quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3411: O meu baptismo de fogo (22): A minha primeira vez... (Vitor Junqueira)

1. Mensagem do nosso camarada Vitor Junqueira (1), ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 - Os Barões - Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá , 1970/72, com data de 4 de Novembro de 2008, contando-nos como foi, nas suas palavras, a sua primeira vez e nas nossas o seu baptismo de fogo (2).

Amigo Carlos,
O texto que se segue, vem um pouco fora de tempo. Estive tentado a nem sequer te pedir a sua publicação depois de saber que na caixa do correio existem milhares de e-mails a aguardar escrutínio. No entanto, como eu acho que não devemos coibir-nos de dar a nossa versão dos acontecimentos quando tal nos é pedido, acabei por decidir deixar ao teu critério o destino a dar ao escrito.
Obrigado pela tua atenção,
VJ

A minha primeira vez …

Há algum tempo que venho tentando corresponder ao desafio que nos foi feito para que reportássemos para o blog, aquela experiência que deveria ser inolvidável: A nossa primeira vez! Pois, queridos camaradas, não sei se por culpa do Dr. Alzheimer ou, por o acontecimento não ter deixado marcas, não possuo qualquer recordação de como a coisa se passou. Sei que terá ocorrido algures na mata do Oio, mais precisamente no triângulo Mansabá, Olossato, Farim, por volta de Novembro ou Dezembro de 1970 – eu até podia ir pesquisar alguns dados aos meus papéis, mas acho que não vale a pena –, encontrando-se a minha guerra, empenhada numa segurança afastada aos trabalhos de reabertura da auto-via Mansabá – Farim. Estávamos na altura acampados nuns escafundós de Judas chamado Bironque, de onde partia diariamente uma expedição com o propósito de retribuir gentilezas com que éramos mimados, diariamente, pelo IN. Aqueles contactos decorriam quase sempre da mesma, pelo que, por mais que puxe pelo bestunto, não consigo recordar-me do primeiro.

Mas recordo como se tivesse acontecido ontem, um episódio em que pela primeira vez senti os ditos realmente entalados e, aquela sensação de arrepio gelado a trepar pelo espinhaço acima. Na mesma região, no mesmo contexto e na mesma época. Se me permitem, vou partilhá-lo convosco, estando certo de que alguns camaradas reviverão também situações idênticas, das quais saímos convencidos de que o Senhor Santo Cristo dos (meus camaradas) Açorianos, para outros o Altíssimo, se não fez fogo ao nosso lado, pelo menos orientou os trabalhos.

Província da Guiné, mostra a zona designada pelo Vitor Junqueira como triângulo Mansabá, Olossato, Farim na problemática região do Óio. O rectângulo encarnado assinala o Bironque onde se encontrava o Destacamento provisório de apoio à construção do troço de estrada Bironque-Farim.

Foto 2 > Destacamento do Bironque, inaugurado pela CART 2732, destinada à protecção das máquinas da Engenharia, utilizadas na construção da estrada.

Foto 3 > Troço novo da estrada Mansabá-Farim.

Fotos: © Carlos Vinhal (2008). Direitos reservados.


Sempre ouvi dizer que na tropa, voluntário, nem para cima da filha do comandante! E que a melhor atitude era não fazer ondas, porque quando o mar fica agitado, quem se lixa – com éfe – é o mexilhão. Pois, com este manancial de sabedoria, caí na esparrela e fiz-me notar através de uns bitates que mandei em frente a uma certa individualidade que os terá registado. A factura surgiu na volta do correio, a liquidar em suaves prestações, geralmente semanais, até ao final da comissão.

Eis a primeira tranche: Um belo dia, fui abordado pelo senhor CMDT do Cop 6, major Moura (?), que me propôs uma diligência no sentido desalojar uma guarnição do In que durante meses insistira em perturbar o bom andamento da obra, atacando a frente de trabalhos. Terminados estes, ou em vias de conclusão, a malta do PAIGC tinha agora o desplante de se passear na nossa estrada, novinha em folha, como se aquilo fosse o da Joana. Inaceitável!

Num mapa, mostrou-me a localização do objectivo, os itinerários possíveis – quanto a isso também não havia grande escolha –, transmitiu-me as informações que possuía acerca da composição daquela força (1 bigrupo + 1 secção de sapadores) e… desejou-me boa sorte! Certamente por lapso ou puro esquecimento, não mencionou o facto de àquela data haverem já sido feitas três tentativas para espatifar a barraca aos homens. Todas sem sucesso e, como vim a saber mais tarde, a nossa malta trouxe o que contar dessas incursões. Numa delas participou o CMDT Jorge Picado que a narra num delicioso relato, publicado há meses no blog.

No dia D, alta madrugada, uma vez apeados das viaturas, lá seguimos aos encontrões e apalpadelas, caminhando pela berma com a discrição possível ao longo de, talvez dois quilómetros, no sentido Farim – Mansabá. Em breve nos embrenhámos na faixa de terreno arroteado pelas caterpillars, que corria paralela à estrada, em cujo limite e sem grande dificuldade encontrámos a boca do carreiro que nos havia de conduzir ao objectivo, uma tabanca com o piedoso nome de Fátima, tal como o da filha do Profeta e da localidade mais milagreira de Portugal, situada aqui bem perto do sítio onde moro. Já no coração da mata, abandonámo-lo com receio de que estivesse minado ou armadilhado.

Progressão penosa, lenta, sem outro meio de orientação que não fosse uma bússola e o tino do pica titular, o Cunha de Santa Cruz da Graciosa que, com a vareta sob o sovaco, nos abria caminho tentando desembaraçar-se das lianas. Certo é que, ao clarear, sentimos o cheiro de presença humana pelo que concluímos estar muito próximo do objectivo e da bernarda. A cabeça da coluna estacou na orla da mata que bordejava uma zona quadrangular, limpa, onde tinham sido poupadas apenas as grandes árvores. Fez-se uma curta pausa para retirar as remelas mais persistentes e, com mil olhos, perscrutar cuidadosamente o extenso campo visual que se apresentava pela frente. Não vislumbrámos indícios de qualquer construção, não se via gente nem se ouvia o canto alegre do galo madrugador ou o tan-tan ritmado do pilão. Nada, apenas aquele silêncio sinistro, prenúncio de coisas más. Até os pássaros pareciam estar feitos com o IN, espiando-nos sem soltar um pio.

De repente, fazem-me sinal apontando na direcção de um combatente armado que, à distância, entra na clareira acompanhado por uma mulher. O par está bastante longe, oitenta metros aproximadamente. Naquela altura já não existiam quaisquer dúvidas de que a nossa presença era conhecida. Perdido por um, perdido por mil… o Francisco de Assis de Angra, vira para lá o canudo do LG de 6cm (eles juram que fui eu, mas não me lembro!) e com um único tiro, o combatente interrompe a caminhada. Com a perna esquerda amputada pelo joelho, o homem cai e a mulher segue o seu destino em passo acelerado. Aproximamo-nos avançando pelo lado direito da clareira, no sentido da progressão, ao longo da linha de separação com a mata, contando com a protecção da floresta, ou assim pensávamos. Uma secção da qual faz parte o maqueiro Leonel Melo, desloca-se rapidamente para o local onde se encontra o ferido. Porém, assim que entra em campo aberto é recebida por uma saraivada de tiros e bazucadas que parecem chover de todos os lados.

Vamos tentando dar alguma cobertura à equipe sanitária, fazendo tiro de morteiro para a orla oposta, poupando ao máximo as preciosas munições. Ao abrigo de enormes baga-baga e dos troncos de imponentes árvores, o cabo Melo lá consegue pôr um soro a correr e administrar alguma morfina, enquanto o transmita Osvaldo, por alcunha o Fafe, tentava contactar Bissalanca a fim de evacuar o soldado do PAIGC. Se até então, nunca tínhamos deixado um ferido abandonado não era altura para abrir excepções e por isso, a decisão rápida embora discutível foi, aguentar até à chegada do meio de salvamento.

Decisão errada! Em breve percebemos que a tropa com quem estamos metidos, se movimentara de forma a encurralar-nos. Ouvíamo-los nas nossas costas, na tal mancha de floresta que supostamente nos poderia proporcionar alguma protecção, estavam do outro lado da clareira, da rectaguarda chegava a informação de que a cauda da coluna tinha a retirada cortada enquanto da frente rebentava nos entrementes um fogachal que só visto. Sim senhor, lindo serviço, pensámos todos. Pois bem, como se costuma dizer, a gente dança conforme a música!

Dado que intuí que esta operação ia cheirar ao esturro, preparei na véspera com os elementos de que dispunha, um cuidadoso plano de fogo de apoio. Numa saltada a Farim, fui entregá-lo ao camarada Moreira, senhor de três magníficas peças de 14cm, pedindo-lhe que se mantivesse por perto para o caso de.

