1. Publica-se hoje, para quem ainda não conhece, mais um documento que faz parte da história da guerra na Guiné (mencionado no poste P8644 e matéria com o mesmo relacionada). É um reprodução integral da narrativa original que a direcção da revista “Combatente” entendeu resumir, nas páginas 47-49 da s/edição Nº 346, publicada em 12Dez2008 – já o autor - Sr. Cor. António Vaz Antunes (21JUN1921 a 14OUT1998) havia falecido, com a simples indicação «síntese de documento enviado à LC». Na dita revista foram omissos o título original do documento bem como a data em que o mesmo foi enviado à direcção-central da Liga dos Combatentes. Também por omissas foram dadas as funções militares que o autor então desempenhava na Guiné [comandante do BCAÇ 4512/72 - RI15, Farim 13Jan73-29Ago74], e a data do seu falecimento.
Guiné: uma diligência interrompida. Porquê?
António Vaz Antunes
(Coronel de Infantaria)
Mafra, Abril de 1987
Depois da Operação Guidaje,
em Maio de 1973, para apoio e reabastecimento àquela guarnição,
sucederam-se vários movimentos de colunas, de ida e volta, todas com ponto de
passagem em Farim, cujo sector era, por isso, muito empenhado em picar itinerários,
montar seguranças, alimentar e prestar toda a ordem de apoios ao pessoal de
passagem. Isto provocava um enorme desgaste nos elementos dos órgãos de comando
do sector que, durante vários dias, não puderam contar com um horário normal de
actividade. Dormir o indispensável era nas horas mais variadas, de dia ou de
noite, nos curtos intervalos de acalmia.
O comandante da companhia Capitão Miliciano Vasco Vale, ao ver-me chegar imprevistamente, não escondeu a sua surpresa nem tão pouco a sua preocupação por deduzir, após a explicação da minha presença, que se punha em dúvida a sua capacidade para enfrentar a situação.
Tranquilizei-o, afirmando-lhe que não ia interferir no seu comando, confiava no seu serviço de informações (que não previa nenhum agravamento da situação a curto prazo) e que ia aproveitar para descansar. Aliás, com o mesmo intuito, levava comigo o oficial de operações (1) e o oficial de transmissões (2) que eram os mais desgastados com a Operação Guidaje e os problemas de coordenação que se seguiram com as já referidas colunas.
Distribuídos os alojamentos, depois da troca de impressões sobre a situação no subsector, os três demos de imediato cumprimento ao nosso programa: pôr o sono em dia.
A descontracção que propositadamente vivia apenas era importunada pelo clima que, em Junho, a preceder o período das chuvas, era ainda mais incómodo.
As manhãs eram agradáveis, pelo bulício resultante da chegada de senegaleses que, a partir das nove horas, acorriam ao nosso Posto Médico.
Os homens da Companhia Eventual também ali sediada, constituída por Fulas, todos voluntários, e sem quadros (3), quando estavam presentes aproveitavam para se abeirar das vistosas senegalesas todas enfeitadas, e faziam-lhes a corte à sua maneira: era a hora do ronco dos namorados.
O Capitão Vale entretanto colhia habilmente as notícias que lhe interessavam. Nada de novo.
No dia 29 de Junho, sábado, surgiu o inesperado: três helicópteros são detectados em aproximação à pista (4) e simultaneamente uma mensagem faz saber que está a chegar [era] o General Spínola [a chegar].
Havia já vários meses que nenhum meio aéreo tinha sido visto em Cuntima, excepto para raras acções de evacuação consequência das medidas preventivas contra a utilização do míssil terra-ar pelo PAIGC. Com efeito junto à fronteira não podia arriscar-se sem as adequadas medidas de segurança por ser sempre possível um lançamento partindo do Senegal.
A aterragem dos helicópteros foi festa.
Por mim encarei com certa apreensão a visita do Comandante-Chefe. A Operação Guidaje, embora tivesse dado já origem a referências especiais e muito elogiosas, não estava para mim terminada. Aguardava a oportunidade para explicações e não me tinha preparado para a discussão que previa fosse muito dura.
Eis senão quando o Comandante-Chefe desembarca sorridente, não quis fazer o questionário que lhe era habitual nas visitas aos comandos operacionais, adiantou que confiava nas medidas tornadas pelo sector e, depois de uma breve exposição do Capitão Vale sobre a situação na sua área, pediu apenas para ficarmos a sós no Gabinete do Comandante da Companhia.
