terça-feira, 4 de setembro de 2012

Guiné 63/74 - P10325: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (37): Guerra de titãs, o Almeida Comando contra o Vilar Pára

1. Mensagem do nosso amigo e irmão Cherno Baldé, com data de 29 de agosto último:
  

Caros amigos Luís e Carlos Vinhal,
Junto envio uma crónica na linha do habitual, algumas imagens e poemas da minha colecção da juventude que podem utilizar de acordo com os habituais critérios de utilidade e bom gosto bloguistico.

Um grande abraço,

Cherno Baldé



2. Guerra de Titãs > Almeida contra Vilar / Comando contra Pára

por Cherno Baldé (*)

Hoje vou contar uma pequena estória sobre uma disputa física entre dois militares muito especiais e que, não fosse o ambiente tenso da guerra subversiva que transformava misteriosamente o destino das pessoas envolvidas, poderiam ter cumprido a sua missão normalmente, regressar a sua terra natal, casar-se e ter um destino feliz, como aconteceu com a maioria dos seus companheiros de armas que passaram no TO da Guiné, dita portuguesa.

Estou a referir-me ao duelo entre o Almeida-Comando e o Pára-Villar que ficou gravado na memória de todos os que se sentiam, de uma forma ou outra, atraidos ou ligados à vida dos soldados do quartel local.

Como habitualmente acontecia na época, havia pouca gente que estava informada das suas verdadeiras identidades, nao pertenciam ao corpo original da companhia, tinham vindo de parte incerta para integrar e conviver no meio de soldados milicianos numa localidade meio esquecida do nordeste guineense de Fajonquito, que o soldado Inácio M. Gois tão bem descreveu no seu Diário da Guiné (1964/66).

Dos dois contendores, o Almeida-Comando tinha sido o primeiro a chegar à Fajonquito na coluna que todas as semanas ia à cidade de Bafatá, sede do Batalhão, com a sua G3 numa mão e uma bolsa contendo os seus pertences, noutra. Soldado robusto, estatura media e boca de lâmina (lábios miudinhos), olhar decidido, europeu típico da raça dos Victor Tavares, José Dinis, Antonio Dâmaso ou Silvio Abrantes, cedo mostrou a sua preferência pela solitude, não tinha amigos e os companheiros de caserna não tardaram a desertar, procurando locais mais seguros. Nas suas costas falavam que era maluco ou que estava apanhado, mas ninguém se atrevia a repeti-lo a sua frente. 

Militarmente aguerrido, oferecia-se para todas as saídas ao mato e quando havia ataques nas localidades mais próximas, enquanto os outros ficavam a espera de ordens superiores, ele seguia correndo, sozinho. Era sempre o primeiro a chegar ao local do ataque e, quando os outros chegavam, já ele estava de regresso ao quartel, exausto.

O boato que circulava a seu respeito era que ele teria cometido violações graves que tinham provocado a sua expulsão de uma companhia de comandos para o cumprimento de um castigo que o condenava a ficar na Guiné durante muito tempo. De qualquer modo o que era certo e sabido é que não apreciava muito os seus companheiros brancos, preferindo a companhia das crianças nativas e que não estava programado o seu regresso com aquela companhia de metropolitanos. Quanto tempo teria da Guiné? Ninguém sabia ao certo.

O Pára, Villar,  chegaria mais tarde e, ao contário do primeiro, ele era alto e direito como uma palmeira das bolanhas, mãos largas e fortes, olhar insolente e brincalhão, mas também ele marcado pelo destino e pela carreira que escolhera como militar, pois quando abria a boca viam-se alguns espaços vazios entre os seus dentes da frente e no maxilar esquerdo.

No meio da soldadesca macaca, minado por intrigas e pequenas quezílias de rancho do quartel, não tardou a circular de boca em boca entre criancas e auxiliares nativos da messe e do refeitório que entre os Páras havia uma norma ou lei que se designava "regra da dentadura",  segundo a qual os candidatos à  entrada para a mais exigente de todas as especialidades militares deviam possuir uma dentadura completa e bem saudável e ainda ter que mantê-la durante o periodo de serviço militar sob pena de serem expulsos deste corpo de elite.

