1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Agosto de 2014:
Queridos amigos,
Chega de vos cansar com estas viagens inglesas, uma coisa é a viagem ser inolvidável para quem a faz outra para quem acompanha os relatos apaixonados, rendidos, do viajante.
Este Peak District tem desfiladeiros, regatos, estâncias termais, arquitetura imponente, casas senhoriais e marcas profundas da I Revolução Industrial. O apanhado de imagens procura impressionar-vos para quem se sentiu, sem reservas, impressionado do princípio ao fim.
O Luís desafiou-nos em encher estes passos, em férias, falando das nossas férias. Foi assim que eu as vivi, e é com a maior satisfação que procurei transmitir-vos a alegria deste viajante.
Um abraço do
Márioviage
Biblioteca em férias (9)
Dentro do Peak District, a vasculhar belezas incomparáveis
Beja Santos
O Peak Distric fica em Derbyshire, nas Midlands. A ideia era percorrer uma pequena superfície a pente fino, monumentos arqueológicos dentro de quintas, ver regatos, passear nas florestas, embrenhar-nos em casa senhoriais ímpares, parar em feiras, percorrer instalações da I Revolução Industrial. É disso que vos vou relatar, sabendo antecipadamente que esta síntese não contribui em si tão favoravelmente como eu gostaria para vos aliciar a vir até aqui, dispostos à vida pedestre, a misturar ambiente com história, visitas a aldeias e pequenas cidades. Paciência, é o que posso fazer e faço-o com imenso gosto. Vamos então à última etapa desta viagem.
Primeiro a visita a Haddon Hall, sentimo-nos pequenos e até atrapalhados a detetar o que ali há de normando, de gótico e de Tudor, há por ali intervenções que chegaram até há um século atrás, intervenções dignas, nada de “fachadismo”. As reconstituições convencem.
Haddon Hall tem belas tapeçarias, móveis genuínos não faltam. A parede é do tempo. Senti-me nos tempos isabelinos e não desgostei.
Um detalhe do salão de receções, procurei registar o varandim onde os músicos alegravam os serões dos antepassados dos duques de Rutland e seus convidados. As dimensões são impressionantes e, curiosamente, o salão é acolhedor, é mesmo íntimo.
Este corredor é impressionante, quem concebeu esta ala sabia da poda, tinha tato fino para o cumprimento largura e altura, é tudo gigantesco e não é, grandioso e acolhedor. Entra muita luz, todas estas casas procuram rasgar janelas para vencer os invernos rigorosos, os tempos de negrume, que são longos.
No Peak District há património mundial da humanidade, e grandioso, digo-o sem exagero. Ali para os lados de Cromford, de Derwent Valley assinala a chegada da revolução industrial, do motor de ignição, do tear mecânico, o que estão a ver é uma das primeiras fábricas de lanifícios do mundo, isto, ainda por cima rodeado de vales frondosos, como Matlock Bath, que se mostra abaixo.
Matlock Bath terá sido assim há cerca de 180 anos atrás, o esforço para manter a sua beleza é grande, a despeito das lojas de Fish and Chips e de traquitana inconcebível. Ali perto temos Cromford onde um dos pioneiros da revolução industrial, Sir Richard Arkwright mandou construir Willersley Castle, hoje uma guest house superintendida pela Christian Guild Holidays, os preços são módicos, ali pernoitei.
Willersley Castle, Cromford, Derbyshire. Hoje não está exatamente assim, mas é dos pontos altos das belezas incomparáveis do Peak District. Mais: passeia-se à volta de Willersley Castle e fica-se com a sugestão de que Sintra para aqui se transmutou, em sem qualquer prejuízo.
A fotografia é minha, o postal é de 1930, tirei-a em Cromford, na visita aos primórdios do mundo fabril, em Inglaterra e em todo o mundo. O postal mostra-nos Derwent Valley e vale a pena andar por ali, muitas fábricas desapareceram, havia moinhos em profusão, hoje é meramente um recanto turístico, um espaço de negócios, de escritórios, de entretenimento.
Está na hora da abalada. Estas são as Midlands, mas não sai de Derbyshire. O leitor encontrará nomes como Biddulph Grange Garden, aconselho a visitar se gosta de floricultura, de um espaço reconstruído, com jardins secretos e recantos íntimos; Buxton é uma estância termal encantadora tem ópera e tudo; Leek para ser sincero, foi um desapontamento, mas vi lá uma instalação fabril abandonada que me arrepiou; Ashbourne é uma pequena jóia, com os seus declives e muita arquitetura jorgiana e eduardiana; e há Tidewell com uma imponente igreja, e visitei Eyam que tem uma casa espantosa, Eyam Hall. Chegámos ao fim. Para quem quiser, tenho mapas, brochuras e ofereço-me como cicerone para quem quiser ir visitar com um guia apaixonado. O Peak District gravou-se-me na alma. Nada mais a acrescentar.
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Nota do autor:
Tinha programado que a série terminaria hoje, mas seguir-se-à a resenha de uma viagem que fiz recentemente a Bilbau.
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Nota do editor
Último poste da série de 17 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13618: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (8): Notas soltas de viagem em Inglaterra, Maio-Julho de 2014
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 24 de setembro de 2014
Guiné 63/74 - P13642: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXIII: O quotidiano em Canjambari...(Agostinho Evangelista, 1º pelotão)
1
1. Continuação da publicação das "histórias da CCAÇ 2533", a partir do documento editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (*)
Desta vez ex-sold Agostinho Gomes Evangelista, do 1º pelotão conta-nos como era, a seus olhos, o dia a dia em Canjambari, que não era muito diferentes de outros buracos por onde todos ou quase todos nós passamos, meses e meses e meses a fio, no TO da Guiné, (LG)
Desta vez ex-sold Agostinho Gomes Evangelista, do 1º pelotão conta-nos como era, a seus olhos, o dia a dia em Canjambari, que não era muito diferentes de outros buracos por onde todos ou quase todos nós passamos, meses e meses e meses a fio, no TO da Guiné, (LG)
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Nota do editor:
Último poste da série > 16 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13614: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXII: No T/T Niassa,, em 24/5/1969, a caminho do "desterro"... (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)
Último poste da série > 16 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13614: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXII: No T/T Niassa,, em 24/5/1969, a caminho do "desterro"... (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)
terça-feira, 23 de setembro de 2014
Guiné 63/74 - P13641: Caderno de Poesias "Poilão" (Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino, Bissau, Dezembro de 1973) (Albano de Matos) (1): Pássaro tecelão, de Albano de Matos, p. 5
Foto © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem: L.G.)
Capa do documento policopiado do Caderno de Poesias Poilão", editada em dezembro de 1973 pelo Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino (O GDC dos Empregados do BNU foi criado em 1924).
"Pássaro tecelão", o poema de Albano de Matos (p. 5), que abre o perqueno livro, de 35 pp., O Albano de Matos, editor literário, juntou nesta primeira antologia da poesia guineense, 24 poemas, de 11 poetas lusófonos (4 da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal).
1. O nosso camarada Albano Mendes de Matos [, ten cor art ref, que esteve no GA 7 e QG/CTIG, Bissau, 1972/74, e foi o "último soldado do império",], mandou-nos uma cópia, em pdf, do Caderno de Poesias "Poilão"...
Essa aventura (cultural) já aqui foi contada (*). Ele foi um dos obreiros deste livrinho, quer como editor literário quer como autor.
Ficou-nos a curiosidade em saber mais sobre o conteúdo desta brochuira que representou uma lufada de ar fresco no ambiente, já cético e depressivo, de Bissau, no final da guerra. O lançamento da obra foi feita em fevereiro de 1974, a escassos dois meses do 25 de abril. 700 exemplares do texto, policopiado, esgotarm-se num ápice.
Com o devido apoio e a competente autorização do nosso camarada Albano de Matos (, hoje a viver no Fundão, ) vamos (re)publicar este caderno de poesia, dando-o a conhecer a um público mais vasto de leitores lusófonos, em Portuigal, na Guiné-Bissau, em Cabo Verde e demais lugares do espaço lusófono.
