e três anos [faz hoje!], relembra os episódios das emboscadas na Ponta Coli, com particular destaque para a 1.ª [22ABR1972]. A outra efeméride, já com quarenta e um anos, recorda a chegada à Metrópole [como se dizia à época], em 03ABR1974, a derradeira etapa após o dever cumprido.

Como o tempo passa veloz…

RECORDANDO A 1.ª EMBOSCADA NA PONTA COLI 
EM 22ABR1972 E A MORTE DO FURRIEL BENTO
- A única baixa em combate da CART 3494 -

1.- INTRODUÇÃO

Para o contingente dos ex-combatentes da COMPANHIA DE ARTILHARIA 3494 [CART 3494 - Xime-Enxalé-Mansambo / 1971-1974], do BART 3873,ABRIL passou a ser, desde 1972, um mês onde, por motivos opostos, se comemoram duas efemérides de grande significado colectivo; uma de dor, tristeza e revolta [1972] a outra de felicidade pelo regresso às origens depois do dever cumprido [1974].

A primeira, de muitas emoções e tensões, está relacionada com o «baptismo de fogo» da Companhia ocorrido na emboscada em22ABR1972 [sábado], experiência que classificamos de superação extrema [ou superior transcendência] vivida por vinte e dois elementos continentais do 4.º GComb, mais um Guia guineense, atacados [à má fila…] no contexto damissão/acção de segurança à Estrada Xime-Bambadinca, no sítio da Ponta Coli, onde se registou, lamentavelmente, a primeira e única baixa da Unidade contabilizada em combate durante a sua presença no CTIGuiné, a do nosso camarada Furriel Manuel Rocha Bento, natural da Ponte de Sor, a quem justamente prestamos a nossa sentida homenagem.

Foto 1 – Xime - Uma semana antes do trágico acontecimento em 22ABR1972. O camarada Manuel Bento acompanhado por dois homens do “rancho”; à sua dtª o João Machado e à sua esqª o João Torres [cozinheiros], com o Geba ao fundo.

Foto 2 – Xime - Alguns dias antes do 22ABR1972. O trio de furriéis responsáveis pelo 4.º GComb, que foram apanhados na emboscada na Ponta Coli, pousando antes de um «jogo da bola». Da esqª/dtª, o Manuel Bento, eu e o Sousa Pinto [1950-1912.04.01].

Sete meses depois, uma segunda emboscada voltou a ser perpetrada pelo PAIGC no mesmo local e à mesma hora, ou seja, em 01DEC1972 [6.ª feira], em que o alvo foi, naturalmente por coincidência, o mesmo 4.º GComb, mas desta vez não se verificaram baixas mortais nas NT, registando-se dois feridos que foram evacuados para o HM 241, em Bissau. 

Do lado IN, que era constituído pelo grupo de «Bazookas» de Coluna da Costa e pelo bigrupo de Mamadu Turé e Pana Djata [substitutos de Mário Mendes, morto em combate, em 25MAI1972 [5.ª feira], na Ponta Varela, e responsável pela 1.ª emboscada], os guerrilheiros deixaram, no terreno, dois cadáveres, que foram sepultados no cemitério de Bambadinca, em campas separadas, bem como uma pistola, uma espingarda automática e um RPG com duas granadas.

Mapa-itinerário (linha vermelha) utilizado entre o Aquartelamento do Xime e o sítio da Ponta Coli – Estrada Xime-Bambadinca.

2.-RECORDANDO A EMBOSCADA…

Hoje, ao recordar aquele episódio de há quarenta e três anos, continuo incrédulo como foi possível superar aquela batalha, perante tamanha inferioridade física e numérica das NT, com um morto, dezassete feridos, desmaiados e poucos em condições de estabelecer um equilíbrio com quem iniciou a contenda.

Actuando de surpresa a cinquenta/sessenta metros dos alvos [humanos] colocados em cima de duas viaturas, ainda que em movimento lento, estaríamos nos centros das miras das suas “costureirinhas” e “RPG’s”,é inacreditável como não conseguiram fazer um “ronco” maior neste (des)encontro? 

Em primeiro lugar, porque as NT eram piriquitas nestas andanças da guerra de guerrilha, pois tinham apenas oitenta dias de mato, equivalente a mês e meio de sobreposição com a CART 2715 e os restantes dias [ainda poucos] de autonomia plena. Em segundo, pela experiência dos líderes do PAIGC, acumulada nas emboscadas anteriormente montadas no mesmo local desde 10ABR1968, data da primeira acção, a que se adicionam todos os outros conhecimentos adquiridos ao longo de muitos anos de prática neste contexto.

No meu caso, esta deslocação à Ponta Coli era a oitava vez que a fazia, pois havia chegado ao Xime somente nos últimos dias do mês de Março, e onde encontrei muitas rotinas já instaladas, em particular o exemplo da segurança à Ponta Coli.

Foto 3 – Xime [Ponta Coli] – Local do combate travado com o IN pelo 4.º GComb, em 22ABR1972, onde o camarada Bento foi atingido mortalmente por efeito de uma granada de RPG na zona da cápsula articular/clavícula do ombro direito, uma vez que se encontrava na 1.ª viatura, no banco da frente, ao lado do respectivo camarada condutor.

Foto 4 – Xime [Ponta Coli] – Árvore sinalizada como posto de vigia e onde ficava instalado o CMDT da força em acção/missão de segurança diária. Foi a partir deste local que o IN deu início à emboscada no dia 22ABR1972. 

Foto 5 – Xime [Ponta Coli] – A mesma árvore da imagem anterior, agora no seu plano superior, donde se tinha uma observação de maior alcance.

