1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Junho de 2016:
Queridos amigos,
É um intrujice, ou talvez uma doce ilusão, julgarmos que a boa preparação da viagem fecha as portas aquele imprevisto que nos deixa de boca à banda. Lê-se o texto do livro, olha-se as imagens, entra-se depois no local e então toma-se conta de que valeu a pena classificar este palácio de Diocleciano como património da humanidade, porque é um edifício que conserva a sua monumentalidade, ali se embrenham cruzamentos estilísticos que dão um produto notável e geram no visitante um sentimento de como a Europa é feita de retículas, de movimentos artísticos reelaborados e regionalmente adaptados. Basta pensar que em Split a arquitetura romana, os estilos românico e gótico, o renascimento e o barroco conversam entre si, há pequenas igrejas paleo-croatas, aqui se lutou para empregar o glagolítico e a língua nacional nos livros litúrgicos e foi a Split que o maior artista croata de sempre, Ivan Mestrovic, legou uma esplêndida galeria de obras escultóricas.
Um abraço do
Mário
Uma viagem em diagonal pelos países dos eslavos do Sul (5)
Beja Santos
Qualquer porção de terra europeia pode gabar-se de ser uma encruzilhada cultural e facilmente se abonam razões. Por cá, tivemos um pouco de tudo com o picante das invasões bárbaras e o rescaldo dos Descobrimentos. Os eslavos do Sul, pela sua posição, assistiram à divisão entre o Império Romano do Oriente e do Ocidente, em 395, a partilha celebrada em Aix la Chapelle é de Carlos Magno e o imperador de Bizâncio, em 812, a divisão das Igrejas em 1054, a chegada dos Turcos Otomanos que permaneceram 500 anos nos territórios correspondentes à Bósnia Herzegovina e ao Kosovo. E já aqui temos falado de Veneza, do reino sérvio, do Império Austro-húngaro. Podíamos ir mais atrás até às colónias gregas e depois o Império Romano. Em Pula, onde os romanos deixaram um anfiteatro soberbo, o império Austro-húngaro dispunha de um poderoso porto militar.
Isto para introduzir Split, a magnífica, o topo do topo a que se arroga o viajante nesta diagonal pelos países dos eslavos do Sul. Pena que neste caso as imagens não valham por mil palavras, mas o viajante entrou de boca aberta e dali saiu arrelampado com a grandiosidade da cidade-palácio. Tudo se deve ao imperador Diocleciano que construiu um grandioso palácio aqui, ele que era dálmata, entre 295 e 305 depois de Cristo, aqui deixou o seu mausoléu que mais tarde foi adaptado à catedral com o bispo João de Ravena.
Entra-se e circula-se por Split e nem sempre temos presente que já foi palácio a despeito de todas as transformações que aqui tem ocorrido.
Consta que Diocleciano escolheu este local por razões climáticas e pela beleza da paisagem. O palácio é um dos exemplares mais belos e melhores conservados da arquitetura da época romana tardia. Mais tarde, depois dos Ávaros e dos Eslavos terem destruído Salona, Split desenvolveu-se como centro urbano, submeteu-se aos soberanos croatas, depois a Veneza, ao Império Austro-húngaro, segue-se a Jugoslávia, hoje a Croácia.
Visitar Split é deambular pelo palácio Diocleciano, 215 metros de comprimentos, 175 metros de largura, 30 mil metros quadrados de história, três grandes portas, a Porta de Ouro a Norte, a de Prata a Leste e a de Ferro a Oeste. Uma cidade circundada de muralhas com uma espessura de pelo menos 2 metros e uma altura de 24. A ornamentação da fachada, perto do mar revela uma esplêndida galeria coberta de arcadas. E as caves, sujeitas a exploração arqueológica depois da II Guerra Mundial, são magnificentes pela dimensão e arcaria.
É agradável conversar com gente da terra, estão esclarecidos acerca da grandiosidade envolvente, explicam que a metade norte do palácio abrigava a guarda imperial, os servos e os escravos, alistavam as oficinas e toda a parte da logística e manutenção. A meio do palácio, ainda hoje o ponto nevrálgico por onde circulam os turistas, está o peristilo com as colunas de coluna róseo e de mármore branco, proveniente do Egipto, com capitéis coríntios; o mausoléu octogonal do imperador é hoje a catedral da cidade, dispõe de um campanário medieval imponente; e ali perto está o templo de Esculápio ou de Júpiter e o acesso aos apartamentos do imperador.
O peristilo guarda a sua imponência, uma esfinge egípcia original parece policiar a ordem no local mais visitado de Split, saindo dali o visitante é brindado com uma nova revelação, perto da Porta de Ouro construiu-se na Idade Média a pequenina igreja de S. Martinho, impossível não ficar comovido com esta relíquia da igreja do tempo da mais austera sobriedade.
A catedral encerra elementos preciosos de diferentes estilos: portas monumentais com relevos, um crucifixo gótico do século XIV, o gótico, o renascimento e o barroco cruzam-se frequentemente.
Dou plenas garantias ao leitor que pode visitar à confiança a esplendorosa Split, prepondera a massa de pedra e os tesouros deixados pelo imperador Diocleciano, pode-se almoçar ou jantar numa sala adossada a uma das muralhas do palácio, passear por ruas estreitas com estilos heteróclitos, veja-se esta senhora ao telemóvel, perto de uma porta de alumínio e cercada por reminiscências romanas, medievais e contemporâneas. Ainda não estou completamente em mim, a ter que joeirar o cômputo das imagens, tenho a ilusão que ainda não saí de Split. Doce ilusão, pois amanhã de manhã vou admirar a obra de um grande escultor, Ivan Mestrovic, antes de partir para o Parque Nacional dos Lagos de Plitvice.
(Continua)
____________
Nota do editor
Último poste da série de 12 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16593: Os nossos seres, saberes e lazeres (179): Uma viagem em diagonal pelos países dos eslavos do Sul (4) (Mário Beja Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário