sábado, 9 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20955: (In)citações (149): Homenagem ao ex-alf mil capelão, Arsénio Puim, CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), no seu 84º aniversário - Parte V: lembranças do capelão do BART 2917 (Beja Santos)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambinca > CCS/ BART 2917 (1970/72) > O Mário Beja Santos, cmdt do Pel Caç Nat 52, em fim de comissão, junto ao edifício de comando, messe  e instalações de oficiais. Era aqui o quarto do médico e do capelão... (Do lado esquerdo, eram as instalações dos sargentos; o edifício em U fora construído pela Engenharia Militar, BENG 447, ao tempo do BART 1904 (, que será substituído pelo BCAÇ 2852, 1968/70)... O Beja Santos, que esteve em Missirá, conheceu estes 3 batalhões).

Arquivo do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Lembranças do capelão do BART 2919

por Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70)

Arsénio Puim. Foto do cmdt da CCS / BART 2917,
Cap Art Gualberto Magno Passos Marques,
Convivi com três batalhões, dependi sempre das respetivas CCS, tudo que tinha a ver com cimento e arame farpado, tratamentos de enfermaria, visitas do médico ao Cuor, ou doentes do Cuor à consulta médica, manutenção de viaturas, pagamentos à tropa (caçadores nativos e milícias), munições, caixas com bacalhau e barricas de pé de porco, tinha que ser tratado com o respetivo comandante ou seu substituto. 

Comecei com o BART 1904, até setembro de 1968, com o BCAÇ 2852, até maio de 1970, e até fins de julho com o BART 2919. 

Tivemos vários capelães de passagem, dormiam no quarto com o médico, a recordação mais bizarra que conservo eram as discussões fora de horas entre o Dr. Vidal Saraiva e o capelão, tudo aos gritos, dizia o médico que Deus não existia, pois se existisse não consentiria naquela carnificina. Gritavam um com o outro, o Vidal Saraiva atirava violentamente com a porta e vinha queixar-se para outros quartos, amainava com um copo de uísque e retirava-se com uns livros do Tio Patinhas.

Isto tudo para explicar que tenho fugazes lembranças do Arsénio Puim, era muito comedido nas suas homilias, muito reservado na messe, nós tínhamos um tema em comum que eram os Açores, originário da Ilha de Santa Maria, devo tê-lo aborrecido a contar as peripécias com um pelotão de marienses que apareceu nos Arrifes, não puderam ir passar o Natal de 1967 com as famílias, procurou-se colmatar o desgosto organizando uma festa em que houve imensa participação de gente amiga, assim se amainou a saudade daqueles jovens que passavam o primeiro Natal longe de entes-queridos. 

Guardo as melhores lembranças do batalhão recém-chegado. Ciente de que estava a atingir 24 meses de comissão, e já num estado físico pouco lisonjeiro, o tenente-coronel Domingos Magalhães Filipe deu-me como prato de substância o apoio aos trabalhos do alcatroamento da estrada do Xime, entre Amedalai e Ponta Coli, um non-stop das cinco da manhã às cinco da tarde e as noites horríficas na ponte do rio Undunduma, a título excecional aquele trabalho árduo que era a organização das colunas de Bambadinca ao Xitole, onde íamos com a CCAÇ 12.

Nos 84 anos do Arsénio Puim, posso dizer que lhe desejo uma longa vida plena de alegrias, que lhe estou grato pelo conforto espiritual que me ofereceu, tanto não o esqueço que tenho procurado enviar-lhes correio eletrónico e que bom seria que ele viesse à liça, que nos deixasse as suas memórias, pois só dispomos de testemunhos raros e de um modo geral fragmentados, ponto curioso é que muitos de nós não os esquecemos, há testemunhos tocantes de capelães que suavizaram a vida de quem penava nos confins do mato e carecia de arrimo religioso. 

Será muito bem-vindo tudo quanto o Arsénio Puim escrever das suas lembranças em Bambadinca e arredores. E, Arsénio, receba um abraço muito afetuoso do Mário Beja Santos
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Nota do editor:

8 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Mário, sem querer ser o tey "cardeal diabo", deixa-me lemnbrar aqui os quatro médicos que passaram pleo BART, segundi o registo (seguro) do Benjamim Durães:


Dr. Mário Gonçalves Ferreira: na sede do Batalhão em Bambadinca, de 27 de Maio de 1970 a 25 de Janeiro de 1971, data em que foi transferido para o HM 241, em Bissau;

Dr. António Rodrigues Marques Vilar: na sede do Batalhão em Bambadinca, ds 9 de Março de 1971, vindo da CCAV 2721, sedeada em Olossato, a Janeiro de 1971, data em foi transferido para a CCAÇ 3545 / BCAÇ 3883, em Piche;

Dr. Jorge Pedro Ferreira Nunes Matos: de 22 de Outubro de 1970, data em que veio transferido da CCAV 2539, em São Domingos, para a CART 2716 / BART 2917, no Xitole;

Dr. João Horta Vale, na CART 2716 / BART 2917, no Xitole, em substituição do Dr. Nunes de Matos.