Agora era altura de colher alguns frutos da diligência efectuada. Foi dada ordem geral para abrigar, e ao Moreira foram solicitados os tiros, tal e tal e tal. Daí por uns segundos que pareceram minutos, ouvíamos as saídas e uma onda de conforto envolveu-nos a alma. Não tardou, primeiro o silvo das brutas por cima das nossas cabeças e logo a seguir, um estrondo tão grande capaz de acagaçar o mais afoito. Devido aos clarões, o céu ficou cor de laranja e pelo ar voaram chispas de aço incandescente, toneladas de pó, folhagem, ramos arrancados às árvores e o intenso odor característico da combustão de explosivos, criaram um cenário próprio do reino de Lucífer. Aquilo, sim, parecia a guerra. Mas os sacanas já deviam estar habituados à fruta, e não se deixaram intimidar. Ó Moreira, manda lá mais três ameixas para os pontos X, Y e Z. Despachadas as bojardas, vemo-las aterrar ainda mais próximo de nós, na margem oposta da clareira. O camarada artilheiro apanhou-lhe o gosto e continuámos naquilo até limpar esse lado da arena.

Para lá deslocámos metade da nossa força, assumindo o controle de uma zona anteriormente ocupada pelos malandros. A situação melhorou bastante em termos de segurança, o que vinha mesmo a calhar dado que, pelo transmita ficámos a saber que os Helis haviam descolado e deviam estar a chegar. Por precaução suspendeu-se a guerra, e de novo um silêncio pesado se abateu sobre nós acompanhando aquele falso sentimento de paz que se segue a cada escaramuça. Estava no papo! Santa ingenuidade, mais um engano!

Mal chega e helicanhão, faz duas passagens à nossa vertical e logo se ouve o matraquear lento de uma metralhadora pesada tentando derrubá-lo. Só então percebemos que ali mesmo na nossa frente, a escassas dezenas de metros e encoberto por um pequeno declive do terreno, estava o verdadeiro ninho da cobra. O In tinha estado a jogar apenas com reservas, a sua milícia. O heli-maca mal contacta o solo e já os enfermeiros pára-quedistas se despacham a recolher o sinistrado. Partem levando consigo o lobo mau que nos informa … estou a ser batido, tenho de retirar.

E adeus, boa tarde! Ficámos novamente no mato sem cão. Com as precauções habituais e muitas outras motivadas pelo aperto do buraco ao fundo das costas onde certamente não caberia um chícharo, retomámos a progressão, agora a duas colunas e com flancos limpos pela artilharia(*). Percorridos meia dúzia de passos, estaríamos a menos de cinquenta metros do objectivo ou seja, do grupo de moranças ocupadas pelos militares, pois as outras habitadas pela população civil ficavam um pouco mais afastadas, quando uma violenta tempestade de chumbo e aço nos fez amochar. Amochar, aguentar, levantar, mais uns passos e nova cambalhota forçada. Foram os cinquenta metros mais duros que tive de percorrer em África. A cena repetiu-se várias vezes até que, passo a passo, nos fomos aproximando, valendo-nos os seis morteiretes que nos acompanhavam sempre e a perícia dos apontadores dessa arma que não me canso de encomiar, o precioso dilagrama.

Confrontando-se mais com uma inesperada teimosia da nossa parte do que com arte guerreira que certamente não possuíamos, o tal bi-grupo e mais as suas milícias retiraram quando acharam que era oportuno, com prováveis perdas, bastantes, atrevo-me a dizer fazendo fé nos vestígios, deixando para trás algum material, sobretudo muitas munições que foram destruídas in loco, dado não possuirmos meios de evacuação. Foi abatido gado, fizeram-se estragos numa plantação de milho e as construções reduzidas a cinzas como recomendavam as NEPS. Espaldões de morteiro, ninhos de metralhadora e uma trincheira que circundava todo o perímetro da tabanca-quartel lá ficaram à espera de ser reocupados. A população civil não foi incomodada e também não nos causou qualquer problema.

E foi assim, até à semana seguinte …

(*) O êxito alcançado com esta operação só foi possível graças à excelente e nem sempre devidamente valorizada colaboração dos nossos camaradas artilheiros. Em outras que se seguiram e até onde o seu braço chegou, nunca a minha companhia deixou algo por fazer. A todos eles, um serôdio abraço de gratidão.

E para todos os Tertulianos, abraços também.
VJ
____________

Notas de CV

(1) Vd. último poste de Vitor Junqueira de 23 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2979: Exercício do meu direito à indignação (1): Simplesmente obnóxio, senhor anónimo (Vitor Junqueira)

(2) Vd. último poste da série de 30 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3381: O meu baptismo de fogo (21): 6 de Outubro de 1970, o primeiro contacto com a realidade das minas (Carlos Vinhal)

Guiné 63/74 - P3410: Memória dos lugares (14): Farim e o monumento ao 5º centenário da morte do Infante D. Henrique (Carlos L. Carreira, arqueólogo)

Guiné > Região do Oio > Farim > BCAÇ 2879 (1969/71) > c. 1970 > Igreja, jardim e monumento. Foto de Carlos Silva, ex-Fur Mil At Armas Pesadas da CCAÇ 2548, Jumbembem, 1969/71, hoje advogado (vd. a sua página na Internet > Guiné da Guiné 63/74, Carlos Silva (BCAÇ 2879).

Foto: © Carlos Silva (2008). Direitos reservados (*).


Guiné-Bissau > Maio de 2007 > Farim > Monumento, da época colonial, ao 5º centenário da morte do Infante D. Henrique. Foto do nosso amigo Fernando Inácio que tinha 10 anos por altura do 25 de Abrild e 1974, mas que lê e ouve com emoção as nossas histórias de combatentes. Viaja com frequência para a Guiné-Bissau, por motivos de negócios. Em Maio de 2007 passou por Farim e mandou-nos um texto e algumas fotos, entre elas, esta que interessa muito em particular ao arqueólogo Carlos Leitão Carreira (**). O último contacto que temos com ele é de Outubro de 2007. É membro da nossa Tabanca Grande e recebe regularmente os nossos mails.

Foto: ©
Fernando Inácio (2007). Direitos reservados (*).


1. Mensagem de Carlos Leitão Carreira, arqueólogo, com data de ontem:

Olá. Como está?

Volto ao seu contacto para saber se há alguma hipótese de me dizerem qual o nome do autor desta foto e a sua data.

Melhores cumprimentos,

Carlos Carreira

2. Mensagem de Carlos Leitão Carreira, com data de 21 de Junho de 2008

Assunto: Monumento

Exmo. Sr.:

Investigando na Internet por alguma informação relacionada com determinado monumento que ando a estudar, deparei-me com esta sua foto [segue-se a respectiva URL, no Blogger; vd. imagens que se reproduzem acima].

O monumento em causa, desenhado e elaborado aquando das comemorações do V Centenário da Morte do Infante D. Henrique, encontra-se reproduzido em várias outras cidades do antigo Ultramar, caso único na nossa escultura. Esse monumento existe ainda na cidade portuguesa de Torres Novas, única em Portugal onde este foi erigido.

Este meu trabalho pressupõe a recolha ou angariação de fotos antigas e actuais destes monumentos espalhados e, em muitos casos, esquecidos. Escrevo-lhe na esperança de que me possa ceder esta foto no seu tamanho original e de outras que possua do mesmo monumento.

Acredite que faria uma tremenda diferença na execução deste trabalho, pelo que lhe fico desde já agradecido.

Com os melhores cumprimentos,
Carlos Leitão Carreira
Arqueólogo

Tlm. 93 464 10 23

E-mail: leitaocarreira@gmail.com

3. Comentário de L.G.:

Meu caro Carlos Leitão:

Temos muito interesse em colaborador nesta sua pesquisa, cuja natureza não referiu mas que julgo se destine a fins académicos. O conhecimento da presença histórica portuguesa em África (e no resto do mundo) interessa-nos a todos, nós, portugueses, mas também aos africanos e demais povos que herdaram os vestígios dessa presença. No que diz respeito ao património edificado, há necessidade de ser inventariado, estudado, protegido, conhecido, divulgado. Louvo, por isso, os seus esforços.

No que diz respeito à(s) fotografia(s) que me pede, terá que fazer a gentileza de contactar os respectivos autores (Fernando Inácio e Carlos Silva), com vista a uma eventual cedência. Posso dar-lhe informação adicional sobre as fotos e o seu contexto. Não posso ceder-lhe os originais (que de resto não tenho, tenho apenas cópias em suporte digital, com maior ou menor resolução). Espero que as suas diligências sejam coroadas de êxito. Não tenho dúvida que os amigos e camaradas da Guiné, em questão, Fernando Inácio e Carlos Silva, irão dar-lhe uma resposta positiva.