Quando supunha que iríamos entrar no caso Guidaje o General nem se lhe referiu. No tom mais cordial que imaginar se possa contou-me o que tinha sido a sua acção desde que chegara à Guiné, nos contactos com o Presidente Senghor, os contactos com os comandos do PAIGC nos tempos de Amílcar Cabral e as suas diligências na interferência da escolha do próximo Secretário Geral do PAIGC cuja eleição ia ocorrer dentro de dias.
Tudo eu ouvi com um misto de surpresa e curiosidade. Muita novidade para mim e ao mesmo tempo muitas interrogações íntimas, permanentes, mas contidas: porquê esta abertura? Porquê esta abordagem de temas tão secretos, comigo que não pertenço a tal círculo? Será só para desvanecer a minha animosidade por causa dos precedentes da Operação Guidaje? Virá aí alguma missão especial? Porquê esta conversa longa, pormenorizada, esta exposição da situação de áreas tão confidenciais?
Fiquei meio atónito quando o General, que continuava [sempre] bem-humorado, se despediu de todos e regressou a Bissau.
Sempre tive a preocupação de respeitar o segredo e habituara-me a controlar a curiosidade. Sempre considerei que, em matérias classificadas, não se deve fazer pressões nem usar habilidades para conhecer mais que aquilo que o superior entenda poder e dever dizer. Por isso não fiz perguntas, limitei-me a ouvir e apenas pretendi deduzir, mas não encontrava fácil explicação para esta visita nem resposta para as perguntas que a mim próprio punha. A dúvida mantinha-se no meu espírito.
Também os meus subordinados estranhavam o modo como tudo decorreu, tão fora do que era hábito em visitas do Comando-Chefe às unidades operacionais.
Mas eis que no dia seguinte, 30 de Junho de 1973, domingo, cerca do meio-dia, me procura um indivíduo fula, não guinéu, que eu conhecia desde que assumira o comando do sector por contactos estabelecidos em Farim. Era um agente de informações com o nome de código “Padre”, ao que se sabia pertencente ao “Front” da Guiné-Conackry e com especial aceitação no Comando-Chefe.
Nunca lhe perguntei o que fazia, mas facilmente se deduzia pelos apoios que lhe eram concedidos: era obsequiado em Farim pelo agente da DGS, vinha de Bissau, em regra, em avião militar e no sector havia instruções para lhe ser facultado transporte sempre que o pedisse. Dirigia-se a Cuntima e, dali, em regra ao Senegal.
Havíamos passado alguns serões em Farim falando em generalidades e, quando ele entendia, em problemas da guerra. Tinha formação de curso superior e falava apenas em francês e fula. Era bastante culto e muito correcto no trato. Talvez por nunca o ter importunado com perguntas incómodas, em obediência ao meu princípio de respeito pelo serviço de informações, fui, a pouco e pouco, ganhando a sua confiança e até a sua amizade.
Foi por força desta mútua confiança que ele agora me procurou e pediu que fizesse uma mensagem relâmpago para Bissau solicitando a presença do General Spínola nesse dia, ali em Cuntima, para um contacto com alguns [altos] dirigentes do PAIGC (5).
Pareceu-me, agora, perceber o que se passara na véspera.
Acedi ao pedido, redigi a mensagem, retroverti-lha [traduzi-a] para francês para verificação e fi-la seguir. Por volta das 14:00 horas é recebida a resposta de Bissau. Pretendia o Comandante-Chefe explicações de pormenor. O agente estranhou tal pedido uma vez que o General sabia do que se estava a passar e o seu retardamento podia prejudicar o resultado de todo um trabalho de meses.
Fez-se, no entanto, rapidamente novo texto, um pouco mais explícito. [e] Cerca das 16:00 horas vem a resposta à segunda mensagem: àquela hora já não se podia fazer a deslocação porque o regresso não era possível antes da noite e os helicópteros não estavam preparados para isso.
Foi um balde de água fria para o agente que, mal tomou conhecimento da mensagem saiu, desesperado; era, segundo dizia, todo o esforço perdido, o seu crédito junto do PAIGC abalado e, provavelmente, a impossibilidade de preparar outro encontro.
Não escondia a sua angústia.
Passado algum tempo regressa e procura-me. Trazia agora uma conversa com pouco nexo contrariamente ao seu habitual, e exteriorizava nervosismo. Pedia-me que o ajudasse, na circunstância, mas não concretizava a ajuda que queria.
Em dada altura, e perante o seu embaraço, pretendi acalmá-lo e fazer com que reflectisse friamente na situação: a reunião não podia fazer-se sem o General e ele não vinha, “ou acha que eu posso substituir o General” - perguntei em tom jocoso por supor que não tinha sentido resposta afirmativa. Mas eis que os olhos do meu interlocutor adquirem um brilho especial e ele me retorquiu:
- Mas o Coronel vai? É que eu não me atrevia a pedir, mas é mesmo essa a única hipótese de salvar a situação criada pela recusa do General Spínola.