Obrigado, Albano, com o nosso apreço e gratidão. E também ao Aguinaldo de Almeida, que fez parte da equipa deste projeto cultural. LG
[Foto acima; Bissau > 1974 > Albano de Matos, a preparar o Caderno de Poesias «Poilão», no Clube Militar de Oficiais; foto à direita: o Albano de Matos, hoje]
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Nota do editor:
(*) Vd.poste de 13 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12975: Memórias dos últimos soldados do império (2): A aventura do "Caderno de Poesia Poilão", de que se fizeram 700 exemplares, a stencil, em fevereiro de 1974, em edição do Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do BNU (Albano Mendes de Matos)
(...) Posso dizer que fui o último militar português a vaguear pelas ruas de Bissau, de onde saí, na noite de 13 de Outubro, para o aeroporto de Bissalanca, para regressar a Portugal, no último avião da Guiné, na madrugada do dia 14 de Outubro de 1974.
(...) Colocado em Bissau, sujeito a horários, não tive condições, nem disponibilidade para contactos com os povos negros. Em Bissau, passei a frequentar a UDIB - União Desportiva Internacional de Bissau, da qual fui sócio (...), o Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino e a Associação Comercial. Na UDIB e no Grupo Desportivo e Cultural do BNU, colaborei na organização eventos culturais, como, concursos literários e sessões de teatro.
Nos inícios do mês de Dezembro de 1973, ao ler o jornal «Voz da Guiné», deparei com um escrito de Agostinho de Azevedo, alferes miliciano, creio que chefe de redacção do jornal, insinuando que não havia poesia na Guiné. Respondi com um escrito, «O Despertar da Guiné», dizendo que havia poesia na Guiné e que, em breve, iríamos ter um Caderno de Poesias, com o título de «Poilão», a designação de uma árvore sagrada na Guiné. Depois da publicação do primeiro número, seriam publicados cadernos de poesia de um só autor.
No Grupo Desportivo de Cultural do BNU, conheci guineenses e cabo-verdianos que faziam poesias e pedi originais para colaboração em «Poilão», que ainda guardo no meu arquivo. Juntei 24 poemas de 4 poetas da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal.
De modo artesanal, fiz 300 exemplares do caderno. Dactilografei os poemas, imprimi-os em duplicador, dobrei as folhas e agrafei-as em capa de cartolina, esta impressa em tipografia, com desenho do poilão da autoria de um alferes miliciano, do Batalhão de Transmissões.
Os 300 exemplares do Caderno de Poesias «Poilão», editado pelo Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino, esgotaram-se na noite do lançamento. Sem preço de capa, cada pessoa dava a importância que queria. O preço por unidade foi de 20$00 a 100$00.
Por minha proposta, o dinheiro angariado foi doado à Leprosaria da Cumura, nas proximidades de Bissau. Preparei, então, mais 400 exemplares que se esgotaram num dia. Havia apetência para a Poesia na Guiné. Eu apercebi-me desse facto.
No Grupo Desportivo de Cultural do BNU, conheci guineenses e cabo-verdianos que faziam poesias e pedi originais para colaboração em «Poilão», que ainda guardo no meu arquivo. Juntei 24 poemas de 4 poetas da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal.
De modo artesanal, fiz 300 exemplares do caderno. Dactilografei os poemas, imprimi-os em duplicador, dobrei as folhas e agrafei-as em capa de cartolina, esta impressa em tipografia, com desenho do poilão da autoria de um alferes miliciano, do Batalhão de Transmissões.
Os 300 exemplares do Caderno de Poesias «Poilão», editado pelo Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino, esgotaram-se na noite do lançamento. Sem preço de capa, cada pessoa dava a importância que queria. O preço por unidade foi de 20$00 a 100$00.
Por minha proposta, o dinheiro angariado foi doado à Leprosaria da Cumura, nas proximidades de Bissau. Preparei, então, mais 400 exemplares que se esgotaram num dia. Havia apetência para a Poesia na Guiné. Eu apercebi-me desse facto.
(...) Com um mês de licença, em Portugal, e com as antevisões do 25 de Abril, não foram publicados mais cadernos.
O Caderno de Poesias «Poilão» está referenciado, praticamente, em todas as Bibliografias, Dicionários, Histórias e Estudos da Literatura Africana de Expressão Portuguesa, sendo considerado como a primeira Antologia de Poesia na Guiné-Bissau. Tem sido referido em tertúlias, seminários e encontros culturais.
Em «Poilão», colaborou Pascoal D’Artagnam Aurigema, falecido em 1991, que foi um dos principais poetas da Guiné-Bissau [. Nasceu, em Farim, em 1938] (..:).
O Caderno de Poesias «Poilão» está referenciado, praticamente, em todas as Bibliografias, Dicionários, Histórias e Estudos da Literatura Africana de Expressão Portuguesa, sendo considerado como a primeira Antologia de Poesia na Guiné-Bissau. Tem sido referido em tertúlias, seminários e encontros culturais.
Em «Poilão», colaborou Pascoal D’Artagnam Aurigema, falecido em 1991, que foi um dos principais poetas da Guiné-Bissau [. Nasceu, em Farim, em 1938] (..:).
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poesia
Guiné 63/74 - P13640: Parabéns a você (790): Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto do CMD AGR 16 (Guiné, 1964/66)
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Nota do editor
Último poste da série de 21 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13632: Parabéns a você (789): Coutinho e Lima, Coronel Art Ref (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73); Teresa Almeida, Amiga Grã-Tabanqueira (Liga dos Combatentes) e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)
Nota do editor
Último poste da série de 21 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13632: Parabéns a você (789): Coutinho e Lima, Coronel Art Ref (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73); Teresa Almeida, Amiga Grã-Tabanqueira (Liga dos Combatentes) e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)
segunda-feira, 22 de setembro de 2014
Guiné 63/74 - P13639: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (7): Vermeer teria gostado de pintar as libanesas de olhos verdes... (Valdemar Queiroz, ex fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)
"A rapariga com brinco de pérola" (c. 1665)... Uma das obras primas do pintor holandês Johannes Vermeer (1632-1675). Óleo sobre tela (44,5 cm x 39 cm). Localização atual: Galeria Mauritshuis, Haia. Imagem do domínio público. Cortesia de Wikipedia.
.
1. Mensagem do Valdemar Queiroz
[, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]
[, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]
Data: 15 de Setembro de 2014 às 01:25
Assunto: Ainda sobre as libanesas (*)
Ora viva, caro Luís Graça.
Cá te temos, desta vez pra sabermos o que é o belo. Isto para voltarmos a falar das libanesas de Nova Lamego e/ou Bafatá.
Quanto eu gostava de saber o que é o belo, agora que em toda a zona da Agualva/Mercês há um florescer de plumas, milhares de plumas, que é uma beleza de ver, ou se só as 'Meninas de Avignon', do Picasso, ou 'As meninas' ,de Botticelli, são uma beleza de ver?
E por que razão as raparigas/mulheres libanesas de Nova Lamego ou Bafatá, não seriam uma beleza de ver? Que mal estaria a rapazida a fazer, se só apreciassem os olhos verdes das libanesas? Cometiam um grave sacrilégio de apreciar a sua beleza, ou querendo lá saber disso teriam que apreciar o saber do passar a ferro, o mudar a água ás azeitonas, o fazer uma sopa de beldroegas e esperar?
Acho que não, a rapaziada gostava de ver raparigas bonitas, libanesas, fulas, mandingas e até as filhas dos da metrópole que eram mais finas. Não havia nenhum mal nisso, era absolutamente normal.
Quem em 1969/70, na Guiné, não gostava de ver uma mulher de olhos verdes, sem estar a pensar nas mulheres de olhos castanhos, azuis ou pretos para fazer comparações e também pensar que todas as mulheres têm olhos bonitos, que elas haveriam de ser um dia as nossas companheiras e as mães dos nossos filhos?