Verdadeiro ou falso, para os miúdos que faziam do quartel a sua primeira escola de vida, não era muito importante, o certo-certo mesmo era que dai em diante o ambiente habitual do quartel seria necessariamente alterado com a presença de duas espécies raras da paisagem militar portuguesa com garras bem afiadas. Um soldado comando corajoso e psicologicamente desequilibrado, que no seu estilo de lobo solitário, qual cowboy saído de um Western americano e que fazia das crianças nativas seus instruendos e um Paraquedista durão e provocador, aparentemente normal, amigo da farra, das bajudas e do jogo de cartas.

A chegada do Villar também trazia de volta um debate muito frequente, no começo dos anos 70, no seio da miudagem dos aquartelamentos, que era a questão de saber quem,  entre Comandos e Páras,  é que tinha a melhor preparação militar. Cada um argumentava com as suas armas sem que tivessem, na realidade, noção clara sobre o que os distinguia na prática, suas forças e fraquezas. O facto de os Páras fazerem-se ejectar de um avião em pleno voo, embrulhados num simples pedaço de tecido, parecia conferir-lhes uma nitida vantagem, mas os adeptos dos comandos levavam sempre melhor, pelo menos a luz dos acontecimentos no terreno e o respeito que impunham no mato e, também, nas ruas de Bissau, claro.

O Almeida tinha como "hobby" preferido a caça às pombas na orla da bolanha. Homem de poucas palavras, quando estava de acordo em que o seguissemos,  não dizia nada e ia a nossa frente. Quando não estava no seu melhor dia, com o cano da G3 apontada ao chão, mostrava a direcção da porta de armas com a mão livre, não a descendo enquanto os "djubis" não tivessem transposto o limite dos arames farpados, depois seguia cabisbaixo no seu trote rápido de homem que sabia ter o destino nas suas próprias mãos. 

Inocentes e impertinentes, sempre que as crianças tinham a sorte de o poder acompanhar, não se cansavam de admirar o fisico compacto deste homem, os seus reflexos rápidos e o tiro certeiro da G3. Nunca se precipitava nem perdia muito tempo em pontarias de inclinar cabeça e fechar olhos como faziam os outros, era "tau-rau", isto é, por cada tiro dado era uma ave que caia com uma mancha negra à volta do buraco da morte. Custava acreditar, por atrás dele, movendo-se ligeiros, num silêncio de arrepiar, esperávamos pelo sinal da mão para ir buscar o animal que se esbatia com o corpinho ainda quente. 

Todavia, acompanhar o Almeida era entrar num jogo atractivo, mas sem fim a vista, pois as suas mudanças de humor eram frequentes e imprevisiveis e,  quando isso acontecia, o divertimento inicial podia ultrapassar os limites do suportável, transformando-se num calvário para adultos. Os sinais de tal mudança manifestavam-se no súbito desinteresse pela caça habitual, na raridade dos tiros e na aceleração da marcha. 

Os menores, como eu, não podiam passar dos limites da bolanha de Sunkudjuma e, depois desta, começava a grande floresta de Oio e Cola-Caresse, região povoada de "Djinnés", prenhe de perigos vários e dominada pela guerrilha. O segundo grupo de temerários continuava a marcha, com o Almeida sempre à frente. Percorriam uma zona remota, semeada de centenárias Baga-bagas gigantes, habitat dos lendários "Kankurans" mandingas que coloriam o imaginário da nossa infância mestiça e, quando começavam a escassear os sinais da presença humana, as crianças, impelidas por um instinto natural de defesa, começavam a desertar, uma a uma, deixando o Almeida-comando no meio de intrincados trilhos de gazelas e de porco-espinhos, entregue a si mesmo, a sua inseparável G3 e a granada expansivel na cintura. E, estafados de tanto caminhar, quando voltavam à aldeia e iam ao quartel, encontravam o homem tranquilamente sentado à porta da sua caserna, limpando a sua arma. 