Quanto ao resto sabe qual é a política do nosso blogue:

Qualquer texto ou imagem publicada no nosso blogue pode ser reproduzida, desde que: (i) não se destine a fins comerciais; (ii) seja pedida a devida autorização por mail ao(s) editor(es) do blogue; e, por fim, (iii) seja feita a citação expressa da fonte (blogue e autor do documento).

Disponha sempre. LG
_________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:

3 de Julho de 2007 >
Guiné 63/74 - P1914: Tabanca Grande (21): Em Farim, em 2007, imaginando um Unimog com tropas portuguesas ao virar da esquina... (Fernando Inácio)

1 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2496: História do BCAÇ 2879, 1969/71: De Abrantes a Farim: O Batalhão dos Cobras (5) (Carlos Silva)

Guiné 63/74 - P3409: O Tigre Vadio, o novo livro do Beja Santos (1): Entrevista à Gazeta das Caldas

Capa do segundo livro do Beja Santos, Diário da Guiné, 1969/70: O Tigre Vadio. Lisboa: Círculo de Leitores / Temas e Debates. 2008.

Foto: Cortesia da editora.

O Mário já nos tinha antecipadamente, em 10 de Outubro passado, enviado o programa das festas do lançamento:

"É só para confirmar que o Tigre Vadio tem lançamento marcado para 11 de Novembro. Nessa data, serão apresentados ao público [, no Museu da Farmácia,] 3 novos núcleos museológicos que tem a ver com a nossa guerra: Os medicamentos do Laboratório Militar, os equipamentos das enfermeiras pára-quedistas e os primeiros socorros dos aparelhos da Força Aérea que iam levar e trazer os nossos feridos.

"Nesse dia, haverá visitas guiadas ao Museu da Farmácia, único à escala dos museus que têm a ver com o combate ao sofrimento humano. O livro será apresentado pelo general Lemos Pires e pelo escritor António Valdemar. Fico receptivo a organizar um almoço baratinho, caso a malta pretenda fazer uma assembleia-geral do blogue até às 16.30, hora que começam as cerimónias no Museu, com a presença do Chefe de Estado Maior da Força Aérea. Um abraço do Mário".


1. Mensagem de Beja Santos, com data de 30 de Outubro de 2008, para a jornalista Natacha Narciso (*) e conhecimento ao nosso blogue:

Assunto: Respostas ao questionário sobre o livro "O Tigre Vadio"


Prezada Natacha Narciso, Obrigado pelo seu email. Vou procurar responder ao seu questionário, de modo sintético. Se precisar de mais elementos, não hesite em escrever-me ou telefonar-me (213564686). Receba os cordiais cumprimentos do Mário Beja Santos.



Creio que este é um segundo volume de memórias. Porque decidiu agora lançá-los?

Conforme expliquei no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/ ), onde estas narrativas foram inicialmente publicadas, tinha o propósito de escrever todo o diário da minha comissão na Guiné entre 1968 e 1970 (cerca de 25 meses) quando me reformasse. Ora o autor e editor do blogue, o meu camarada Luís Graça, apoiou a minha proposta de escrever um diário sob a forma de um episódio semanal, o que veio a acontecer entre 2006 e 2008.

Há quem se mostre surpreendido nos livros Na Terra dos Soncó e O Tigre Vadio (editados por Círculo de Leitores e Temas e Debates, 2008) registar de forma inusitada o nome das localidades, dos militares e dos civis, os episódios trágicos e acontecimentos corriqueiros. Tive inúmeros suportes, a começar pelas centenas de aerogramas que enviei à minha namorada.

Foram sobretudo razões de pudor que me impediram de concretizar este projecto mais cedo: receei que toda esta descrição soasse a pretensiosismo, agora que o Beja Santos caminha para velho vamos ter o relato das suas façanhas, a existência heróica que levou na floresta profunda, rodeado de alguns dos soldados mais valentes do mundo.

Que idade tinha?

Combati na Guiné quando tinha entre 23 e 25 anos.

Que impacto é que teve na sua vida a participação naquela guerra?

A guerra, em toda a sua crueza e brutalidade, reforma a nossa existência pelas aprendizagens que exige. Como se escreve no 1º Vol. do diário:

“Era uma vez um menino alferes que chegou à Guiné e foi lançado no regulado do Cuor, no Leste, em 1968. A sua missão principal era proteger o rio Geba, garantindo a sua navegação, indispensável para continuação da guerra. Mas havia outras missões, para além de proteger o rio: emboscar, patrulhar, minar, atacar e defender, garantir um professor para as crianças, reconstruir os quartéis flagelados, levar os doentes ao médico, praticar a justiça com o régulo, um destemido Soncó. Era uma vez um alferes que aprendeu a trabalhar com um morteiro 81, a emboscar na calada da noite, a enterrar os mortos e levar os moribundos às costas”.

Quem teve esta experiência, teve de mudar. É uma aprendizagem radical: matar e ver morrer, ver desaparecer todos os bens consumidos pelo fogo, amar e considerar os seus soldados, aprender a cuidar dos outros. Muda-se para todo o sempre.

Trata-se de um trabalho autobiográfico?

Sim, tudo o que se escreve nestes 2 livros pode ser questionado mas é autobiográfico.

Entre os acontecimentos que relata, o que destaca?

A reconstrução de Missirá, que foi devorada pelas chamas e reconstruímos em tempo recorde, sem diminuir o esforço de guerra. Vivi uma gesta colectiva, limitei-me a puxar pelo ânimo dos meus soldados e dos civis. É muito belo ver uma povoação renascer das cinzas, com o esforço de quem faz a guerra, de quem sonha com a paz. Descrevo esta reconstrução no 1º livro.

No 2º livro há um episódio pungente, a operação Tigre Vadio, entrámos num santuário do PAIGC no pino do calor, no fim de Março de 1970, foi uma chacina. A retirada foi duríssima, com os soldados a morrer de sede.

Considera importante que quem participou nos eventos conte a sua própria história?

É indispensável, toda a guerra da Guiné precisa de ser contada, parcela por parcela. Há muitos episódios mistificados. Leio em quase todos os livros que a luta armada começou em Janeiro de 1963, desencadeada pelo PAIGC. É mentira, começou em 1961, começou a ser feita por uma força rival do PAIGC, no norte da Guiné. Há muitos episódios mistificados porque os relatos das operações não correspondem à verdade. É crucial que cumpramos este dever de memória, todos aqueles que combateram de ambos os lados.

Qual a sua opinião sobre a forma como tem sido contada a História da Guerra da Guiné? Há muita investigação ainda por fazer?

Há muito a fazer, a investigação sobre o princípio da luta armada, a forma como Salazar e o seu regime recusaram a solução política negociada, por exemplo. O trabalho que se está a fazer no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné é da maior importância. Mas os militares e civis que viveram aquela guerra não podem continuar a silenciar os factos.

_______

Nota de L.G.

(*) Mensagem de
Natacha Narciso, de 30 de Outubro de 2008:

Assunto: Questões Livro

Bom dia Dr. Beja Santos:

O meu nome é Natacha e trabalho na
Gazeta das Caldas. Gostaria de lhe colocar algumas questões sobre o seu livro, que será lançado a 11 de Novembro, de modo a produzir um artigo para este semanário.

Tomo a liberdade de lhe enviar algumas perguntas.

1. Creio que este é um segundo volume de memórias. Porque decidiu agora lançá-los?
2. Que idade tinha?
3. Que impacto é que teve na sua vida a participação naquela guerra?
4. Trata-se de um trabalho autobiográfico?
5. Entre os acontecimentos que relata, o que destaca?
6. Considera importante que quem participou nos eventos conte a sua própria história?
7. Qual a sua opinião sobre a forma como tem sido contada a História da Guerra da Guiné? Há muita investigação ainda por fazer?

Agradeço antecipadamente a sua colaboração.

Com os melhores cumprimentos,

Natacha Narciso
Jornalista

Gazeta das Caldas
Tel.: 262 870 050

Guiné 63/74 - P3408: Ser Solidário (23): Expedição à Guiné-Bissau 2009: 'Vamos Encher um Contentor' (Xico Allen)


1. Mensagem do nosso camarada Xico Allen, ex-1.º Cabo At Inf da CCAÇ 3566, Empada e Catió, 1972/74, com data de 2 de Novembro de 2008, dando conta da realização em curso de mais uma Expedição de Solidariedade à Guiné-Bissau, desta vez organizada, não por ele, mas pelos camaradas da Associação Humanitária Memórias e Gentes, de Coimbra, com quem de resto ele tem colaborado.