Depois de argumentar que não estava credenciado para tal missão e de uma troca de impressões sobre o que ele pretendia, acabei por dizer-lhe:
- Nós estamos proibidos de contactos deste género mas porque confio em si aceito ir.
Eram cerca das 18:00 horas. O pessoal presente no aquartelamento preparava-se já para a 3ª refeição servida em quatro refeitórios separados, por razões de segurança. Chamei o Capitão Vale e expus-lhe resumidamente o que se passava. Precisava que ele, com toda a discrição, no final do jantar enviasse dois grupos de combate para os lados da fronteira na missão habitual de segurança afastada, que todos os dias era montada ao anoitecer em direcções diferentes; recomendei-lhe que desse a tudo o ar mais natural, mas esta missão tinha por finalidade actuar contra qualquer emboscada de que eu viesse a ser vítima e, se necessário, desenvolver uma acção de retaliação.
O Capitão Vale, homem já experiente na vida e com sentido prático muito refinado, bom caçador, entendeu rapidamente, perguntou-me apenas se o autorizava a acompanhar-me (disse-lhe que sim) e saiu de imediato a tomar as disposições requeridas.
Simulando ir à caça, montámos numa viatura e seguimos pela estrada cerca de 800 metros . Depois apeámos e dirigimo-nos ao marco nº 104 da fronteira. Ali chegados o agente estranhou que ainda não estivessem [lá] os interlocutores e não escondeu uma certa apreensão. No entanto aguardamos. Passados uns minutos vem alguém do outro lado, de bicicleta. Vem informar que o interlocutor está dentro do Senegal, receia vir até nós (terá dado conta do movimento das nossas tropas?) e solicita que nos desloquemos nós.
Recusei.
O agente insiste, pretende que eu me disfarce com um albornoz, mas não aceitei porque o disfarce não atenuava aquilo que eu considerava indisciplina: entrar em território estrangeiro. Ele porém pedia-me agora com todo o empenho que não desistisse de prosseguir na decisão tomada de não deixar gorar esta oportunidade única.
A argumentação convenceu-me e fui.
A noite estava cerrada. Na nossa frente viam-se as luzes de uma povoação senegalesa, já próxima. Caminhávamos em silêncio. Chegávamos ao local indicado pelo mensageiro da bicicleta, cerca de um quilómetro dentro do Senegal, quando se notou a aproximação de um automóvel que parou a duas centenas de metros, do qual saíram dois indivíduos que se dirigiram a pé para nós [a pé].
Era o [nosso] interlocutor.
O agente fez as apresentações e eu estendi-lhe a mão - o que, segundo soube mais tarde, o sensibilizou muito. Tratava-se do [ele era o] representante pessoal do Comandante Geral das forças do PAIGC.
Não podíamos demorar-nos porque era imperioso evitar qualquer detecção quer por parte de elementos das forças de segurança senegalesas quer por parte de elementos do PAIGC não envolvidos nesta diligência, e por isso o interlocutor foi directo:
- Não venho tratar de assunto pessoal nem de grupo restrito. Trata-se sim de problema[s] que diz[em] respeito a todos os combatentes do PAIGC. Andamos há já [há] dez anos nesta luta. Somos agora menos do que quando começámos. Actualmente não nos entendemos com o escalão político: eles são caboverdeanos e comunistas; e nós somos guinéus, combatentes e não comunistas. Desejamos apenas uma Guiné melhor. Já chegámos à conclusão de que, sozinhos, não somos capazes de a fazer, mas sê-lo-emos convosco. A nossa proposta é muito simples: em dia e hora que se combine acaba a guerra, nós seremos integrados nas forças da Guiné, sem recriminação nem vingança; e depois, juntos, faremos a Guiné melhor. Tudo isto tem que ser combinado em curto espaço de tempo e com o maior segredo, porque se fôr descoberto antes do tal dia e hora terei a mesma sorte que outros companheiros meus já tiveram.
Isto dito assim de chofre deixou-me um pouco perplexo e retorqui apenas:
- Do que propõe, eu, que não sou [o] Comandante-Chefe mas apenas um comandante de sector, somente posso dar como aceite com toda a certeza, já, que recriminações ou vinganças da nossa parte nunca haverá: temos todos instruções severas nesse sentido. Quanto a rapidez, amanhã mesmo vou pessoalmente dar conhecimento da sua proposta. No que se refere à segurança dos elementos que eventualmente venham a participar em conversações futuras, no caso do [se o] General comandante [chefe] concordar com a continuação dos contactos também posso garantir que os podemos recolher em qualquer ponto à vossa escolha e voltar a colocar onde desejarem.