Num certo dia em que vínhamos de uma jornada de caça normal, dei uma fugida rápida e imprevista entrando de rompante numa das moranças da aldeia com a intenção de impressionar os aldeões com as dezenas de pombas que trazia em cima dos ombros. O resultado foi receber uma valente reprimenda também ela inesperada. Os mais velhos não teriam gostado de ver tantos animais mortos com arma de fogo numa só tarde. Descobri assim que o africano,  mesmo levando uma vida miserável,  é, por princípio, avesso ao desperdício de vidas e de recursos. Era muito pouca, de facto, a carne que se aproveitava nos pássaros com o estoiro dos projécteis.

O Almeida, no interior do seu silêncio, parece que fazia tudo para provocar a ira das hierarquias militares e estes, por sua vez, armados de bom senso e instinto de conservação, parece que faziam tudo para não entrar em rota de colisão com um subordinado de modos estranhos e psicologicamente instável. Esta postura oficial, mais tarde, revelar-se-á muito negativa e com consequências bem drásticas e que afectará toda a companhia, a escassos meses de fim de comissão.

Tanto assim que, uma vez por semana, o Almeida ao comando do seu pequeno e barulhento pelotão de "djubis", crianças caídas na órbita do quartel, dirigia os treinos físicos e de preparação militar, seguidos de uma faxina no interior do aquartelamento, tal como apanhar o lixo, capinar e limpar os sanitários. Após estas tarefas que habitualmente terminavam à hora do almoço, todo o grupo se dirigia ao refeitório-geral para servir-se dos restos do almoço do dia, servido em cima das mesas pelos cozinheiros nativos, utilizando os pratos e talheres disponiveis na cozinha da companhia e ainda com direito a sobremesa.  Enquanto isso, o Almeida-comando punha-se a passear de um canto a outro do refeitório, ao som das batidas ritmadas do chicote na parte mais alta das suas botas de cabedal reluzente, peito inchado e olhos vermelhos no rosto inexpressivo de ferra indomada.

Os "djubis", indiferentes ao ambiente tenso que reinava devido a contrariedade que provocava a sua presença indesejada no refeitório, comiam com a sua habitual gula e, ao mesmo tempo, estavam atentos aos movimentos de vaivém do seu Comandante-chefe. Quando este se afastava um pouco e os talheres começavam a atrapalhar, metiam rapidamente as mãos dentro das terrinas metálicas para dai retirar pedaços de carne ou restos de comida. Se a refeição era feita com pedaços de batatas ou arroz, tudo bem, mas às vezes era massa de esparguetes compridos e delgadinhos, que nem com as mãos se seguravam e constituíam tarefa complicada metê-los dentro da boca. Nestes casos a melhor solução era absorvê-los directamente com a boca, "tchúúph". Os brancos não gostavam desta forma muito prática de comer animal, o Almeida também. A ameaça do chicote era real.

Foi o Vilar que acabou com o nosso reinado no refeitório. Para todos os efeitos, era uma situação anormal e que não podia perdurar, pois não agradava a ala mais conservadora da tropa e não era muito apreciado pelos miúdos que, habituados à liberdade natural de comer à mão, sentiam-se bastante constrangidos com o espectáculo de comer com facas e garfos em cima de uma mesa e diante de olhares curiosos, coisas de brancos.

No dia em que se deu a briga, estávamos na cozinha do refeitório a preparar, em fogo brando, as pombas que o Almeida tinha trazido na tarde do dia anterior. O refeitório ainda estava quase vazio, estando numa das mesas o Vilar, sozinho, a entreter-se com a sua faca de mato, de cara para a porta do quarto onde residia o Almeida, facto que, pela sua ousadia, não augurava nada de bom. De vez em quando mandava uns palavrões ao ar, sem se dirigir a ninguém em especial. Caso estivesse a tentar provocar a fera, decerto que não perdia nada por esperar, pensávamos com os nossos botões.