Quanto ao menor sucesso do IN [e ainda bem…], acredito que uma possibilidade ficou a dever-se à gestão do tempo, que correu a nosso favor, pois [como referi na narrativa original, a 1.ª que publiquei no blogue] aos poucos, ao ritmo de um tempo que parecia não passar, os desmaiados começam a acordar, os feridos tomam consciência de que ainda têm força suficiente para reagirem, e com os cinco ilesos que continuavam activos e operacionais, através de um impulso colectivo vindo das entranhas e de um grito de contra-ataque, contribuímos para anular a terceira tentativa de sermos apanhados à mão por parte dos elementos do PAIGC, que muito porfiaram mas sem sucesso. 

Por outro lado, é da mais elementar justiça referir o desempenho do nosso camarada guineense MALAN [guia e também ele combatente - imagem ao lado (6)], que sempre me mereceu o maior respeito, admiração e apoio, pois era um homem solitário, tendo como única companhia o seu cachimbo artesanal, mas nosso amigo, e que muito nos ajudou nos diferentes itinerários que tivemos de percorrer, numa mata extremamente difícil, com muitas armadilhas, ratoeiras e outros obstáculos [já relatados neste espaço por outros camaradas que por lá passaram] e que hoje, certamente, ele já não faz parte do grupo dos vivos. 

Parece que ainda o estou a ver sangrando com alguma abundância da cabeça, onde existiam pelo menos duas perfurações, empunhando duas G3 [a sua e outra que encontrou abandonada no solo].Com uma em cada membro superior, apoiadas nas suas axilas e, em plena estrada, de pé, defendia-se contribuído, também, para o sucesso do grupo. Foi depois evacuado para Bissau, onde ficou internado algumas semanas, regressando ao Xime ainda a tempo de participar na segunda emboscada. 

Outra situação que também ajudou, certamente, na debandada dos guerrilheiros teve a ver com a circunstância dos municiadores de morteiro e de bazuca, após recuperarem a consciência, depois de terem ficado atordoados na sequência do salto das viaturas em andamento, fazerem uso das suas armas a uma cadência de tiro inconstante, mas mesmo assim relevante, uma vez que o desempenho de ambos estava/ficou dependente da localização das suas munições [granadas] que acabaram por ficar dispersas ao longo da estrada, numa frente de cento e vinte metros, mais ou menos, dando a ideia de que estávamos fortemente armados.

Foto 7 – Xime [Ponta Coli] – Linha recta da zona de segurança à Ponta Coli. A estrada Xime-Bambadinca fica do lado direito da imagem, paralela às árvores. Os elementos IN estavam emboscados ao longo do trilho, enquanto as NT se encontravam na estrada asfaltada, à direita.

Depois deste episódio negativo, que provocou dor, sofrimento e algum temor entre nós, nada mais ficou como dantes, a exemplo do que nos diz a metáfora popular «depois de casa roubada trancas à porta», tendo apresentado de imediato outras metodologias e procedimentos assimilados durante a instrução no CIOE, em Lamego, visando a salvaguarda da minha/nossa sobrevivência perante este contexto adverso e muito exigente.

A prová-lo estava, ainda, o facto do CMDT da Companhia se ter autoexcluído no dia seguinte à 1.ª emboscada, ao assinar a sua própria baixa ao Hospital Militar [Serviço de Psiquiatria],em Bissau, para não mais regressar ao Xime.

Devido a essa sua decisão de se autoexcluir é nomeado para novo CMDT da CART 3494 [o 2.º], o então ex-CapArt António José Pereira da Costa [hoje, Cor Art Ref], meu/nosso camarada e tertuliano deste blogue. A sua chegada ao Xime ocorreu dois meses após a 1.ª emboscada, ou seja, no dia 22JUN1972 [5.ª feira], dia do seu aniversário… que coincidências!

As duas histórias originais que foram escritas na primeira pessoa em 2012, quarenta anos depois de as ter vivido in loco, e que agora recordei em síntese, fazem parte do espólio de narrativas divulgadas neste blogue [P9698 e P9802], no separador “Ponta Coli”e que, por sinal, correspondem às minhas duas primeiras memórias com que iniciei a participação na «Tabanca Grande», o grande batalhão de ex-combatentes que no passado sábado, em Monte Real, se reuniram no seu X Encontro Nacional, e que na próxima 5.ª feira, 23ABR2015, comemorará o seu 11.º Aniversário.

PARABÉNS aos Editores e a todos os camaradas Tertulianos que dela fazem parte.

Entretanto, em resultado da experiência e das emoções contabilizadas nesse 1.º episódio no sítio da Ponta Coli, e como modo de as traduzir no papel, decidi baptizá-las como «Era uma vez uma estrada, palco de jogos de sobrevivência (Xime-Bambadinca) – o caso da Ponta Coli».

Quanto à segunda efeméride, reportada ao mês de Abril,esta está datada desde03ABR1974 [4.ª feira],quando o contingente regressou definitivamente à Metrópole, ao aeroporto de Figo Maduro, em Lisboa, a bordo de um boeing 707, dos Transportes Aéreos Militares [TAM]. Este acto [ou facto] ocorreu oitocentos e vinte e sete dias depois do embarque no Cais da Rocha, em Lisboa, encerrando-se assim o ciclo de vida ultramarino previsto nos deveres individuais para com a Nação inscritos, à data, na Lei do Serviço Militar Obrigatório [SMO].

Esta referência normativa é dirigida, justamente, aos mais jovens leitores deste blogue, uma vez que o SMO foi extinto em meados de 1999. A partir de 2004, passou a ser atribuída às Forças Armadas a capacidade de captar os seus próprios recursos humanos concorrendo directamente no mercado de trabalho com outras entidades empregadoras.

Termino, prometendo voltar logo que possível a este tema, resumindo num só texto o mapeamento cronológico e histórico relacionado com as emboscadas na Estada Xime-Bambadinca, com destaque para a Ponta Coli, e as suas consequências.

