Foto: © Albino Silva (2007). Todos os direitos reservados.
Guiné-Bissau > Região do Cacheu > 2012 > A controversa ponte (inacabada, em betão) no lado direito da estrada Canchungo - Bachilé- Cacheu, ao km 6. Foto do eng agr Carlos Schwarz, Pepito.
Guiné-Bissau > Região do Cacheu > 2012 > A 600 metros, ao lado da antiga ponte (inacabada, em betão), na estrada Canchungo - Bachilé - Cacheu, ao km 6, há uma nova ponte em ferro, construída pelos portugueses. Foto do eng agr Carlos Schwarz, Pepito. (**)
Fotos: © Carlos Schwarz (Pepito) (2012). Todos os direitos reservados.
A. Mensagem de 21 de março último, enviado pelo Jorge Picado:
Caro Luís
Não ficaria de bem com a minha consciência se não esclarecesse alguns pontos acerca da "célebre Ponte Alferes Nunes em Betão", já que julgo ter sido eu o "pai da criança".
Assim, procurei o mais sinteticamente que me foi possível escrever o que se segue, que confrontarás com aquilo que o Carlos Silva j escreveu.
Abraços
Jorge Picado
1 – Ora bem, ao fim de tantos anos passado, sobre aqueles idos de 1971, sem qualquer apontamento escrito ou foto desses dias que possa precisar os fragmentos que se pescam dessas lembranças, acabamos por andar "às voltas" a tentar concretizar algo, se é que lá chegaremos, em que fui um dos "culpados", ao escrever num comentário ao poste P4350, sobre uma interrogação que o "Chefe da Tabanca" Luís Graça tinha feito sobre a Ponte Alferes Nunes.
Escrevi então em 16 de maio de 2009:
"Muito sinceramente, eu que lá passei algumas vezes, que andei apeado pelo 'areal' até à célebre e verdadeira Ponte Alferes Nunes, em cimento e de um só arco, 'plantada' em seco, por baixo da qual não corria uma gota de água…"
2 – O problema reside nas afirmações "verdadeira Ponte Alferes Nunes" e "um só arco".
3 – É pena que não possamos ter testemunhos de ex-camaradas que por lá andaram antes e mesmo no meu tempo ou posteriormente, como por exemplo o soldado (?) condutor do jeep que me transportava nesse dia e foi o responsável por me mostrar o dito cujo "exemplar da ponte" e fornecedor da informação que pelos vistos circularia no meio, ou seja: "que aquilo tinha sido construído por um tal Alferes Nunes, daí o nome dado aquela passagem do rio, onde depois tinham construído aquela em madeira que se usava. Por a de cimento não servir, os naturais 'gozavam' com a esperteza dos tugas" (...)
4 – Neste momento há as seguintes referências:
a) a minha, que me deixou espantado, não esqueci e tentei muitos anos depois tirar conclusões;
b) a do meu conterrâneo e condiscípulo, ex-alf eng do BENG de 1967/68 (***), que quando lá foi preparar a montagem de uma ponte metálica, por secções, feita nesse mesmo BENG para substituir a de madeira que tinha sido destruída pelo PAIGC, correria talvez o 2.º semestre de 1967 e viu da estrada aquela a que me referi e que ele também atribuía ao tal Alferes Nunes, por ouvir dizer;
c) um depoimento, que colhi acidentalmente, de um familiar do falecido oficial do Exército, cor Alcides José Sacramento Marques, oriundo de família de Ílhavo, que foi Cmdt da CCaç 74 (desembarque em Bissau em 18 de março de 1961) e também um dos Cmdt da 4.ª CCaç (Africana), que tinha referido … ter sido construída na Guiné uma Ponte, num rio que tinham aterrado e, no final, não terem desaterrado o rio… Claro que refutei a parte relativa ao "aterramento do rio", uma vez que admiti tratar-se da ponte que tinha visto;
d) a indicação do José Câmara, partindo do Fortim da Ponte: "de facto, para quem estava na ponte virado para o Bachile, e a uns metros acrescentados para a direita havia uma ruína daquilo que parecia ter sido uma ponte. Aí o rio era pouco largo e pouco profundo";
e) o testemunho do Paulo Basto, que disse ter visto ainda "essa ponte" em 1993, mas não a ter fotografado. Coloquei agora as aspas, uma vez que não sabemos se o camarada se refere a esta que o Pepito enviou.