Ninguém viu como  nem quando aconteceu, mas parece que o Almeida teria saído do seu quarto a vomitar impropérios e num salto teria voado em cima do Vilar com os pés em riste. Da violência do choque dos dois corpos, a faca do Villar tinha caído das suas mãos e os dois, entrelaçados, tinham rolado ao chão num grande estrondo, derrubando mesas e cadeiras. Durante alguns segundos, que pareceu um longo espaço de tempo, lutaram no chão cada um tentando dominar o outro e, de repente puseram-se de pé. Ofegantes e punhos cerrados, mediram-se novamente com os olhos e, quando se preparavam para um novo embate,  ouviu-se uma potente voz de comando que gritava "alto ai!!!". Era a voz do Capitão da companhia, Carlos Borges de Figueiredo, também ele com volume e estatura respeitável.

Não ficamos para saber como terminou a briga e, na confusão do momento, aproveitamos para sair dos arames farpados e regressar as nossas casas, na certeza, porém, de que se tratava apenas do começo de uma história que, qualquer dia, poderia terminar muito mal.

Depois, para a posteridade, de aldeia em aldeia, de bantabá em bantabá, como a notícia não pesa nem tem custos de transporte, cada um encarregar-se-ia de descrever o sucedido à sua maneira, acrescentando alguns pormenores ou dando vantagem ao herói da sua preferência. Comando contra Pára, Almeida contra Vilar e, de tanto tocar e retocar no assunto tornou-se dificil distinguir, ao certo, quem conta do que assistiu e viu com os seus olhos de quem conta do que ouviu alguém contar. 

Nasceu assim esta crónica que se inspira da vivência de um imaginário real, de tal modo que qualquer semelhança com a vida real de alguém só pode ser uma coincidencia fortuita e irreal.

Com abraços amigos de

Cherno Baldé (Chico de Fajonquito)
Bissau, 27 de Agosto de 2012.


Na imagem: os meus dois filhos Luís e Domingos numa esplanada da Praça do Império rebaptizada Praça dos Heróis Nacionais em Bissau, 2011. Teria eu a mesma idade quando acompanhava o Almeida-Comando nas aventuras da Bolanha de Sunkudjuma, em Fajonquito, nos anos de 1971/72. Sinais dos tempos.

Cherno Baldé (direita) e o seu colega de infância Saido Candé (esquerda), conhecidos no quartel com os nomes de Chico e Barbosa, antigos alunos e adeptos do Almeida-Comando. O Barbosa realizou o seu sonho de infância e é hoje um graduado do Ministério do interior.

Bissau, Setembro de 2011. Cherno Baldé com os filhos Domingos Ali e Luís Bubacar.


O Duelo entre Almeida-Comando e o Para-Villar, visto por um cartoonista/ humorista da época. Imagem de um desenho mural no bar de um Bairro da periferia de Bissau (Antula, Agosto de 2012)


Sunkudjuma - Eu nasci aqui, / É Sunkudjuma, / É rio dormindo, / É bolanha, fossas e lianas, / São leitos secando, / Peixes escuros e lama, / Aqui lavramos o arroz e / A tristeza dos olhos

Extrato de um poema da minha colecção de juventude com data de 1985.


O Kankuran é um elemento cultural da etnia mandinga, hoje largamente adoptado por muitos grupos de confissão muçulmana na Guiné, associado ao ritual de iniciação e de mudança de estatuto social entre os homens (sexo masculino). O mito fundador quer que as pessoas acreditem que o Kankuran tem poderes mágicos de desmistificar e neutralizar os maus espíritos, proteger, unificar e reforçar a coesão social da comunidade (ver Nhinte Camatchol entre os nalus). Portanto, é um instrumento unificador e propiciador da harmonia social, especialmente direcionado contra o malefício da divisão social associado aos excessos do poder feminino no seio das comunidades. O kankuran emerge das baga-bagas gigantes de onde tira a sua cor vermelha como o próprio chão da Guiné. 