Com um fraterno abraço de amizade,
Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494
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Nota de M.R.: 

Vd. Também o último poste desta série em: 


Guiné 63/74 - P14494: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de abril de 2015 (14): as fotos de família, tiradas pelo nosso fotógrafo Manuel Resende


Foto  nº 1

Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Foto nº 5 - Entre outros, reconhece-se Raul Albino, Idálio Reis, José Zeferino, José Manuel Lopes Mário Fitas e esposa Helena, e António Faneco


Foto nº 6


Foto  nº 7 - António Faneco, Maria de Lourdes; Isaura Resende, Tina Faneco e o neto do nosso camarada José Nunes Francisco que pelo segundo ano participa no nosso Encontro


Foto nº 8 - Gil Moutinho, Fernando Súcio, Joaquim Soares e esposa Maria Laura


Foto nº 9 - Em primeiríssimo plano o camarada Armando Pires


Foto nº 10 - Artur Soares e Francisco Silva

As primeiras fotos de família (fotos nºs 1, 2 e 3)... Por volta das 11h30 celebrou-se missa na igreja da freguesia, em frente ao hotel e, terminada a celebração, o pessoal foi-se juntando frente à fachada principal do hotel, com fachada dos anos 20, da autoria dos arquitetos Korrodi (pai e filho)... É difícil juntar 200 pessoas para uma foto de família, mas lá se conseguiu com a disciplina da tropa... Como o  tempo estava fresco e a ameaçar chuva, os aperitivos foram servidos no Salão D. Diniz, com capacidade para 20 mesas de 10 lugares, onde decorreu também o almoço.

Como todos os anos aparecem, caras novas, precisamos de tempo e vagar para identificar alguns camaradas... Outros são já velhos conhecidos da Tabanca Grande... Poucos, nove, são totalistas dos nossos 10 encontros... (CV)

PS -As fotos vão numeradas para facilitar a sua legendagem, se os nossos leitores quiserem colaborar connosco, fazendo comentários na respetiva caixa...

Fotos: © Manuel Resende (2015). Todos os direitos reservados.
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Guiné 63/74 - P14493: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de abril de 2015 (13): Obrigado pela gentileza, cordialidade e camaradagem (Carlos Alberto Rodrigues Cruz, Paço de Arcos, Oeiras; ex-fur mil, CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66)



Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > O numeroso grupo de malta da Tabanca da Linha, que é devidamente comandado pelo Jorge Rosales, tendo como eterno ajunto o Zé Manel Dinis... O Carlos Alberto [Rodrigues da] Cruz aparece aqui no lado esquerdo, é o primeiro da sgunda fila, e esta acompanhado pela esposa, Irene... É de Paço de Arcos / Oeiras... Veio também com o seu filho, Paulo Jorge. É frequentador da Tabanca da Linha e nosso grã-tabanqueiro.

Foto: © Manuel Resende (2015). Todos os direitos reservados.


1. Mernsagem de Carlos Alberto Rodrigues Cruz [foto à esquerda, na Tabanca da Linha, coma  esposa Irene, em 19/3/2015, foto de Manuel Resende;  foi fur mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66]


Data: 19 de abril de 2015 às 17:15
Assunto: Ponto de situação no regresso da festa-18/04/15



Caríssimos camaradas e amigos,

Tem este por finalidade dar-vos conta de que eram precisamente 16.30, retornei à minha residência, em Paço de Arcos, após viagem sem incidentes de maior.

Creio em boa verdade ser esta a forma correcta de corresponder à vossa gentileza e cordialidade que, como era de esperar, foram inexcedíveis e verdadeiramente dignas de ex-camaradas que pisaram as mesmas bolanhas, tarrafes e outros caminhos difíceis à força de muito sangue, suor e lágrimas, para conseguir destilar as "bazookas"que nos retemperavam as forças até quando nos aproximávamos do balcão da cantina. Aí agradecíamos aos deuses por não sermos maometanos e não estarmos sujeitos á lei do não álcool. Pior que isso só se nos enfiassem uma burka pela cabeça abaixo e nos mandassem para o Afeganistão. Lagarto, lagarto - que me desculpe o Bruno de Carvalho e o seu delfim Marco Silva a quem desejo as maiores felicidades desde que o seu clube fique à devida distância das "Papoilas Saltitantes do meu querido Luis Piçarra que Deus haja.

Mas para quê tanta divagação, dirão os meus queridos amigos e camaradas ?! Que se pode fazer se eu já nasci assim com esta veia de prosador inato (ou será que é nato ?).

Já estou mesmo baralhado, pelo que peço me desculpem se puderem que eu pra próxima vou espremer-me (ou exprimir-me) melhor.

Sorry, but I did my best.

Carlos Alberto Cruz
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P14492: Notas de leitura (705): Abdulai Silá, o grande prosador guineense (1): "A Última Tragédia" (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Junho de 2014:

Queridos amigos,
Uma surpresa de um escritor empolgante, empático, um grande confecionador do português e do crioulo guineense.
Temos aqui uma patroa branca iluminada por Deus, uma criada negra nascida no Biombo sob o sinal do azar e uma paixão que irá desaguar numa tragédia, à mistura teremos o emolduramento do colonialismo nos anos 1950.
É uma injustiça e um atentado cultural que este escritor não esteja editado em Portugal. Leiam-no e vão ver que me dão razão.

Um abraço do
Mário


Abdulai Silá, o grande prosador guineense (1)

Beja Santos

Abdulai Silá nasceu em 1958, em Catió. Estudou em Dresden, então República Democrática Alemã onde se licenciou em Engenharia Eletrotécnica. Além de engenheiro é também economista e investigador social. Foi cofundador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas – INEP, da primeira editora privada da Guiné-Bissau, a Ki Si Mon e da revista cultural Tcholona. Eterna Paixão é o primeiro romance guineense (1994) ao qual se seguiu a publicação de A Última Tragédia (1995) e Mistida (1997). Esta trilogia foi publicada em 2002 pelo Centro Cultural Português Praia-Mindelo. Importa esclarecer que não há nenhuma edição em Portugal deste autor, ele é editado em Bissau pela Ku Si Mon Editora Lda.