Assunto: Expedição à Guiné-Bissau 2009





"O sorriso enriquece os recebedores
sem empobrecer os doadores"






Apartado 45
3046-801 TAVEIRO (COIMBRA)

Contacto: E-mail
j.moreira@sapo.pt
Telem.: 96 402 80 40
Paulo Quintana
Associação sem fins lucrativos
Matriculada na C.R.C. de Coimbra
NIPC 508 343 461

Parceiro especializado da LIGA DOS COMBATENTES para acções humanitárias
____________

Coimbra, 02 de Novembro de 2008

Meus Amigos

Começamos a trabalhar para a Expedição Humanitária Portugal-Guiné-Bissau/2009.

Esta Associação (de todos nós) precisa da colaboração de toda a gente, fundamentalmente de vós, que tão bem conhecem a realidade daquelas gentes, sobretudo as crianças, deficientes e doentes. Vamos, uma vez mais, alegrar aquelas Instituições (que têm rosto e que são credíveis) minimizando as suas carências.

Tenho a certeza que vão empenhar-se para que esta missão seja mais um marco das nossas vidas "fazendo o bem". Temos local de armazenamento, temos pessoas para encaixotar, temos transporte, temos grua e temos contentor… por isso, a ordem é: VAMOS ENCHER UM CONTENTOR!!!

Não interessa quem vai ou quem não pode ir, pretende-se, isso sim, da colaboração de todos vós, para mais esta nobre missão.

É desejo de todos que o contentor esteja já no mar ou em Bissau, quando sairmos de Portugal, para isso, é urgente começar a angariar bens de todo o tipo, inclusivamente, bens alimentares "duradouros".

Apelo aos meus amigos que não fiquem expectantes… peçam aos vizinhos, aos amigos, às empresas, às instituições (inclusivamente hospitalares), enfim, vamos pedir a toda a gente (pois não estamos a pedir para nós).

A nível de secretariado (cartas, e-mails, etc) cá estarei para tratarmos em conjunto, se assim vós o entenderdes.

Não vos enfado mais!!!

Recebam um grande abraço do
Moreira
______________

Nota de CV

Vd. último poste da série de 11 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3297: Ser solidário (22): A Tipografia da ADFA (Luís Nabais)

Guiné 63/74 - P3407: Em busca de... (51): Os Bravos da CCAÇ 726, Guileje, 1964/66 (Aurélia Duarte / Henrique Almeida Duarte)





Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1864/66) > Fotos do Henrique Almeida Duarte, enviadas com muita ternura pela sua sua filha Aurélia Duarte, na esperança de que "algum companheiro o reconheça"...

Fotos: © Aurélia Duarte (2008). Direitos reservados


1. Mensagem de Aurélia Duarte, com data de ontem:


Assunto - Ex combatente Henrique Almeida Duarte


Olá, Luís:

Há cerca de mais ou menos 3 meses, enviei-lhe um email a pedir ajuda para encontrar amigos do meu pai, Henrique Almeida Duarte, residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, ex-combatente da Guiné. Eles embarcaram a Dezembro de 64 e regressaram em Janeiro de 66.

Mas não tive sucesso [nas minhas diligências] (*).

Apareceu em minha casa um colega do meu pai, mas eu estava de férias, esse colega era o fotógrafo e lembrou-se perfeitamente do meu pai, mora em Almada, mas infelizmente não deixou contacto.

Aqui estou eu de novo mais uma vez a pedir ajuda. Junto a este email envio-lhe umas fotografias do meu pai, talvez assim algum companheiro o reconheça.

Desde já lhe agradeço pela vossa atenção. Vou deixar aqui os meus contactos:

Aurélia de Fátima Repolho Duarte;
Email: aureliaduarte3@live.com.pt ;
Telemóvel:934762969.


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 > 1964/65 > Aspecto dos trabalhos de fortificação do aquartelamento e tabanca. Foto Alberto Pires (o Teco), que chegou às mãos do Nuno Rubim, por intermédio do Carlos Guedes, três bravos da CCAÇ 726... que o Henrique Almeida Duarte e a sua filha, Aurélia, gostariam de (re)encontrar e abraçar.

Foto: ©
Nuno Rubim (2006). Direitos reservados


2. Comentário de L.G.:

Cara amiga Aurélia:

Filha de um camarada, nossa filha é. Começo por saudá-la e dizer quanto aprecio as diligências que está a fazer, através do nosso blogue, para encontrar camaradas do seu pai, que tenham pertencido à mesma unidade. Seguramente que os vai encontrar e seguramente que fará bem ao seu pai poder um dia destes abraçá-los e recordar os bons e os maus momentos que passaram juntos, no sul da Guiné. Obirgado pelas fotos que nos mandou com tanta ternura mas também ansiedade.

O seu pedido anterior foi publicado em má altura, no mês de Agosto, mês de férias e de menor actividade do nosso blogue. Voltamos a publicar um segundo pedido, na esperança (e na certeza) de que desta vez será mais bem sucedida.

Temos, entre nós, na nossa Tabanca Grande - que você (ou o seu pai) poderá passar a integrar a partir de hoje, se assim o desejar - um dos comandantes da CCAÇ 726, na altura o Cap Art Nuno Rubim, hoje coronel na reforma. Poderá contactá-lo por email.

Outros dois camaradas do seu pai, nossos conhecidos, são o Alberto Pires (mais conhecido por o Teco) e o Carlos Guedes. O fotógrafo de que fala e que procurou o seu pai quando você estava de férias, pode muito bem ser ele, o Teco. (Não tenho a certeza se ele mora em Almada; pelo que voê me disse ao telefone ele terá mostrado ao seu pai fotografias desse tempo passado em Guileje).

A malta da companhia reune-se todos os anos: este ano, em 24 de Maio passado, realizou-se o 18º Almoço-convívio da CCAÇ 726, em Arados, Benavente, tendo o evento sido organizado pelo Estêvão Lopes e esposa, que vivem em Arados, freguesia de Samora Correia, concelho de Benavente (Contactos: Telef. 263 656 742 / tm: 919 458 799). Sugiro que volte a entrar contacto com este camarada, que de resto já lhe sido indicado pelo nosso diligente co-editor Carlos Vinhal. Pelo que me diz ao telefone, o Estêvão Lopes não terá reconhecido o seu pai só pelo nome. O que é natural: já vão mais de 40 anos. Além disso, na tropa só eramos conhecidos pelo último apelido ou por alcunha. As fotos que nos mandou vão ajudar-nos.

De acordo com a informação que já publicámos no nosso blogue, a CCaç 726, durante a comissão na Guiné (Guileje, 1964/66), sofreu 10 mortos, dos quais 9 em combate. Eis aqui a lista (pode ser que o seu pai se recorde de alguns nomes) (**):

Furr Mil António Gonçalves da Silva, em 29 Nov de 1964, por ferimentos em combate;
1º Sarg Joaquim Balsinhas, em 28 Fev 1965, por explosão de armadilha IN;
1º Cabo Amadeu Jaló, em 28 Maio de 1965, por doença, no HMP, em Lisboa;
1º Cabo Enf Manuel Moreira Marques, em 28 Jun de 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond Armando Gonçalves da Fonseca, em 28 Ago de 1965, por ferimentos em combate;
1º Cabo Elísio Santos Filipe, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Mil Mussa Bela Camará, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond José Luís L. Pereira, em 29 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Luciano Florêncio, em 7 Set 1965, por AP, em Cutia, ao serviço do Gr Cmds "Vampiros".
1º Cabo João Seborro, em 7 Nov 1965, por ferimentos em combate.


Aurélia (e Henrique):

Conte connosco e com os bravos da CCAÇ 726. Os amigos e camaradas da Guiné desejam as melhoras do seu pai que, pelo que você me acaba de dizer ao telefone, está num programa de tratamento do stresse pós-traumático de guerra. Dê-nos conta do sucesso dos seus contactos. Até breve. Boa saúde, bom trabalho.

Luís Graça.

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 17 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3137: Em busca de... (34): Camaradas da CAÇ 726 (Aurélia de Fátima)

(...)"Eu sou Aurélia de Fátima Repolho Duarte, filha de Henrique Almeida Duarte que partiu para a Guiné em 29 de Dezembro de 1964 e regressou a Portugal em 1966.

"O meu pai era Atirador e pertencia à Companhia 726, de Infantaria. Saiu para a Guiné do Quartel de Évora.

"Fugiu ao embarque uma vez e teve 16 dias preso na prisão de Caxias e foi libertado, depois de ter sido detectada a doença. Então partiu para a Guiné, como eu já referi.

"É residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, distrito de Setúbal. Sofre da doença de stress pós-traumático.

"Está um pouco esquecido, mas lembra-se do Furriel Padilha que era de Vila Real, e de quatro colegas, mas não se lembra os nomes deles, apenas se lembra onde viviam. Eram dois colegas de Vendas Novas, um de Pias e um de Castro Verde.

"Aguardo resposta se possível, e desde já muito obrigada pela atenção.

"Sem mais assunto de momento, me despeço com ansiedade, aguardando uma resposta. Muito obrigada" (...).