- Eu compreendo que não pode adiantar mais do que isso, e eu próprio também apenas posso transmitir o que já disse. Não tenho poder de decisão. Mas agradeço-lhe ter vindo a este encontro e peço apenas um sinal para autenticar ou selar esta conversa.
- O sinal de autenticação que nós usamos, em conversa, é a palavra de honra. E eu dou a minha palavra de honra de que vou transmitir o que ouvi e que são verdadeiras as afirmações que fiz.
- Nós não usamos a palavra de honra, costumamos jurar perante Deus.
- Pois estamos aí à vontade: não teremos a mesma religião, mas certamente acreditamos no mesmo Deus Único, e Criador. Por mim, quando dou a palavra de honra faço-o sempre em termos de juramento perante Deus.
- Certo, mas se pudéssemos ter um sinal deste compromisso era bom.
- Pois eu julgo que já dei sinal de boa vontade: vim até aqui confiado apenas na honestidade do nosso intermediário.
Nisto o homem parece ter-se sentido atingido e interrompeu-me dando-me como que um abraço.
- Desculpe, desculpe. O senhor fez mais do que eu pois veio aqui enquanto que eu tive medo de ir ao lugar combinado.
Impunha-se que não demorássemos mais o diálogo. Fazem-se as despedidas rapidamente. Quando me apertava a mão (era o dobro da minha) dizia-me:
- Estou muito feliz. Desde há dez anos é a primeira vez que estou em conversa agradável e a primeira vez que estou desarmado.
De novo repetiu o seu agradecimento.
Regressamos alvoroçados. Teríamos nós o privilégio de ser os intermediários e os primeiros intervenientes num processo que levaria a um próximo fim da guerra com honra para ambas as partes?
Mal dormi, ansioso pela madrugada, pelo regresso a Farim, pelo avião dessa 2ª feira que me levaria a Bissau, pelo encontro com o General Spínola.
Eram 18:50 horas do dia 1 de Julho de 1973 quando cheguei ao Palácio do Governo em Bissau. O Capitão Ayala, ajudante do Governador e Comandante-Chefe atendeu-me.
Disse-lhe que tinha urgência em falar com o General Spínola.
- Não me diga que é por causa do contacto de Cuntima.
- Precisamente.
- O nosso general não o poderá receber agora porque tem o briefing às 19:00 horas no Quartel-General e vai já para lá.
- Diga-lhe que estou aqui, que não o demoro com o que tenho a dizer-lhe e que é do maior interesse não atrasar; os minutos contam.
O General recebeu-me de imediato.
- Então hoje já aqui?
- É verdade meu general. No sábado estivemos em Cuntima, não contava nada com esta vinda, para a qual nem pedi autorização, mas como fui ao contacto que estava preparado para V.Exª...
- Então o senhor não sabe que proibi todos os contactos; não sabe o que aconteceu aos três majores? Atalhou o general, irritado, levantando-se e crescendo para mim.
Mantive-me sentado, cruzei as pernas e retorqui:
- Sei e até era muito amigo de dois deles, mas entendi que era meu dever ir, e fui.
- Espere lá, mas afinal você está aqui; conte lá.
E sentou-se de novo para ouvir o resumo que lhe fiz da conversa e das propostas do interlocutor do PAIGC.
O General voltou a levantar-se, agora com entusiasmo, abraça-me ao mesmo tempo que [e] diz:
- Mal sabe o alto serviço que acaba de prestar à Nação!
- Ainda bem. Estou feliz por isso.
Dirige-se ao telefone liga para Lisboa e ouvi-lhe o seguinte:
- Allas? (era o chefe da DGS em Bissau) Está bem? Tome o avião amanhã e venha aqui.
- Pois, sei bem que foi ontem de licença... É pena não poder vir ainda hoje, pois temos aqui coisa importante que requer já a sua presença.
- Está bem, mas tenha paciência. Espero-o amanhã. Um abraço!
O General agradeceu-me de novo. Vai a sair para a reunião mas faz questão que o acompanhe a jantar no Palácio.
Era a terceira vez que me convidava para jantar na sua residência.
Não falámos mais sobre este caso. Ficou acordado que se manteria total segredo e que seria pessoalmente contactado para qualquer interferência futura se fosse necessário.
Os curiosos de Bissau bem tentaram saber da razão da minha presença ali tão imprevista. Fui escapando como pude do cerco de perguntas.
