quinta-feira, 9 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14857: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (V Parte): Brá, SPM 0418

1. Parte V de "Guiné, Ir e Voltar", enviado no dia 5 de Julho de 2015, pelo nosso camarada Virgínio Briote, ex-Alf Mil da CCAV 489 (Cuntima), e Comando do 2.º curso de Comandos do CTIG (Brá), CMDT do Grupo Diabólicos (1965/67).


GUINÉ, IR E VOLTAR - V

Brá, SPM 04181

Inferno na mata em frente a Brá. O sol queimava ainda não eram 9 da manhã.
Quicos à legionário pelo pescoço abaixo, trinta e tal tipos desapareciam pelo chão.
A cento e tal metros, Saraiva, Miranda, Moita, Mário Dias e outros, estrategicamente colocados, vigiavam-lhes os movimentos.

Um rabo mais levantado, pau pau nos troncos das palmeiras. Aqueles filhos da puta quase que me acertavam, viste? Cuidado com os gajos, pá! E vim eu de Guileje, grita o Vilaça! Pau pau, para o gajo que piou. Sai, sai daí, Vilaça, os tipos agora não te largam! Saio como, pá? Que merda!

Mata em frente a Brá

Quico a espreitar por um lado da palmeira, pau pau, outra vez no tronco.
Vão ali dois gagos aos esses, não os largue, assape-lhes, o Saraiva para um dos outros. Projécteis a bater no chão, lascas da terra a saltar, buum buum, granadas ofensivas a cair-lhes aos lados.
Olhos a cuspirem ódio no meio da poeirada. Estes cabrões não me largam! Um dos desesperados, localiza a palmeira onde se abrigava o capitão. Levanta suavemente o cano da G3 e tira a folga ao gatilho lentamente até a bala ir por ali fora e desaparecer no tronco, a pouco mais de dois metros do chão, talvez.

Um silêncio a durar minutos, ninguém se mexia. Estão à espera de quê, meninas? Nada, nem um pio.

Tinha acabado de jantar no hotel Portugal com o Toni, com quem matara saudades do Porto. O Toni Ramalho tocava no conjunto do Toni Hernandez que fizera e ainda fazia furor entre a malta nova, a animar as festas em Santo Tirso, Riba d’Ave, Vizela, Guimarães, um pouco por todo o Norte. Viera de férias, e claro, falava da metrópole. Ora então, Toni, abre lá!



Hotel Portugal, Bissau

Com os olhos brilhantes, ouvira-o cantarolar o "Calhambeque" e "E que tudo o mais vá pró inferno", do Roberto Carlos, Love me Tender do Elvis the Pelvis, a Sylvie Vartan, pá, o Johnny Holliday, Les garçons et les filles da Françoise Hardy, já ouviste? Les Quattre-cents coups, grande filme do Truffaut! Qual filme de guerra, pá, é a história de um miúdo, de 14 ou 15 anos para aí, que passa a vida no desenrascanço, os pais não querem saber dele, passa a vida a golpar para ir ao cinema. Duas horas para aí, sempre a ouvir!

O curso de comandos chegara ao fim. Segunda-feira começava a preparação dos novos grupos. Os nomes já estavam escolhidos, os Centuriões herdavam os sobreviventes dos Fantasmas do Saraiva, os Apaches os dos Camaleões do Godinho, os Vampiros o 4.º grupo que não existia anteriormente e os Diabólicos ficavam com o pessoal dos Panteras do tenente Pombo.

Quatro semanas cheias, com muita emoção, actividade física até mais sim, andar na mata de noite e de dia como deve ser, aprender a assobiar de noite, como pôr a arma a olhar, tentar distinguir os sons à noite e de dia, ligar disparos a armas, sentir ricochetes, chicotadas altas e baixas, projécteis a bater nas árvores, exercícios, repete, outra vez, táctica no terreno, sempre com fogo real. Trabalho nocturno todas as noites, granadas a toda a hora e em todo o lado, até debaixo da almofada da cama, montagem e desmontagem de minas e armadilhas, travessia de bolanhas, tiro de todas as posições, instintivo para alvos móveis, tiro-a-tiro, rajadas curtas de 3 a 5, disposição para emboscadas e golpes de mão, uso e manutenção dos rádios AN PRC/10, AVF, Hitachi, National, prática de primeiros socorros, injecções nas veias, intramusculares, intradérmicas até.

Nos intervalos da instrução no mato faziam por praticar uma alimentação rica em proteínas. Pão, se tivessem, e se não tivessem mais nada que se desenrascassem, que arranjassem na natureza. Apanhavam moscas e gafanhotos, tiravam-lhes as asas, pão fechado depressa, para aproveitar tudo.

As tribos da Guiné, Fulas, Balantas, Mandingas, Papeis, Manjacos, Felupes, Bijagós e o que se sabia da posição deles face ao conflito, utilização de guias, tudo embrulhado com muita mentalização, tanta que quando estavam a dormir eram acordados pela Voz, precedida de música alta, ritmada, intensa. Depois da Voz, música suave ajudava-os a adormecer.
Ao fim de semana descansavam. Iam para o mato executar golpes de mão a acampamentos do PAIGC que o Saraiva tratava de lhes arranjar nas 2.ª e 3.ª Repartições

De uma das vezes voaram num Dakota para leste, Canquelifá, foram procurar uma base da guerrilha no Piai, na fronteira com a Guiné-Conacri e em duas outras vezes foram para o triângulo do Oio, um na área de Bissorã, o outro entre Mansoa e Mansabá. O pessoal, à volta de 20 oficiais e sargentos enquadrados por comandos naturais da Guiné, Mamadú Jaló, Marcelino, Kássimo, o Tomás Camará e poucos mais, portara-se bem.

Sentia-se bem preparado, tinha a consciência que estava mais forte, já que tinha que ser, podia fazer uma guerra como devia ser.

Porta de armas do quartel de Brá. 
© Foto do autor.

O quartel de Brá era enorme. Era melhor que estivessem sós, mas repartiam sem grandes problemas as instalações com os Adidos e com o Batalhão de Artilharia 733. As instalações eram boas, limpas todos os dias. Os quartos seguidos, num edifício térreo de frente para a messe, uma rua de alcatrão bem tratado no meio, um campo de volei ao lado.


terior do aquartelamento de Brá. Messes em frente, à direita. 
© Foto de Mário Dias.


No edifício à direita pernoitavam os oficiais dos comandos. Para lá da mata em frente ficava a base aérea e o aeroporto de Bissau.


As traseiras davam para terra batida, capinada uns dias antes que ainda cheirava a fresco, o arame farpado a pouco mais de 200 metros, junto à estrada alcatroada que ligava Bissau a Mansoa e que se ramificava depois em estradas de terra batida, picadas como lhe chamavam, para Bissorã uma, para Mansabá a outra, formando os dois lados do famoso triângulo do Oio, albergando pequenos mas numerosos acampamentos Inimigos em volta da base de Morés, destruída e logo de novo levantada noutro lugar próximo.


O aeroporto de Bissalanca a escassos quilómetros era um entretimento, iam lá tomar café, ver as chegadas dos voos semanais da TAP, as hospedeiras de saia travada a descerem as escadas do avião, o pessoal novo a chegar, chamavam-lhes maçaricos, periquitos meses depois, quase todos em rendição individual, as caras deles, coitados, e as jovens mulheres recém-casadas ao encontro dos maridos, corações descontrolados, mortos por as apertarem, beijos envergonhados, os olhares invejosos dos outros nas pernas delas.

No bar do aeroporto, o Paul Anka, às vezes, fazia o fundo, Only you. No quarto que repartia com o Vilaça, herdado do Saraiva e do Godinho, adormeceu embalado com a música ritmada da ventoinha do tecto.
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Nota:
1 - Serviço Postal Militar e nome de código atribuído à CªCmds.

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Incidentes em Bissau

Nada de admirar, estamos na época das chuvas. O chumbo do céu a bater no alcatrão, até fumo subia! Voltou ao quarto a correr, no gravador a Rita Pavone "Perché, perché, la domenica mi lasci sempre sola"... Vilaça na cama, olhos no tecto, cantava com ela, oh Rita, grande Rita, canta, sua desgraçada, abre-me bem essas goelas!

Sem saber o que fazer, voltou a deitar-se, os Centuriões2 outra vez na mão. As coisas não andavam famosas em Brá, nem tudo estava a correr bem. O capitão Rubim ameaçava demitir-se, pirar-se deles. Acima de tudo estava farto, cansado de ver por um canudo as promessas do Comando Militar.