Em sucessivas entrevistas, Abdulai Silá fala das suas recordações, dos seus sonhos, da força da escrita, da mágoa que representam os sucessivos retrocessos da Guiné-Bissau. Falando da guerra de libertação diz o seguinte:
“Não é fácil para mim falar da guerra de libertação. As minhas lembranças são horríveis! Perdi o meu melhor amigo de sempre, o meu irmão Idrissa, que numa manhã de fevereiro de 1972 foi gravemente ferido. Tinha na altura oito anos de idade, ficou paraplégico, viveu mais seis anos. No mesmo dia, uma outra irmã minha, que tinha dez anos, perdeu uma perna. Ela era a melhor futebolista de Catió… podes imaginar como foi a vida dela depois? O meu pai morreu pouco tempo depois em consequência do choque que teve ao ver metade da família a sangrar. A minha mãe foi quem aguentou mais, mas perdeu a alegria da vida. Tomou conta do meu irmão paraplégico”.

No inverno rigoroso de 1984, em Dresden, Silá ficou mais de duas semanas retido no quarto, foi nessa altura que escreveu A última Tragédia. Escreveu depois Eterna Paixão, o primeiro livro que publicou. Mistida tem uma temática mais próxima do desencanto guineense, como ele observou a Fernanda Cavacas:
“As pessoas que estão hoje em situação de desenrasca tinham há pouco tempo outras preocupações, tinham outros sonhos. Os valores tradicionais africanos de solidariedade foram destruídos. Foram destruídos por pessoas concretas e essas pessoas, infelizmente, conseguiram destruir a tal ponto que puseram em questão os próprios valores seculares. E hoje transformam a vida nisso, numa coisa banal em que não há mais sonhos, em que a esperança foi enterrada… acho que nós ainda temos de encontrar uma explicação para tudo isto e, sobretudo, uma explicação para as gerações vindouras. O que é que a geração vindoura dirá em relação a nós? Quando nós destruirmos mesmo o nosso país com essa desgovernação, essa corrupção que acaba por dar cabo de nós mesmos, o que é que a geração vindoura dirá?”.

A Última Tragédia passa-se na Guiné colonial dos anos 1950. Tem um arranque luminoso:
- “Sinhora, quer criado? Ela repetira esta frase já não sabia quantas vezes naquele dia. Uma pergunta imbuída de esperança, que colocara em muitas casas e em diversas pessoas. Até parecia que a origem das pessoas que a atendiam era determinada pela altura do sol: No início, quando o sol se encontrava lá em baixo, ainda mansinho, ela fora atendida quase sempre por jovens brancos, provavelmente filhos das senhoras brancas a quem ela de facto queria dirigir a falar; depois o sol subira, tornando-se bravo, agitando as pessoas e as coisas, e então, durante todo aquele período, só fora atendida por gente que certamente não habitava naquelas casas, uns empregados domésticos que apesar de serem, na quase totalidade dos casos, da sua raça, nem por isso se dignavam ouvi-la, deixá-la explicar direito as suas pretensões; enfim, o sol se acalmara de novo, o suor deixara de correr por todo o corpo e eis que finalmente ela localiza uma interlocutora condigna, uma senhora branca que habitava uma casa grande, que até parecia estar à sua espera”.
Depois de muitas peripécias, Ndani, é admitida como criada por Maria Deolinda Leitão, mulher de funcionário colonial. Dona Linda, esta, quer que a menina tenha “nome de gente”, trata-a por Maria Daniela. Ndani veio do Biombo amaldiçoada por bruxos, veio cheia de fome, procura adaptar-se à psicologia do branco. Dona Linda descobre que é uma agente da civilização, é preciso levar a criada à igreja. Cedo o proselitismo desta iluminada choca com a rotina das outras senhoras brancas, mais do que fazer rezas e procissões é preciso fazer escolas, assim se impedirá, controlando a escola, qualquer subversão que surja.

Em paralelo, o régulo de Quinhamel acorda para o sonho de construir uma casa como tem o funcionário colonial local e depois encontrar uma jovem esposa com regras de civilização. Ndani será eleita. O régulo pede ao professor local que venha à sua casa, quer passar a papel o seu testamento, não é para deixar dinheiro a ninguém, é para que se saiba o que o régulo Bsum Manky pensa da presença do branco, um plano de como tirar os brancos a mandar nesta terra. “Não é matar ninguém. Não é matar nem expulsar ninguém. É só pôr os brancos no seu lugar. Essa coisa de uma pessoa ir mandar na terra de outras pessoas não me agrada, não estou de acordo. Então eu posso sair daqui e ir mandar no chão dos Bidjogós, sem mais nem menos? As pessoas podem ir para onde quiserem ir, podem viver em paz onde quiserem viver, mas agora ir para mandar nas pessoas que encontram lá, para cobrar impostos, castigar, isso não pode ser”. Mas este régulo morre sem ter concluído o seu testamento. Ndani apaixona-se pelo professor, paixão correspondida. Partem para Catió, aqui o filho de um funcionário colonial procura fazer uma tropelia ao professor, este aplica um corretivo ao administrador que irá aparecer morto em casa. A reação da administração é encontrar um bode expiatório, monta-se uma cabala contra o professor, e mesmo com o médico a dizer em tribunal que o professor não assassinara ninguém, o professor será deportado para São Tomé. Como nas grandes obras românticas, Ndani irá todos os anos até ao cais do Pidjiquiti esperar pelo seu amante. Mas a atmosfera vingativa de África acaba por vencer, e Abdulai Silá termina o seu livro numa combinação espetacular entre o português e o crioulo guineense: “Subitamente, sentiu um vento diferente a soprar. Estava carregado de muita humidade. Num instante tinha toda a roupa molhada e a água começou a dançar à frente, num ritmo absurdo que nem um kankuran tchaskiado. O ambiente à sua volta tornou-se turvo. Virou a cabeça para um lado e para o outro, mas descobriu que o cenário era sempre o mesmo. A água exibia a sua estranha dança e não deixava ver outra coisa. Abriu a boca e choupou uma boa quantidade. Começou então a ouvir uma melodia desconhecida, uma mistura de sons agudos que chegavam de todos os lados, fazendo vibrar as mãos e os pés sem parar. O ambiente tornava-se cada vez mais turvo, a água à sua volta dançando a um ritmo frenético. Tinha que olhar para aquele local de costume onde estava o seu homem à espera. Tinha que falar com ele, sem falta.
Tinha que dizer-lhe que estava morrendo de saudades…”.