Na 3ª feira regressei a Farim onde poucos dias depois pude observar, por duas vezes, a passagem dos helicópteros que transportavam interlocutores que deviam dar continuação aos contactos de Cuntima.
O sector passou a conhecer uma tranquilidade esperançosa.
Em Agosto entrei de licença. Na metrópole soube da substituição do General Spínola pelo General Bettencourt Rodrigues. Fui à tomada de posse deste último. Ouvi os discursos e pareceu-me que estavam em dessintonia com tudo o relatado, o que muito me surpreendeu. Preso como estava à promessa de segredo não perguntei nada. Já em Bissau pedi audiência ao novo Comandante-Chefe. Abordei o caso e tive a resposta que me surpreendeu: não sabia de nada.
O agente que tinha preparado o encontro em Cuntima, manifestou-me, em Farim, o seu desgosto por se aperceber de que tudo voltara ao princípio. Não entendíamos o porquê da viragem, que era notória.
Um dia, no bar do Estado Maior do Exército, já em 1976, contava o caso [este episódio] a uns camaradas, dado que a manutenção do segredo já não tinha razão de ser.
O então Major Monge estava ao lado e certamente ouvindo o meu relato, porque a dada altura interrompeu-me e diz:
- Afinal foi o meu coronel quem provocou o 25 de Abril.
Fiquei atónito. Mas imediatamente me veio à memória que tinha lido dias antes, uma informação do Chefe do Estado Maior General da Forças Armadas (o então General Costa Gomes) para o Governo (do Dr. Marcelo Caetano) segundo a qual para Portugal era preferível na Guiné um desastre militar a uma solução negociada...
Porquê?
(1) Capitão Beato
(2) Alferes Miliciano Costa
(3) O comandante da companhia em operações era o Cabo Sitafá
(4) Já uns dias antes tentada mas sem concretização por causa de forte trovoada
(5) Contacto que, segundo me disse, «vinha preparando havia alguns meses»
__________
Nota de M.R.:
Vd. também o poste relacionado com esta matéria em:
6 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 - P8644: Recortes de imprensa (43): O pacto secreto de NINO com a PIDE, jornal TAL & QUAL, 14 Maio 1999 (Magalhães Ribeiro/Manuel Marinho)
Vd. último poste desta série em:
22 comentários:
A politica tem razões que a razão desconhece.
Ora aqui está um documento histórico.
Muito se podia especular sobre este assunto,mas não o vou fazer.
Só pergunto,PORQUÊ ?PORQUÊ ?
C.Martins
Relatos que de facto fazem a história.
Interessante. Quantas mais situações ainda por conhecer?
Os meus agradecimentos a quem tem e divulga o que sabe, só assim avançamos e chegamos mais próximo da verdade.
BSardinha
De alguma maneira este documento complementa o que foi publicado sobre o Nino.
A actividade da PIDE, por outro lado, também se espelha na manipulação aqui descrita sobre a eleição do novo líder do PAIGC.
Informação e contra-informação foram tentadas e existiram. Apesar do grande falhanço da Operação Mar-Verde, e do caso dos majores, Spínola desenvolveu uma acção meritória neste âmbito, que terá falhado pela oposição quase sistemática de Caetano.
Aqui reside o busilis, porque terá sido Caetano tão incongruente? Porque Spínola tomou iniciativas sem o seu aval? Será que informava atempadamente o governo sobre os sucessos eminentes destas acções, por forma a arquitectar-se um projecto?
É que o político concordou com a Mar-Verde, provavelmente na esperança de um sucesso que lhe grangeasse prestígio, na medida em que também enfrentava dificuldades de relacionamento interno que lhe corroíam a imagem.
Pode concluir-se, afinal, que se trataou de uma guerra particular entre Caetano e Spínola, e que se este viesse a alcançar a presidência, aquele teria os dias políticos contados.
E o ministro do ultramar, que papel desempenhava, que ligações garantia, até que ponto os assuntos militares lhe estariam vedados e ficava alheio às negociações?
E,nesse caso, também se poderá concluir, que os interesses particulares daqueles dois, sobreposeram-se aos da Nação.
Mas ainda ressalta outra ilacção: se os capitães tivessem apenas destituído o governo, e dessem execução a uma política mais aberta a negociações, as relações com os movimentos teriam tido outro desfecho, e a eventual transição para as independências poderia ter sido prevenida de lutas fraticidas, vinganças, e da enorme destruição de estruturas socias e económicas que vieram a acontecer.
Mas não se pensou nisso.