Do Porto nada de notícias. A última carta que tinha recebido não lhe deixara muitas esperanças. Que não sabia se a coisa ia dar certo, que estava com dúvidas, que se calhar era melhor fazer uma pausa na escrita. A retaguarda ameaçava ruir, sentia falta de pé. Nestes meses todos, habituara-se a vê-la como se fosse a boa consciência que tinha deixado lá. Recebia cartas regulamente, todas as semanas, era um ritual pegar nelas, retirar-se para o quarto, abri-las, cheirá-las, pô-las por data, deitar-se na cama, ouvi-la.

Já há tempos que mantinham essa correspondência. Escreve para aqui, escreve para acolá, conheceu-a já nem se lembrava bem como. Gostou dela desde o início. A figura batia com o que escrevia. Foi para os Açores até que acabou por ser mobilizado.

Nos dias de férias da mobilização, antes do embarque, foi despedir-se. Daquele turbilhão de acontecimentos em tão poucos dias recordava o momento em que se separaram na Avenida dos Aliados, na paragem dos eléctricos, frente à Arcádia. Se um dia viesse a casar, era com ela que gostaria. Interessado, escrevia-lhe com regularidade, dava-se a conhecer melhor. Ela dava-lhe notícias, geralmente optimistas, do trabalho, da faculdade, da vida no Porto.
Mantinha-o ligado à vida real.

A Guiné estava a ser uma coisa estranha, um trambolhão de acontecimentos absurdos, uns atrás dos outros. Ia abatendo os dias para as férias cada vez mais próximas, mantinha-se mais ou menos equilibrado, parecia ter ganho até uma imagem de bom senso naquela barafunda.
Escrevia para alguns amigos e para um conhecimento de Angra. Esporádicos, do género como tens passado, vai correr tudo bem, o tempo passa depressa, nós por cá vamos andando.
De Angra, a correspondência era diferente, trazia-lhe recordações daquela liberdade, daqueles meses loucos, de Setembro quase até ao Natal do ano passado. Tanta liberdade, meu Deus, tanta asneira, nem sabia como saíra dali incólume, manchado saíra de certeza.

Todos, mas todos os regulamentos do Exército tinham ido para o tecto. O trabalho que teve para arranjar aquele conhecimento, quase que desistira, chegou até a pensar oferecer-se voluntário para sair dali, nem que fosse para a Guiné. O tempo que gastou atrás dela, a chuva que apanhou à noite a subir a pé para o Monte Brasil3, sem nada, nem uma esperança. Mais de 15 dias seguidos, ela sempre com cara de pau, conversa só se fosse para chamar a polícia. Amanhã é dia de última tentativa, andava a repetir há dias.

Ao fim de duas semanas, o tempo que se perdeu, ela lá se dispôs a conhecer o quartel. Ele, feito burro, acreditou que estava perante uma santa, mostrou-lhe a relíquia da capela do quartel, uma igrejinha dos tempos de um Filipe de Espanha, as muralhas, até o dístico "Antes mortos livres que em paz sujeitos", tão ingénuos como ele afinal.

Finalmente conseguiu convidá-la para uma partida de bilhar na sala de oficiais. As portas fechadas, que o comandante ainda não saíra, taco na mão, puseram-se a jogar bilhar livre.

Ela, quase do tamanho dele, mas muito melhor proporcionada, que vistosa nem se fala, a cor da pele que as açorianas têm, quando pegava no taco, o vestido a subir por ali acima. Meu Deus. As bolas difíceis, então aquele tripé ou lá como se chama, não está aí? Nem associava nada, aquela maravilha toda estendida em cima do pano verde, e ele definitivamente arrumado no jogo.
O taco na mão dela, o cabelo comprido em cima dos olhos. Perdeu o sentido do jogo, de oficial de dia também, ia até perdendo a compostura se ela não lhe diz, hoje não. Hoje não, porquê?
Ora porque não, nem hoje nem amanhã, depois de amanhã vamos a ver, ele sem perceber, mais burro que nunca, ela a sorrir. Nem um beijo, nem nada? E ela, mas quem pensas tu quem sou? Tudo a ruir, o castelo também se calhar, tanto esforço para nada. Hit the road, Jack, o Ray Charles a estrear a grafonola comprada dias antes no PX4.

E subitamente, dois dias depois, ficou a saber quem ela era, o jogo todo aberto. Uma loucura dali para a frente. Por acréscimo, nem é bom falar nisto, pusera-se a poupar dinheiro à tropa, dando prémios aos melhores recrutas. Quem fizer 20 flexões, quem correr os 100 metros antes dos 20 segundos, quem se apresentar melhor, quem fizer isto tudo, dois dias de dispensa!
Num dia, lá para as 11 da manhã, estava a despachar o pequeno almoço e o expediente, tudo ao mesmo tempo, o 1.º sargento disse-lhe, talvez não seja má ideia, meu aspirante, avisar o pessoal do rancho, quase metade da companhia de recrutas está de licença estes dias todos.
Uma vergonha, nem lembrar quanto mais para contar. Tributo à gente boa daquelas ilhas, que terra tão abençoada!

As cartas desse conhecimento traziam-lhe os cheiros da Ilha, o capacete da humidade daqueles dias em Setembro, a vontade de preguiçar, os banhos sem roupa no mar dos Biscoitos5, naquelas manhãs e tardes em que as ondas iam e vinham, mansas, embrulhadas na bruma. O gosto da areia na boca, as mordidas naqueles seios minúsculos, os bicos enormes, o beijo até sentir as coxas dela a apertar-lhe o pescoço. Cartas perturbadoras, claro, de esquecer.

"Morreu um tipo de um país qualquer6, o Salazar decretou 3 dias de luto e lá estamos nós a ouvir música de mortos com a nossa bandeira a meia haste. Custa-me engolir estas histórias quando os nossos mortos estão a ser ignorados.

Fala-se no próximo baile de finalistas, que vai ser uma festa de arromba. Alguns dos nossos vão roncar com as namoradas ou com os arranjinhos. O Parreira anda todo satisfeito, até o Quintanilha, aquele alferes dos páras mandou vir da metrópole um fato de cerimónia! Quando estive de férias em Lisboa logo a seguir à formação dos grupos, os Fantasmas accionaram uma mina e foi o que se sabe, 9 dos nossos já lá estão. Entre eles o meu grande amigo Artur. Morrem-nos 9 homens e a Emissora Nacional continua a twist e a ié-ié. É isto que me custa engolir. E ainda por cima, cabo-verdianos e alguns guineenses não vêem com bons olhos a nossa presença nas festas deles”, descarregava o Miranda, mais que irritado.

Mas que raio estava aqui a fazer? A Guiné não lhe estava a dizer nada, não a sentia como sua, sentia-se um intruso. Até com os civis brancos, poucos, talvez três dúzias, se calhar nem tanto, para além da cor da pele, de comum não sentia nada. E até lhe parecia que a sua presença era bem vinda como comprador, só isso.

Na esplanada do Bento7, a 5.ª rep. como também era conhecida, bebia cerveja com mancarra, num grupo de meia dúzia de alferes e furriéis comandos. Um terá dito, depois, que naquela noite, na Associação Comercial de Bissau, havia o baile dos finalistas da Escola Técnica. Outro lembrou-se de perguntar se alguém recebera convite. Eu não, tu não, aquele também não. Ninguém se lembrou de nós, como pode ser? Queres ir? Vamos.

Edifício da Associação Comercial e Industrial de Bissau. 
© Foto do autor.

Dentro da Associação, no enorme salão de baile, finalistas e professores da Escola Técnica de Bissau, familiares e convidados, todos animados a dançarem ao ritmo da orquestra do maestro Reis Pereira, viram alterado o programa por volta da meia-noite.

Os poucos elementos policiais, que se espalhavam pelas escadas de acesso ao andar de cima, tentaram barrar-lhes a entrada. Não conseguiram. Quando os dançantes os viram entrar em fila, fizeram alto e o baile parou. Depois, ninguém soube bem como tudo começou.

A princípio, as frentes pareciam bem delimitadas, a maioria dos participantes em festa de um lado e a meia dúzia de intrusos do outro. Com o decorrer das hostilidades, as duas partes em confronto clarificaram-se ainda mais. Quando se começaram a ouvir vivas ao camarada Presidente Amílcar o conflito alargou-se para a via pública, até que um pelotão da PM entrou em acção. Trinta e tal tipos com escoriações para o hospital, a polícia civil e a PIDE também metidas, vidros e loiças em cacos, cadeiras e mesas partidas, uma noite que nunca mais acabava.
Mesmo em frente ao Palácio do Governo, onde, soube-se depois, da janela, o Governador via aqueles gajos darem-lhe cabo da psico. Uma vergonha!
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Notas:

2 - Jean Lartéguy, escritor panfletário das acções da Legião Estrangeira na Indochina e na Argélia Francesas.
3 - Castelo de S. João Baptista, antiga fortaleza, onde estiveram presos muitos oposicionistas ao regime que vigorou em Portugal até ao 25 de Abril.
4 - Armazém da USAF na Base Aérea da Terceira.
5 - Freguesia do Concelho da Praia da Vitória
6 - John Kennedy, presidente dos E. U. América.
7 - Cervejaria com esplanada na baixa de Bissau, muito frequentada por militares.