Pois é, caro Luís, naquele tempo, há 45 anos, sem querer, já nós apreciávamos a 'Mulher com brinco de pérola', de Vermeer , sem com isso desgostar da 'Mulher de Afife com arrecadas', da 'Mulher com o joelho à mostra na Pastelaria Suíça', ou 'A Vera de biquíni amarelo na Caparica'.
Pois é, caro Luís, isto do belo dá pano para mangas e é só escolher, pra nós as libanesas chegavam: libanesas de olhos verdes, nunca tinhamos visto.
Um abraço e gostei de ver tuas fotos e de ler os teus poemas.
Valdemar Queiroz
Sintra > Zona da Agualva/Mercês > Setembro de 2014 > "Há um florescer de plumas, milhares de plumas, que é uma beleza de se ver"...
Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados [ Edição: LG]
Quem em 1969/70, na Guiné, não gostava de ver uma mulher de olhos verdes, sem estar a pensar nas mulheres de olhos castanhos, azuis ou pretos para fazer comparações e também pensar que todas as mulheres têm olhos bonitos, que elas haveriam de ser um dia as nossas companheiras e as mães dos nossos filhos?
Pois é, caro Luís, naquele tempo, há 45 anos, sem querer, já nós apreciávamos a 'Mulher com brinco de pérola', de Vermeer , sem com isso desgostar da 'Mulher de Afife com arrecadas', da 'Mulher com o joelho à mostra na Pastelaria Suíça', ou 'A Vera de biquíni amarelo na Caparica'.
Pois é, caro Luís, isto do belo dá pano para mangas e é só escolher, pra nós as libanesas chegavam: libanesas de olhos verdes, nunca tinhamos visto.
Um abraço e gostei de ver tuas fotos e de ler os teus poemas.
Valdemar Queiroz
Sintra > Zona da Agualva/Mercês > Setembro de 2014 > "Há um florescer de plumas, milhares de plumas, que é uma beleza de se ver"...
Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados [ Edição: LG]
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Nota do editor:
(*) Vd. último poste da série > 14 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13607: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (6): Ainda as libanesas de Nova Lamego (José Martins / Valdemar Queiroz / Abílio Duarte)
Guiné 63/74 - P13638: Selfies / autorretratos (2): filho único, com pai emigrado no Canadá, podia também ter saído do país, aos 17 anos... Passei pela universidade de Coimbra e lutas académicas, tendo decidido participar na guerra colonial, contrariado e sabendo ao que ia (Manuel Reis, ex-alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, 1972/74)
1. Comentário de Manuel Reis ao poste P13623:
[, Foto á esquerda: Manuel Augusto Reis, em Guileje, 1973: foi alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]
Amigo e ex-camarada Vasco:
Abriste uma frente de diálogo bastante interessante e que o Luís com o seu saber deu uma ajuda suplementar.
Nota do editor;
Último poste da série > 22 e setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)
[, Foto á esquerda: Manuel Augusto Reis, em Guileje, 1973: foi alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]
Amigo e ex-camarada Vasco:
Abriste uma frente de diálogo bastante interessante e que o Luís com o seu saber deu uma ajuda suplementar.
Conheço o Vasco desde os tempos de escola, com um percurso um pouco idêntico, mas trilhando o mesmo caminho: colégio de Anadia e Universidade de Coimbra e, imagine-se, ....Gadamael.
Aproveito para lembrar o percurso dos meus familiares no que à guerra diz respeito. Meu avó (materno) foi mobilizado para a 1ª guerra mundial e participou na batalha de La LYs. Consegui ouvir algumas peripécias, dispersas, dos momentos difíceis, que teve de suportar, na sua qualidade de granadeiro.
No seu regresso era um homem destroçado anímicamente. A minha presença na sala tornava-se incómoda, pelo que me era dada ordem de retirada.
Na casa dos meus avós vivia-se um ambiente republicano, sendo o meu bisavô, Pedro, meu grande amigo, constantemente perseguido. A maior parte das noites eram dormidas em palheiros, afastados da sua residência. Lamento que o diário do meu avó se tenha extraviado, a sua importância, para mim, era bastante significativa.
Seguiu-se o meu pai, que é mobilizado para alinhar na 2º guerra mundial, sendo enviado para Moçambique, durante 3 anos, onde supostamente se previa um desembarque de tropas japoneses. Nada faria supor esta mobilização do meu pai, recém- casado. Não sofreu os traumas da guerra, mas a ausência da família foi dura.
Poucos anos passados, face ás dificuldades económicas, o meu pai emigra para o Canadá onde permanece durante mais de 20 anos. No ano em que eu completava 17 anos e perante o espectro da guerra que pairava sobre a minha cabeça, desloca-se a Portugal e coloca-me a possibilidade de emigrar também.
Seguiu-se o meu pai, que é mobilizado para alinhar na 2º guerra mundial, sendo enviado para Moçambique, durante 3 anos, onde supostamente se previa um desembarque de tropas japoneses. Nada faria supor esta mobilização do meu pai, recém- casado. Não sofreu os traumas da guerra, mas a ausência da família foi dura.
Poucos anos passados, face ás dificuldades económicas, o meu pai emigra para o Canadá onde permanece durante mais de 20 anos. No ano em que eu completava 17 anos e perante o espectro da guerra que pairava sobre a minha cabeça, desloca-se a Portugal e coloca-me a possibilidade de emigrar também.
O meu pai, homem simples do campo, tem a noção e a preocupação de que a guerra me espera.Possibilita-me que decida .Estar-lhe-ei eternamente grato. Acabei por recusar, via a guerra ainda muito longe, e com um percurso académico satisfatório, nada o aconselhava.
A minha entrada na academia, e o meu envolvimento nas lutas académicas, rasgaram-me outros horizontes e quando decidi, contrariado, participar na guerra que já se vivia nas ex-colónias, sabia para o que ia. A decisão era sustentada no plano familiar, pois na qualidade de filho único, não imaginava um afastamento prolongado dos meus pais.
Um grande abraço.
Vasco, as caçoilas estão prontas!
Manuel Reis
Um grande abraço.
Vasco, as caçoilas estão prontas!
Manuel Reis
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Último poste da série > 22 e setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)
Guiné 63/74 - P13637: Convívios (631): Encontro do pessoal da CCAÇ 2616 (Buba, 1969/71) a realizar-se no próximo dia 4 de Outubro de 2014 em Arraiolos (Francisco Baptista)
1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 20 de Setembro de 2014:
Amigo Carlos
Será a primeira vez que eu irei encontrar esta companhia.
A CCAÇ 2616 era sobretudo composta por pessoal do sul (alguns graduados do norte), a CART 2732 como bem sabes da Madeira (graduados e especialistas do continente).
Em parte desculpas minhas, porque na verdade durante muitos anos procurei esquecer a Guiné.
Saúde e um grande abraço
Francisco Baptista
Concentração às 12,30 no restaurante Pelourinho, no centro da vila de Arraiolos*, onde decorrerá o almoço, de cuja ementa constará:
Entradas:
Polvo em vinagrete;
Grau com bacalhau;
Paio de porco preto;
Bom pão alentejano e azeitonas
Primeiro prato:
massinha de peixe
Segundo prato:
carne de porco com ameijoas
Bebidas:
vinho brano e tinto da casa, água e café
Sobremesa:
doces e fruta da época
Cerca das 17 horas será servida a merenda:
Canja de galinha e leitão
Preço: 22,50 euros
As inscrições para o convivio estão abertas até ao dia 2 de Outubro
Contacto:
João Pausinho - Telefone: 266 499 705 - Telemovel: 969 984 162
Este convite é extensivo a todos os camaradas que connosco conviveram em Buba: Pelotão de Morteiros, Pelotão de Obuses, Pelotão de Intêndencia, Destacamentos de Fuzileiros.