(**) Sobre a CCAÇ 726 ver postes de:

10 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P862: O nosso novo tertuliano, o Coronel Nuno Rubim

14 de Outubro de 2006 >Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)

17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2360: A CCAÇ 726, a primeira Companhia a ocupar Guileje (2): 10 mortos e mais de metade do pessoal ferido em combate (Virgínio Briote)

14 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3060: Convívios (74): CCAÇ 726 (Guileje, 1964/66), em 24 de Maio de 2008, Arados, Benavente (Nuno Rubim)

22 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3082: Convívios (76): Ainda o 18º encontro dos bravos da CCAÇ 726 (Nuno Rubim)

Guiné 63/74 - P3406: Notícias da região de Tombali, Setembro de 2008: Chamarra e Guileje/Mejo (Nuno Rubim)

Guiné-Bissau > Setembro de 208 > Os dois "expedicionários" nas motorizadas que utilizaram: Moisés Caetano Pinto (Tino) e o Honório Correia (ambos trabalham na AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau).
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Chamarra > Setembro de 2008 > Uma placa que eles encontraram em Chamarra, os "Gatos Negros". Julgava eu que esse era o emblema da CCaç 5, mas os dizeres mostram CArt 16... ( creio que é 1612 ). Talvez algum camarada possa
explicar o facto (**).
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mejo > A Awa, viúva do Régulo Suleimane, de Guileje. A foto da direita foi tirada em Mejo e por ela se pode ver que os medicamentos que o Honório e Tino levaram para o tratamento da vista dela deu resultado (na ida levaram os remédios indicados por um oftalmologista, indicaram a posologia e no regresso puderam constatar dos resultados da sua aplicação).

Fotos (e legendas): © Nuno Rubim (2008) . Direitos reservados.


1. Mensagem do Nuno Rubim, Cor Art Ref, membro da nossa Tabanca Grande, especialista em história da artilharia, ex-comandante da CCaç 726 (Guileje, desde o final de Jan 66 até Junho de 1966) e da CCaç 1424 (também em Guileje, de Junho até Dezembro de 1966). (Anteriormente tinha comandado a CArt 644 Mansabá, e a CCmds).


Aproveitando as suas férias, o nosso já conhecido Moisés Caetano Pinto (Tino) e o Honório Correia, que também trabalha na AD - Acção para o Desenvolvimento, deslocaram-se no final de Agosto / início de Setembro ao Sul da Guiné e realizaram algumas pesquisas que eu lhes pedi.

Tratou-se, fundamentalmente, de entrevistarem ex-combatentes de ambos os lados, Régulos e outra pessoas, fazerem o levantamento das Tabancas existentes junto às estradas e caminhos (para o que levaram Fichas de Tabanca a preencher ), visitar locais de antigos quartéis portugueses e bases do PAIGC, etc ...

Desempenharam-se da tarefa de forma muito positiva, entregando-se totalmente a esse trabalho, mau grado várias as dificuldades, a mais gravosa das quais a época pouco propícia (chuvas).

Considero altamente positivo o resultado final da "expedição" e com um pouco mais de experiência ambos poderão vir a constituir uma mais-valia importante nos trabalhos de campo que porventura venham a realizar. Espero eu contar com eles na próxima vista à Guiné.

O planeamento durou cerca de dois meses e o projecto aprovado foi realizado
praticamente na íntegra. Foram executadas várias medições GPS, tiradas mais de 300 fotografias e gravadas várias entrevistas.

Desta feita envio-vos três fotos interessantes [publicadas acima].

Um abraço

Nuno Rubim

____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 3 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3168: Ser solidário (20): Bissau: O triste caso da Cadi e a ajuda extraordinária do Tino, que trabalha na AD (Nuno Rubim)

(**) Vd. poste da I Série do blogue > 19 de de Janeiro 2006 > Guiné 63/74 - CDLXI: O meu diário (José Teixeira, enfermeiro, CCAÇ 2381) (8): Chamarra, Janeiro de 1969

(...) Guiné-Bissau > Chamarra > Novembro de 2000 > Vestígios da presença dos tugas, a CART 1612 (?), "bravos e leais" ... É espantosa a emoção com que se mostram (os guineenses) e se (re)descobrem (os portugueses) estes toscos marcos da nossa passagem por terras da Guiné...

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3405: Efemérides (12): Nuno Álvares Pereira, um dos primeiros Portugueses em África (José Martins)

Um dos nossos primeiros Combatentes em África: Nuno Álvares Pereira, o Condestável e o Beato Nuno

Nasceu em 24 de Junho de 1360 – Dia de S. João;
Morreu em 1 de Abril de 1431 – Domingo de Páscoa ou
1 de Novembro de 1431 – Dia de Todos os Santos.



Durante a sua vida, foi pagem, combatente e, depois de ficar viúvo, distribuiu os seus bens e recolheu-se ao Convento do Carmo, edificado a suas expensas, sem contudo professar, em 15 de Agosto de 1423, adoptando o nome de Irmão Nuno de Santa Maria.

No Calendário Carmelita, que se encontra em Itália na Biblioteca da Parma e composto entre os anos de 1456 e 1478, que se destinava na ser usado pelos Carmelitas Portugueses, refere que já se celebrava a festa de Sanctus Nonius O Carm (São Nuno da Ordem dos Carmelitas) no dia 1 de Abril, prova de que havia sido inscrito no registo da Vida dos Santos Carmelitas.

Em 21 de Julho de 1437, o Rei D. Duarte envia uma carta ao Abade D. João Gomes em que lamenta não ter recebido cópia do despacho oficial dado pelo Papa Eugénio IV, com pontificado entre 3 de Março de 1431 a 23 de Fevereiro de 1447, afim de iniciar o processo de Canonização do Santo Condestável, forma como era conhecido pelo povo português, ainda em vida e após a sua morte.

Nas cortes realizadas em 1641, o rei D. João IV solicitou ao Papa Urbano VIII, com pontificado entre 6 de Agosto de 1623 a 29 de Julho de 1644, a canonização de Frei Nuno de Santa Maria, sendo este pedido renovado em 20 de Janeiro de 1674, pelo rei D. Pedro II ao Papa Clemente X, com pontificado entre 29 de Abril de 1670 e 22 de Julho de 1676.

A 15 de Janeiro de 1918 a Sagrada Congregação dos Ritos aprovou a Festa de D. Nuno a realizar em 6 de Novembro, com base na confirmação de Culto Antigo. Bento XV, com pontificado entre 3 de Setembro de 1914 e 22 de Janeiro de 1922, seis dias mais tarde, a 23 de Janeiro de 1918, eleva às honras dos altares como Bem-aventurado ou Beato, e dado como exemplo aos militares que combatiam na I Grande Guerra.

No ano de 1940, durante a 2ª Guerra Mundial o Papa Pio XII declarou que o Beato Nuno devia “ser modelo a seguir por todos os militares que combatiam na guerra”, e tentou a canonização por decreto, como “exemplo do soldado cristão num tempo de guerra”.

Os Prelados Portugueses também solicitaram a reabertura de canonização ao Papa Pio XII, com pontificado entre 2 de Março de 1939 e 9 de Outubro de 1958, que foi autorizada em 28 de Maio de 1941, mas obstáculos colocados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, impediram que fosse canonizado por decreto pontifício.

No ano de 1960, quando se iniciou a comemoração do 6º centenário do seu nascimento e as suas relíquias percorreram o país, a Ordem do Carmo reabriu, de novo, o processo, mas o início da Guerra do Ultramar e toda a polémica que a envolvia, e com receio que se valorizasse mais o seu papel como soldado do que como religioso, impediu o avanço do processo.

Nuno Alvares Pereira, ao desembarcar em Ceuta em 21 de Agosto de 1415, tornou-se num dos primeiros combatentes portugueses em terras de África.

É patrono do Exército Português, e, provavelmente, o próximo Santo Português, terá a sua festa no próximo dia 6 de Novembro, com liturgia própria.

___________


Nota de vb: Vd. poste anterior desta série

25 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3239: Efemérides (11): Comemoração do 35.º Aniversário da declaração unilateral da Independência da República da Guiné-Bissau (Casa da Guiné-Bissau, Coimbra)

Guiné 63/74 - P3404: Recortes de imprensa (9): Em Gandembel - O adeus à Guerra (José Teixeira / César da Silva)

1. Mensagem com trabalho reenviado pelo nosso camarada José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, em 2 de Novembro de 2008, com um desabafo de que seria a segunda vez que o estaria a mandar. Ao Zé, as nossas desculpas.


2. Através do Almeida, o camarada da CCaç 2317, que nos tem deliciado com a canção de Gandembel, na Tabanca de Matosinhos, chegou-me à mão uma reportagem do Diário Popular com data de 17 de Março de 1969 sobre Gandembel, assinada pelo jornalista César da Silva.