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Nino? Sentido!

Nove horas da noite, grupos em sentido na parada. Porta fechada num gabinete. O capitão pergunta aos comandantes dos grupos os porquês de tanto atraso da formatura. Para que horas estava marcada a instrução dos grupos? Às 21? E que horas têm? 21h02? Às 21h00, 1 ou 2 minutos depois são outras horas, ou não? Um minuto, meu capitão, resmunga baixo um! Uns bardamerdas é o que vocês são, os gajos fazem o que querem de vocês!

O meu grupo estava pronto às 5 para as nove, diz-lhe outro. Saraiva pára, vira-se de frente, olha-o de baixo para cima, dispara, ouça lá seu alferesinho de merda, você acha que não sou capaz de o pôr daqui para fora ao murro e pontapé?

Não devia ter falado, meu capitão, agora já estou avisado. a raiva tira a boina, o alferes não lhe larga os olhos. O capitão passa a mão pelo cabelo, três afastam-se ligeiramente a olharem para o lado, o outro segue-lhe os movimentos.

Esta, suas meninas, esta, martela o capitão, com a mão virada para o tal, é a única, a única atitude que um comando pode ter! Falamos mais tarde, alferesinho, agora todos à minha frente, 20 flexões para cada um, grupos incluídos.


Capitão Maurício Saraiva, com os "Apaches" ao fundo. Brá, Setembro de 1965.


O capitão Maurício Saraiva, promovido a capitão por distinção, até então o único vivo com a Medalha de Valor Militar em Ouro, depois de duas cruzes de guerra, tinha metido o chico8, estava em Lisboa na Academia Militar.

Aproveitara as férias para vir a Bissau dar-lhes instrução operacional, e sair com eles para o mato durante o curso de comandos para oficiais e sargentos do CTIG.

Foi um dos fundadores dos comandos da Guiné. Tinha estado em Angola, com o Godinho, os irmãos Roseira Dias, o Miranda e outros. Depois formou o grupo dos Fantasmas e com ele percorreu a Guiné de uma ponta a outra.

Deixou fama pela forma como fazia a guerra, por vezes parecia encará-la como se fosse uma brincadeira. Fazia que retirava, dava às vezes até sinais de fuga descontrolada, como se quisesse animar o IN a mostrar-se confiante. Escondia-se com o grupo, paciente, uma ou duas horas se fosse preciso. E depois, Fantasmas ao ataque! Uma série de êxitos coroavam-no e era objecto de mal disfarçada homenagem, numa altura em que a regra era ver as NT recolhidas a posições defensivas.

Mas nem sempre as coisas correram bem. Tanta intrepidez e desafio também lhe trouxeram sérios problemas.

Novembro de 64, dia 28. Perto da fronteira com a Guiné-Conacri, na estrada de Madina do Boé para Contabane, a uma escassa centena de metros do pontão sobre o rio Gobige, os Fantasmas detectaram uma mina anti-carro.

Levantaram a mina e simularam o rebentamento. Ficaram emboscados nas proximidades cerca de 2 horas. Viram um grupo IN aproximar-se e afastar-se logo que deram pela presença de mulheres na estrada. Uma hora depois viram um elemento IN a fugir. Afinal, estavam em igualdade de circunstância, todos sabiam da presença uns dos outros. No dia seguinte voltou com o grupo ao local. Meteu-se com alguns soldados no Unimog mais pequeno à frente, e encaixou o resto do grupo no Unimog maior atrás. A primeira viatura passou, a outra, uma dezena de metros atrás, não. Pisou uma mina. A viatura incendiou-se, as munições explodiram como foguetes num arraial minhoto e do depósito de combustível saía fogo. Quase todos os homens foram projectados a arder. Sete mortos logo ali e três feridos graves. Regressaram doze a Bissau. Com o grupo dizimado, poucos dias depois arrancou com os restantes para uma operação.

Já quase no final da comissão, em Cameconde, lá para o sul. No diário do furriel João Parreira, um deles, podia ler-se:
 
“6 Maio 65. Saímos às 15h00 para a operação “Ciao”, num Dakota até Cacine e depois em viaturas até Cameconde, onde já se encontrava um pelotão à nossa espera. O Capitão Rubim foi connosco. Saímos às 19h00 em direcção ao objectivo. Segundo as informações que nos foram fornecidas, a base IN era composta por cerca de 80 homens bem armados, comandados por Pansau Na Isna, chefe militar, adjunto do João Bernardo Vieira, de etnia Papel, mais conhecido pelo Comandante Nino.

Já na madrugada do dia 7, a poucos quilómetros do objectivo demos indicações ao pelotão para permanecer ali e esperar pelo nosso regresso, com a missão de proteger a nossa retirada ou dar-nos apoio, caso fosse necessário. Assim, seguimos silenciosamente até perto do acampamento, situado na mata a sudoeste de Catunco. Apesar de termos feito uma aproximação cuidadosa, fomos detectados por uma sentinela. Tentámos assaltar o acampamento. Mas eles estavam bem preparados, reagiram ao nosso fogo e o tiroteio prolongou-se. Quando o fogo deles abrandou, entrámos por ali dentro e vimos material abandonado durante a fuga. Oito armas, cunhetes de munições, granadas, petardos, equipamentos, minas, fardas, e muitos documentos, entre os quais um caderno que pertencia a um tal Armindo Pedro Rodrigues, com elementos importantes da Ordem de Batalha do PAIGC.

Carregados com o nosso material e com o que tínhamos capturado, regressámos para junto do pelotão de recolha. Juntámo-lo e começamos a vê-lo em pormenor. Faltava o aparelho de pontaria de um morteiro, até então ainda não apreendido na Guiné.

O Morais afiançava tê-lo visto lá. O tenente Saraiva chamou o Amadú e o Morais e disse-lhes para voltarem ao acampamento. Embora estivéssemos conscientes do perigo, arriscámos, partindo do princípio que o IN se tinha retirado após as baixas sofridas. O Morais perguntou quem é que queria ir com ele e com o Amadú. Ofereci-me bem assim como o capitão Rubim, o furriel Matos e mais 7 camarada, 10 no total.

De novo no interior do acampamento a arder. Vi uma árvore gigante, com umas cavidades enormes. Espreitei para dentro de uma, o Morais para a outra, à procura de material, e o restante pessoal, por ali perto, fazia o mesmo. Subitamente, rajadas de metralhadora e granadas de bazuca caíram-nos em cima. Uma destas rebentou entre nós. Um pequeno estilhaço partiu a coluna do Morais, que caiu sobre uma fogueira. Eu fui atingido no lado direito das costas, mas na altura nem localizei o ferimento.

Vi o Morais a morrer quando o olhei de relance. Um vago murmúrio, depois mais nada, um ar sereno no rosto, pareceu-me. Deitei-me e reagi ao fogo, mas passado pouco tempo fiquei sem força no braço, a G-3 ficou muito pesada, e depois já nem o gatilho conseguia apertar. Passei a espingarda para o braço esquerdo e fiz fogo, mas julgo que não fui nada eficaz. Os outros 8 camaradas, embora ligeiramente, foram todos atingidos. Depois os restantes elementos do Grupo foram lá buscar-nos. Junto do pelotão de apoio, injectaram-me morfina. Tinha perdido muito sangue. Prestaram-me os primeiros socorros em Cacine.

Fomos evacuados para Bissau. Eu de barriga para baixo, bem atado, com mais uma injecção de morfina, e o Morais, morto, cada um em macas de lona, encaixados no exterior do heli9. Durante o trajecto, e em duas localidades diferentes, na minha sonolência ouvi rajadas de metralhadora que me pareceram passar rente ao helicóptero. Pareceu-me uma eternidade a viagem até ao hospital de Bissau, onde, depois de me terem operado, fiquei internado.

8 Maio. O Marcelino foi o primeiro a vir ver-me ao Hospital. O crucifixo que eu trazia ao peito era uma crosta, uma grande cruz de sangue seco. Pedi-lhe que o lavasse.