É igualmente extensivo a todos os camaradas do BCAÇ 2892 e a todas as Companhias e Pelotões Independentes de Aldeia Formosa, Mampatá ou Empada, cujo comando de sector era em Aldeia Formosa.
Todos os outros camaradas da Guiné ou doutros TOs que se queiram associar a nós serão bem-vindos e acolhidos como irmãos.
(*) OBS: - Em virtude de o centro da vila de Arraiolos, onde se situa o restaurante, ser uma zona pedonal, aconselha-se a todos os camaradas que vierem ao almoço, que estacionem as suas viaturas no Parque, que fica atrás do edifício dos correios.
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Nota do editor
Último poste da série de 22 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13636: Convívios (630): Almoço de confraternização e comemoração do 40.º aniversário do regresso da CCAÇ 4544/73, levado a efeito no Marco de Canaveses (António Agreira)
Amigo Carlos
Será a primeira vez que eu irei encontrar esta companhia.
A CCAÇ 2616 era sobretudo composta por pessoal do sul (alguns graduados do norte), a CART 2732 como bem sabes da Madeira (graduados e especialistas do continente).
Em parte desculpas minhas, porque na verdade durante muitos anos procurei esquecer a Guiné.
Saúde e um grande abraço
Francisco Baptista
Convivio da CCAÇ 2616 (Buba, 1969/71)
Arraiolos, 4 de
Outubro de 2014
Concentração às 12,30 no restaurante Pelourinho, no centro da vila de Arraiolos*, onde decorrerá o almoço, de cuja ementa constará:
Entradas:
Polvo em vinagrete;
Grau com bacalhau;
Paio de porco preto;
Bom pão alentejano e azeitonas
Primeiro prato:
massinha de peixe
Segundo prato:
carne de porco com ameijoas
Bebidas:
vinho brano e tinto da casa, água e café
Sobremesa:
doces e fruta da época
Cerca das 17 horas será servida a merenda:
Canja de galinha e leitão
Preço: 22,50 euros
As inscrições para o convivio estão abertas até ao dia 2 de Outubro
Contacto:
João Pausinho - Telefone: 266 499 705 - Telemovel: 969 984 162
Este convite é extensivo a todos os camaradas que connosco conviveram em Buba: Pelotão de Morteiros, Pelotão de Obuses, Pelotão de Intêndencia, Destacamentos de Fuzileiros.
É igualmente extensivo a todos os camaradas do BCAÇ 2892 e a todas as Companhias e Pelotões Independentes de Aldeia Formosa, Mampatá ou Empada, cujo comando de sector era em Aldeia Formosa.
Todos os outros camaradas da Guiné ou doutros TOs que se queiram associar a nós serão bem-vindos e acolhidos como irmãos.
(*) OBS: - Em virtude de o centro da vila de Arraiolos, onde se situa o restaurante, ser uma zona pedonal, aconselha-se a todos os camaradas que vierem ao almoço, que estacionem as suas viaturas no Parque, que fica atrás do edifício dos correios.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 22 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13636: Convívios (630): Almoço de confraternização e comemoração do 40.º aniversário do regresso da CCAÇ 4544/73, levado a efeito no Marco de Canaveses (António Agreira)
Guiné 63/74 - P13636: Convívios (630): Almoço de confraternização e comemoração do 40.º aniversário do regresso da CCAÇ 4544/73, levado a efeito no dia 14 de Setembro de 2014, no Marco de Canaveses (António Agreira)
1. Mensagem do nosso camarada António Agreira (ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 4544/73, Cafal, 1973/74), com data de 20 de Setembro de 2014:
Mais uma vez a CCAÇ 4544 reuniu para o almoço de confraternização e comemoração dos 40 ANOS do regresso.
O local escolhido foi Marco de Canaveses, e este ano tivemos a presença de 4 camaradas de armas que se juntaram a nós pela primeira vez nestas andanças.
Foi um dia esplêndido na companhia de alguns familiares que nos acompanharam.
Mais uma vez a organização esteve a cargo do Oliveira (o reguila)
Cordiais cumprimentos
António Agreira
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Nota do editor
Último poste da série de 18 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13621: Convívios (629): I Encontro de paraquedistas do Oeste... Lourinhã, 6 de setembro de 2014... Parte V: Discurso do Jaime Bonifácio Marques da Silva > 1ª Parte: o elogio dos Boinas Verdes, e a homenagem aos nossos bravos, caídos na campo da honra (I Grande Guerra, 1914/18, França, Angola e Moçambique; e guerra colonial, 1961/74)
Guiné 63/74 - P13635: Notas de leitura (634): “Vamos", por Jacinto Lucas Pires (1) (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Março de 2014:
Queridos amigos,
Mais uma grande surpresa, um projeto de inovação social a que a fundação Gulbenkian está ligado, buscam-se novas soluções para novos e velhos problemas sociais.
Jacinto Lucas Pires conta primorosamente histórias de jovens que foram capazes de fazer cada obstáculo um degrau, são estudantes e simultaneamente dinamizadores, coordenadores de projeto ou fazem estágios. Jovens que valorizam a liberdade, que aprenderam a perdoar.
A fotografia de Tiago da Cunha Ferreira substitui luminosamente as palavras. Mostra estes jovens prontos a conquistar o mundo mesmo quando vivem nos bairros mais inóspitos.
Um abraço do
Mário
Chegar ao começo e sonhar com o céu (1)
Beja Santos
Que a vida me tem sido benfazeja em imprevistos deleitosos, escuso-me de queixar, sou pródigo em tais benesses, em felizes acasos. E então na descoberta de livros…
Vai um cidadão pronto para assistir a “Dido e Eneias”, de Purcell, tem ainda uns momentos ociosos, deambula pelas estantes de livros, a Gulbenkian, mesmo fora da feira de Natal, tem sempre umas oportunidades catitas. O livro chama a atenção pelo grafismo, o livro parece um álbum, tem papel de boa gramagem, e as ilustrações, então…
Os olhos saltitam pelas histórias, trata-se de texto da autoria de Jacinto Lucas Pires, está lá a Guiné e jovens guineenses na diáspora, casos ímpares de força de vontade, histórias incríveis, poderiam emparceirar nos relatos das sagas e odisseias. Compra-se sem hesitar, estão aqui jovens que apostam no futuro, os chamados casos de resiliência, vamos ler e depois contar no blogue.
Porque a esperança nunca acaba. O livro chama-se “Vamos”, a fotografia é de Tiago Cunha Ferreira, o convidado para a empreitada da escrita é Jacinto Lucas Pires, Edição Gulbenkian, 2011.
Como foi possível estar tanto tempo sem saber deste projeto? A responsável da Gulbenkian, Isabel Mota, dá-nos o pano de fundo: “A Academia Ubuntu, dinamizada pelo Instituto Padre António Vieira, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e da Universidade Católica Portuguesa, deu vida, no último ano, a um projeto experimental de capacitação de jovens líderes descendentes de imigrantes, tendo como patronos Mandela, Tutu e Luther King. Estes gigantes da humanidade inspiraram um ambicioso e inovador programa que procurou desenvolver competências ao serviço dos outros. Quatro dezenas de jovens inseridos em contextos de grande exclusão social, viveram um roteiro de formação exigente, na certeza de poderem contribuir para alavancar a mudança”.
E mais adiante Isabel Mota explica no final do projeto se lançou o desafio a Jacinto Lucas Pires para que retratasse as histórias por dentro das vidas dos que frequentaram a Academia Ubuntu, vidas reais contadas pelos próprios como se não fosse nada. Aqui ficam extratos de histórias de jovens guineenses:
“Foi há dezoito anos, mas Edson nunca mais esqueceu daquele dia em Bissau. O primo-irmão Mário tinha ido buscar a sua irmã Daise ao jardim-de-infância. Estão os dois à beira da estrada à espera para atravessar, um dia normal de sol, quando a criança larga a mão do primo, começa a correr e é atropelada por um autocarro.
Mário chega a casa assustadíssimo a dizer que a menina está morta. Daise está morta, morreu, um acidente muito grave.