Gandembel é um local mítico da Guerra na Guiné, que alguns dos camaradas que em 1 de Março passado visitaram aquando do Simpósio sobre Guiledge.

O Título Em Gandembel – O Adeus à guerra seduz qualquer ex-combatente que tenha andado pela Guiné nessa época, a ler o referido artigo que abaixo descrevo.

O seu conteúdo espelha bastante bem o inferno de Gandembel. Estranho para mim, é o facto de a Censura política ou a Pide terem deixado passar este artigo, em pleno tempo de guerra, com uma descrição tão rigorosa do que era a guerra naquele local, que eu, estando em Mampatá Forreá e participando nas colunas de reabastecimento de algum modo testemunhei. Talvez porque Gandembel à data da vinda a lume do artigo, já estivesse desactivada.

Pode ler-se por exemplo: Afinal isto dará uma ideia do que efectivamente é a guerra no Ultramar? Pois eu permito-me pensar, de acordo com o que pude observar directamente na Guiné, que o conflito naquela Província não será melhor nem pior que o do Vietname, desde os quadros dirigentes, aos operacionais, desde a mentalização dos soldados inimigos, ao material por ele utilizado, o que é exactamente o mesmo.

Ao ler o artigo ficamos a saber que os fortes de Gandembel e Balana foram construídos com o objectivo de libertar, já nessa altura (princípios de 1968) a pressão sobre Guiledge, o que veio a acentuar-se após o abandono destas praças, em fins de 1968 e culminou com o seu abandono forçado em 1973.

Interessante também a descrição exagerada, a meu ver, das acções dos Páras, bem como a hilariante história do leite para o comandante Nino, que foi efectivamente verdadeira. Tanto quanto sei, porque acompanhava de perto a movimentação dos Páras e o seu enfermeiro era um camarada amigo, colega de curso, que mais tarde foi gravemente ferido numa A/C a caminho de Fulacunda, onde morreram creio que sete camaradas, tais encontros com o IN aconteceram e muitos mais, pois todos os dias ouvíamos em Mampatá o matraquear da metralha. Foi de facto apanhado manga de material, bem como o leite para o Nino. A quantidade de IN mortos, tal como é descrito, é que me parece exagerada. Talvez o Idálio Reis ou o Hugo Guerra nos possam dar uma ajuda, repondo tanto quanto possível a verdade dos factos.

Zé Teixeira




3. EM GANDEMBEL – O ADEUS À GUERRA

por Cesár da Silva ( com a devida vénia e homenagem pela sua coragem em ter ido até Gandembel e por ter escrito um artigo tão realista)

A operação “Bola de fogo” foi lançada pelas Forças armadas no dia 8 de Abril de 1968. Na madrugada do dia nove, após violento combate, foi fixada, com carácter provisório, a posição de Gandembel. Situava-se o referido ponto estratégico da estrada da estrada que, vinda de Kandiafara e passando por Cimbéli, na República da Guiné, liga a rodovia Mampatá-Cameconde, no nosso território. Em Kandiafara encontrava-se o grande depósito de material de guerra de Amilcar Cabral no Sul e Cimbali era o quartel general do comandante de todas as operações da zona.

Esta posição (a) permanentemente ocupada por soldados do exército, por vezes reforçada por tropas especiais, destinava-se a impedir a utilização inimiga do já famoso corredor de Guilege, o mais importante ao Sul da Guiné, na tentativa de evitar infiltrações de efectivos humanos e matérias no nosso território. No entanto, dada a proximidade da fronteira, o inimigo desencadeava diariamente violentos ataques de armas pesadas, quase sempre do outro lado da linha de demarcação, pelo que foi resolvido mudar o centro de operações dois quilómetros mais para norte, sobre a estrada do Balana, pois era mais seguro lançar os movimentos a partir daí e continuar a controlar o que para o inimigo constituía importante via de comunicação com grupos do interior.

Esforços e sacrifícios indizíveis

A fixação dos efectivos no actual ponto não foi, de modo algum, obra fácil. Pelo contrário, exigiu esforços e sacrifícios indizíveis. Para que o leitor possa fazer uma ideia aproximada, dir-lhe-emos apenas, o seguinte: Gandembel, tem a superfície de 40 decâmetros quadrados e está toda minada de valas e cercada de arame farpado, com espaços armadilhados; os soldados vivem em abrigos fortificados, construídos com milhares de toneladas de toros de árvores, pedra e terra removida. Pois tudo isso feito a braços, visto que os nossos rapazes, só dispunham de uma moto serra e duas viaturas. No gigantesco trabalho participaram todos os soldados com a respectiva arma numa das mãos e, na outra, uma pá, um machado, uma picareta, ou simplesmente, nada. Trabalharam continuamente de dia e de noite, mas apenas nos intervalos dos combates que eram obrigados a travar, ou que eles procuravam por força das circunstâncias, pois Gandembel nunca deixou de constituir alvo permanente para o inimigo, que contra ele ainda hoje dirige brutais ataques, quase sempre apoiados por armas pesadas.

O maior potencial de fogo inimigo na Guiné

É na zona de Gandembel que o inimigo possui o maior potencial de fogo e foi contra esta posição que utilizou, pela primeira vez na Guiné, o morteiro 120mm. Foi, também na mesma zona que plantou o maior número de fornilhos (minas reforçadas com torpedos de TNT), que se destina a cortar itinerários, pois tem grande potência e, portanto poder destruidor (b). Também é utilizada contra colunas militarizadas.

Muitas vezes no decurso das flagelações nocturnas o inimigo tentou penetrar no aquartelamento, chegando mesmo a cortar o arame farpado da primeira fiada e estabelecer abrigos pessoais perto da segunda, portanto praticamente dentro da unidade. Foi sempre repelido.

O auxilio das forças especiais

Os pára-quedistas deixaram quatro mortos em Gandembel e levaram alguns feridos, mas foram capazes de façanhas como a seguinte: numa nomadização orientada até algumas centenas de metros da fronteira, surpreenderam certa madrugada um bi-grupo inimigo (cerca de oitenta homens). Dizimaram-no completamente em menos de uma hora e estabeleceram contacto com outro que vindo da República da Guiné, pretendia socorrer aquele. Para esses já não foi tão mau, pois regressaram com sete elementos ao outro lado da fronteira, sem ferimentos graves. Cerca de seis toneladas de armas e munições e um grande carregamento de víveres, além de documentação importante, foi o balanço do espólio. É inacreditável, mas o que se segue, pode ser testemunhado pelos rapazes de Gandembel e pelos “Páras”. Do carregamento apreendido faziam parte víveres de vária espécie e leite para o comande “turra” João Nino. Alguns dias depois, ao anoitecer, alguns “turras” gritavam da orla da floresta

“pára-quedista gatuno dá-nos o leite do Nino. Dá-nos o leite do Nino, que ele precisa, está doente”

Pois os “Páras”quiseram levar-lho, mas eles, que tanto tinham implorado, não esperaram e fugiram.

Dois exemplos do que é a guerra na Guiné

Os rapazes de Gandembel supriram dificuldades à custa de um esforço heróico inigualável de abnegação e sacrifício sem conta. Apesar de debilitados fisicamente, pois desde o dia oito de Abril do ano passado, que não sabem o que é uma cama e muito menos um lençol, continuam a operar com elevada moral, até vinte e quatro horas por dia, prontos para entrar em combate. E para se avaliar em definitivo da capacidade do inimigo na zona, do elevado nível técnico dos seus quadros, que em tudo se aproxima, sem sombra de exagero do que acontece no Vietname, daremos apenas dois exemplos:

Uma coluna rodava de Guiledge para Gandembel com abastecimentos, protegida por dois grupos de combate. Em dada altura, o IN emboscado, disparou intensa fuzilaria, e, subitamente abriu numeroas colmeias de abelhas, atrás das quais fez explodir potes de fumo. Os soldados, martirizados pelos insectos não podiam permanecer no mesmo sítio para se protegerem.

Frequentemente, o IN inicia a flagelação com armas pesadas ao cair da noite e termina somente na madrugada. No dia 15 de Julho do ano passado, Gandembel sofreu um ataque desses, que agora já é par de vários outros. Mas, à altura, foi considerado o maior da Guiné desde o princípio da guerra. Forma disparados sobre a posição 236 granadas de canhão sem recuo e mais de 300 de morteiro 82 e 120.

Afinal isto dará uma ideia do que efectivamente é a guerra no Ultramar? Pois eu permito-me pensar, de acordo com o que pude observar directamente na Guiné, que o conflito naquela província, não será melhor nem pior que o do Vietname, desde os quadros dirigentes aos operacionais, desde a mentalização dos soldados inimigos ao material por ele usado, que é exactamente o mesmo.