9 Maio. Muitos camaradas me visitaram hoje, o major Dinis, o tenente Saraiva, o alferes Pombo, os furriéis Matos, Moita e o Miranda, claro. Da parte da tarde vieram a D. Beatriz Sá Carneiro, mulher do Comandante Militar e a D. Mariana do MNF10.

O Morais era órfão de pai. No caso dele correu tudo no mesmo sentido. Mal. Não era necessário a presença dele nesta operação, já tinha acabado a comissão. Em Brá tentaram persuadi-lo, mais que uma vez, a não ir. Tantas vezes, que diferença vai fazer sair mais uma, insistia. Não embarcou com o Batalhão a que pertencia, por ter combinado que esperava que o tenente Saraiva e os furriéis Matos, Moita e Ilídio acabassem a comissão. A estes faltavam-lhes apenas 15 dias. Imaginava o regresso à Metrópole, todos juntos num navio, como se regressassem de um cruzeiro de férias.

O Miranda recebeu o corpo no Hospital. Foi ele com o Mário Dias, o Fabião e o Ilídio que o lavaram, vestiram e deitaram no caixão. Fizeram uma colecta para a compra do caixão de chumbo. E coincidência, morreu no mesmo dia em que o seu Batalhão de origem desfilava em Lisboa, com a missão cumprida.”

Claro que, fosse para onde fosse, o Saraiva trazia com ele esses e outros acontecimentos, como se uma auréola o enfeitasse.

Quando reentrou em Brá, para passar o tal mês de “férias”, apresentaram-lhe os novos que estavam a frequentar o curso e pessoal já bem conhecido dele, o capitão Rubim, o sargento Mário Dias, os furriéis Miranda, Moita, Matos, Fabião, o João Parreira, o cabo Marcelino, os soldados Kássimo, Tomás Camará, o Adulai Jaló e outros.

Dos novos conhecia um ou outro, e aos que não conhecia tinha algum tempo à frente para os ver trabalhar no mato e depois veria a quem entregaria o crachá. Passava a vida a pô-los em sentido. Uma volta na conversa e lá vinha o Nino à baila. O Nino, estão a olhar para mim?

O Nino11, que porra, estes gajos são todos surdos? O Nino, ele a insistir e os alferes com falta de entendimento. Sentido, porra! Aqui nos comandos quando se fala no Nino, toda a macacada, vocês também, saltam como uma mola, estejam onde estiverem, não interessa, põem-se a pé! Em sentido!

E foi assim que se fez escola, dali para a frente, sempre que alguém pronunciava o nome do Nino, os outros punham-se em sentido.

Uma vez, em Biambe, na zona do Oio, uma tempestade como não havia na memória deles, tinha partido o grupo em dois, aí pela uma da madrugada, noite negra como só em África quando o céu está todo tapado. Um, sozinho, lá encontrou o trilho depois de andar a tactear o chão. Daqui não saio, vou-me mas é sentar!

A chuva não parava, pareciam pedras a cair, faziam tanto barulho no camuflado que receou que o denunciassem. Ainda bem que só tinha as cuecas debaixo, menos peso para carregar. Nada de sinais, nem de trás nem da frente. Esta é boa, onde é que os gajos se meteram, que merda, assobiou baixo, a imitar o pássaro que afinaram no curso. Nada de respostas, minutos a passar, chuva em barda. Estou frito, estou mesmo perdido, o coração como um cavalo a galope, até sentia calor, olhava para todo o lado e só via escuridão, pirilampos nem vê-los, nada, só ouvia o barulho da água a bater. E agora, o que faço? Eles hão-de dar pela minha falta, não me vão deixar aqui. E se não derem?

Calma, esperas pelo nascer do dia, viras as costas ao Sol, cortas mato, nada de trilhos, sempre em frente, até à estrada Mansoa-Bissorã, escondes-te, há-de aparecer uma coluna um dia destes, quase todos os dias passam. Depois é só saltar para a estrada e pronto. E se a guerrilha te vê, o que é que fazes? Pois. Minutos a durarem horas, o coração outra vez.

Um pequeno som, pareceu-lhe, serão eles, ou estarei a sonhar? Um assobiar baixinho. É isso, são eles, nunca mais vinham, assobia também, assobio cada vez mais próximo, uma mão, o Kássimo, o Saraiva atrás. Então e os outros? O capitão, danado, a bufar, e os outros? Kássimo à frente a assobiar, dentro do trilho, foram andando para trás, mãos no cinturão do da frente. Encontraram o capitão Rubim e o alferes Vilaça, os dois sentados, costas com costas. A dormir na forma, ah?

No outro sábado o Saraiva encontrou os quatro alferes sentados, tinham acabado de almoçar na messe de Brá. E o programa para hoje, qual é, perguntou. Vou até Bissau espairecer, diz um, outro vou mas é dormir com a cama, a correspondência a preocupar o terceiro, o quarto, sei lá? Ele arranjava um melhor, têm 5 minutos para se equiparem para sair.

Levou-os para o aeroporto, os motores já quentes do Dakota pronto para descolar. Foram para leste, Nova Lamego até Canquelifá, perto da fronteira com a Guiné-Conakri. Chegaram com o Sol quase a ir-se. Esperaram fechados dentro do avião, os motores parados.

Abriram-lhes as portas, entraram directos para uma GMC com as lonas corridas. Meteram-lhes lá dentro queijo partido aos bocados e pão. O Saraiva, gargalhada baixa, a pedir os cantis, para encher de água fresca, disse. O meu não precisa, está cheio até cima, nem se ouve, mesmo que o abane, diz um. Passe, o capitão a insistir. Que a marcha ia ser longa, cerca de 20 km, e a água vai ser decisiva.

Ouçam bem, só bebem quando eu der sinal, todos a beber ao mesmo tempo.

© Foto do Júlio Abreu. Com a devida vénia.

Carvão negro na cara e nos braços, pareciam manjacos e mandingas. Pôs-se o sol, meteram-se no mato, dois a dois, trilhos fora, quilómetros e quilómetros, a noite toda.

Comandos ao ataque, o Saraiva desalmado a gritar, como gostava de começar o dia. Fizeram-se a eles, por ali dentro, as casas de mato com 2 ou 3 gajos que nunca lhes tinham sido apresentados a pisgarem-se. Depois, um dos intrusos passou à história. Da gargalhada. Quando sentiu os projécteis de uma metralhadora pesada inimiga a bater lá em cima nas árvores, até disse para os outros, olha a NT a apoiar! Os outros a rirem-se, uma força danada dentro deles. No caminho do regresso lembraram-se da genica que sentiram, estamos numa forma do caraças, não estamos?
Nunca souberam de onde tinha vindo tanta gana, se calhar tinha sido quando o capitão,

 finalmente, autorizou meterem água, devia ter vitaminas. A certa altura do caminho de retirada, começaram a ficar sem forças. Estranharam, nunca lhes tinha acontecido, não acertavam com o trilho, não era só um, eram todos. Menos o capitão. Alguns paravam, encostavam-se às árvores, queriam sentar-se, os olhos para cima. Quem parar fica para trás, o Saraiva lá à frente, na esgalha. Em pequenos grupos foram chegando. Em Canquelifá, uma cerveja gelada, boca abaixo, duma vez só. Alguns só acordaram com os motores do Dakota e um ou dois nem assim. A caminho do avião, pareciam zombies, em coluna por um, pelo campo fora.

Da outra vez, mandou tapar-lhes os olhos com algodão, fita adesiva e um lenço negro por cima. Só tiram os lenços e o adesivo quando eu mandar. É para ver se adivinham para onde vamos passar o fim-de-semana. Viaturas pela estrada fora, para onde havia de ser, para o Oio. Quando entraram em Mansoa, pararam. Então, quem é amigo? Para onde vamos então? Toca a tirar os lenços, olhos e ouvidos bem abertos agora. Foram por ali fora até Bissorã. A mesma história do queijo e do pão, uma cerveja para cada um, cantis cheios de água, por aqueles trilhos, a noite toda.