Edson tem oito anos e aquela notícia provoca-lhe um sofrimento grande demais.
Depois vêm dizer-lhe que não, a Daise não morreu, mas ele não acredita. Pensa que é tudo mentira, que lhe dizem aquilo para que não sofra tanto. Um sofrimento intenso, do qual não se pode sair, do qual é impossível conseguir sair.
Dias mais tarde, quando vai ao hospital e vê a irmã, é como se testemunhasse uma ressurreição.
A mãe de Edson traz Daise para Lisboa, para ser vista por uma junta médica no Hospital da Estefânia e Edson fica em Bissau. Passa a viver com a avó e os tios numa grande casa coberta de palha. Teve uma infância bastante feliz”.
“Braima nasceu em Bolama, na Guiné-Bissau; uma ilha do arquipélago dos Bijagós. Do lado da mãe, são bijagós (única etnia da Guiné que não foi islamizada). O pai de Braima é do continente, de Buba; os bisavós vieram da Guiné-Conacri. Do lado do pai são muçulmanos. Do lado da mãe animistas, de educação católica. Braima teve uma educação católica.
Quando ele tinha seis anos, a mãe teve um problema de saúde e veio para Portugal. Curou-se e ficou por cá.
Braima tem cinco irmãos da parte da mãe. O pai teve doze filhos, ao todo. Em Bolama, ele era o codé (é o mais novo da família).
O avô de Braima ficou viúvo muito cedo. Era funcionário público e não tinha com quem deixar a filha pequena (a mãe de Braima). Uma senhora, a Avó Nhinha, costuma ver a miúda sentada ao pé da mesa onde o avô de Braima trabalhava as escrever numa máquina antiga. Um dia, foi ter com ele e perguntou-lhe se não queria que ele tomasse conta da menina. A partir daí, a mãe de Braima – e depois Braima – passa a integrar essa outra família, de origem senegalesa.
Braima também passou muito tempo da infância no Senegal. Quando era miúdo, até falava uólofe.
Mas a sua primeira língua é o crioulo guineense. Na Guiné fala-se português na aula e crioulo no recreio. E português é muito diferente do crioulo e é muito difícil para os miúdos. É preciso dobrar a língua, coloca-la mais leve. O crioulo da Guiné é falado com a língua no céu-da-boca e não tem, por exemplo, os sons ‘lh’ e ‘rr’. Também não há artigos masculinos ou femininos, é sempre neutro”.
“Edson tem outra irmã, do lado da mãe, com dez anos. Também veio para Portugal antes dele.
Agora está parado no sol do meio-dia, nas escadas da Faculdade de Letras, em Lisboa. A camisa branca é um concentrado de luz. Edson tem 24 anos e olha para nós; uma cicatriz na base do nariz, uma curta linha horizontal, lembrança de um prato que lhe acertou na cara quando era criança. O resultado de se ter metido no meio de uma discussão entre adultos: os tios estavam aos gritos e ele armou-se em ONG”.
“Em Bissau, à noite, Edson sente saudade de um lugar que não conhece chamado Lisboa. Sonha em vir ter com a mãe e os irmãos.
No dia 22 de outubro de 2000, com 13 anos, veio finalmente para Portugal. É o último da família a vir porque é o irmão mais velho.
Mas, quando chega, as aulas estão a meio e tem de ficar um mês sozinho num apartamento em Odivelas. Chora todos os trinta dias”.
“Os Barai são da região de Bula, na Guiné. A mãe de Rui é a filha de um português de Reguengos de Monsaraz e de uma guineense do Arquipélago dos Bijagós. Os avós paternos são guineenses, da etnia mancanha.
Os pais conheceram-se em Bissau; Rui nasceu lá, veio para Portugal com três anos. O pai veio estagiar como meteorologista e a família veio com ele. São três irmãos, Rui é o do meio.
Depois regressaram à Guiné, mas o pai de Rui viu as coisas lá não estavam a correr bem e voltou para Portugal. A família ficou na Guiné mais um tempo. em 1977 os pais de Rui, que eram casados só pelo registo, casaram pela igreja e fizeram uma bela festa em Bissau. O plano era regressarem todos a Portugal em 1998, mas de repente estalou a guerra.
A família já não consegue voar para Lisboa.
A mãe, os três filhos e uma prima que vive com eles saem da cidade, para uma casinha no mato. Vão para Bolama, de canoa – uma canoa cheia de animais e tralha –, e daí para Bambaiá, e depois para o Sul.
A tia tem uma fábrica de descascar arroz. Algumas pessoas dão dinheiro, outras dão parte de arroz, outros pagam com gado, e vai-se vivendo assim. Um dia vão lá militares, mas a tia dá-lhes arroz e eles não fazem mal a ninguém.
Não há notícias, não há rádio, comunicações, não sabem de nada. Rui tem dez anos.
Passados uns meses, regressam a Bissau, mas perdem o barco que os podia tirar dali. Decidem então sair por terra, pelo Senegal.
Em Dakar, numa zona de barracas de venda, uma senhora olha para a mãe de Rui e para, espantada. É uma tia do pai de Rui. Vai ter com eles, pergunta-lhes o nome e abraçam-se.
O pai compra-lhes bilhetes de avião para eles virem ter com ele a Portugal, mas no aeroporto há truques, têm de pagar aos funcionários, etc., e não conseguem passar. Várias tentativas, em vão. A mãe vem para Portugal e eles ficam lá.
Entretanto, o tio do Rui torna-se secretário de Estado da Cooperação Internacional da Guiné. Tem o mesmo nome que ele, Rui Barai. É ele que os vai buscar a Dakar.
Em 2000, chegam a Portugal. Vão viver para a Póvoa de Santa Iria, para um lugar chamado Bragadas. Rui tem onze anos, vai fazer doze”.
(Continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 19 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13625: Notas de leitura (633): “Poesias e Cartas", por José Bação Leal (Mário Beja Santos)
Queridos amigos,
Mais uma grande surpresa, um projeto de inovação social a que a fundação Gulbenkian está ligado, buscam-se novas soluções para novos e velhos problemas sociais.
Jacinto Lucas Pires conta primorosamente histórias de jovens que foram capazes de fazer cada obstáculo um degrau, são estudantes e simultaneamente dinamizadores, coordenadores de projeto ou fazem estágios. Jovens que valorizam a liberdade, que aprenderam a perdoar.
A fotografia de Tiago da Cunha Ferreira substitui luminosamente as palavras. Mostra estes jovens prontos a conquistar o mundo mesmo quando vivem nos bairros mais inóspitos.
Um abraço do
Mário
Chegar ao começo e sonhar com o céu (1)
Beja Santos
Que a vida me tem sido benfazeja em imprevistos deleitosos, escuso-me de queixar, sou pródigo em tais benesses, em felizes acasos. E então na descoberta de livros…
Vai um cidadão pronto para assistir a “Dido e Eneias”, de Purcell, tem ainda uns momentos ociosos, deambula pelas estantes de livros, a Gulbenkian, mesmo fora da feira de Natal, tem sempre umas oportunidades catitas. O livro chama a atenção pelo grafismo, o livro parece um álbum, tem papel de boa gramagem, e as ilustrações, então…
Os olhos saltitam pelas histórias, trata-se de texto da autoria de Jacinto Lucas Pires, está lá a Guiné e jovens guineenses na diáspora, casos ímpares de força de vontade, histórias incríveis, poderiam emparceirar nos relatos das sagas e odisseias. Compra-se sem hesitar, estão aqui jovens que apostam no futuro, os chamados casos de resiliência, vamos ler e depois contar no blogue.
Porque a esperança nunca acaba. O livro chama-se “Vamos”, a fotografia é de Tiago Cunha Ferreira, o convidado para a empreitada da escrita é Jacinto Lucas Pires, Edição Gulbenkian, 2011.