Uma tragédia antiga, grega ou africana, a fatalidade de ver o amor roubado por ódios de poderes dominantes. Um livro impressionante que abre a carreira literária de Abdulai Silá.
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14483: Notas de leitura (704): A contestação contra a guerra colonial: A radiografia das universidades em 1971 feita por uma organização ultranacionalista (Mário Beja Santos)

domingo, 19 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14491: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de abril de 2015 (12): Um blogue de desvairadas e bravas gentes...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 >  Dois "cavaleiros", o J. L. Vacas de Carvalho (Lisboa) e o Ernestino Caniço (Tomar)... Ambos comandaram, no CTIG, o seu Pel Rec Daimler, sensivelmente na mesma altura, um no leste (Bambadinca, Pel Rec Daimler 2206, 1969/71), outro da região do Óio (Mansabá e Mansoa, Pel Rec Daimler 2208, 1970/72)...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > O nosso JERO, o "último monge de Alcobaça" e a filha do Manuel Joaquim, a Alexandra, reputada especialista em restauração artística (pintura mural) que nos honrou com a sua presença, acompanhando o pai e o "mano", o Zé Manel, o nosso "Adilan"


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > A Alexandra e o JERO... "Velhos" conhecidos do Mosteiro de Alcobaça e da paixão pelo património cultural...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 >  A Alexandra e o mano "Adilan", o "nha minino" do Manuel Joaquim, cuja história de vida é uma das mais fantásticas que cá contámos no nosso blogue...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 >  O Zé Manel e a "mana" Alexandra (de costas)


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 >  Um homem feliz, o nosso coeditor Carlos Vinhal, a avaliar pelo seu sorriso aberto, aqui num "tête-a-tête" com a nossa camarada de armas, a Giselda Pessoa...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Da esquerda para a direita: (i) Vitor Caseiro (Leiria) (ex-fur mil da CCAÇ 4641, Mansoa e Ilondé, 1973/74); e (ii)  Jorge Picado (Ílhavo) (ex- cap mil, CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72).


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Dois dos homens que "abriram" a guerra: o José Augusto Miranda Ribeiro (Condeixa) e o Joaquim Luís Mendes Gomes (Mafra / Berlim), o nosso poeta das "Baladas de Berlim"... Ambos são do tempo do caqui amarelo... Recorde-se que o José Augusto [Miranda] Ribeiro foi fur mil da CART 566, Cabo Verde (Ilha do Sal, Outubro de 1963 a Julho de 1964) e Guiné (Olossato, Julho de 1964 a Outubro de 1965)... O nosso poeta, J. L. Mendes Gomes, esse,  foi alf mil da CCAÇ 728 (Cachil, Catió e Bissau, 1964/66),


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Ao centro, o Jorge Rosales, "régulo" da Tabanca da Linha, tendo à sua esquerda o seu solícito e competente "secretário", o Zé Dinis...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Dois guineenses de alma e coração:

(i) O cor inf ref, Rui Guerra Ribeiro, filho o intendente Guerra Ribeiro (no tempo de Spínola), e administrador  de Bafatá (o homem que construiu a piscina de Bafatá, a "princesa do Geba");
(ii)  e o António Estácio, escritor... [O seu livro mais recente é sobre Bolama, mas o editor pede-lhe 4 mil euros para o pôr cá fora)...

Ambos têm costela transmontana: o António Estácio, filho de transmontanos, nasceu em Bissau e estudou no Liceu Honório Barreto, tendo mais tarde tirado em Coimbra o curso de engenheiro técnico agrícola; o Rui Guerra Ribeiro foi levado com escassos meses para Guiné onde o pai fez a carreira de administrador, estudou na metrópole, da 4ª classe  ao 5º ano do liceu, voltou à Guiné, voltou a Portugal para fazer a academia militar, foi capitão da 15.ª CCmds, em Angola, onde foi ferido num braço; voltou à Guiné, para se recuperar; foi Ajudante de Campo do último Governador e Comandante-Chefe Bettencourt Rodrigues... Está convidado a integrar o nosso blogue e tem histórias para contar do dia, o 26 de abril, em que o MFA de Bissau tomou de assalto a fortaleza de Amura e destitui o Com-Chefe... (Diz ele que a história está mal contada e promete esclarecer alguns pontos do que se passou nesse dia...).


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Da direita para a esquerda: (i)  Arménio Santos (Lisboa), bancário, dirigente sindicalista, deputado da Nação (pelo PSD) (, ex-fur mil de rec inf, Aldeia Formosa, 1968/70, entrou para a nossa Tabanca Grande em 5 de novembro de 2009, tendo por padrinho o Jorge Cabral); (i)  o António Manuel Garcez Costa (Lisboa) (que foi locutor no PFA - Programa das Forças Armadas); e  (iii)  Paulo Santiago (Águeda) (que não precisa de apresentações, é um dos "velhinhos" da Tabanca Grande)...


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Foi um prazer enorme rever e abraçar o nosso veteraníssimo Albano Costa (ex-1.º Cabo da CCAÇ 4150, Bigene e Guidaje, 1973/74), fotógrafo profissional, com estabelecimento em Guifões, Matosinhos)... Desde 2007 (Pombal), se não erro, que não vinha a um dos nossos encontros, por razões de agenda... É pai do nosso tabanqueiro Hugo Costa... (Espero que ele me mande algumas das fotos que tirou)...