5 - Transcrevo algo que escrevi quando ainda não tinha qualquer contacto com antigos camaradas, em fins de 2004 ou princípios de 2005 e apenas possuía como meios auxiliares, fotocópias das folhas da Carta (idênticas às do Blogue) de TEIXEIRA PINTO e PELUNDO e as reminiscências daquele episódio, um dos tais que não esqueci, talvez pela "irrealidade daquele cenário".
"Antes de mais quero aqui dar conhecimento da 'célebre' Ponte de Alferes Nunes… Saindo de T. Pinto pela estrada para o Cacheu, meia dúzia de km à frente, se tanto, cruzava-se o Rio Costa (Pelundo), numa ansa deste rio que quase formava um círculo completamente fechado, tal a proximidade das margens. Zona de bolanha, naturalmente, e formando o rio vários meandros, o terreno do lado S – lado de T. Pinto – tinha no entanto aí uma grande mancha de areias, até muito claras, o que não era muito normal por aquelas paragens. Assim, o tal Alf Nunes, já que não dmito ser este nome o de algum oficial da Arma de Engenharia que mandou ou executou os estudos para a construção de tal ponte, deve ter entendido que ficava mais económico e mais fácil construí-la em seco, isto é, no areal entre as tais duas pontas da ansa, em lugar de o fazer em pleno leito do rio. Depois era só unir essas pontas com um novo canal, ao mesmo tempo que se tapava o leito 'velho', eliminando-se a ansa.
Este meu pensamento é lógico, uma vez que isto foi feito antes de se iniciar a revolta que deu origem à guerra de libertação e, nessa época, o trabalho nativo praticamente não representava quase qualquer custo. Era por assim dizer trabalho "escravo". Os nativos seriam "recrutados" pelo Administrador – de acordo com as regras da época – e
como pagamento receberiam umas malgas de arroz… só que veio a guerra e não pode concluir-se tal tarefa.
Resultado: Deixou-se como herança um "monumento" de cimento na forma duma ponte com um arco, no meio da areia e a poucos metros dum rio e, uma mão cheia de razões que foram logo exploradas pelo PAIGC, para mostrar aos indígenas a falta de inteligência dos "tugas" colonizadores, o que creio ser uma grande injustiça.
Na época em que isto aconteceu, talvez ainda não fosse usual o procedimento de construção deste tipo de obras como descrevi, e que admito ter sido esse o entendimento do responsável por tal obra. Mas passados poucos anos começou-se a ver no nosso País – possivelmente por já ser muito antigo nos países mais evoluídos – esta maneira de construir pontes. Aterrar zonas do rio para aí trabalhar mais comodamente na construção dessas obras.
como pagamento receberiam umas malgas de arroz… só que veio a guerra e não pode concluir-se tal tarefa.
Resultado: Deixou-se como herança um "monumento" de cimento na forma duma ponte com um arco, no meio da areia e a poucos metros dum rio e, uma mão cheia de razões que foram logo exploradas pelo PAIGC, para mostrar aos indígenas a falta de inteligência dos "tugas" colonizadores, o que creio ser uma grande injustiça.
Na época em que isto aconteceu, talvez ainda não fosse usual o procedimento de construção deste tipo de obras como descrevi, e que admito ter sido esse o entendimento do responsável por tal obra. Mas passados poucos anos começou-se a ver no nosso País – possivelmente por já ser muito antigo nos países mais evoluídos – esta maneira de construir pontes. Aterrar zonas do rio para aí trabalhar mais comodamente na construção dessas obras.
Logo nos primeiros dias depois de "aterrar" no CAOP, foi-me mostrado este "monumento".
Fui lá de jeep, andei por aquele areal a pé. Passei por debaixo da ponte, não o fazendo por cima por faltarem uns degraus para se poder subir. Deambulei pelas margens do rio e, quando prossegui para fazer a travessia, recusei-me a fazê-lo em cima do jeep, perante a
estupefacção do respectivo soldado condutor. Atravessei o rio, sim, mas percorrendo a ponte existente a pé, desculpando-me que queria admirar o percurso e observar o próprio rio.