Abraços fraternos
JD
Recordo a presença do Sr. Cor de Inf António Vaz Antunes em Guidage, a sua chegada ao posto de comando, como comandante da 1ª coluna de auxílio e reabastecimento do dia 10 de Maio de 1973. Pareceu-me um oficial disciplinado. Não sabia do seu falecimento.
Esta postagem, oportuna, poderá dizer-se que completa a P8644, de 6-8-2011...
Deus ofereceu uma oportunidade única, para o ultramar ter um desenlace histórico bem diferente, que não foi aproveitada.
Porquê?
Porque os homens erram e o Diabo ajudou.
Um Abraço
José Pechorro
– o documento emitido em Abr87 pelo cor. Vaz Antunes, foi remetido em 05Ago2008 ao UTW - e naquele portal prontamente aceite e colocado online em nova subpágina 06livros_antoniovazantunes.htm -, ou seja, desde aquela data ficou disponível na internet;
– só assim se pode entender que a direcção-central da Liga dos Combatentes, à qual o citado oficial havia - em devido tempo - entregue um exemplar, tenha por via de uma tal "exposição na internet" sido forçada a
"recuperar dos arquivos" o supra transcrito depoimento, mau grado a "sintética" forma em que o fez... , extemporaneamente e sem quaisquer merecidos destaques ou apreciações;
– na sequência da troca de impressões (verbais e escritas) com um veterano, que comandou um pelotão de cavalaria na região de Farim e também leu na internet a "perplexidade" do coronel, foi então o conteúdo da supracitada subpágina do UTW reformulado, tal como desde então se apresenta, e desde esta madrugada aqui aberto à consideração de quantos visitam este blogue.
Cpts,
JCAS
Meus Caros Camaradas;
Venho apenas dizer que, quem aparece na fotografia é o Sr. Tenente-General João Nuno Vaz Antunes, que ainda se encontra no activo e é filho do já falecido Sr. Coronel António Vaz Antunes.
Um Abraço a todos os Camarigos, do
Joaquim Sabido
Évora
Ao ler-se,no último período do texto:"Uma informacäo do Chefe do Estado Maior General das Forcas Armadas(General Costa Gomes)para o Governo (Marcelo Caetano)näo está,aparentemente, de acordo com o que tanto Spínola como Costa Gomes sempre afirmaram quanto a ter sido Marcelo Caetano que os teria surpreendido com a afirmacäo de que seria preferível uma derrota militar a iniciar negociacöes políticas.O próprio Marcelo Caetano também refere este facto nas suas memórias.
Pois, o marechal Costa Gomes, também conhecido por "rolha" ou "cortiça"...
O homem dizia uma coisa hoje, e amanhã mudava de azimute. Enfim, boiava à tona dos azeites.
A Isabel Vaz Antunes, filha do coronel Vaz Antunes, por quem tenho todo o respeito do mundo, foi minha colega na Escola Secundária José Saramago, em Mafra, durante quase vinte anos.
Falou-me muitas vezes, com imenso orgulho, do seu pai, e já me tinha contado este singular episódio.
Apenas à atenção dos falsificadores (ia a escrever aldrabôes, mas não escrevo)
da nossa História 1973/74, na Guiné.
Forte abraço,
António Graça de Abreu
A tal guerra que estava ganha e o território todo libertado!!!
Curioso que há "noticias" que são capas de jornal e outras vai-se tentado fazer de conta que não existem.
É pobre, muito pobre, o jornalismo português.
Amigo João Sabido, Já retirei a foto, que, como é óbvio, pensava ser do Sr. Cor. Vaz Antunes.
Será possível, junto do Sr. TGEN João Nuno Vaz Antunes, Obter uma foto do Sr. Cor. António Vaz Antunes?
A finalidade é ilustrar este apreciado e louvado poste (quer pelas mensagens aqui recolhidas quer por telefonemas e e-mails que me estao ser dirigidos).
Um Abraço Amigo do,
Magalhães Ribeiro
"Actualmente não nos entendemos com o escalão político: eles são caboverdeanos e comunistas; e nós somos guinéus, combatentes e não comunistas..."
O encontro aqui retratado, de resto um indiscutivel testemunho a clarificacao de aspectos mais obscuros da historia da luta/guerra travada na Guine,tem por horizonte temporal, o pos morte de Amilcar Cabral...um periodo convenhamos marcado pela intensificacao das accoes armadas da guerrilha ( Guiledje e Guidage e Gadamael)e de uma intensa "purga" ou "depuracao" interna no seio do movimento guerrilheiro...com o complot que culminou no assassinato do lider guerrilheiro, a servir de mote !!
Por outras palavras,ocorre numa altura, em que o proprio PAIGC (ingenuamente) acreditava ter desvendado a real dimensao da implicancia interna de uns e outros na morte do seu lider...e consequentemente o fecho ao cerco a dita "traicao" !!!