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Guiné 63/74 - P14490: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de abril de 2015 (11): Um salão, cheio que nem um ovo, uma forma digna e alegre de comemorar os 11 anos do nosso blogue, de celebrar a nossa amizade e camaradagem... As primeiras fotos (panorâmicas)







Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Um salão, cheio que nem um ovo, uma forma digna e alegre de comemorar os 11 anos do nosso blogue... 20 mesas redondas com 10 lugares cada... Convivas: 131 camaradas + 69 acompanhantes de todas as idades e de todos lados do país (esposas, filhos/as, netos/as, amigos/as)...

O nosso alfabravo para todos/as, a começar pela comissão organizadora (Carlos Vinhal, Joaquim Mexia Alves e Miguel Pessoa)... E até para o ano, se todos/as quisermos... Aqui ficam as primeiras fotos... LG

Fotos: © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados

LISTA FINAL DOS 200 PARTICIPANTES  NO X ENCONTRO NACIONAL DA TABANCA GRANDE, MONTE REAL, 18 DE ABRIL DE 2015... (Para memória futura...)

Abel Santos - Leça da Palmeira / Matosinhos
Acácio Dias Correia e Maria Antónia - Linda-a-Velha / Oeiras
Agostinho Gaspar - Leiria
Albano Costa e Maria Eduarda - Guifões / Matosinhos
Alberto Godinho Soares - Maia
Almiro Gonçalves e Amélia - Vieira de Leiria / Marinha Grande
António Augusto Proença e Beatriz - Covilhã
António Brito da Silva e Isabel - Madalena / V. N. de Gaia
António Dias - Porto
António Estácio - Mem Martins / Sintra
António Faneco e Tina - Massamá / Sintra
António Fernandes Neves - Setúbal
António Fernando Marques e Gina - Cascais
António Joao Sampaio e Clara - Leça da Palmeira / Matosinhos
António José P. Costa e Isabel - Mem Martins / Sintra
António Manuel Garcez Costa - Lisboa
António Manuel S. Rodrigues e Rosa Maria - Oliveira do Bairro
António Maria Silva e Maria de Lurdes - Lisboa
António Martins de Matos - Lisboa
António Osório, Ana e Maria da Conceição - V. N. de Gaia
António Paiva - Lisboa
António Pimentel - Figueira da Foz
António Santos Pina - Lisboa
António Santos e família (6) - Caneças / Odivelas
António Sousa Bonito - Carapinheira / Montemor-o-Velho
António Souto Mouro - Paço de Arcos / Oeiras
Arlindo Farinha - Almoster / Alvaiázere
Armando Pires - Algés / Oeiras
Arménio Santos - Lisboa
Artur Soares - Figueira da Foz
Baltazar Rosado Lourenço - Nazaré
Belarmino Sardinha e Maria Antonieta - Odivelas
Benjamim Durães, Fábio, Rafael, Marta, Tiago, Pedro e Sérgio - Palmela
C. Martins - Penamacor
Carlos Alberto Cruz, Irene e Paulo Jorge - Paço de Arcos / Oeiras
Carlos Alberto Pinto e Maria Rosa - Reboleira / Amadora
Carlos Vinhal, Dina e 2 amigas- Leça da Palmeira / Matosinhos
David Guimarães e Lígia - Espinho
Delfim Rodrigues - Coimbra
Eduardo Ferreira Campos - Maia
Eduardo Magalhães Ribeiro e Carlos Eduardo - Porto
Ernestino Caniço - Tomar
Fernando Gouveia - Porto
Fernando de Jesus Sousa - Lisboa
Francisco Silva - Lisboa
Gil Moutinho - Fânzeres / Gondomar
Hernâni Joel Silva e Branca - Lisboa
Hélder V. Sousa - Setúbal
Idálio Reis - Cantanhede
J. L. Vacas de Carvalho - Lisboa
Joao Alves Martins e Graça - Lisboa
Joao Maximiano - Santo Antão / Batalha
Joao Sacoto e Aida - Lisboa
Joaquim Carlos Peixoto e Margarida - Penafiel
Joaquim Gomes Soares e Maria Laura - Porto
Joaquim Luís Fernandes - Maceira / Leiria
Joaquim Luís Mendes Gomes - Mafra
Joaquim Mexia Alves, Catarina e André - Monte Real / Leiria
Joaquim Pinto de Carvalho - Cadaval
Jorge Araújo e Maria João - Almada
Jorge Cabral - Lisboa
Jorge Canhão e Maria de Lurdes - Oeiras
Jorge Picado - Ílhavo
Jorge Pinto e Ana Maria - Agualva / Sintra
Jorge Rosales - Monte Estoril / Cascais
José Alberto Pinto - Barcelos
José Almeida e Antónia - Viana do Castelo
José António Chaves - Paço de Arcos / Oeiras
José Augusto MIranda Ribeiro - Condeixa
José Barros Rocha - Penafiel
José Botelho Colaço - Lisboa
José Casimiro Carvalho - Maia
José Diniz Faro - Paço de Arcos / Oeiras
José Eduardo R. Oliveira - Alcobaça
José Fernando Almeida e Suzel - Óbidos
José Leite e Ana Maria - Sintra
José Manuel Cancela e Carminda - Penafiel
José Manuel Lopes e Luísa - Régua
José Manuel Matos Dinis - Cascais
José Marques e Florinda - Paredes
José Miguel Louro e Maria do Carmo - Lisboa
José Nunes Francisco e família (5) - Batalha
José Pereira Augusto Almeida - Lamego
José Ramos Romão e Emília - Alcobaça
José Vieira Machado - Lisboa
José Zeferino - Loures
Juvenal Amado - Fátima / Ourém
Liberal Correia e Maria José - Ponta Delgada (RA Açores)
Lucinda Aranha e José António - Santa Cruz / Torres Vedras
Luís Duarte - Seixal
Luís Graça e Alice- Alfragide / Amadora
Luís Lopes Jorge - Monte Real
Luís Moreira - Mem Martins / Sintra
Luís Paulino e Maria da Cruz - Algés / Oeiras
Manuel Domingos Santos - Leiria
Manuel Domingues - Lisboa
Manuel Fernando Sucio - Vila Real
Manuel Joaquim, Alexandra e José Manuel - Agualva / Sintra
Manuel Lima Santos e Maria de Fátima - Viseu
Manuel Luís Lomba e Maria Arminda - Barcelos
Manuel Ramos - Lisboa
Manuel Reis - Aveiro
Manuel Resende e Isaura - S. Domingos de Rana / Cascais
Mario Fitas e Helena - Estoril / Cascais
Mario Vasconcelos - Guimarães
Miguel José Ribeiro Rocha e Olinda - Linda-a-Velha / Oeiras
Miguel e Giselda Pessoa - Lisboa
Mário Gaspar - Lisboa
Paulo Santiago - Aguada de Cima / Águeda
Raul Albino e Rolina - Vila Nogueira de Azeitão / Setúbal
Ribeiro Agostinho e Elisabete - Leça da Palmeira / Matosinhos
Ricardo Figueiredo e Cândida - Porto
Ricardo Sousa e Georgina - Lisboa
Rogé Guerreiro - Cascais
Rui Gouveia e Eulália - Leiria
Rui M. D. Guerra Ribeiro - Lisboa
Rui Pedro Silva - Lisboa
Rui Silva e Regina Teresa - Sta. Maria da Feira
Valentim Oliveira, Maria Joaquina, Cyndia e Carina - Viseu
Victor Tavares - Recardães / Águeda
Virgínio Briote e Irene - Lisboa
Vítor Caseiro e Maria Celeste - Leiria
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Guiné 63/74 - P14489: Libertando-me (Tony Borié) (13): Era mesmo ele, o Vítor Carvalho

Décimo terceiro episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66.




Já passava da meia-noite, como a nossa mente é jovem, pois agora pouco dormimos, sentamo-nos em frente ao computador, abrimos a página das mensagens e, um tal Vítor Carvalho, procura companheiros criptos do ano de 1964\66, e mais, quem tivesse passado pelo aquartelamento da Trafaria.

Era demais, será que... será ele... aquele companheiro inteligente, magro, muito bom em tudo o que fazia, mas sobretudo na disciplina de ginástica, parecia que tinha sido treinado para fazer parte dos atletas que naquele tempo iam aos “Jogos Olimpicos”, tal era a desenvoltura com que nos deliciava naquelas acrobacias, pois o instrutor dizia, dez exercícios deste modo, todos acabavam cansados, o Vítor continuava naquelas corridas desgastantes para a Costa da Caparica, por vezes levava a minha espingarda e, mesmo assim, chegava na frente. Era mesmo ele, e responde-me em seguida, dizendo: “...quanto eu adorava apanhar mais alguns como te apanhei a ti, deu-me uma alegria enorme, tenho esperanças de apanhar ainda mais algum”.

“...lembras-te quando íamos fazer os crosses até à Costa da Caparica, e o nosso amigo alferes Coutinho nos levava para a praia e para um café no centro da vila, onde bebíamos o nosso cafezinho e o grande Coutinho pagava a despesa?”.

“...também tinha o melhor pelotão, éramos famosos, éramos o 2.º pelotão. Tivemos coisas giras, tais como duas que me recordo bem, uma foi na parada, estávamos a marchar mas numa agradável cavaqueira e o oficial de dia, o Capitão Oliveirinha mandou parar o pelotão, cujo "comandante” era o instruendo Brandoa, que dava umas vozes em idioma “marroquino”, muito à maneira dele, e o dito capitão fez-nos marchar em ala, não sei se te recordas, era marchar em frente com as duas filas, e fizemos isso impecavelmente e o Oliveirinha disse-nos que realmente estava rendido ao 2.º pelotão”.

“...outra vez foi alguém que foi dizer que o 2.º pelotão ia para a mata contar anedotas e o comandante ordenou ao Coutinho que ficássemos no quartel a fazer ginástica com arma, pois nem isso nos tirou a nossa disciplina, e mesmo com o comandante na janela estivemos impecáveis”.

Pois, do companheiro “Brandoa”, cujo apelido era Lourenço, era da Brandoa, agora até nos lembramos muito bem, falava “marroquino”, “apache”, “cheyenne”, “Cherokee”, “Sioux”, “Navajo” e, talvez um pouquinho de “Balanta”, oxalá esteja vivo, leia esta mensagem e também apareça por aí.

O nosso companheiro Vítor, defendendo a bandeira do seu País, sem culpa absolutamente nenhuma, que uma tal personagem, que dava pelo nome de Luís Mendes de Vasconcelos, por volta do ano de 1617, após aquelas incursões portuguesas na África Austral, invadisse a aldeia de N’Dongo, em Luanda, território de Angola, e tivesse carregado 60 cativos a bordo do navio negreiro “São João Baptista”, enviando-os para o porto de Vera Cruz, no México. Ninguém ao certo sabe se o negócio era rendoso, houve alguns séculos de história, talvez maior que a “espada de D. Afonso Henriques”, mas o companheiro Vítor, tal como nós, num daqueles anos de guerra no Ultramar, não no navio negreiro “São João Baptista”, não indo para o porto de Vera Cruz, mas sim no navio português “Vera Cruz”, indo talvez para a aldeia de N’Dongo, em Luanda, território de Angola.


Este trocadilho faz alguma confusão, mas bate quase certo, qualquer dia vamos contar a continuação da viajem do navio negreiro “São João Baptista”, mas agora falemos do companheiro Vítor, que ia fardado, equipado, mentalizado e treinado para combate, tal como nós, para defender o seu País, a sua bandeira, a tal mãe Pátria, que muitos jovens, hoje, não sabem o que isso é, passou lá dois anos, sobreviveu e regressou, seguiu a sua vida, completou os seus estudos, que a guerra interrompeu, criou a sua família e, está aí a dar notícias, passado mais de cinquenta anos.

