Foto: © Arlindo Roda (2010). Todos os direitos reservados
A. Continuação da série A Minha CCAÇ 12 (*), por Luís Graça
(7.3) Op Safira Única: recuperados 15 elementos da população sob controlo IN, na região de Poindom/ Ponta do Inglês, destruídos 2 acampamentos e capturado o guerrilheiro Festa Na Lona, oriundo de uma unidade combatente... do Gabu.
Na última operação (*), o IN mostrara-se particularmente agressivo, reagindo à acção das NT durante mais de meia-hora. E o guia-prisioneiro Jomel Nanquitande tentara despistar-nos com manobras de diversão. A frustração era profunda, sobretudo entre os soldados africanos da CCAÇ 12. Mas foi imediatamente compensada pelo êxito espectacular da operação seguinte, uma semana depois.
Sabia-se que na Ponta do Inglês o IN controlava um importante aglomerado populacional que cultivava a bolanha do Poindom. Segundo as informações do prisioneiro Jomel Nanquitande, a população não estava armada, sendo a segurança aos trabalhos agrícolas feita por um grupo que todos os dias se deslocava do Baio (onde há um acampamento com 50 homens armados), fazendo a cambança do Rio Buruntoni (, afluente do Rio Corubal), em canoa.
Em face destes elementos, foi decidido fazer uma batida cuidadosa à área da Ponta do Inglês (ou Gã Garnes, como o PAIGC lhe chamava), a fim de: (i) aniquilar os grupos IN eventualmente detectados, (ii) aprisionar a população que nela vivesse e (iii) destruir todos os meios de vida existentes (Op Safira Única, 2 dias, região de Xime – Gundagué Beafada – Ponta do Inglês).
O conceito da operação era executar a progressão e batida com o Dest A (CCAÇ 12, a 3 Gr Comb reforçados) e o Dest B (CART 2520, unidade de quadrícula do Xime, a 2 Gr Comb), apoiando-se mutuamente, sobretudo a partir de Gundagué Beafada.
Guiné > Zona Leste > Região do Xime (margem direita do Rio Corubal) > Foz do Corubal, tendo à direita a Ponta do Inglês, de triste memória para muitos de nós... Mais acima, na margem esquerda, Ganjauará, perto de Gampará, de triste memória para o Vitor Tavares e os seus camaradas da CCP 121/BCP 12 (Mapa de Fulacunda, Escala 1/50000).
(Detalhes)
Desenrolar da acção:
(i) Em 20 de Janeiro de 1970, pelas 23.30h, a Artilharia do Xime executa uma concentração de 4 tiros sobre a Ponta do Inglês, na margem direita do Rio Corubal (Fulacunda 8I2-95).
(ii) Ao amanhecer, pelas 5h30, saem os 2 Destacamentos do Xime, apoiando-se mutuamente e progredindo com o auxílio de bússola através dum itinerário previamente estudado, de maneira a evitar os trilhos da Ponta do Inglês, usados pelo IN.
(iii) Por volta das 15.30h, já nas proximidades do objectivo (Xime 2B8), foram notados indícios de presença humana: trilhos batidos, moringas nas palmeiras para recolha de vinho e um cesto de arroz.
(iv) Seguindo um dos trilhos, avistou-se um homem desarmado que seguia em direcção contrárias às NT. Capturado, informou: (a) que ia recolher vinho de palma, (b) que a tabanca ficava próxima, (c) que não havia elementos armados e (d) que a maior parte da população estava àquela hora a trabalhar na bolanha do Poindom.
(v) Feita a aproximação com envolvimento, capturaram-se mais 2 homens, 5 mulheres e 6 crianças, andrajosos e aterrorizados. Um dos homens capturados disse chamar-se Festa Na Lona, de etnia balanta, estar alí a passar férias (sic) e pertencer a uma unidade combatente do Gabu (Nova Lamego). Foi-lhe apreendido uma pistola Tokarev (7,62, m/ 1933) e vários documentos.
Foto à direita: Uma pistola de origem soviética, Tokarev m/1933, de 7,62, igual ou parecida à que que foi apreendida ao guerrilheiro Festa Na Lona, na Ponta do Inglês, no decurso da Op Safira Única ...
Pelo que me recordo, esta pistola ficou à guarda do Alf Mil Abel Maria Rodrigues, transmontano, comandante do 3º Grupo de Combate da CCAÇ 12, que a tomou como ronco... Não sei (mas ele pode-nos dizê-lo, já que é membro da nossa Tabanca Grande), se a conseguiu trazer para a Metrópole e legalizá-la...
Ao que parece, esta arma teve a sua estreia na Guerra Civil de Espanha, em 1936, nas fileiras do exército republicano, estando distribuída a pilotos e tripulações de tanques, entre outros... (Para saber mais, ver o que diz o nosso especialista em armamento, Luís Dias, sobre esta pistola soviética).
(vi) Havia 2 tabancas (ou melhor: barracas), cada uma com 4-5 moranças, afastadas umas das outras cerca de 200 metros. Cada casa era revestida de chapa de bidão e coberta de capim. Para o efeito foram aproveitados os bidões existentes no antigo aquartelamento da Ponta do Inglês que as NT retiraram em Novembro de 1968.
Foram destruídos todos os meios de vida encontrados e incendiadas casas, à excepção das que ficaram armadilhadas (a 1ª e a última, no primeiro acampamento). A localização do acampamento era em Xime 2A5-93.
Mais notável, os 2 Dest executaram toda a acção sem disparar um único tiro...
(vii) A retirada fez-se igualmente a corta-mato em direcção de Gundagué Beafada, tendo-se chegado ao Xime pelas 18.30h do dia 21.
(viii) Os prisioneiros ficaram às ordens do comando e CCS do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). Lembro-me particularmente do ar aterrorizado das crianças, nuas, ao ouvir o ronco de uma GMC... Eram miúdos nascidos no mato. Já não recordo de qual terá sido o seu destino: como era usual, eram entregues à autoridade administrativa local e acabavam por ser integrados nalguma tabanca mais próxima, com gente da sua etnia (balantas ou beafadas). Todos os anos era o mesmo drama, com esta pobre gente que trazíamos do mato, na altura da época seca, e para qual não havia, no quartel de Bambadinca, as condições mínimas de acolhimento... (Vd., a este propósito, as memórias do alferes capelão Arsénio Puim, que pertenceu à CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72).
(ix) Durante a noite, a Artilharia fez fogo de concentração sobre os acampamentos IN do Baio/Buruntoni e Ponta Varela/Poindom.
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Fontes consultadas:
História da CCAÇ 12: Guiné 69/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores nº 12. 1971. Cap. II. 24-25.
Guiné 68/70: História do Batalhão de Caçadores nº 2852. Documento policopiado. Bambadinca: BCAÇ 2852. 1970. Cap. II. 131-132.
Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, I e II Séries
Diário de um Tuga (notas pessoais de L.G.)
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Nota do editor:
(*) Vd. poste de 17 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7957: A minha CCAÇ 12 (14): Op Borboleta Destemida, 14 de Janeiro de 1970: a ferro a fogo no Poindon/Ponta Varela ou... como nunca confiar num guia-prisioneiro (Luís Graça)
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