Um cigarro agora é que sabia bem. Pois, também a mim me apetecia estar na praia de Carcavelos, ao sol com a miúda, os ouvidos dele em todo o lado. Fumas no fim do fogo. O dia clareou, estavam no sítio certo, as casas de mato em frente. Os guerrilheiros é que faltaram à chamada naquela altura. Não saímos daqui enquanto os gajos não aparecerem, o capitão a provocá-los. Vieram mais tarde, quando já não dava muito jeito, mas arranja-se sempre qualquer coisa, que remédio. Um daqueles alferes integrado na equipa do furriel Moita, apanhado num campo de mancarra, com nada para se abrigar, ou estava com pressa de regressar a Bissau, ou tinha visto no cinema uma cena parecida, chateou-se, aqui vou eu, quem quiser que venha. Quis lá saber da parelha e da equipa, meteu-se por aquelas casas de mato dentro. Depois ficou lá dentro sozinho, sem saber bem o que fazer. Os companheiros daquele fim-de-semana encontraram-no a olhar para o ar, para os ramos das árvores a abanarem com as balas. Estes gajos nunca mais aprendem, porra, 20 flexões aí já, o Saraiva oportuno como sempre. Agora sim, podem fazer fogo com o isqueiro, toca a fumar!
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Notas:

8 - Dizia-se dos milicianos que passavam ao Quadro Permanente.
9 - Allouette II
10 - Movimento Nacional Feminino.
11 - Considerava o Nino como um verdadeiro chefe militar e, apesar de inimigo, merecedor de respeito.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14845: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (IV Parte): Comandos do CTIG

Guiné 63/74 - P14856: Cusa di nos terra (17): Uma raridade, o disco "Djiu di Galinha", do pai fundador da música moderna guineense, José Carlos Schwarz (1949-1977)


Capa do disco de José Carlos [Schwarz], "Djiu di Galinha" [Ilha das Galinhas], Bissau, 1979.  José Carlos no palco com a Mama Afrika, a sul-africana Miriam Makeba. Gentileza do António Estácio, guineense nascido no chão de papel, de ascendência transmontana, meu querido amigo e camarada,  que me permitiu fotografar a capa e a contrapa. (As fotos são de fraca qualidade, tiradas em cima do joelho, no nosso último encontro anual, em Monte Real. O Estácio e o Zé Carlos foram colegas de liceu). 

Este disco é hoje uma raridade.  Foi editado, em 1979,  pelo Departameno de Edição-Difusão do Livro e do Disco, do Comissariado de Estado da Guiné-Bissau da  Informação e Cultura.




Contracapa > Nota biográfica



Contracapa > Palavras de Miriam Makeba (1932-2008)










José Carlos Schwarz
 (Bissau, 6 de dezembro de 1949 - Havana, Cuba, 27 de maio de 1977)



Letra (em crioulo e português) do "Djiu de Galinha". Ouçam aqui as vozes fabulosas do José Carlos e da Miriam Makeba, numa atuação conjunta de 1976,,,  Vídeo (a  preto a branco) disponível no You Tube, na conta de Vital Sauane (a quem agradeço)... Há também uma interpretação, do tema "Djiu di Galinha", a solo, pela Miriam Makeba, em 1979. Confesso que prefiro o original... A morte prematura do Zé Carlos foi uma perda brutal para a música guineense e africana, eu diria mesmo, para a música do mundo...

Sobre a Ilha das Galinhas, no arquipélago Bolama-Bijagós, e sobre a curta passagem (3 meses) do José Carlos pela "colónia penal e agrícola" da Ilha das Galinhas, ver aqui várias referências no nosso blogue.

Fotos (e legendas): © António Estácio / Luís Graça  (2015). Todos os direitos reservados {Edição: LG]

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Guiné 63/74 - P14855: Convívios (695): Mais um Encontro do pessoal da Magnífica Tabanca da Linha, dia 23 de Julho em Cascais (José Manuel Matos Dinis / Jorge Rosales)





1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), Amanuense da Magnífica Tabanca da Linha, em efectividade de serviço, com data de hoje, 9 de Julho de 2015:

Bom dia Camarradas!
(isto de um gajo ir a Setúbal, pode deixar marcas.)

O Senhor Comandante Rosales aprontou, e cá o escrevente declara estar a coisa aprontada.
De facto, e a pedido de algumas famílias, chegaram alguns pedidos de informação sobre o próximo encontro da Magnífica. Incomodado na sua importante ignorância (ainda não se sabia, porque S. Exa. ainda não tinha dado ordens para o efeito), o nosso amado Comandante mandou-me apresentar ao gabinete. Pôs-se a rir com o meu aspecto desgrenhado, e com um sorrizinho sacana declarou definitivamente que não presto para muita coisa, mas acedia a dar-me nova oportunidade pela marcação do novo encontro do pessoal da Linha e arredores.

Ora, estimulado pela vontade de lhe provar que ainda vou servindo para uns recados, já não ambiciono ser cooptado para o cargo de tesoureiro, sentei-me ao volante do pó-pó e dirigi-me para Oitavos. Oitavos? Perguntar-se-ão: sim, é que parte do pessoal referiu algumas vezes, que a largueza de vistas e a luz da sala ganham mais expressão nesta época estival, e a ideia ganhou um significativo número de partidários, desde que o serviço volte a ser decente.

Ia naquela fase de dirigir o pó-pó para Oitavos, e pela mente desfilavam imagens de S. Exa. nas vezes que o acompanhei para tão importantes diligências. Tentei imitá-lo o melhor possível, e impressionar o gerente para o fim em vista. Entrei, e perfilou-se um empregado que assinalou a presença do gerente ao fim da sala. Endireitei a carcaça e dirigi-me para ele, a pensar se S. Exa costumava ou não cumprimentá-lo. Ainda não tinha concluído e já estava a estender-lhe a mão.

Lembrei-lhe que os convívios desta tertúlia procuram acima de tudo cimentar a amizade e a concórdia, o que se consegue se as ocasiões forem bem preparadas. Ela assentou que sim. Portanto, continuava eu altivo no papel destacado de que fora incumbido, portanto, será necessário que o serviço seja tão em simultâneo quanto possível, e que não voltem a verificar-se situações de uns terem acabado, e outros estarem para começar. Ele concordou. E quanto ao vinho, lembrei-lhe a importância de uma imagem de marca a que estamos associados, e ele anotou tinto Esteva, e branco de Palmela. Sobre as sobremesas, também insisti que não deve haver muita variedade em quantidade espartana, pelo que assentou-se em salada de fruta e pudim. As entradas, a água, os refrigerantes e o café como de costume.

Faltava indicar o dia, uma quinta-feira como é parte constitutiva da nossa marca, no dia 23 de Julho do calendário. Alguns estarão de férias, mas podem interrompê-las para uma deslocação inaugural desta segunda fase em Oitavos. Aos restantes, pede-se que façam as suas marcações tão depressa quanto possível, e até ao dia 20, segunda-feira. 
A ocorrência terá lugar pelas 12H30, que dá tempo para removermos a caruncho a quem o apresentar.

Abraços fraternos
JD
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14826: Convívios (694): II Almoço do pessoal da Tabanca de Setúbal, Praia de Albarquel, no ido dia 27 de Junho de 2015 (Hélder Valério de Sousa)

Guiné 63/74 - P14854: Efemérides (194): No passado dia 20 de Junho, em São Miguel, foram inauguradas as obras de conservação e renovação do Museu Militar Militar dos Açores e impostas ao nosso camarada Carlos Cordeiro, a Medalha Comemorativa das Campanhas e a Medalha de Cobre de Comportamento Exemplar (José Câmara)

1. Mensagem do nosso camarada José da Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), com data de 8 de Julho de 2015:

Caros amigos,
No passado dia 20 de Junho, em São Miguel, foram inauguradas as obras de conservação e renovação do Museu Militar dos Açores, um novo pólo de atracão para o turismo e para os estudiosos de uma região que é riquíssima na sua história militar.

A efeméride, que contou com a presença da actual Secretária de Estado-Adjunta e da Defesa Nacional, a Sra. Dra. Berta Cabral, não passou despercebida aos muitos açorianos que viram o noticiário daquela noite. Infelizmente, como é hábito da RTP-Açores, pelo meio da notícia ficou perdido um acto muito significativo e dignificante, que a todos nos diz respeito. O nosso amigo Carlos Cordeiro, a par de outros, foi oficialmente condecorado com a Medalha das Campanhas do Ultramar e a Medalha de Cobre de Comportamento Exemplar.

A Medalha de Cobre de Comportamento Exemplar foi imposta pelo Sr. Contra-Almirante Coelho Cândido, Comandante da Zona Marítima dos Açores, e a das Campanhas (Angola, 1969-1971), pelo Sr. General Comando (Reformado), Luciano Garcia Lopes, um gesto de alto simbolismo e de cortesia militar, pois aquele oficial foi colega de Liceu e camarada na Academia Militar do malogrado irmão do Carlos Cordeiro, o Cap. Paraquedista João Cordeiro, tragicamente ceifado de vida num salto de pára-quedas, na Guiné

Para além disso, muito embora não tenha tido formação específica de comando, o Carlos Cordeiro foi convidado a ingressar na Associação de Comandos, força que integrou em Angola. Um exemplo de bem querer, que deveria ser seguido por outras instituições, incluindo as Associações da Liga de Combatentes.