Eu lembro-me dos dois primeiros... O Vidal Saraiva foi o último médico do BCAÇ 2852, foi depois colocado no HM 241 (, como cirurgião) e regressou à metrópole, no Niassa em março de 1971... Portanto, nõa cehgou a conheceu o Puim...

19 DE JUNHO DE 2013
Guiné 63/74 - P11731: Os nossos médicos (51): O BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) teve pelo menos 4 médicos e prestava assistência à população civil (Benjamim Durães)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Sobre o Vidal Saraiva, que conhecemos também (, o único qe alinhou connosco, na penosa Op Tigra Vadio, março de 1970), tens aqui dois postes para reler:

O Vidal Saraiva foi transferido para Bissau, para o Hospital de Bissau, quando o BCAÇ 2852 é rendido pelo BART 2917...Vamos perguntar ao Arsénio Puim se ele ainda o conheceu...

30 DE JUNHO DE 2016
Guiné 63/74 - P16253: In Memoriam (261): Joaquim Vidal Saraiva (1936-2015), um adeus, emocionado, do "Tigre de Missirá"



30 DE JUNHO DE 2016
63/74 - P16251: In Memoriam (260): Joaquim [António Pinheiro] Vidal Saraiva (1936-2015), especialista em Cirurgia Geral, ex-alf mil med CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, nov 1969/jun 1970) e HM 241 (Bissau, 1970)... Está sepultado em Valadares, V. N. Gaia. Passa a ser o nosso grã-tabanqueiro nº 720, a título póstumo.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Eu queria a dizer:

Sobre o Vidal Saraiva, que conhecemos TÃO BEM, tu e eu...

Mas já não conheceste Mário Gonçalves Ferreira, que veio a seguir ao Vidal Saraiva, e muito menos o dr. Vilar, psiquiatra: chego ao no fim da comissão dos quatrdos e especialistas metripolitanos da CCAÇ 12, em março de 1971... Era popularmenet conhecido, pela malta do BART 2917, como o "DRácula"... Felizmente ainda está vivo, mora em Aveiro ou arredores...

Agora capelães, só me lembro do Puim...Podes estar a confundir com o meu primo Horácio Fernandes,que acabou a comissão no BCAÇ 2852, embora eu (que não ia à missa...) não me lembre dele em Bamnadinca... E já perguntei ao Fernando Calado...

Pelo que eu conheço dos dois (Arsénio e Horácio), essa discussão violente sobre Deus e o Mal, entre o capelão e o médico, só podia ter sido com o meu primo Horácio...o Puim era um santo...


25 DE AGOSTO DE 2014
Guiné 63/74 - P13533: "Francisco Caboz", um padre franciscano, natural de Ribamar, Lourinhã, na guerra colonial (Horácio Fernandes, ex-alf mil capelão, BART 1913, Catió, 1967/69): Parte VII: (i) A ideia peregrina de adotar um criança, de cinco anos, filha de um soldado algarvio e de uma mulher fula, uma "filha do vento" (ii) gozo de licença de férias na metrópole; (iii) colocação, em maio de 1969, no batalhão de Bambadinca, antes de acabar a sua comissão, de rendição individual...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Voltando à vaca fria:

O BART 2917 chegou a Bussay em 25MAI70 e assumiu a responsabilidade do SECTOR L-1 (Bambadinca) em 08JUN70... É muito pouco provável que o capélão Arsénio PUim e o médico Vidal Saraiva se tenha cruzado sequer... Mas pode ter acontecido no período de sobreposição dos dois batalhões...

Quem partilhava o quarto com o Puim só podia ser o médico (, penso que de origem goesa), Mário Ferreira, ou Mário Gonçalves Ferreira, que ainda hoje tem cosultório em Lisboa, pelo menos vem na Net... É cardiologista.

Mário Gonçalves Ferreira
R. Domingos Sequeira 27, 1º - K
1350-119 LISBOA

Telef + 351 21 396 7907
____________

O Mário Ferreira, conheci-o bem, era Alf Mil Médico da CCS do BART 2917, antes da vinda do Dr. Marques Vilar. TInha uma atitide crítica em relação à guerra e também é escritor. O Amtónio Fernandes Marques, da CCAª 12, esteve há anos com ele...

Aqui ficam os dois títulos de livros dele, de que já li o primeiro:
TEMPESTADE EM BISSAU ANO 1970
Mario Goncalves Ferreira
PALLIUM EDITORA
Colecção: EXTRA PALLIUM EDITORA
978-989-95439-0-4 14.00 €

DONA ERMELINDA ZANGOU-SE COM O MAR
Mario Goncalves Ferreira
EUROPRESS
Colecção: EXTRA EUROPRESS
972-559-255-7 10.50 €

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Encontrei aqui na Chiado Books uma nota biobliográfica sobre o nosso camarada:


Mário G. Ferreira
Mário Gonçalves Ferreira nasceu em Abiul, cresceu no convívio com homens e mulheres do campo e dos montes, e, em 1967, obteve a licenciatura em medicina.