Isto não é absolutamente maravilhoso!
É mais um dos nossos, anda por aí, procura mais companheiros do curso da Trafaria, dos Criptos do ano de 1964.

Tony Borie, Abril de 2015
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14460: Libertando-me (Tony Borié) (12): Quatro da madrugada. Estou acordado

Guiné 63/74 - P14488: Parabéns a você (892): Augusto Vilaça, ex-Fur Mil Art da CART 1692 (Guiné, 1967/69); Leão Varela, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1566 (Guiné, 1966/68) e Victor Barata, ex-1.º Cabo Esp MMA/DO 27 da BA 12 (Guiné, 1971/73)



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Nota do editor

Último poste da série de 18 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14486: Parabéns a você (891): Raul Brás, ex-Soldado CAR da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

sábado, 18 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14487: Manuscrito(s) (Luís Graça) (54): Dias de ira, aqueles, os da guerra... (Poema dedicado a todos os meus camaradas que me honram como grã-tabanqueiros, quer me acompanhem ou não, hoje, em Monte Real, no X Encontro Nacional da Tabanca Grande)

Dias de ira, aqueles,
os da guerra...



para os meus camaradas
que combateram
naquela terra verde e rubra
a que chamávamos Guiné,
e que a pátria, a mátria e a fátria
há muito esqueceram,
mas que me dão a honra
de partilhar memórias e afetos,
neste blogue,
desde há onze anos,
e que vão estar hoje reunidos
em Monte Real,
mostrando afinal
que o Mundo é Pequeno
e a nossa Tabanca… é Grande!

e recordando ainda, com saudade,

os camaradas e amigos
que nos últimos dois anos e menos de quatro meses,
desde o início de 2013,
nos deixaram, 

ficando nós 
mais pobres e tristes
( foram 17,  numa lista, já longa,  que vai em 40, desde 2007,

os que da lei da morte se foram libertando):

Amadu Bailo Jaló (1940-2015)
António Manuel Martins Branquinho (1947-2013)
António Rebelo (1950-2014)
Armandino Alves (1944-2014)
Carlos Schwarz da Silva, 'Pepito' (1949-2014)
Fernando Brito (1932-2014)
Fernando Rodrigues (1933-2013)
João Caramba (1950-2013)
João Henrique Pinho dos Santos (1941-2014)
José Fernando de Andrade Rodrigues (1947-2014)
José Marques Alves (1947-2013)
Luís Borrega (1948-2013
Luís Faria (1948-2013)
Luís F. Moreira (1948-2013)
Manuel Martins (1950-2013)
Manuel Moreira (1945-2014)
Maria Manuela Pinheiro (1950-2014)

Cavalgam, caudalosos,
os rios
pela terra adentro,
enquanto fluem, ruidosos,
os dias da guerra.

Rios que não são rios mas rias,
entranhas ubérrimas,
fustigadas pelo vento do Sará,
rias baixas pela manhã,
pedaços, braços de mar,
restos de tsunamis,
pontas de fuzis,
palavras acérrimas,
imprecações ao grande irã,
picadas minadas,
de ir e não mais voltar.

Dias que não são dias,
circadianos, mas fragmentos,
ora ledos ora amargos enganos,
estilhaços de tempo,
riscos nas paredes sujas dos bunkers,
feitos de troncos de cibe, argamassa
e chapas de bidões,
repentinas, fatais emboscadas,
breves finais de tarde,
instantes, flagelações, balas tracejantes
sob o céu verde e vermelho,
enquanto o capim arde.

Narciso, revês-te ao espelho,
quebrado,
vais seminu, de camuflado,
de azul, celestial,
ao encontro do anjo da morte
em Jugudul.

E não há estrelas, à noite,
nem djubis soletrando em árabe
as tabuínhas dos marabús,
allahu akhbar,
allahu akhbar,
mas a bússola indica o norte, sideral,
nunca o sul,
nunca o nascer nem o morrer
numa curva apertada do Corubal.

Dies irae, dies illa,
dia de ira, aquele,
em que subiste o portaló,
o cadafalso do Niassa,
ou do Uíge ou do Ana Mafalda,
dias de ira, aqueles,
os da guerra!

Calai-vos,
rápidos do Saltinho,
cascatas de Cussilinta,
vós que mais não sois
do que canoas loucas,
desenfreadas, frenéticas,
levadas pelo macaréu da nossa raiva,
entre o Geba e a foz do Corubal.

Braços que não são braços,
amputados,
mas apenas tatuagens, traços,
letras de fado pungentes,
amor de mãe,
pontes que são miragens,

tentáculos, serpentes,
lianas, cortadas pelas catanas, 
a eito,
pela floresta-galeria adentro,
inferno tropical, túneis, tarrafo,
bolanhas, lalas, bissilões,
pontos de cambança,
flamingos vermelhos sangrando,
curvas da morte do Cacheu ao Cumbijã,
apocalípticos palmeirais,
pontas de punhais cravadas no peito,
irãs acocorados no alto dos poilões.

E depois o silêncio,
o impossível silêncio,
o silêncio das partituras,
dos mapas dos argonautas,
partículas, pausas, pautas,
cartas de tiro com claves de sol,
desidratação, a ogiva do obus,
o medo da avestruz,
o roncar do helicanhão,
gritos do djambé,
e do macaco-cão,
gemidos de kora,
espasmos de balafon,
a hiena que chora,
o dari que ri,
o hipopótamo que urra,
rajadas de kalashecos do bombolon,
o ribombar do trovão,
bombas de fragmentação
que correm no dorso dos cavalos
desde o Futa Djalon.

Não vou poder ouvir o silêncio 
do Cantanhez,
nem quero ouvir o grito da morte
outra vez.


v12 3 mar 2022

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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P14486: Parabéns a você (891): Raul Brás, ex-Soldado CAR da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 15 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14471: Parabéns a você (890): António Pimentel, ex-Alf Mil Rec Inf do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70)