A modéstia de Carlos Cordeiro nunca lhe permitiria trazer até nós o tumulto de sentimentos que o avassalaram ao sentir aquelas medalhas no peito, impostas que foram numa cerimónia simples, mas de alto gabarito social e militar.

Se há coisas neste mundo que me dão imensa alegria é aperceber-me que os meus amigos são devidamente reconhecidos por aquilo que fizeram, pelo exemplo que deram, pela dignidade como cumpriram. As medalhas não lhe foram dadas, são sim uma conquista pessoal, num tempo muito especial da sua juventude. Também sinto que devo reconhecer o nosso País que aos poucos se vai reconciliando com a sua História, de que o Carlos Cordeiro e nós que combatemos no Ultramar não envergonhámos.

Carlos, aquele dia foi teu. Dos teus familiares e amigos. Parabéns.

Se me é permitido, ao amigo, ao Prof. Doutor Carlos Cordeiro, um bem hajas pelo que tens feito por nós, pelos Açores e por Portugal.

Uma bela perspectiva entre o presente e um passado (na nossa memória sempre actual). Carlos Cordeiro e as duas militares, em posição de sentido, no acto da imposição das medalhas.
© Cortesia do Museu Militar dos Açores

A Medalha de Cobre de Comportamento Exemplar foi imposta pelo Sr. Contra-Almirante Coelho Cândido, Comandante da Zona Marítima dos Açores. 
© Cortesia do Museu Militar dos Açores

A Medalha das Campanhas (Angola, 1969-1971) foi imposta pelo Sr. General Comando (Reformado) Luciano Garcia Lopes, um gesto de alto simbolismo e de cortesia militar, ao bem visível comovido Carlos Cordeiro.
© Cortesia do Museu Militar dos Açores
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Nota do editor:

Último poste da série de 6 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14839: Efemérides (193): Lourinhã, 28 de junho de 2015: comemoração dos 10 anos do monumento aos combatentes do ultramar - Parte II: alocução do ten gen inf ref, lourinhanense, Jorge Silvério

Guiné 63/74 - P14853: O nosso livro de estilo (9): proverbiário da Tabanca Grande...


Lourinhã > Praça municipal > 4 de julho de 2015 > Uma raia... Adoro raia (Ou arraia, como se diz na minha terra)... Mas convenhamos que não é, tal como o tamboril, um dos animais mais bonitos do mundo... Adoro raia de todas as maneiras e feitios, fresca ou seca (exposta ao sol no telhado e ao chichi dos gatos)... Mas não me parece que seja bicho com sentido de humor: pudera, nunguém gosta de ser apanhado... para ser comido pelos outros...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados

1. Eis algumas dos nossos provérbios, lugares comuns, frases,  slogans, bocas, piropos... Nossos, da Tabanca Grande... Ajudam-nos  a distinguir um grã-tabanqueiro, isto é, um leitor do nosso blogue que se identifica com o "espírito", aberto, bem humorado, da Tabanca Grande, independentemente de estar ou não estar (ainda) registado como membro desta comunidade virtual que se chama Tabanca Grande...

Já em tempos fizemos até uma sondagem sobre as cinco melhores frases... Recorde-se as três que recolheram mais votos

O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande! (n=40)
Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti. (n=37)
abanca Grande: onde todos cabemos com tudo o que nos une  e até com aquilo que nos separa. (n=27)

Aqui fica uma nova versão, por ordem alfabética. Está longe de estar completa... É apenas o embrião do proverbiário ds Tabanca Gramde... É uma recolha, onde todos/as podem colaborar... Cultivamos o humor e o humor (ainda) não paga imposto (*)...

Esta versão destina-se sobretudo aos camaradas que chegaram mais recentemente  à Tabanca Grande. Recorde-se que estamos  com o nº 693, a 7 lugares do difícil objetivo que são os 700... O último a entrar foi o Tibério Lopes, açoriano dos quatro pontos do mundo.

  • A 'roupa suja' lava-se na caserna, não na parada.
  • Ainda pior do que o inferno da guerra, é o inverno do esquecimento dos combatentes.
  • Amigo traz amigo e amigo fica.
  • As nossas queridas enfermeiras paraquedistas: os anjos que desciam do céu.
  • Até aos cem, ainda se aguenta, depois dos cem, só com água benta.
  • Cabral só há um, o de Missirá e mais nenhum.
  • Camarada e amigo... é camarigo!
  • Camarada não tem que ser amigo: é o que dorme no mesmo buraco, na mesma cama, no mesmo abrigo.
  • Camarada, que a terra da tua Pátria te seja leve!
  • Combatente um vez, combatente para sempre!
  • Dão-se lições de artilharia para infantes.
  • Desaparecidos: aqueles que nem no caixão regressaram.
  • Desarmados mas não arrumados.
  • Dez anos a blogar, pois é!, são cinco comissões na Guiné!
  • É proibido fazer juízos de valor sobre o comportamento de um camarada (do ponto de vista operacional, disciplinar, ético, moral, social).
  • E  também lá vamos facebook...ando e andando.
  • Entra e senta-te à sombra do nosso poilão.
  • Estorninhos e pardais, aqui somos todos iguais.

  • Guiné,  de floresta verde e chão vermelho.
  • Lá vamos blogando, recordando, (sor)rindo, e às vezes cantando, gemendo e chorando!
  • Lembra-te, ó português: bandeira dos cinco pagodes, é na loja do chinês!
  • Luso-lapão só há um, o Zé Belo, e mais nenhum.
  • Mais morto de alma do que vivo de corpo.
  • Mais vale um camarada vivo do que um herói...morto!
  • Miguel & Giselda, o casal mais 'strelado' do mundo,
  • Muita saúde e longa vida, porque tu mereces tudo,


  • Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti.
  • Não é o Panteão Nacional, é melhor, é... a Tabanca Grande.
  • O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!
  • O nosso maior inimigo: o Alzheimer (de que Deus nos livre!)
  • O seu a seu dono: respeita os direitos de autor,
  • O último a morrer, que feche a tampa do caixão.
  • Olhe que não, sr. ministro!, olhe que não.
  • Os camaradas tratam-se por tu.
  • Os camaradas da Guiné dão a cara, não se escondem por detrás do bagabaga.
  • Os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são

  • Para que os teus filhos e netos não digam, desprezando o teu sacrifício: "Guiné ? Guerra do Ultramar ? Guerra Colonial ? Não, nunca ouvi falar!"
  • Partilhamos memórias e afetos.
  • 'Periquito' salta pró blogue, que a 'velhice' já cá está!
  • P'rós insultos, não há contemplações nem indultos.
  • Que Deus nos livre da doença do alemão.
  • Que Deus, Alá e os bons irãs nos protejam!
  • Rapa o fundo ao teu baú da memória.
  • Recorda os sítios por onde passaste, viveste, combateste, amaste, sofreste, viste morrer e matar, mataste, e perdeste, eventualmente, um parte do teu corpo e da tua alma...
  • Saber resolver os nossos conflitos... sem puxar da G3!
  • Sempre presentes, aqueles que da lei da morte já se foram libertando.
  • Só há três coisas de que aqui não falamos: futebol, política e religião.
  • Somos uma espécie em vias de extinção.
  • Tabanca Grande: a mãe de todas as tabancas.
  • Tabanca Grande: onde todos cabemos com tudo o que nos une e até com aquilo que nos separa.
  • 'Um blogue de veteranos, nostálgicos da sua juventude' (René Pélissier dixit). (**)
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Guiné 63/74 - P14852: Parabéns a você (933): Adriano Moreira, ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 2412 (Guiné, 1968/70); Arménio Estorninho, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70) e Joaquim Carlos Peixoto, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3414 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 8 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14848: Parabéns a você (932): Jose Zeferino, ex-Alf Mil Inf do BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14851: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte V: Mulheres e bajudas (II): A Rosinha, a lavadeira de Bambadinca, 40 anos depois (em Bissau)


Guiné- Bissau > Bissau > 2010 > A Rosinha e o Jaime, quattro décadas depois (*)...


Guiné- Bissau > Bissau > 2010 > A Rosinha, que o Jaime foi encontrar em Bissau 40 anos depois...


Matosinhos > Senhora da Hora > 2015 > A Rosinha, pintura em acrílico feita a partir de foto de 2010



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > Pel Rec Daimler 2046 (maio de 1968/fevereiro de 1970) >  A Rosinha, então com 18 anos...