Como foi possível estar tanto tempo sem saber deste projeto? A responsável da Gulbenkian, Isabel Mota, dá-nos o pano de fundo: “A Academia Ubuntu, dinamizada pelo Instituto Padre António Vieira, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e da Universidade Católica Portuguesa, deu vida, no último ano, a um projeto experimental de capacitação de jovens líderes descendentes de imigrantes, tendo como patronos Mandela, Tutu e Luther King. Estes gigantes da humanidade inspiraram um ambicioso e inovador programa que procurou desenvolver competências ao serviço dos outros. Quatro dezenas de jovens inseridos em contextos de grande exclusão social, viveram um roteiro de formação exigente, na certeza de poderem contribuir para alavancar a mudança”.
E mais adiante Isabel Mota explica no final do projeto se lançou o desafio a Jacinto Lucas Pires para que retratasse as histórias por dentro das vidas dos que frequentaram a Academia Ubuntu, vidas reais contadas pelos próprios como se não fosse nada. Aqui ficam extratos de histórias de jovens guineenses:
“Foi há dezoito anos, mas Edson nunca mais esqueceu daquele dia em Bissau. O primo-irmão Mário tinha ido buscar a sua irmã Daise ao jardim-de-infância. Estão os dois à beira da estrada à espera para atravessar, um dia normal de sol, quando a criança larga a mão do primo, começa a correr e é atropelada por um autocarro.
Mário chega a casa assustadíssimo a dizer que a menina está morta. Daise está morta, morreu, um acidente muito grave.
Edson tem oito anos e aquela notícia provoca-lhe um sofrimento grande demais.
Depois vêm dizer-lhe que não, a Daise não morreu, mas ele não acredita. Pensa que é tudo mentira, que lhe dizem aquilo para que não sofra tanto. Um sofrimento intenso, do qual não se pode sair, do qual é impossível conseguir sair.
Dias mais tarde, quando vai ao hospital e vê a irmã, é como se testemunhasse uma ressurreição.
A mãe de Edson traz Daise para Lisboa, para ser vista por uma junta médica no Hospital da Estefânia e Edson fica em Bissau. Passa a viver com a avó e os tios numa grande casa coberta de palha. Teve uma infância bastante feliz”.
“Braima nasceu em Bolama, na Guiné-Bissau; uma ilha do arquipélago dos Bijagós. Do lado da mãe, são bijagós (única etnia da Guiné que não foi islamizada). O pai de Braima é do continente, de Buba; os bisavós vieram da Guiné-Conacri. Do lado do pai são muçulmanos. Do lado da mãe animistas, de educação católica. Braima teve uma educação católica.
Quando ele tinha seis anos, a mãe teve um problema de saúde e veio para Portugal. Curou-se e ficou por cá.
Braima tem cinco irmãos da parte da mãe. O pai teve doze filhos, ao todo. Em Bolama, ele era o codé (é o mais novo da família).
O avô de Braima ficou viúvo muito cedo. Era funcionário público e não tinha com quem deixar a filha pequena (a mãe de Braima). Uma senhora, a Avó Nhinha, costuma ver a miúda sentada ao pé da mesa onde o avô de Braima trabalhava as escrever numa máquina antiga. Um dia, foi ter com ele e perguntou-lhe se não queria que ele tomasse conta da menina. A partir daí, a mãe de Braima – e depois Braima – passa a integrar essa outra família, de origem senegalesa.
Braima também passou muito tempo da infância no Senegal. Quando era miúdo, até falava uólofe.
Mas a sua primeira língua é o crioulo guineense. Na Guiné fala-se português na aula e crioulo no recreio. E português é muito diferente do crioulo e é muito difícil para os miúdos. É preciso dobrar a língua, coloca-la mais leve. O crioulo da Guiné é falado com a língua no céu-da-boca e não tem, por exemplo, os sons ‘lh’ e ‘rr’. Também não há artigos masculinos ou femininos, é sempre neutro”.
“Edson tem outra irmã, do lado da mãe, com dez anos. Também veio para Portugal antes dele.
Agora está parado no sol do meio-dia, nas escadas da Faculdade de Letras, em Lisboa. A camisa branca é um concentrado de luz. Edson tem 24 anos e olha para nós; uma cicatriz na base do nariz, uma curta linha horizontal, lembrança de um prato que lhe acertou na cara quando era criança. O resultado de se ter metido no meio de uma discussão entre adultos: os tios estavam aos gritos e ele armou-se em ONG”.
“Em Bissau, à noite, Edson sente saudade de um lugar que não conhece chamado Lisboa. Sonha em vir ter com a mãe e os irmãos.
No dia 22 de outubro de 2000, com 13 anos, veio finalmente para Portugal. É o último da família a vir porque é o irmão mais velho.
Mas, quando chega, as aulas estão a meio e tem de ficar um mês sozinho num apartamento em Odivelas. Chora todos os trinta dias”.
“Os Barai são da região de Bula, na Guiné. A mãe de Rui é a filha de um português de Reguengos de Monsaraz e de uma guineense do Arquipélago dos Bijagós. Os avós paternos são guineenses, da etnia mancanha.
Os pais conheceram-se em Bissau; Rui nasceu lá, veio para Portugal com três anos. O pai veio estagiar como meteorologista e a família veio com ele. São três irmãos, Rui é o do meio.
Depois regressaram à Guiné, mas o pai de Rui viu as coisas lá não estavam a correr bem e voltou para Portugal. A família ficou na Guiné mais um tempo. em 1977 os pais de Rui, que eram casados só pelo registo, casaram pela igreja e fizeram uma bela festa em Bissau. O plano era regressarem todos a Portugal em 1998, mas de repente estalou a guerra.
A família já não consegue voar para Lisboa.
A mãe, os três filhos e uma prima que vive com eles saem da cidade, para uma casinha no mato. Vão para Bolama, de canoa – uma canoa cheia de animais e tralha –, e daí para Bambaiá, e depois para o Sul.
A tia tem uma fábrica de descascar arroz. Algumas pessoas dão dinheiro, outras dão parte de arroz, outros pagam com gado, e vai-se vivendo assim. Um dia vão lá militares, mas a tia dá-lhes arroz e eles não fazem mal a ninguém.
Não há notícias, não há rádio, comunicações, não sabem de nada. Rui tem dez anos.
Passados uns meses, regressam a Bissau, mas perdem o barco que os podia tirar dali. Decidem então sair por terra, pelo Senegal.
Em Dakar, numa zona de barracas de venda, uma senhora olha para a mãe de Rui e para, espantada. É uma tia do pai de Rui. Vai ter com eles, pergunta-lhes o nome e abraçam-se.
O pai compra-lhes bilhetes de avião para eles virem ter com ele a Portugal, mas no aeroporto há truques, têm de pagar aos funcionários, etc., e não conseguem passar. Várias tentativas, em vão. A mãe vem para Portugal e eles ficam lá.
Entretanto, o tio do Rui torna-se secretário de Estado da Cooperação Internacional da Guiné. Tem o mesmo nome que ele, Rui Barai. É ele que os vai buscar a Dakar.
Em 2000, chegam a Portugal. Vão viver para a Póvoa de Santa Iria, para um lugar chamado Bragadas. Rui tem onze anos, vai fazer doze”.
Dois jovens que sonham com o céu
(Continua)
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Nota do editor
Último poste da série de 19 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13625: Notas de leitura (633): “Poesias e Cartas", por José Bação Leal (Mário Beja Santos)
Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)
Guiné > 1970 > Um "selfie" ("avant la lettre"...) do Vasco Pires, ex-al mil art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72; bairradino, vive no Brasil desde que acabou a comissão de serviço no CTIG).
Observ.: Selfie - junção do substantivo self (em inglês "eu", "o próprio") e o sufixo ie. Ou selfy... É um tipo de fotografia de autorretrato, normalmente tirada com uma câmara digital de mão ou telemóvel com câmara. Foi considerada a palavra internacional do ano de 2013 pelo Oxford English Dictionary. Tornou-se "viral", como muitas outras modas... Fonte: Adapt. de Wikipedia.