Na imagem, Kankurans da nova geração nas ruas de Bissau (Bairro Militar, 2011).  
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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de julho de 2012 >  Guiné 63/74 - P10146: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (36): Recordando o inesquecível amigo João, ex-1.º Cabo Mecânico da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4514/72

9 comentários:

jpscandeias disse...

Cherno Baldé, o mesmo nome mas não a mesma pessoa. Em 1973, em janeiro, quando estive na Ccaç 12 fomos convocados para alfabetizar os militares da companhia que o desejassem. Recordo que não foram muitos os que aderiram, mas ao que mais me dediquei, e quase sem sucesso, foi o Cherno Baldé, que passadas muitas aulas na escola de Bambadinca aprendeu apenas a ”desenhar” o nome. No final do mês de Fevereiro quando foi receber o pré deixou de assinar com a impressão digital, como nós dizíamos, de caneta balanta. É o único nome que recordo sem margem de dúvida dos meus camaradas de africanos da companhia.

Joao silva ex-furriel ccaç 12

Luís Dias disse...

Caro Cherno Baldé

Mais um dos teus excelentes contos/ memórias, que nos remetem/reconduzem aos lugares onde muitos de nós combatemos/passámos e convivemos quer uns com os outros, quer com a população local. As lembranças dos maus momentos são esquecidas pela camaradagem existente e pelos risos das crianças que frequentavam o quartel. Saudades dos domingos prazenteiros, em que as bajudas Fulas se aperaltavam e passeavam livremente pelo quartel, cochichando segredos entre elas.
Um abraço e obrigado por me teres reavivado a memória.
Luís Dias

Antº Rosinha disse...

Cherno Baldé tem um estilo de escrever que recria o ambiente dos quarteis e da mentalidade "tuga" em África no época colonial, na perfeição.

São milhares que têem a cultura semelhante à do Cherno Baldé.

Não só na Guiné mas mais ainda em Angola,Caboverde e Sãotomenses.

Só que no caso presente,e neste blog,Cherno Baldé é o único que venceu tabús e complexos.

Sim, na Guiné, ainda é preciso coragem correr o risco de lhe chamarem de "cathurru" (?) do branco a quem se relacione com o antigo "colon".

Penso que estejam a desaparecer esses complexos.

Nos primeiros tempos da independência, só disfarçadamente se aproximavam do tuga recem-chegado a Bissau, a perguntar por antigos cabos e furrieis.

Cumprimentos

JD disse...

Meu Caro Chico,
Não sei que ideia fazes a meu respeito, nem isso será relevante, pois decorre da apreciação subjectiva de cada um sobre quem se expõe.
Digo isto, porque me incluis num tipo de europeus "raçudos" com quem comparas o Almeida.
Ao contrário, do que decorre da caracterização que lhe fazes, penso eu de que... não teremos semelhanças, pois eu gosto de brincar e conviver, e não sou sorumbático, apesar de ter passado muitas horas na cama, ora a dormir, ora nas núvens. Nem de Cisco Kid.
De facto, durante os dois anos não gastei as 20 munições de um carregador. Usei duas em duas perdizes, quatro na parada atrás do Pedro Nunes, e as restantes naquilo que se designou de combates.
Quando há 4 anos me aposentei, rumei loga à África do Sul para frequentar um curso de guia/gestor de parque natural, vulgarmente designados de rangers, aproveitando os excelentes conceitos de preservação da natureza e o meu interesse pela conservação do ecossistema na savana. Ali dei 4 tiros de carabina para alvos, e não fiquei mal classificado (talvez por estar cegueta, a vista torta terá corrigido as defeituosas posições dos braços, ou vice-versa). A experiência de tiro faz parte do curso, e quem já foi guiado pela savana, deve terse dado conta da presença da arma - just in case.
Continuo a gostar dos teus textos, aliás muito bem escritos, e que descrevem as sensações da pequenada no convívio com a tropa portuguesa, com tanta graça e verosimilhança, que me transportas para o chão fula.
Fica à vontade para posteriores críticas ou comentários, nem de longe fiquei susceptibilizado.
Conheceste algum Muntagá Baldé de Bajocunda?
Um abraço
JD

Manuel Joaquim disse...