6 – Foi portanto partindo daqueles pressupostos que marquei na Carta Militar e, já muito posteriormente em imagem Google, a possível localização dessa ponte.
7 – Fiz deduções e tirei conclusões partindo de premissas, em parte, não correctas, já que agora se sabe quem foi o Alferes Nunes – militar morto naquela zona nas Campanhas de Pacificação de Teixeira Pinto – portanto não tendo nada a ver com a construção da dita ponte em betão e a "obra", que estamos procurando identificar, foi construída antes
(quantos anos?) do início da Guerra e muito provavelmente pelos respectivos Serviços Provinciais de então. (****)
Abraços
Jorge Picado
_______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 20 de março de 2010 > Guiné 63/74 - P6029: Memória dos lugares (76): Prestei o meu serviço na Guiné (Albino Silva)
A Ponte, de madeira, tinha sido reconstruída porque a primeira, também em madeira, tinha sido destruída. Nesse serviço nunca tive qualquer receio porque também estávamos bem armados e nunca tinha havido nada de anormal. Sei que após o Batalhão deixar a Guiné, algum tempo depois, a Ponte foi reconstruída novamente, desta feita em ferro, como aliás já a vi em fotos de outros camaradas. Entre a Ponte Alferes Nunes e o Bachile participei em picagens de estrada com um Pelotão da CCaç 2313, quando se faziam escoltas de reabastecimento ao Bachile, onde estava um Pelotão da Companhia 2368 do meu Batalhão. (...)
(**) Vd. poste e comentários diversos (António J. P. Costa, Carlos Silva, José Câmara, Jorge Picado, Salvador Nogueira) > 19 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9625: Memória dos lugares (178): Sobre a ponte da estrada Canchungo - Cacheu, ao Km 6 (Carlos Schwarz/Pepito)
Amigos: Reitero o que disse na minha análise que vos enviei. A ponte "exótica", cognominada pelo Luís, para mim não tem nada a ver com a designada Pte Alf Nunes. A razão da sua construção, não sei. Só investigando os arquivos da mesma, que não sei onde param. O José Câmara, que já me respondeu à minha análise, também concorda com a mesma, face aos argumentos deduzidos e que são fáceis de compreender. Vd. resposta em baixo a azul. Com um abraço amigo. Carlos Silva (...).
(...) Mail de 20 de março de 2012, enviado pelo José Câmara:
Caro amigo Luís Graça,
Segundo a Carta Cartográfica de Teixeira Pinto (nosso tempo na Guiné) o rio era conhecido por Costa (Pelundo). Seria bom manter essa distinção para não confundir com a zona do Pelundo, sede de um Batalhão.
A ideia de desviar o curso do rio nem era assim tão disparatada. [como já referi, em minha opinião não exitiu qualquer ideia de desciar o rio] Vejamos no mesmo Mapa.
O rio naquela área tem a configuração de um polvo estrangulado. A ponte fantasma está localizada precisamente no estrangulamento [não está, como refere o Pepito e como resulta do recorte enviado pelo SNogueira e como já evidenciei o erro do Jorge Picado ao assinalar a posição da Pte no estrangulamento] e a Ponte Alferes Nunes no alto da cabeça. Tudo isso é bem visível nas fotos e no Mapa que estamos a seguir. [não é - ou melhor é em relação à análise que faço, no dito post que enviei... publiquem para todos verem e terem a possibilidade de chegarem à mesma conclusão]
No estrangulamento o rio era visível dos dois lados da estrada. Por isso mesmo não é de admirar que algum engenheiro tenha antecipado a possibilidade de um rompimento natural das margens e tenha tentado antecipar o evento desviando artificialmente o leito do rio. [ pois, mas a ponte não está situada no estranguamento, mas mto longe, portanto essa tese não passa de meras especulações].
Como sabemos, qualquer que tenha sido a ideia, o projecto foi posto de parte e a estrada nova aproveitou na íntegra o traçado da antiga picada (estrada) entre Teixeira Pinto e o Bachile. Só a partir daí foi alterado o traçado, na tal zona da Mata dos Madeiros.
O Carlos Silva certamente que irá clarificar tudo isso. [Como já referi ao Zé, o trabalho não vai clarificar nada. Pois apenas vai versar sobre a evolução história da Pte Alf Nunes, no entando poderemos fazer uma alusão a esta ponte exótica]
Um abraço amigo, José Câmara (...)