Tem vindo a exercer clínica em hospitais, civis e militar, inclusivé durante dois anos na Guiné-Bissau no desempenho da função de médico militar numa unidade operacional, para além de em unidades privadas de saúde.

Teve participações activas em congressos da área da medicina e desenvolveu trabalhos de investigação científica, alguns publicados em revistas da especialidade.

Na sua escrita pretende dar ênfase aos problemas reais do Homem natural, em particular da porção consciente da sua personalidade, do Eu e seus conflitos com a líbido, não raramente caoticamente desordenados, bem como da sua outra consciência, o superego, que por vezes é largamente inconsciente, e tudo em confronto com a realidade externa. Assim sendo, em constante conflitualidade consigo próprio, com os outros, e até ousar, por vezes, contestar a Natureza.



No campo da literatura publicou:

1. Dona Ermelinda zangou-se com o mar.

2.Tempestade em Bissau

Em publicação:

3.A Farmácia do Sr. Augusto

4. O Rapaz do Piano.

https://www.chiadobooks.com/autores/mario-g-ferreira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Peço desculpa, Abiul é uma freguesia de Pombal...

Não sei onde fui a pretensa origem goesa do Mário G. Ferreira...

https://pt.wikipedia.org/wiki/Abiul

Ele estudou em Coimbra, onde concluiu a licenciatura de medicina em 1967... Apanhou a crise de 1962...

Tive uma conversa muito reconfortantecom ele, no dia 27 de novembro de 1970, em contexto clinico... depois da minha perturbação emocional, na véspera, no final da Op Abencerragem Candente em que sofremos 6 mortos e 9 feridos graves... Nessa altura o Puim foi para o Xime...

Estou eternamente grato ao alf mil médico Mário G. Ferreira: o comando do BART 2917 queria dar-me uma porrada ou, em alternativa, mandar-me para a psiquiatria... depois das "bocarras" que lancei à noite na parada, frente ao edifício do comando...

Também tenho uma dívida de gratidão para com o meu capitão, Carlos Alberto Machado Brito, hoje cor inf ref (que não vejo desde 1994), bem como aos meus camaradas e amigos Tony Levezinho e 2º sargento José Manuel Rosado Piça, que "seguraram as pontas. Sei que poderia ter apanhado uma valente porrada...

A gratidão é dos sentimentos mais bonitos de que são capazes os seres humanos...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Mário, tens aqui uma recensão tua (, já antiga, 2010) do livro do Mário G. Ferreira, "Tempestade em Bissau, Ano 1970"...Reconheces que o autor foi médico no BART 2917, mas não o "reconheces" como teu contemporâneo...Ora ele é que foi, e não o Vidal Saraiva, o companheiro de quarto do capelão Arsénio Puim... E pelo que conheci dos dois, não estou a vê-los a ter uma discussão metafísica violenta... O Vidal Saraiva, sim, era muito temperamental...

Escreveste:

(...) !Que eu saiba, é o primeiro médico a afoitar-se nas incursões literárias da guerra da Guiné. Não é uma grande lançada em África mas dá para saudar as reconstituições de atmosferas e vivências militares.

"O autor centra-se em Tolentino Menezes, o que certamente o fascina é mostrar como nestes períodos de mudança o ser humano defende-se ignorando o que vê à volta. Depois morre e não pode participar na tempestade". (...)

(...) "O que sobressai do relato é o pendor para exibir as misérias do mundo e a incapacidade de fazer a leitura das mudanças à nossa volta. As descrições de Mário G. Ferreira são pouco lisonjeiras para as individualidades do regime, para os militares em Bissau, para os esteios administrativos guineenses. É uma mordacidade que não se dissimula. É uma tempestade que muitos recusam ver. A prosa é barroca, a linguagem privilegia o obnóxio, o discurso espalhafatoso, os guerrilheiros heróicos e ingénuos. Vamos ficar à espera da continuidade literária deste médico de Bambadinca que tomou gosto pela escrita." (...)


29 DE DEZEMBRO DE 2010

Guiné 63/74 - P7525: Notas de leitura (181): Tempestade em Bissau, Ano 1970, de Mário Gonçalves Ferreira (Mário Beja Santos)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Mário, tem piada, a nossa memória é mesmo seletiva, e fragmentada... Dizes: tivemos vários capelões de passagem... Ora, eu só me lembo do Puim, porque convivemos um pouco... E o único capelão de me lembro em Bambadinca... Tu eras calólico, ias à missa, comandavas um destacamento, de vez em quando vinhas a "sede" do Batalhão (comnhecestes três, eu só dpis...).

Lemras-te do Horácio Ferndes que diz que passou por Bambadinca, vindo de Catió ? Veio para lá em maio de 1970... Ei cheguei à Guiné nesse fim de mês e fui/fomos para Contuboel dar a instrução de especialidade e fa<zer a IAO com as nossas praças do recrutamento local, a futura CCAÇ 12...Em 18 de julho éramos colocados em Bambadinca, mas nesse tempo não me lembro de nenhumk capelão...Só entrava na capela para "espreitar" ou velar algum morto...

DE há muito que me intriga a história do meu primo Horácio...