Fotos: © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]



1. Mensagem de Jaime Machado, com data de hoje, às 9h42, respondendo ao meu desafio para legendar as fotos publicadas no poste anterior (*)


[Jaime Machado, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70); vive em Senhora da Hora, Matosinhos: mantém com a Guiné-Bissau a forte relação afetiva e de solidariedade (através do Lions Clube); voltou `Guine-Bissau em 2010  (, foto atual à esquerda)]

Luís

As fotos nº 1, 2 e 3 foram tiradas em Madina Bonco [... e não Máxima],  em setembro de 1969.

Na foto nº  2 uma mulher  catava piolhos a outra enquanto na foto nº 3 uma penteava outra.

As fotos nºs 4 e 5 foram tiradas em Bambadinca,  não posso precisar a data. A jovem era lavadeira e costumávamos chamar-lhe Rosita embora não fosse esse o seu nome verdadeiro.

Encontrei-a em 2010 em Bissau, 40 anos depois!

Mostrei-lhe as fotos que lhe tinha tirado em Bambadinca mas teve dificuldade em reconhecer-se. Envio-te foto com ela. Desta fotografia recente dela fiz um quadro em acrílico cuja foto também te envio.

Abraço

Jaime

2. Comentário do editor:

Jaime, obrigado pela pronta resposta... E pelas espantosas fotos de 2010, que tiraste da Rosinha, em Bissau, para além da reprodução do acrílico... Sei que tens pintado, inspirando-te em fotos do teu álbum da Guiné...

Quanto ao topónimo "Máxima Bonco",,, devias querer dizer "Madina Bonco", no  setor L5, (Galomaro), por onde andaste com as tuas Daimler e onde tiraste  fotos que vou publicar... Tenho aqui uma referência a essa tabanca:

(...) "O Pel Mil 147 (Madina Xaquili, vd. mapa de Cansissé, ) fazia parte, em finais de Setembro de 1968 (data em que o BCAÇ 2852 passou a tomar conta do Setor L1), da Companhia de Milícias nº 14 que tinhas pelotões e secções espalhados por Quirafo e Cansamange (Pel Mil 144), Dulombi e Cansamange (Pel Mil 145), Madina Bonco e Galomaro (Pel Mil 144). Nesta data já não há referência a Padada ]vd. mapa de Padada], presumindo-se que tenha sido abandonada anteriormente. 

Em Agosto de 1969, Madina Xaquili e o Pel Mil 147 já constam no dispositivo das unidades combatentes do BCAÇ 2852, em virtude de se passado a constituir um novo Sector, o L5, com sede em Galomaro (onde já estava de resto a CCAÇ 2405, com forças espalhadas por Imilo, Cantacunda, Mondajane, Fá, Dulo Gengele), integrado no CO7 (Bafatá)". (...) (**)

PS1 - O Jaime Machado veio imediatamente confirmar que se trata, de facto,  de Madina Bonco [, lugar que ainda não localizei no mapa: é preciso tempo e pachorra; pode ser no mapa de Duas Fontes (Bengacia), onde as tabancas têm muitas vezes dois nomes, provavelmente um fula e outro mandinga, e há diversas povoações com a designação de Madina e Sinchã].

PS2 - Informa o Jaime que "Madina Bonco fica na estrada para Galomaro, muito perto da estrada Bambadinca/ Bafata" [mapa de Bafatá].
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Notas do editor:

(*) Vd, poste de 8 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14847: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte IV: Mulheres e bajudas de Bambadinca (I)

Guiné 63/74 - P14850: Tabanca Grande (469): Tibério Borges, ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2726 (Cacine, Cameconde, Gadamael e Bedanda, 1970/72)

1. Mensagem do nosso camarada e novo amigo Tibério Borges, ex-Alf Mil Inf MA da CCAÇ 2726, Cacine, Cameconde, Gadamael e Bedanda, 1970/72, com data de 28 de Junho de 2015:

Caro Vinhal

Sou Tibério Borges que esteve na Companhia de Caçadores 2726 em Cacine de 70 a 72 e, pelo que sei do Luís Paulino, viajámos no mesmo barco, Ana Mafalda, de Lisboa para Bissau.

Posto militar: Alferes Miliciano

Especialidade: Infantaria

De S. Miguel fui estudar para a Terceira. Daqui para o Continente. Regressei a S. Miguel de onde tive que ingressar na Tropa, Mafra e daqui para os Comandos em Lamego.

De seguida fui para Tancos tirar minas e armadilhas. Regressei a S. Miguel para formar companhia no BII 18.

Antes de embarcarmos para a Guiné passamos por Setúbal para tirar o IAO. Depois do desembarque em Bissau fomos para Cacine / Cameconde onde alternávamos mensalmente.

Fui deslocado para Gadamael mais de um mês assim como para Bedanda.

Feita a tropa passei à vida civil e depois de alguns meses em S. Miguel fui para Luanda onde estive 3 anos na vida civil.

Regressei a S. Miguel em Junho de 75. Trabalhei 3 anos na CTM (Companhia de Transportes Marítimos) tendo concorrido à TAP onde estive 20 anos.

Reformei-me por imposição aquando o fecho da delegação em Ponta Delgada em princípios de 2000.
Neste longo espaço de tempo em S. Miguel estive no Brasil (Rio e S. Paulo), Canadá (Mississauga), América (Nova Inglaterra com artesanato).  Portugal de Norte a Sul. Europa: Itália, Suiça, Checoslováquia, passando por Zurique, França (S. Genis Laval – Lyon), Espanha (Rio de Honor).

Com um abraço
Tibério

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2. Comentário do editor

Caro camarada Tibério Borges_

Bem aparecido na nossa tertúlia onde és recebido de bom grado.

Em poucos dias és o segundo português insular a apresentar-se no Blogue. Felizmente temos entre nós alguns açorianos (assim de repente só me lembro de um madeirense, o Inácio Silva, meu camarada da CART 2732) que prezamos especialmente, por serem pessoas também especiais, já que vivem em pequenas ilhas dispersas no Atlântico, para muitos pequenas demais, que os leva à emigração. Por esse mundo fora, especialmente no continente americano, honram o nome de Portugal, e por isso a nossa especial estima e consideração.

O meu particular apresso também aos madeirenses, com que convivi cerca de 28 meses, e entre os quais fiz amizades para a vida.

Não só as nossas Companhias viajaram juntas a partir do Funchal, no "paquete" Ana Mafalda, até à Guiné, como nós os dois nos devemos ter cruzado em Tancos - Casal do Pote - no mesmo Curso de Minas e Armadilhas, o XXXIII, entre 20 de Outubro e 28 de Novembro de 1969.

Mandaste no teu mail de apresentação um excelente texto de memórias, ilustrado com muitas fotos, a que chamaste "3 Anos nas Forças Armadas", que comecei aqui mesmo a publicar.

Que mais te posso dizer? Que espero te sintas em casa e participes comentando o que por aqui se vai escrevendo. Não sei as tuas memórias se esgotam no texto que agora enviaste, se não, esperamos a continuação das mesmas.

A partir de hoje tens mais umas centenas de amigos para trocar impressões e conversar sobre aquilo que nos marcou, e que os "outros" já estão fartos de ouvir.

Deixo-te um abraço de boas-vindas em nome da tertúlia e dos editores Luís Graça, Magalhães Ribeiro e eu mesmo.

Ao teu dispor
Carlos Vinhal

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3 anos nas Forças Armadas (1)

Tibério Lopes

Após os estudos que fiz fiquei um ano esperando por ser chamado a cumprir o serviço militar obrigatório. Neste ano de espera estive a trabalhar na Clínica do Bom Jesus. Em Março de 1969 fui para Mafra a fim de fazer a recruta.

Tenho fotos de há quarenta anos e muita coisa já não me lembro. Meu irmão Mariano e eu entramos ao mesmo tempo para Mafra. Tínhamos acabado de estudar. Por isso entramos mais tarde para a tropa. Lembro-me de nos terem ido buscar a Lisboa aonde chegamos de barco dos Açores. As portas do quartel estavam fechadas e tivemos que esperar. Ao entrarmos uma alta patente falou-nos das nossas instalações que cheiravam a bafio. Algo de muito esquisito pairava no ar. Começava a minha odisseia. Sabia-se que morria muita malta nova no Ultramar. No dia seguinte foi a distribuição da farda. Foi vestir o que nos deram. Tudo ficava desproporcional.