O Carlos Silva certamente que irá clarificar tudo isso. [Como já referi ao Zé, o trabalho não vai clarificar nada. Pois apenas vai versar sobre a evolução história da Pte Alf Nunes, no entando poderemos fazer uma alusão a esta ponte exótica]
Um abraço amigo, José Câmara (...)
Outros mails que são contributos importantes para este dossiê:
(...) Salvador Nogueira, 19 de março de 2012:
Luis, se o P9625 trata da ponte de que te falei 'há anos' e que seria uma raridade
porque nem passava o rio por baixo, nem passava a estrada por cima,
então existe - vi-a do ar, claramente off side e com esta configuração aproximada
mas nunca consegui saber onde foi.
Quando se diz 'afamada ponte' é por essa inusitada razão, por não passar o rio por baixo nem a estrada por cima?
Se puderes confirmar, agradeço.Salvador
(...) Salvador Nogueira, 19 de março de 2012:
porque nem passava o rio por baixo, nem passava a estrada por cima,
então existe - vi-a do ar, claramente off side e com esta configuração aproximada
mas nunca consegui saber onde foi.
Quando se diz 'afamada ponte' é por essa inusitada razão, por não passar o rio por baixo nem a estrada por cima?
Se puderes confirmar, agradeço.Salvador
Luís, aqui tens a localização da ponte sobre o Rio Pelundo, referida no P9625 e que, agora visto melhor e na carta, não sei se é a de que te falei. Julgo que a que vi era mais a sul e com menos pilares... já não sei mas seria curioso que na Guiné houvesse mais que uma ponte sem rio por baixo e estrada por cima! Naquela terra valia tudo...
Foto aérea do Google Earth. Infografia de SNogueira
Guiné > Região do Cacheu > Carta de Teixeira Pinto (1953) > Escala 1/50 mil > Pormenor: troço da estrada Teixeira Pinto/Bachilé... A meio, atravessando o Rio Costa (Pelundo), há uma ponte (que devia ser a original ponte Alferes Nunes).
Luis: Ouvi ao meu pai contar que esta ponte (que nunca chegou a ser usada) seria para substituir a outra de que te enviei foto e que na altura da independência era de madeira e muito rudimentar. Sucede que só depois de estar construída é que os engenheiros descobriram que a mesma ficava a uma cota mais elevada, quando tentaram desviar o rio para passar debaixo dela... e a água se recusou a subir...enfim, perversões da natureza.
abraços
pepito
Caro amigo Luís Graça,
Segundo a Carta Cartográfica de Teixeira Pinto (nosso tempo na Guiné) o rio era conhecido por Costa (Pelundo). Seria bom manter essa distinção para não confundir com a zona do Pelundo, sede de um Batalhão.
A ideia de desviar o curso do rio nem era assim tão disparatada. Vejamos no mesmo Mapa.
O rio naquela área tem a configuração de um polvo estrangulado. A ponte fantasma está localizada precisamente no estrangulamento e a Ponte Alferes Nunes no alto da cabeça. Tudo isso é bem visível nas fotos e no Mapa que estamos a seguir.
No estrangulamento o rio era visível dos dois lados da estrada. Por isso mesmo não é de admirar que algum engenheiro tenha antecipado a possibilidade de um rompimento natural das margens e tenha tentado antecipar o evento desviando artificialmente o leito do rio.
Como sabemos, qualquer que tenha sido a ideia, o projecto foi posto de parte e a estrada nova aproveitou na íntegra o traçado da antiga picada (estrada) entre Teixeira Pinto e o Bachile. Só a partir daí foi alterado o traçado, na tal zona da Mata dos Madeiros.
O Carlos Silva certamente que irá clarificar tudo isso.
Um abraço amigo, José Câmara (...)
Vd. também 17 de maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4364: Memória dos lugares (22): Fortim e Ponte Alferes Nunes, sobre o Rio Costa, entre Canchungo e Bachile (Jorge Picado)
(***) Julgo tratar-se do eng José Manuel Bastos Cachim, que conheci na Costa Nova em agosto de 2010.
(****) Último poste da série > 10 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P10020: Memória dos lugares (185): Gadamael: Ainda sobre a sigla ASCO (Cherno Baldé)