segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4885: Relembrando o nosso querido capelão, Arsénio Puim, no Xitole (David Guimarães)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xitole > 1970 > O Alf Mil Capelão Arsénio Puim, capelão militar, de origem açoriana (à esquerda), com o furriel Guimarães da CART 2716 (à direita). Devido presumivelmente às suas homilías, o capelão do BART 2917 (Bambadinca , 1970/72) teve problemas com as autoridades do CTIG, acabando por ser detido em Bambadinca, em Maio de 1971, levado para Bissau e, ao fim de um semana, repatriado e demitido de capelão miliar. Terá havido outros casos: o caso talvez mais famoso foi o do Padre Mário da Lixa, também membro da nossa Tabanca Grande.

Até há três meses atrás, era a única foto que possuímos do nosso camarada, hoje enfermeiro reformado, a viver em Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, Região Autónoma dos Açores, donde é natural (Ilha de Santa Maria).(*)
Por seu turno, , David Guimarães é o membro nº 3 da nossa Tabanca Grande, ex-Fur Mil At Atilharia e Minas, Xitole, sede da CART 2716 / BART 2917 (1970/72). Está reformado da Segurança Social e vive em Espinho.
Foto: © David Guimarães (2005). Direitos reservados.

1. Mensagem de L.G. dirigida ao David Guimarães, com data de 16 de Janeiro de 2008:

Convivi pouco com o capelão Puim. Já não ia missa nessa idade, e muito menos na Guiné, em Bambadinca. Além disso, a malta da CCAÇ 12 tinha uma intensa actividade operacional, ao serviço do comando do do batalhão, sobrando pouco tempo para conviver com a malta da CCS. Levei-o, a ele, Puim, uma vez, numa das nossas colunas logísticas ao Xitole, a ele e à mulher do Carlão... (Ainda me recordo de a ver, de camuflado, e de sapatos de salto alto, vermelhos, à guarda do angélico Puim... Não sei se te recordas: o Carlão era um dos alferes da CCÇ 12, estando na altura destacado no reordenamento de Nhabijões... Alguém se recusou, por razões de segurança, a levar a mulher do Carlão. Deve ter sido o comandante da coluna, um dos nossos alferes ou talvez o Beja Santos, do Pel Cal Nat 52, já não me recordo ao certo... Julgo que a coluna ia mesmo até ao Saltinho. Já não tenho a certeza se ela acabou por ir ou por ficar. O Puim foi dessa vez, e terá sido essa uma das quatro vezes que ele te visitou, no Xitole)...


E posteriormente, a 29 de Janeiro de 2008:

David: Foi nesta altura que conviveste mais com o Padre Puim... Ele ficou no Xitole, duas semanas...Vê se te lembras de mais pormenores, incluindo esta cena da mina e dos picadores de Mansambo... Vou perguntar também ao Humberto, que ia nesta coluna... Julgo que o Vacas de Carvalho também foi... Terá sido no 2º semestre de 1970... O BART 2917 chegou a Bambadinca em meados de 1970 (Junho), tinha a CCAÇ 12 já um ano...


2. Resposta do David Guimarães, com data de 29/1/2008, e até agora inédita:

E pronto, aqui está um problemazinho que nos diz respeito: foi há muito tempo... no tempo da guerra... mas foi, aconteceu. Aquela estrada Bambadinca-Xitole era fértil em tudo e até em minas... Contei há dias algo sobre a Coluna que nos reabasteceu nas alturas do primeiro Natal nosso... 10 de Dezembro de 1970, fixei-me em memória porque efectivamente estive presente na protecção desta e mais tarde no armadilhamento da Mercedes 322 que ficou com a parte da frente destruída quando caiu numa mina reforçada na ponte do Jacarajá e quando regressava a Bambadinca...

Efectivamente houve um com muita gravidade, o 1º Cabo Armindo, da CCS do BART 2917... Este história contei-a já, ainda estamos muitas testemunhas do facto e a apoiar esta informação incluindo os militares da CCaç 12 a que pertenciam o Carlão, o Humberto [Reis], o Henriques (Luís Graça) e tantos outros, claro... Mais testemunhas foram o Major de Operações do BART [2917, o major B.B.] e uma secção onde eu estava - que foi a responsável pela protecção por armadilhamento do que sobrou da Mercedes com três granadas defensivas com arames de tropeçar...

Tudo isto se passou como disse na ponte do Jagarajá - zona de raio de acção das CART 2716, aquartelada no Xitole, e da 2714, aquartelada em Mansambo. Apoiei-me agora em datas, não em factos porque os tenho bem de memória e estão confirmados pelo livro do BART 2917 e inserida esta acção nas pág. 41 de 75 HU-CAP II.