Que poderes de atenção e de observação tinha o "Chico de Fajonquito"! E que sorte o seu "alter ego" Cherno ter conservado tão vivas tais memórias e ter capacidade para as escrever com tanta qualidade literária!

Meu caro Cherno:
Quero dizer-te que tenho um grande prazer em ler o que escreves, tanto pela escrita como pelas ideias nela expressas.Além disso os teus textos são muito importantes neste blogue pois trazem-nos a visão e memória de quem era criança naquela altura da guerra (e criança numa situação especial), sobre certos ambientes e comportamentos dos militares com quem conviviam.

Votos de felicidades para ti e para a tua linda família.
Um grande abraço

Luís Graça disse...

Por lapso, e com as pressas, não inclui, na edição do poste, as fotos que o Cherno nos mandou. O Carlos, atento, corrigiu o erro...

Os leitores têm que me dar o desconto: o início de setembro é terrível para mim, e este setembro em particular, por razões pessoais e profissionais... LG

Cherno Baldé disse...

Caros amigos,

Antes de mais queiram aceitar as minhas saudações fraternais desde Bissau.

Aos amigos JPScandeias, Luis Dias e Manuel Joaquim (que me faz lembrar o velho Manel Djoquim que, nos anos 60/70, ia de aldeia em aldeia num velho Ford (?) e nos divertia com os seus westerns), quero agradecer pelas simpaticas palavras e lembranças daqueles tempos.

Ao mais velho e inveterado "colon" Rosinha, quero enviar mantenhas da Guiné e dizer-lhe que o tempo tem o poder e a nobre virtude de curar tudo, mesmo as "dores" mais profundas. Hoje em dia, já não há qualquer motivo para que portugueses e africanos continuem a carregar velhos tabús e complexos do passado.

Quanto ao amigo JD, quero pedir-lhe desculpas pelo atrevimento do menino Chico, mas acho que não lhe fica nada mal estar ao lado dos bravos do BCP 12, CCP 121.

A todos e, em especial aos nossos estimados editores, um forte abraço,

Cherno Baldé

JD disse...

Caro Chico,
Não tens nada que pedir desculpa, conforme decorre da mensagem anterior, pois de algum modo me senti melindrado. Aliás, já realcei antes as tuas qualidades e coragem de guineense, bem como a lisura e o alto nível das tuas intervenções.
O meu comentário foi no sentido de me demarcar da caracterização que fizeste, apesar de ter compreendido a lisonja aos "raçudos" que, afinal, também não fui. Às vezes parecia, o que é diferente.
Amigo Chico, se voltar a Bissau, a par de um bom amigo dessa terra a quem desejo longa vida, serás logo procurado. Igualmente, se aqui vieres, dá-me um toque, que terei imenso prazer em conhecer-te e estarmos no "perlapier". Ficas também à vontade para qualquer necessidade da metrópole.
Um grande abraço
JD

Cherno Baldé disse...

Caro José Dinis,

A propósito da tua pergunta sobre o Muntagá Baldé de Bajocunda, posso dizer o seguinte:

Conheço um tal Muntagá Baldé que cursou direito (?) em Portugal e atualmente trabalha em Bissau, na administração pública. Como o apelido indica é da etnia fula, mas desconheço as suas origens.

Em contrapartida sou amigo muito próximo de Mulai Baldé, nativo de Bajocunda e actual administrador do sector de Gabú e de muitos outros, antigos colegas de Liceu em Bafatá e mais tarde em Bissau, entre 1975-1982.

Acabo de ler o teu post sobre "Vietname" e ainda bem que foi com o "Vietname", tivesse isso acontecido com o Almeida-Comando ficavas bem lixado, porque o homem era mesmo lixado. No fim, acabou suicidando-se com granada(s) ofensiva(s), onde morreram, também, o Capitão da companhia e mais quatro soldados, entre os quais um alferes e alguns furrieis.

Um abraço,

Cherno Baldé (Chico)