Tibério e Mariano Borges

Ouvia-se falar de muita coisa sobre o que era ou não regulamentar usar. Do lado de fora do quartel os comerciantes vendiam quépis o que era mais atraente do que o que nos davam adentro muros. Lembro-me de um dos militares do quadro nos encontrar fora e nos avisar que deveríamos portar-nos de maneira a não deixar mal o militar, isto referindo-se ao nosso vestir. De facto mais parecíamos uns fantoches do que militares. Mas era o que nos davam. As nossas mães não estavam ali do lado de fora do quartel prontas a intervirem no arranjo da roupa. Sei que houve um grupo que adquiriu quépis que não eram regulamentares mas quando saíamos, acabávamos por o usar às escondidas.

Pelotão de Mafra

Os Exercícios começaram. Era ainda inverno. Sair da camarata onde se dormia em beliches era tomar uma lufada de ar fresco. Mas estava frio. E as ordens eram para se cumprir. Deitar no chão! Nem que fosse em cima de lama ou água. Uma ética completamente diferente daquela a que estávamos habituados. Era a preparação para a guerra. Tudo era estranho e um mundo completamente diferente nos esperava. Claro que é preciso enquadrar tudo isto no tempo. Mas como muita coisa já está escrita sobre o antes vinte e cinco de Abril dispenso esse enquadramento.

Foram cerca de três meses a tirar a recruta. Os nossos fins de semana eram no quartel. Via os continentais a saírem para as suas famílias e regressarem no Domingo à noite. Num desses muitos fins de semana lembro-me dum colega de pelotão me levar até sua casa em Santarém e para a refeição desenterrar uma garrafa de vinho. Acho que se conservava mais fresco. As finanças não abonavam pelo meu lado e como tal era tudo dentro do quartel. Meu irmão e eu lá saímos mas com rédea muito curta. Tempos muito difíceis. Penso que pedi uns dinheiros ao meu pai para lhe pagar depois. Mas os treinos eram puxados. O nosso instrutor era um tenente. O meu fito era não perder a recruta porque fazer a tropa abaixo de oficial, no meu caso, era mau. Por isso dei tudo por tudo e foi de tal ordem que a dada altura o instrutor veio dizer-me que me preparasse para ir para os Comandos em Lamego. Ora eu não fazia a mínima ideia do que me estava a dizer. O que me lembro foi que tirei informações de colegas que me foram elucidando do que já tinham ouvido falar sobre essa tropa. Pintaram-me o quadro de negro e fui ter com o tenente a dizer que não queria ir para Lamego. Mas foi o mesmo que nada. Ele já tinha decidido. Estavam a pedir elementos para os comandos e eu já estava incluído nesse grupo. Mal sabia eu o que me esperava. No final da recruta fomos a Ericeira fazer o almoço de despedida.

 Almoço de despedida

Três meses depois estava em Lamego. Guia de marcha para o Porto e daqui de comboio para a Régua. Era a vapor. Lento mas bonita a paisagem. Fui admirando a natureza numa mística que eu nem sabia qual. Ah! Lembro-me de ter parado em Coimbra. Uma colega da Clínica estava a tirar o curso de parteira e parei para darmos uns dedos de conversa. Seria a minha futura mulher. Coisas do destino. Em Lamego estive uma semana sem nada fazer pois a especialidade só começaria depois. Passeei. Conheci Lamego.

Lamego

Foi uma boa semana mas o que se iria passar a seguir não era rebuçado nenhum.

O Capitão Jaime Neves estava a presidir esta unidade. O Carapeta era instrutor. Um sargento que esteve na Índia aquando o colapso de Goa, Damão e Dio. Outros. Havia um outro sargento que fisicamente parecia o Golias. Pois isto aqui era a doer. Os exercícios começaram. Era de dia de noite a qualquer hora. Carreira de tiro com fogo real. Simulação de guerra com fogo real. Até petardos. Foi aqui que fiquei sem o tímpano dum dos ouvidos. Ainda hoje sofro as consequências disso. Vestidos de farda, arma, cartucheiras, munições (acho que granadas, também) e botas, lá marchávamos de noite desde Lamego para a Régua onde no rio nos banhávamos em águas paradas a cheirar mal e cheias de rãs. Também passávamos por buracos onde as tripas de animais faziam parte da merda a que ficávamos a cheirar. Visitas ao cemitério depois da meia-noite fazia parte do programa. Aqui o terror era o tema e lembro-me que ao saltar os muros logo de início afocinhei, resultado dum arame no caminho para logo de seguida apanhar uns bons socos com luvas de boxe do tal sargento Golias. Vozes a surgirem das campas. Mas para a frente era o caminho. Estava escuro como breu. No fim do cemitério saltei para cima dum muro e logo apareceu uma voz de comando para saltar para o incerto e tenebroso vácuo. Era baixo ou alto? Aquela sensação de pensarmos que vamos saltar para muito alto quando afinal não era. Uma sensação terrível. A “psico” era ambientada com a música “Mãezinha” sei que estás a chorar… não chores. Deitados de papo para o ar na parada a olhar a estrelas e a ouvir esta música. Destruir, preparando a malta para uma guerra de guerrilha. Três dias deixados no mato sem sabermos onde estávamos e apenas com coordenadas para regressarmos a casa depois de termos que passar por objectivos. Eram os dias da “sobrevivência”.

Lembro-me que neste trajecto fomos parar a um sítio onde um homem estava em obras numa casa. Soubemos que tinha estado no ultramar pois fomos lá pedir de comer. A fome era negra. Rato como já era, o dono da casa e nós ao entrarmos dentro e ele ao ir buscar algo para enganar a fome, um dos nossos elementos ia vasculhar mas não deu tempo porque o dono logo deu meia volta e nos avisou para estarmos sossegados. Depois de uma cavaqueira amena continuamos o nosso percurso comendo a fruta que apanhávamos por aqueles sítios. Sei que era verão e muita água bebi duma canalização de alimentação de águas para a rede pública. Como consequência apanhei uma insolação. Três dias de cama a tremer de frio em pleno verão.

Foram três meses de duro exercício. Sei que me correspondia com uma senhora minha amiga e minha segunda mãe, Maria Teves. Por ter tido um filho na Guiné foi avisando-me que onde eu estava era bom não me deixar levar pelo espírito que cultivavam nestas unidades porque depois no terreno a morte estava esperando por nós. Estávamos a ser formados para tropa de intervenção. Sei que foi aqui que andei pela primeira vez de helicóptero. De facto o espírito de camaradagem que adquirimos era fora de série. E no meu interior comecei a desenhar o meu sofisma. Chegar ao fim da recruta era meu objectivo. Três minutos antes de acabar um balde de água fria gelou o nosso espírito. Um dos nossos colegas, um furriel, tinha acabado de levar um tiro apanhando a aorta num exercício final de meia lua onde os homens da ponta cruzaram fogo entre si. Uma hora depois estava morto. Um exercício mal efectuado pelo sargento que tinha estado na Índia. A malta ficou mesmo em baixo. Acho que nem ao funeral fomos. Já nem me lembro.

Um papel chegou até nós para o assinarmos. Dizia que éramos voluntários. Bolas!
Assinei o “não” e todos ficaram a olhar de lado para mim.
E foi assim que deixei de ser comando.

Enviaram-me para Tancos a fim de tirar minas e armadilhas.
Devo ter estado em Tancos cerca dum mês. Ensinaram-me a técnica de manejar explosivos, mostraram-me algumas minas e a maneira de as armar e já não sei que mais.

Tancos - Casal do Pote

Uma coisa é certa. Fui bem preparado para ir para o ultramar. Pelo menos para me defender. A vitória duma guerra baseia-se no medo que cada tem e que faz tudo para se defender. Existem pessoas que através de leis se aproveitam desta situação para juntar milhares de pessoas que as colocam num determinado terreno para matar outros. Tirando algumas excepções na história da humanidade impor ideais numa guerra é utopia. O medo é a base da guerra. Todos têm o buraquinho no fundo das costas. O resto é fanfarronice.

Mas a filosofia da guerra é discutível e como tal vamos a factos. Enquanto estive em Tancos andei a conhecer os arredores. Lembro-me de ter ido ao Castelo de Almourol e à Barquinha. Aqui havia um café onde se podia passar umas horas aos fins-de-semana que se convertiam sempre em ver os continentais irem para junto da família e eu, Açoriano, a ficar nos aquartelamentos.

Terminado este tempo de instrução enviaram-me para S. Miguel a fim de ingressar nos métodos de formação de companhia. Disponibilizaram-me vinte e cinco homens e dois furriéis em vez de três para dar formação. Era inverno. Arrifes, BII 18.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14834: Tabanca Grande (468): José Jorge de Melo, ex-Alf Mil da CCAÇ 1498/BCAÇ 1876 (Có, Jolmete, Ponate, Bula e Minar, 1966/67)