Visita do Bispo de Madarsuma (c)

Gandembel foi a última posição avançada da Guiné que visitei durante a minha estadia nesta Província. Cheguei ali de helicóptero com o bispo de Madarsuma, Vigário Castrense das Forças Armadas, no dia de Natal. Recebeu-nos o comandante da sub-unidade, e, pouco depois comparecia também o governador e comandante chefe das Forças Armadas da Guiné. Assistimos à missa campal em ambiente de fervorosa fé. O prelado e o Governador partiram. Eu quis ficar. Era o meu adeus à guerra e queria portar-me com dignidade perante aqueles jovens soldados que me olhavam risonhamente, talvez comentando o facto de à nossa chegada (a do bispo de Madarsuma e a minha) ter sido festejada pelos “turras” com algumas descargas de morteiro e de metralhadoras pesadas. Julgo até, que eles comentavam entre si o facto de os normais habitantes de certo abrigo me terem ali, quando estes entraram (…) ao explodirem as primeiras granadas. Eu pensava que "gato escaldado de água fria tem medo ...” e tentava adivinhar a sensação do bispo de Madarsuma, que subitamente se sentiu agarrado por um braço no meio da parada e levado para o mesmo abrigo, onde eu já me encontrava.

O Adeus à Guerra

Depois do jantar, um dos oficiais perguntou-me:
- Amanhã não quer ir à ponte? (d)
- Pois claro que vou – respondi-lhe.
- Isso dependerá da festa que os turras nos deram esta noite, concerteza...
- Concerteza que não, senhor alferes! Eu sou um homem que tem medo. Por isso sou capaz de fazer o que todos os outros homens fazem e não são as minas de que há pouco me falou que me assustam.

No dia seguinte, visitei o pessoal de Ponte Balana, mas tive de regressar em corrida, para apanhar o helicóptero que me transportaria a Bissau. Os soldados reuniram-se à volta do aparelho insistindo em que querem receber exemplares do “Diário Popular” com mais frequência e pedindo para eu ver o que poderia fazer nesse sentido.

Foi o meus adeus à guerra. Um adeus com o coração amargurado e o pensamento cheio de admiração por tão extraordinários soldados.

César da Silva
_____
Notas do Zé Teixeira:

a. Suponho que se quer referir a Guiledge, pois nunca ouvi falar em Cimbali
b. Infelizmente eram utilizados para matar soldados portugueses e não só cortarem as picadas. Com isso podiamos nós bem.
c. D. António dos Reis Ribeiro – bispo titular de Madarasuma e Forças Armadas Portuguesas .
d. Fortim de Ponte Balana


Foto 1 > Gandembel > 1968 > Vista geral

Foto 2 > Gandembel > 1968 > Porta de armas

Foto 3 > Gandembel > 1968 > Construindo um abrigo.

Foto 4 > Gandembel > 1968 > Depois do trabalho, o mercido banho
Fotos: © Almeida (de Gandembel) (2008). Direitos reservados

Foto 5 > Gandembel > 2008 > Restos de um abrigo

Foto 6 > Gandembel > 2008 > Restos de um abrigo

Foto 7 > Ponte Balana > 2008 > O poço onde os “rapazes” de Gandembel iam buscar água

Foto 8 > Ponte Balana > 2008

Fotos: © José Teixeira (2008). Direitos reservados

___________________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3240: Recortes de imprensa (8): 35 anos de independência da pátria de Amílcar Cabral

Guiné 63/74 - P3403: In Memoriam (11): Júlio Marques, ex-1º Cabo, CCAÇ 2382, Buba, 1968/70, morto no dia de finados (Idálio Reis)

1. Mensagem do Idálio Reis, com data de hoje. Engenheiro agrónomo, reformado, residente em Cantanhede, foi Alf Mil Op Esp, CCAÇ 2317, Gandembel/Balana, 1968/69:


Meus caros Luís, Vinhal e Briote.

Perdemos mais um companheiro que viveu essa guerra que outrora se travou na Guiné. E há um enorme sentimento de perda.

Cordialmente, Idálio Reis


ASSUNTO: Morreu o Júlio Marques, meu conterrâneo e contemporâneo em terras da Guiné


A efemeridade da vida. Regressava o Júlio, da missa de finados celebrada no cemitério da freguesia, quando o seu coração o trai repentinamente, caindo fulminado por uma paragem cardíaca, deixando na maior dor os seus entes mais queridos.

Morre ainda relativamente novo, com 63 anos, após uma vida em que a sorte que lhe estava reservada, de tantas vezes lhe foi adversa, dando mostras de não o querer bafejar.

Paradoxalmente, o Júlio teve uma juventude feliz, mercê de um desvelado afã dos seus pais, que lhe proporcionaram que fosse estudar, e que viria a abandonar por iniciativa própria, algum tempo antes de ser chamado a cumprir o serviço militar.

Não quis, soube ou teve bastante capacidade para aproveitar a benesse ofertada, e os resultados que conseguiu almejar, foram praticamente nulos. E quando chega da Guiné, a única opção que foi capaz de enfrentar e para a qual estava melhor talhado, como a de tantos outros, foi a de dar continuidade à agricultura que era a forma de vida da casa paterna, e que, em princípio, lhe auguraria um futuro com algum desafogo.

Numa aldeia essencialmente rural, a sua casa agrícola despontava entre as melhores, e, conhecedor da actividade, rasgava-se-lhe um horizonte com razoáveis perspectivas para se inserir no seu meio. Estávamos mesmo no princípio da década de 70.

E os primeiros tempos correram-lhe de feição, sentindo-se um homem feliz, ainda que apenso a muito trabalho e canseiras. Mas esta agricultura, de minifúndio, vai entrando em crise, acentuada de ano para ano, e o Júlio perde rentabilidade. Dificulta-se-lhe a vida, manifestam-se dificuldades impossíveis de superar, e hoje vivia para sobreviver, com uma agricultura de subsistência.

Das vezes que nos encontrávamos, reconhecia nele um homem vencido pelas vicissitudes da vida. Cansado, sem queixumes, continuava bastante apegado às suas courelas, pois só com muito esforço conseguia juntar algum pecúlio para o seu quotidiano.

Tinha como vício o tabaco, e tantas vezes o aconselhava para deixar o cigarro. Ripostava-me que andava a tentar abandonar e que um dia o faria. Debalde!

Se lhe apontava este conselho, era tão só para ter um motivo de conversa, pois era bastante lacónico, pouco propenso para falar do que quer que fosse. E, em poucos minutos, desculpava-se e seguia o seu destino. Tornara-se um aldeão “à antiga”, um homem bom, com um tipo de vida muito caseiro.

Éramos conterrâneos, vivíamos nos extremos da aldeia, e durante a meninice raramente brincámos conjuntamente. A nossa grande amizade foi muito cimentada, quando a minha Companhia esteve em Buba, onde ele já se sediava, julgo que pertencendo à CCaç 2381 ou CCaç 2382 como 1º cabo.

No pretérito dia 1, tínhamo-nos cumprimentado no cemitério da freguesia. Era um homem que sempre dedicou um carinho muito especial à memória dos seus pais, que tanto labutaram por ele. Talvez, neste dia de homenagear mais sentidamente os nossos, um turbilhão de sentimentos e comoções mais transparece nas preces que lhes endereçamos. Não resistiu no Júlio.

Em dia de finados, porventura cismando na roda e rumo que a sua vida tomara, num ápice uma folha de Outono tomba para sempre. E deixa-nos mais pobres, pois a perda de um amigo é sempre uma fatalidade pesarosa.

Curvo-me em silêncio à perenidade da memória do homem grande que foi o Júlio Marques. Até sempre, bom amigo.

Um forte abraço a toda a Tertúlia
do Idálio Reis.

Guiné 63/74 - P3402: Acção psicológica a funcionar... O Desporto em Chão Manjaco (Jorge Picado)


1. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado, ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, com data de 1 de Novembro de 2008

Amigos e Camaradas

Estava com disposição de contar algo sobre a minha estada em Chão Manjaco e saíu-me a prosa que se segue.


Apsico a funcionar em Teixeira Pinto

Quando da minha apresentação, citei numerosos nomes de povoações, a maioria dos quais do Chão Manjaco, que levaram até a questionar o que saberia sobre o fatídico dia da morte dos Três Majores nesse Chão. Claro que, sobre esse acontecimento, só sei o que é do conhecimento geral, uma vez que nessa época andava por terras do Chão Balanta.

Já me referi, sobre a história da minha passagem por MANSABÁ, como acordei e acabei por ser colocado no CAOP 1 em TEIXEIRA PINTO. Como disse então, creio que foi com uma ajudinha directa ao então Comandante desse Agrupamento que na altura se encontrava de férias na Metrópole, mas, como agora quem poderia confirmar já cá não mora e, valha a verdade, depois de regressar não mais quis pensar nesses assuntos, não sei exactamente como ocorreu o facto.