Foto: © Vasco Pires (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]
1. O Vasco Pires foi quem deu o mote (*):
(...) Nesses tempos de "selfies" (neologismo que significa autorretrato), chamou minha atenção essa [minha] foto de 1970, poucos dias após a chegada à Guiné [, vd. foto acima].
Autorretrato acompanha a História da Humanidade, lembra Narciso, filho de liríope, passa pela necessidade de autoconhecimento, até chegar na expressão dos modernistas angustiados.
Mas voltemos ao soldado, que parece perguntar:
- Como é que eu vim parar aqui?
É uma viagem à década de sessenta, jovens inexperientes, num país que se queria fechado ao mundo. Eu, particularmente, vinha da Bairrada profunda, de um grupo familiar que Gramsci apelidada "intelectuais rurais', logo por defenição conservadores, embora dela tenham saído alguns que ele chama de intelectuais urbanos.
Passando pelas escolas locais, cheguei na Academia Coimbrã em plena efervescência da segunda metade da década de 60, verdadeiro "ponto de clivagem", dos valores e hábitos Ocidentais (não vamos achar que somos o centro do Mundo, só porque assim fizemos como nosso mapa).
Um fervilhar de ideias, contestação dos valores tradicionais, onde poucos tinham uma visão cosmopolita.
Na época, muitos devem lembrar, a figura do "passador", que mediante determinada quantia, fazia chegar as pessoas, além Pirenéus.
Pois, tinha um que era amigo da família, pai de um amigo, e que trabalhava em parceria com um frade (não sei se este o fazia por dinheiro ou convicção), eu tinha também, grande parte da família do outro lado do Atlântico. Assim, com essa facilidade, eu, que jamais pensei que a missão era "dilatar a fé e o império", nunca me passou pela ideia de usar os seus serviços, ou me reunir aos parentes. Penso, talvez, que não queria romper com os valores culturais em que estava inserido.
Contudo, "nesta altura do campeonato", não é mais relevante. Alguns de nós foram à guerra por convicção, outros movidos pela propaganda, muitos por inércia, e alguns outros com receio de enfrentar usos e costumes estrangeiros.
Um fervilhar de ideias, contestação dos valores tradicionais, onde poucos tinham uma visão cosmopolita.
Na época, muitos devem lembrar, a figura do "passador", que mediante determinada quantia, fazia chegar as pessoas, além Pirenéus.
Pois, tinha um que era amigo da família, pai de um amigo, e que trabalhava em parceria com um frade (não sei se este o fazia por dinheiro ou convicção), eu tinha também, grande parte da família do outro lado do Atlântico. Assim, com essa facilidade, eu, que jamais pensei que a missão era "dilatar a fé e o império", nunca me passou pela ideia de usar os seus serviços, ou me reunir aos parentes. Penso, talvez, que não queria romper com os valores culturais em que estava inserido.
Contudo, "nesta altura do campeonato", não é mais relevante. Alguns de nós foram à guerra por convicção, outros movidos pela propaganda, muitos por inércia, e alguns outros com receio de enfrentar usos e costumes estrangeiros.
2. Comentário do nosso editor Luís Graça [ex-fur mil, armas pes inf, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71] (*)
(...) "Alguns de nós foram à guerra por convicção, outros movidos pela propaganda, muitos por inércia, e alguns outros com receio de enfrentar usos e costumes estrangeiros". (..:)
Vasco, lusitano da diáspora que estás sempre a lembrar as tuas raízes bairradinas... e respiras portugalidade por todos os poros... Dava uma série, para o nosso blogue, o feliz título que tu escolheste: "autorretrato de um soldado"...
No fundo, a questão que pões é: "por que é que eu fui p'rá guerra"...
Questão provocatória, incómoda, ou até absurda ?... Alguns camaradas nossos poderão achar que sim... Se a "pátria" te chama, só tens que responder com prontidão... Não foi sempre assim ao longo da nossa história ?... Se calhar não foi sempre assim... A história da nossa pátria está longe de ser um "livro aberto" e ter uma única leitura...
Sabe-se que de 1946 a 1973, dois milhões de portugueses sairam da sua terra, e quase metade (45%), em plena guerra colonial, só no curto período de 1966 a 1973... A maioria em idade ativa e jovem... E muitos deles, portanto, terão sido refratários...
Como alguém disse, o Estado Novo e as suas políticas (incluindo a guerra colonial) foram plebiscitadas pelos portugueses "com os pés"...
As motivações para a saída em massa e ilegal (, "a salto",) são fáceis de perceber: o círculo viciosoa da pobreza, em Portugal, não poderia ser mantido mais tempo, com o "milagre económico europeu" à nossa porta... (Os "trinta gloriosos", as décadas de excecional desenvolvimento económico e social que a Europa conheceu, desde o pós-guerra até 1973)... Já não era preciso ir para o Brasil: a França e a Alemanha estavam ali, à nossa porta, ou pelo menos, a partir dos Pirinéus...
Muitos jovens da nossa geração emigraram, não tanto para fugir à guerra colonail, mas por razões "económicas" (, digamos assim, para simplificar)... E outros (e se calhar muitos) fizeram a guerra para ter direito a um passaporte e poder emigrar (ou passear pelo estrangeiro, estudar, etc.) legalmente...
Lutámos em África também para ter direito a um pátria... De certo modo, foi o teu caso, o meu, e de muitos outros de nós que fizemos a tropa e a a guerra...
Não sei, não temos suficiente evidência empírica sobre esta questão... Cada um, portanto, só poderá falar de si e por si....
Sinto, no entanto, que é não "confortável" para os ex-combatentes falar, para os seus "pares", num blogue como o nosso, com a audiência que o nosso tem, sobre estas "questões do foro íntimo"... Para mais, à distãncia de meio século...
No passado, quando jovens, reagíamos com o corpo inteiro (cabeça, coração, estômago, hormonas, braços e pernas, o chamado "sangue na guelra"...). Hoje tenderemos a "racionalizar" e a "idealizar" as "escolhas" que fizemos no passado (e que estavam longe de serem inteiramente livres...).
Um alfabravo verde-rubro do tamanho do Atãntico que nos separa e que, ao mesmo tempo, nos une... Luís.
3. Comentário de Francisco Baptista [ex-alf mil inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72)] (*):
Amigo Vasco:
O meu percurso é parecido com o teu. sendo eu natural do nordeste transmontano, filho de lavradores ilustrados para o tempo e região, tinham a quarta classe.
Nesses tempos, excluindo os da capital eramos quase todos provincianos, eu influenciado por algumas leituras, não abençoadas pelo regime, pois por falta de meios financeiros, não fui para a faculdade, deixei que me levassem para a Guiné, por inércia, por outros medos e porque tinha 5 irmãos mais novos que precisavam da minha ajuda. (...)
O meu percurso é parecido com o teu. sendo eu natural do nordeste transmontano, filho de lavradores ilustrados para o tempo e região, tinham a quarta classe.
Nesses tempos, excluindo os da capital eramos quase todos provincianos, eu influenciado por algumas leituras, não abençoadas pelo regime, pois por falta de meios financeiros, não fui para a faculdade, deixei que me levassem para a Guiné, por inércia, por outros medos e porque tinha 5 irmãos mais novos que precisavam da minha ajuda. (...)
4. Comentário de José Manel Matos Dinis [ex-fur mil, CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71]
Olá, Vasco,
A mesma frase que lança o Luís em comentário, pode ser acrescida de outras controversas condições: para além da veneração à pátria, e da aceitação das atribuições dela decorrentes, também a transigência aos costumes, e o medo da perseguição e discriminação pessoal e familiar eram condicionantes influentes na decisão de ir à guerra. Se podemos considerar decisão, face ao estatuto de passividade existente.
Eu nem me questionei muito. Se fugisse, nem sabia bem para onde, pois uma paixoneta ou outra em Inglaterra não seriam garantia de nada. Por outro lado, cedo comecei a preparar-me mentalmente para a sorte ou o azar de ir batê-las em África, e fui sem custo especial.