Também creio que não foi esta a coluna onde aconteceu esse guias terem lerpado enfim, na coluna que o nosso capelão seguia... e se deu para além da zona a que eu estava inserido, quer dizer que foi para lá do Jagarajá, quem do Xitole se desloca para Bambadinca...

Claro que, consultando o livrinho, ele poderá avivar, ela foi outra que não essa... mas a data será menos importante que o acontecimento...

A relação com o Capelão do Batalhão - o Padre Puim (**)...

Os quinze dias de convívio com o nosso capelão no Xitole foi importante naturalmente - o Padre Puim era uma pessoa que transmitia paz e segurança, era ouvido atento, conselheiro e amigo e camarada também...

Sei que na Cart 2716, durante aqueles 15 dias, ele foi pessoa bastante importante, o mensageiro da paz dentro da guerra e, curioso, aquela linda Capela que existia testemunhando decerto as nossa crença, foi nessa data usada para celebração de Eucaristia... Há boa maneira portuguesa e em honra a todas as aldeias que representávamos tivemos missa, no Xitole rezada pelo nosso Pároco afinal - o nosso querido Capelão...

Existe para aí uma foto em que eu estou com o Puim junto a uma bananeira - sim, será possivelmente a única foto que temos no blogue - mas é isso, ele procurou estar em todo o lado e esteve - tivemos dias diferentes...

Estava uma pessoa do Batalhão e que nos era querida a todos... Já tanto não seriam outras pessoas ligadas ao Comando, como é óbvio… que tomáramos nós vê-los sempre longe e muito longe - mas isso passou e o tempo ensinou-nos a isso e resta-nos dizer que a guerra era assim e por certo modo entender que efectivamente seria necessária aquela disciplina, mas isso é outra coisa...

O Puim foi uma pessoa que muito cedo se relacionou connosco... Colocados os quadros para formar Batalhão na Pesada 2 logo nos veio ter um Capelão...portanto logo começamos os quadros a relacionarmo-nos com o Padre Puim - curioso que não usávamos o termo Capelão... Creio também que nunca dissemos Meu Alferes, era o Sr. Padre e pronto...

Mas como dizia foi uma como que longa - a tropa era sempre muito - a nossa a estadia com o Padre Puim e portanto existia confiança e lealdade entre nós num relacionamento fraterno, menos militar e muito mais humano... Vi que a tropa aí era um acidente... Não a consegui reprovar contudo razões se impunham, talvez genéticas, sendo que contudo saberia que meu pai tudo faria para me livrar a atropa e ele era profissional - só por isso... Isso está escrito...

Assim o Padre Puim esteve na Pesada 2 (Vila Nova de Gaia), Viana do Castelo, um tempo largo e depois na Guiné... Ele e nós quadros do BART tivemos oportunidade de nos conhecermos muito bem e, como o IAO foi enorme, também os todos os militares que compunham o Batalhão o conheciam bem, a partir de Viana onde estivemos todos. Daí que houve uma grande e sã convivência entre todos - sendo que os Serviços religiosos, inúteis para a maioria, se tornavam essenciais quando apareciam Puims...

Teve o cuidado de visitar todas as Companhias, de ouvir toda a todos os cuidados e paciência de ouvir a todos e mais teve o cuidado de se fazer ouvir também... Assim esteve sempre perto de todos... Creio que se essa era a missão de um Capelão, pois se era ele cumpriu até ao fim, tempo em que deixou saudades a todo o Batalhão, como sabemos (**)...

E por ter sido apóstolo a tempo inteiro, os fariseus não lhe perdoaram...


Um abraço David Guimarães

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1763: Quando a PIDE/DGS levou o Padre Puim, por causa da homília da paz (Bambadinca, 1 de Janeiro de 1971) (Abílio Machado)

5 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1925: O meu reencontro com o Arsénio Puim, ex-capelão do BART 2917 (David Guimarães)

16 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2444: Arsénio Puim, ex-Alf Mil Capelão, CCS/BART 2917, hoje enfermeiro reformado e um grande mariense (Luís Candeias)

18 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4372: Convívios (131): CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), com o Arsénio Puim e os filhos do Carlos Rebelo (Benjamim Durães)

19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4378: Arsénio Puim, o regresso do 'Nosso Capelão' (Benjamim Durães, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72)


(**) Vd. postes de:

14 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4521: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/ Mai 71) (1): No RAP 2, V.N. Gaia, onde fez mais de 60 funerais

10 de Julho de 2009 >Guiné 63/74 - P4666: Memorias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/Mai 71) (2): De Viana do Castelo a Bissau

10 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4665: Memória dos lugares (33): A minha visita a Missirá, na passagem de ano de 1970, com o médico Mário Ferreira (Arsénio Puim)

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