Dai que, ate que a historia traga mais luz...a real dimensao dessa "dissidencia"...(do "NOS" guineus,combatentes e não comunistas...) e seu impacto numa eventual mudanca do curso dos acontecimentos na Guine ...independentemente do impacto desmoralizante que pudesse ter ( afinal nao estaria a guerrilha refazendo-se do duro golpe,a morte do seu lider) o hiato na historia, esse persistira !!!
A dissidecia de um grupo de guineenses alteraria o desfecho do conflito ?
Mantenhas
Nelson Herbert
Guineense
Caro Graca de Abreu. No meu comentário levanto uma pergunta quanto à aparente contradicäo entre o que Marcelo Caetano escreveu sobre conversa tida com Spínola quanto ao antes desejar uma derrota militar na Guiné do que negociar com o PAIGC.Conversa confirmada por Spínola,e,aparentemente,nas afirmacöes de ambos existe uma contradicäo com o que surge no último período do poste.Costa Gomes que afirmara ser a Guiné defensável na altura,escreve sobre o assunto o mesmo que Spínola e Caetano.Levanto uma simples pergunta factual,ficando grato a quem possa esclarecer este último período do texto,que,repetindo-me,aparenta estar em contradicäo com as afirmacöes destes 3Senhores.Os juízos de valor quanto ao Sr.Coronel,à Sua filha,ou a Costa Gomes,säo os teus ,como o seräo certamente de muitos outros.Näo posso no entanto concordar contigo quando apontas como algo de original o facto de se "mudar de azimute" pois alguns ,aparentemente, têm tido posicöes políticas bem distintas em diversos períodos das suas vidas.Alguns com bons resultados pessoais como,(um exemplo entre outros), o caso do Sr.Dr.Duräo Barroso.
Caros amigos e Nelson Herbert, escreveste (e sou em grande parte da mesma opinião)o seguinte:
" Por outras palavras,ocorre numa altura, em que o proprio PAIGC (ingenuamente) acreditava ter desvendado a real dimensao da implicancia interna de uns e outros na morte do seu lider...e consequentemente o fecho ao cerco a dita "traicao" !!! "
Porque és um cidadão guineense, e portanto mais previlegiado do que muitos de nós, no conhecimento do teu povo, queria colocar-te a seguinte questão:
Até que ponto, ou que dimensão teve a participação de diversos agentes (DGS,PSICO,Congressos do povo,etç, e outros dos países limitoferes)no aprofundar dos conflitos, primeiro étnicos e consequentemente nas fileiras do PAIGC.
E claro, tendo-se em consideração o falhanço quase total da operação Mar Verde, no seu principal objectivo.
Naturalmente que sendo esta questão colocada ao amigo Nelson Herbert, é tambem extensivel a todos os outros.
C/ um abraço, Carlos Filipe
ex- CCS BCAÇ3872 Galomaro/71
amigo Nelson Herbert, é tambem extensivel a todos os outros.
Amigos, naturalmente.
Filipe
Belo,
Durante a leitura dei-me conta dessa contradição de conceitos, sobre a defensabilidade da Guiné pelas NT.
Julgo tratar-se de gralha, face ao ineditismo da afirmação.
Admito, no entanto, que os historiadores possam esclarecer-nos sobre esta matéria relevante.
Abraços fraternos
JD
Meu caro Zé Belo
Claro que mudamos, só os burros não mudam.
Fui para a China em Setembro de 1977, ainda meio maoísta. Bastou um mês de vivência em Pequim para entender quanto equívoco no meu pensamento pequeno-burguês radical! Depois, foram os
dois anos primeiros de muita lágrima a
correr por dentro até encharcar o coração. A decepção com os homens. Pelo meio, sair do atoleiro, dar a volta por cima, estudar, aprender, ir em busca da grande China clássica que vale todas as penas, a da civilização, da cultura, do depurar de sensibilidades e entendimentos do mundo.
Ainda bem que fui meio maoísta. Foin assim um mundo fantástico que se abriu diante de mim. E já publiquei catorze livros com a China lá dentro.
Na Guiné fui um pobre (?) alferes. O general, marechal Costa Gomes foi o que foi, foi mudando conforme
o assoprar dos azeites. Burro não era.
É minha opinião, claro, discutível como todas as opiniões.
E porque sou consequente, amanhã de manhã vou outra vez para a China. regresso a 27 de Agosto.
