1. O sítio da Fundação Mário Soares merece uma visita demorada. Mais: deve ser acrescentado à nossa lista de favoritos. Por muitas razões, e muito em especial pela qualidade e originalidade da documentação que disponibiliza, de interesse histórico e cultural.
De as entre as várias iniciativas desta Fundação que são de destacar, temos o Arquivo & Biblioteca.
O Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares disponibiliza, por exemplo, para visualização (não dá para fazer download), mais de um milhar de fotos do arquivo pessoal de Amilcar Cabral. Segundo a explicação que é dada, "em 1999, a Fundação Mário Soares, com a colaboração da Dra. Iva Cabral, procedeu à recolha de centenas de fotografias respeitantes a Amílcar Cabral e à luta de libertação nacional que se encontravam em iminente perigo de destruição". Muitas delas eram inéditas.
É grato registar que "todo esse importante espólio fotográfico foi objecto de tratamento e reprodução fotográfica e digital", tendo sido a partir de Janeiro de 2003, "gradualmente disponibilizado na Internet, ao mesmo tempo que se prossegue à sua descrição e classificação".
As fotos estão organizadas por conjuntos de 10, num total de 119. Não se perecebe, no entanto, qual foi o critério de ordenação. Aparentemente, não há nenhuma ordem lógica ou cronológica na organização do álbum. A pesquisa, no entanto, pode ser feita por temas ou palava-chave.
Infelizmente, muitas vezes não é indicado o local (nem a data) onde foram tiradas muitas das fotos, nas zonas libertadas ou nas frentes de combate... Presumo que uma boa parte tenham sido tiradas em bases mais recuadas e mais seguras do PAIGC: Ziguinchor, por exemplo (51/119). Tenho dificuldade em reconhecer os sítios por onde passei, de 1969 a 1971, com os meus camaradas da CCAÇ 12: por exemplo, a região do Xime e do Xitole que o PAIGC considerava como "zona libertada".
Há fotos de Cacine, em reuniões do PAIGC com a população (45/119). Há fotos de Cheche e do Rio Cheche (96/119), e até de um cemitério em Cheche (87/119). Mas em muitos casos a legenda limita-se apenas a indicar que a foto foi tirada no "interior da Guiné".
Há, por exemplo, uma foto do hastear da bandeira do PAIGC, com um poster do Amílcar Cabral, em Guileje (30/119). Essa foto só pode ser posterior ao abandono do aquartelamento pelas NT em 1973. Há também uma que parece ser de Gandembel, a crer na legenda que o fotógrafo terá escrito no verso do original (59/119).
Há outra, com elementos mais explícitos, que tem como legenda: "Quartel português da Companhia de Caçadores 3477, ocupado pelas forças do PAIGC; distinguindo-se além das insígnias da Companhia, uma imagem religiosa" (parece ser a imagem de Nossa de Senhora de Fátima, de pé, no parapeito de uma janela) (58/119).
Há muitas fotos de Cabral com dirigentes e combatentes do PAIGC (por exemplo, 50/119), ou de dirigentes, sozinhos ou em grupo. Dos operacionais, destaco a título exemplificativo os nomes de: Nino Vieira (10/119; 81/119), Kecuta Mané (8/119), André Gomes (10/119), Umaru Djaló (2/119), Malan Sanhá (3/119), Francisco Mendes (25/119), Otto Schacht (4/119 e 7/119), Arafan Mané (49/119), Quemo Mané (72/119).
Honório Chantre aparece numa foto mais recente (1974), tal como Manuel dos Santos (Manecas), confraternizando com tropas portuguesas já depois do 25 de Abril de 1974 (77/119) Há também retratos de Manecas em 1973 e 1970 (77/119). E ainda em 1972 (67/119).
Nas outras fotos (34/119) aparecem prisioneiros portugueses "a conviver" com guerrilheiros, disputando uma partida de futebol (34/119). Há retratos de militares portugueses, prisioneiros ou desertores (44/119). Ou ainda de militares portugueses a serem entregues à Cruz Vermelha, no Senegal (61/119).
Numa dessas fotos, por exemplo, vê-se um grupo de cinco prisioneiros portugueses, a jogar futebol, descalços,em Conacri, num espaço murado (18/119).
Pergunto ao Marques Lopes se não serão alguns dos nossos 11 camaradas da CART 1690 (Geba), que desapareceram na noite de 10 para 11 de Abril de 1968, no ataque e assalto do IN ao destacamento de Catacunda ?
Há também fotos de aeronaves portuguessas destruídas (49/119) ou de veículos apreendidos: Por exemplo, um veículo blindado do Batalhão de Cavalaria 311 ("Os Pipas") (17/119) e, mais à frente, de um jipe do mesmo batalhão (103/119) e uma Fox 3115 (MG-34-69); uma Berliet destruída por uma mina (MG-61-01) (35/119); uma vitura abandonada numa picada (64/119); armamento capturado (36/119). Há uma ou outra foto de aquartelamentos portugês. Há uma, por exemplo, que é referida como "quartel português destruído" (48/119) ou "saqueado" (103/119). Nunca é referido o tempo e o lugar (68/119).
Já agora seria interessante saber se alguém conheceu este azarado Batalhão de Cavalaria 311, "Os Pipas", onde esteve e em que época...
Há muitas fotos de grupos de combatentes, empunhando armas, em desfile, em acções de formação e treino (33/119; 38/119), em marcha ou coluna (39/1119; 40/119; 55/119), a pôr ou a levantar minas (32/119; 41/119), cambando um rio (26/119)ou cozinhando no mato (72/119) mas muito poucas tiradas debaixo de fogo, ou em popsição de combate, as verdadeiras "fotos de guerra" (56/119; 68/119; 91/119; 92/119).
O papel das mulheres na luta de libertação, como enfermeiras, professoras, carregadoras de material, milícias, etc., também está bem documentado (27/119; 75/119), bem como a relação da guerrilha com a população (93/119; 98/119).
É claro que também há fotos de "informação e propaganda", destinadas a consumo interno e externo, e nomeadamente dos países amigos do PAIGC (ex-União Soviética, República Popular da China, Cuba, Argélia, Suécia...)e para a opinião pública internacional.
Muitas das fotos são do início da luta armada: por exemplo, tomada da Ilha do Komo (52/119) ou congresso de Cassacá (50/119). Grande parte das fotos de Cabral estão relacionadas com a sua actividade política internacional e diplomática. Por exemplo, Amílcar Cabral com Fidel Castro (76/119), ou com dirigentes de outros movimentos de libertação (Angola, Moçambique).
Mas há também bastantes imagens da actividade do líder histórico do PAIGC, em visita ao interior da Guiné ou nas bases do PAIGC: por exemplo, com Nino Vieira e Constantino Teixeira (105/119). Uma das mais emblemáticas e mais conhecidas é a do líder do PAIGC atravessando um rio, de canoa, de pé, juntamente com Constantinto Teixeira, outros guerrilheiros e uma mulher (104/119).
2. Em resumo, peço aos amigos e camaradas da Guiné para visitarem, com tempo e vagar, esta pagína da Fundação, e verem com mais atenção e detalhe este ábum de fotografias que pertenciam ao arquivo pessoal do grande dirigente político Amílcar Cabral, de quem é bom lembrar que sempre disse que não combatia contra o povo português mas sim contra o regime político de António Salazar e de Marcelo Caetano.
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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