O comentário do Luís tem a virtude de alongar o nosso raio de pensamento sobre a questão, e de nos fazer confrontar, 40/50 anos depois, com o estado de espírito da época.
Ele tem uma interrogação pertinente, "não foi sempre assim ao longo da nossa história?"
Pois a minha resposta é que não sei, em primeiro lugar, porque a história está mal contada, em segundo, porque ao longo do tempo muitos foram arrebanhados para diferentes campanhas, sempre ao serviço dos poderosos, que evitavam a valorização do povo para dele disporem melhor. Ainda é assim. (...)
___________________
Nota do editor:
(*) Vd. poste de 18 de setembro de DE 2014 > Guiné 63/74 - P13623: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (15): Autorretrato de um soldado
domingo, 21 de setembro de 2014
Guiné 63/74 - P13633: Fotos à procura de... uma legenda (34): Missas históricas no Império: do ilhéu de Coroa Vermelha, no litoral sul da Bahia, Brasil (26/4/1500) a Gandembel, Região deTombali, CTIG (25/12/1968)... (António Rosinha / Idálio Reis)
A Primeira Missa no Brasil, 1860. Museu Nacional de Belas Artes, Brasil. Imagem do domínio público. Cortesia de Wikipédia.
A obra prima do pintor académico Victor Meirelles de Lima (Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, 1832 — Rio de Janeiro, 1903) . A tela é um hino ao ecumenismo, ao retratar a chegada pacífica da armada de Álvares Cabral a Porto Seguro, no sul da bahía, e a celebração da primeira missa, no Novo Mundo, assistida pelos habitantes locais, tupiniquins, pertencentes á nação tupi... Os descendentes dessas hstóricas testemunhas da chegada dos portugueses ao Novo Mundo não deverão ultrapassar hoje um milhar...
Na sítio "História da Bahia", Jonildo Bacalar escreve o seguinte sobre esta priimeira missa:
"Quatro dias após ter chegado em Porto Seguro, no Domingo de Páscoa, em 26 de abril de 1500, Cabral determinou que se realizasse uma missa no ilhéu da Coroa Vermelha. Foi a Primeira Missa celebrada em solo brasileiro e o evento foi documentado pela Carta de Caminha. Era o último ano do século 15.
Cabral ordenou a presença de todos os capitães na Missa. Mandou armar um esperavel, e dentro dele um altar mui bem corregido.
A Primeira Missa foi celebrada pelo frei franciscano Henrique Soares de Coimbra, auxiliado pelo padre Marcos de Oliveira Ferreira. No total, eram oito frades, todos franciscanos, todos presentes e todos rezaram.
A bandeira de Cristo, trazida por Cabral de Belém, ficou hasteada durante a Missa. Não há menção de Caminha quanto a existência de uma cruz na Primeira Missa.
Acabada a Missa, frei Coimbra desvestiu-se e subiu numa cadeira alta, de onde fez uma pregação do Evangelho, terminando com referências à chegada dos portugueses na terra achada.
A cerimônia foi também acompanhada pelos tupiniquins. No final, levantaram-se muitos deles, tangeram corno ou buzina, e começaram a saltar e dançar um pedaço." (...)
Cabral ordenou a presença de todos os capitães na Missa. Mandou armar um esperavel, e dentro dele um altar mui bem corregido.
A Primeira Missa foi celebrada pelo frei franciscano Henrique Soares de Coimbra, auxiliado pelo padre Marcos de Oliveira Ferreira. No total, eram oito frades, todos franciscanos, todos presentes e todos rezaram.
A bandeira de Cristo, trazida por Cabral de Belém, ficou hasteada durante a Missa. Não há menção de Caminha quanto a existência de uma cruz na Primeira Missa.
Acabada a Missa, frei Coimbra desvestiu-se e subiu numa cadeira alta, de onde fez uma pregação do Evangelho, terminando com referências à chegada dos portugueses na terra achada.
A cerimônia foi também acompanhada pelos tupiniquins. No final, levantaram-se muitos deles, tangeram corno ou buzina, e começaram a saltar e dançar um pedaço." (...)
Foto: © Idálio Reis (2007). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]
1. Comentário do nosso "mais velho" Antº Rosinha ao poste P13616 (*):
Esta última missa documentada por Idálio Reis, contrasta com a 1ª missa, festejada por índios e pintada por artistas e documentada pela carta de Caminha.
Quatro dias após ter chegado em Porto Seguro, no Domingo de Páscoa, em 26 de abril de 1500, Cabral determinou que se realizasse uma missa no ilhéu da Coroa Vermelha. Foi a Primeira Missa celebrada em solo brasileiro e o evento foi documentado pela Carta de Caminha. (...)-
2. Comentário do editor LG:
Rosinha, é uma legenda genial, a tua, para esta foto, como já te tinha dito... Tens olho de lince e um grande sentido do simbólico, e uma grande sensibilidade sociocultural, ou não fosses tu um português das sete partidas...
Descobri agora esta foto de uma conhecidíssima tela do pintoir brasileiro Victor Meirelles.. Foi pintada em 1860 e teve sucesso nuam exposição em Paris, em 1861.. Espero que os nossos leitores nos ajudem a enriquecer (ou a rescrever) a tua legenda... Há algum paralelismo entre uma e outra imagem, a primeira missa em terras brasileiras domingo de páscoa, 26/4/1500) e a última missa na martirizada Gandembel (natal, 25/12/1968), aquartelamento que será avacuada um mês de depois (E menos de nove meses sofreu mais de 370 ataques e flagelações) (**)....
Já agora convidamos os nossos leitores a conhecer (ou a reler) a famosa Carta de Pero Vaz de Caminha a el-Rei D. Mnauel I, fixada em português moderno e publicada pelo jornal Público, por ocasião do seu 24º aniversário, na sua edição de 5/3/2014.
É um espantoso documento literário e etnográfico que os brasileiros valorizam muito mais do que os portugueses. É também uma fonte de inspiração e um exemplo a seguir por todos aqueles que, tendo sido combatentes na última guerra do império, se identificam com (e/ou seguem) este blogue, mas acham que não têm de nada especial ou excecional para contar ou ou que têm pouco ou nenhum jeito para a escrita. Cite-se a parte final da Carta:
(,,,) "E nesta maneira, Senhor, dou aqui a Vossa Alteza do que nesta vossa terra vi. E, se algum pouco me alonguei, Ela me perdoe, que o desejo que tinha, de Vos tudo dizer, mo fez assim pôr pelo miúdo.
E pois que, Senhor, é certo que, assim neste cargo que levo, como em outra qualquer coisa que de vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro – o que d'Ela receberei em muita mercê.
Beijo as mãos de Vossa Alteza.
Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500.
Pêro Vaz de Caminha"
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 17 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13616: Os nossos capelães (4): O bispo de Madarsuma, capelão-mor das Forças Armadas, em Gandembel, no natal de 1968 (Idálio Reis, ex-alf mil, CCAÇ 2317, Gandembel / Balana, 1968/69)
(*) Vd. poste de 17 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13616: Os nossos capelães (4): O bispo de Madarsuma, capelão-mor das Forças Armadas, em Gandembel, no natal de 1968 (Idálio Reis, ex-alf mil, CCAÇ 2317, Gandembel / Balana, 1968/69)
(**) Último poste da série > 19 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13514: Fotos à procura de... uma legenda (33): Professoras que passaram pelas escolas da Guiné colonial... (Nelson Herbert)
Guiné 63/74 - P13632: Parabéns a você (789): Coutinho e Lima, Coronel Art Ref (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73); Teresa Almeida, Amiga Grã-Tabanqueira (Liga dos Combatentes) e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)
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Nota do editor
Último poste da série de 15 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13609: Parabéns a você (788): Ribeiro Agostinho, ex-Soldado TRMS da CCS/QG/CTIG (Guiné, 1968/70)
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