Pena não te levar no meu grupo. Teríamos quilómetros de conversa para desenrolar.-
Abraço amigo,
António Graça de Abreu
Já tinha lido este documento. Tinha quase a certeza que aqui no blogue. Vejo, porém, que me enganei. Terá sido no ultramar.terraweb.
Abraço,
Carlos Cordeiro
Amigos & Camaradas
1 - O Sr Cor Vaz Antunes, não fez a Comissão completa como Comandante do Bat Caç 4512/72 como é referido na introdução. Este Batalhão teve 4 Comandantes. Vid Liv de Fichas das Unidades do EME pág 167.
2 - – Quando o JCAS diz que: o documento emitido em Abr87 pelo cor. Vaz Antunes, foi remetido em 05Ago2008 ao UTW - e naquele portal prontamente aceite e colocado online em nova subpágina 06livros_antoniovazantunes.htm -, ou seja, desde aquela data ficou disponível na internet; devo informar que o texto foi publicado em data anterior a 05Ago2008, pois eu já o tinha visto e fiz cópia do mesmo retirada de http://www.geocities.com em 24-01-2008, donde, pelo menos, foi publicado antes 8 meses do que a data referida. Mas foi com certeza publicado muito antes e já é conhecido há muito tempo.
Como vêem o texto já corre Mundo muito antes das datas indicadas
Ainda não publiquei nada sobre esta matéria na pág do BCaç 4512/72 do meu Site www.carlosilva-guine.com, porquanto tenho trocado impressões com vários camaradas do BCaç 4512/72 e tenho ouvido várias versões e por isso sempre será melhor colher mais informação em vez de narrar baboseiras sem conhecimento
Um abraço amigo
Carlos Silva
Caríssimo Amigo e Camarada Graca de Abreu. Desejo-te uma boa,e mais uma vez por certo muitíssimo interessante,viagem atá à China.Lamento näo te acompanhar porque,como täo bem escreves,muito teríamos,näo para discutir,mas antes para debater.Seriam muitos "gritos de alma" ao luar do Oriente,só que,como o poeta que és...estarias sempre em vantagem. Um grande abraco e Boa Viagem!
Honoravel Antonio Graça de Abreu,nesta vida até os burros mudam.
Só não muda quem já perdeu a capacidade e aprender ou na escola ou na vida.
Um abraço e muita saúde para todos nós.
Amilcar Dias
Amigos & Camaradas
JCAS
1- Não sei se te conheço, pois a sigla não me diz nada. Eu sou conhecido e dou a cara em tudo.
2 - Não vou alimentar qualquer polémica nem sequer comentar sobre os Postes em causa.
3 - Na capa do documento está lá escrito "Mafra Abril de 1987" Eu tirei cópia em 24-01-2008 do geocities muito antes da data que referes e com certeza que o documento foi publicado antes de 24-01- 2008 e nada tem a ver com a publicação na revista referida.
Se tens dúvidas podes continuar com elas, pois eu apenas informei com base no documento que tenho na minha posse, que publicarei em sede do BCAÇ 4512/72 no meu site, quando entender que tenho alguma informação capaz ou então terei de limitar-me a dizer baboseiras que não quero ou fazer interpretações da minha responsabilidade, conjugando o teor do documento com conversas que tenho tido pessoalmente, com ex-alferes, furriéis e até com o Cor Ramiro Morna, último Comandante do Batalhão.
4 - Os dados que possuo não os vou revelar aqui, por enquanto, embora eu seja um colaborador do Blogue, pois já escrevi muito em Postes e em comentários.
5 - Quanto à introdução está lá, [comandante do BCAÇ 4512/72 - RI15, Farim 13Jan73-29Ago74], ora o que eu afirmei e reitero é que o Cor Vaz Antunes não foi Comandante em toda a comissão do Batalhão, este teve 4 Comandantes. Está escrito no livro do EME que referi.
6 - Tenho fotos do Cor Vaz Antunes enviadas por ex-alferes do Batalhão que ainda não publiquei e até o poderia fazer.
7 - Eu fiz a minha comissão completa em 69/71 CCaç 2548/Bat Caç 2879 no Sector de Farim, que conheço como a minha palma das mãos, vou lá quase todos os anos.
8 - Portanto, não se trata de campeões. Eu informei correctamente. Não estou a fazer interpretações, embora tenha já um pouco uma ideia formada sobre o assunto, pois eu e outro camarada que também esteve em Farim 66/67 andas às voltas com o tema, talvez há mais de 2 anos.
9 - É tudo que tenho para informar e não votarei nem mais uma palavra de discurso sobre o assunto.
O meu mail consta da lista dos tertúlianos, poderás escrever e eu responderei
Recebe um abraço amigo
Carlos Silva
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