A verdade é que pouco mais de 15 dias depois de me ter apresentado na CArt 2732 recebi a Nota n.º 7007/A, de 15MAR71 da 1.ª REP, dando-me conhecimento da colocação no CAOP 1 em substituição do Cap. Pinto de Lima, mandando-me apresentar logo que seja desnecessário. Estes amaldiçoados formalismos vertidos naquela expressão fizeram com que o nosso brilhante co-editor Carlos Vinhal tivesse que aguentar por mais uns tempos este desajeitado ex-Capitão

Assim em 04MAI71 saí às 6 horas da manhã de BISSAU para TEIXEIRA PINTO, numa coluna que atravessando o Rio Mansoa na jangada em JOÃO LANDIM cerca das 6h30m chegou ao seu destino cerca das 13 horas.

Tratando-se dum percurso para mim desconhecido – depois de JOÃO LANDIM com rumo a Norte apanhava-se a bifurcação antes de BULA, onde não se entrava e, rumando para Oeste passava-se por CÓ, PELUNDO e finalmente a nova casa – sempre em estrada bem asfaltada e de bermas bem desmatadas, mas a verdade é que, mesmo não conhecendo tal itinerário, já não senti qualquer emoção como tinha sentido cerca de 15 meses antes quando pela 1.ª vez rumei a MANSOA.

A verdade é que agora já era naturalmente um velho e não um reles periquito virgem nestas andanças. Os meus olhos já não vasculhavam para todo o lado à espera de ver aparecer a todo o momento os ferozes turras. Preocupado? Sempre. Mas agora, encarando com naturalidade e uma grande frieza a realidade duma paisagem desertificada, sem tão pouco saborear a possível beleza que, em circunstâncias de normalidade poderia usufruir.

A minha estadia neste Agrupamento não se comparou em nada com o restante tempo passado até aí nas outras localidades, dada a natureza das funções que passei a desempenhar e a aparente calma que se vivia. No entanto o meu alheamento por tudo que me cercava mantinha-se, raramente entrecortado por lapsos de lucidez.

Para me posicionar e enquadrar quem ler estas recordações esclarecerei que, quando cheguei o CAOP 1 tinha por Cmdt o Cor Art Gaspar P. de C. Freitas do Amaral, mais tarde substituído pelo Cor Pára Rafael F. Durão e lembro-me do Maj CEM Inocentes – Chefe do EM –, Maj CEM Barroco – Of Op (?) –, Cap Art Borges – Adj Of Op e meu camarada de quarto –, havendo possivelmente mais um que não recordo. Perdoem-me todos os outros, Alf e Fur do CAOP propriamente dito, mas de quem já não tenho na lembrança.

Passei a ser adjunto do Of Inf e Acap/Pop (?), o Maj Santos Costa, ficando com as tarefas relacionadas com os assuntos da Acap/Pop e assim, tendo deixado a G-3 ou qualquer outra arma, passei a empunhar lápis e bloco de notas de forma a documentar-me sobre os encontros que se efectuavam com as populações e os chefes das mesmas, anotar as preocupações, queixas, os avanços e atrasos na execução das obras planeadas e depois, no gabinete, redigir actas das reuniões e relatórios para serem remetidos ao COMCHEFE.
Depois deste intróito o que hoje quero recordar são 3 factos, de natureza desportiva, inseridos no âmbito das actividades da APSICO, ocorridos durante a minha permanência.

O 1.º diz respeito a uma prova de ciclismo organizada pelo CAOP – a 1.ª, não sabendo se posteriormente se realizou mais alguma – naquela localidade e designada por Circuito de Teixeira Pinto, da qual guardo 2 fotografias (tiradas por quem?) já bastantes deterioradas, mas que envio em anexo para que ajuízem da possibilidade de serem apresentadas.
Teve lugar esta prova no dia 12SET71, Domingo, como não podia deixar de ser e acerca dela transcrevo as parcas notas que constam da Agenda.

[Circuito T. Pinto -/9 inscritos. 15 voltas à Avenida, 24 km/1h 5m, por cima de lama, água e sob um calor tórrido. (10,15 -11,20). 1.º Abdul Karim (Pel.)]

Portanto e esclarecendo melhor, este circuito que decorreu na Avenida Central, constou de 15 voltas à mesma perfazendo um total de cerca de 24 km, tendo sido realizado em 1h05m, pelo menos pelo vencedor que foi um tal Abdul Karim (não sei se o nome estará correctamente grafado) do PELUNDO. Os inscritos teriam sido 9, segundo a nota, ainda que pela foto estejam alinhados à partida 10 (?).

A prova contou, como não podia deixar de ser, com a presença das Autoridades – Militares, Civis, Religiosas e Tribais – tendo-se iniciado às 10h15m e terminado às 11h20m. Como refiro a pista estava toda enlameada, cheia de poças de água – ainda visíveis nas fotos – e o calor era já elevado, condições aliás próprias da época (estava-se na época das chuvas).

As bicicletas eram as vulgares pasteleiras, como todos se devem lembrar, já muito usadas, mas que nem por isso fazia desanimar os concorrentes, como se pode observar, naqueles momentos antes da partida mais interessados quiçá a sonhar qual deles se transformaria no herói, face à inúmera assistência que povoava os passeios, mas principalmente perante as bajudas presentes!

Se as fotos puderem ser recuperadas, nelas se observarão alguns dos aspectos que enumerei, desde o ar descontraído – algum mais concentrado – dos concorrentes e suas maravilhosas máquinas, passando pelo terreno e o tipo de avenida que era de 2 faixas com separador central, até à numerosa assistência que emoldurava os passeios e não só, pois até no telhado duma casa em construção (?) se empoleiraram para ver melhor.

São visíveis 3 militares dos quais, admito que o de calções seja o Maj Inocentes, enquanto sobre os outros 2, apesar de perfil e postura de andar dum deles se parecer comigo, não ouso fazer qualquer sugestão. Só posso garantir que estava presente.

Finalmente tenho que confessar e, mais uma vez isto sucede, sempre que visiono estas fotografias me interrogo. Será que estive mesmo nestas paragens? Não teria sido um sonho? É que não tenho a mínima ideia daquilo que vejo. É como se nunca tivesse pisado aquela rua e, no entanto, nem eu sei quantas as dezenas de vezes que percorri aqueles cerca de 1600 metros da avenida fosse de jeep, Unimog ou mesmo a pé.

É isto que mostra o verdadeiro estado de alma em que me encontrava. Andava por ali, impessoal, aéreo, olhando, mas não vendo, qual sonâmbulo deambulando por entre a multidão e a paisagem. Por isso tudo aquilo se esfumou rapidamente, quando, naquela fase, devia ser o contrário. Se era a zona mais tranquila por onde passei, devia ser aquela cujas recordações mais perdurassem. Mas afinal não foi assim. Vá-se lá saber porquê.

Já quando logo no principio de 2007 li "Diário da Guiné. Lama, Sangue e Água Pura" do António Graça de Abreu, que me fartei de anotar, fiquei admirado por muitas das passagens que conta de TEIXEIRA PINTO, das quais não guardo recordação. Até quando ele cita o cinema, me admirei e no entanto, se não vi lá qualquer filme (não me lembro), pelo menos tive de assistir a uma sessão onde uma entidade religiosa da Mauritânia proferiu uma palestra em marabu (?).

O 2.º, que aconteceu no Domingo 26SET71, foi uma Prova de Atletismo, denominada pomposamente Légua de Teixeira Pinto que decorreu no mesmo lugar e constou de 3 voltas à mesma Avenida, num total de 5 km.
Deste acontecimento não guardo fotos e as notas ainda são mais parcas.

[Légua de T.PINTO. 10h – 30 c – 3 voltas Av. 5 km]

Iniciou-se às 10h, quando o tempo quente e húmido já fazia naturalmente mossas, contando com maior número de concorrentes, 30, naturalmente porque para o ciclismo era preciso montada e estas não abundassem, creio eu. Não posso explicar porque nem sequer o nome do vencedor anotei.

O 3.º acontecimento ocorreu no Domingo 3OUT71 e tratou-se dum Jogo de Futebol interno, para consolidação das relações entre militares metropolitanos e africanos. Uma equipa da CCS do BCaç 2905 contra uma representação da CCaç 16.

Devo dizer que estas partidas, realizadas sempre com o espírito de confraternização, eram sempre uma incógnita quanto ao seu desfecho, pois nunca se sabia quando poderiam dar para o torto. Recordo-me que antes de se tomar a decisão de as efectuar ponderava-se muito o risco e tomavam-se algumas cautelas… nesta, porém, não houve problemas, talvez porque o resultado final se traduziu num empate a 1 golo.

Apenas escrevi como notas [Futebol – CCS x CCAÇ 16 (1-1)].

E por hoje já chega de maçada.
Abraços
Jorge Picado



Fotos a que se refere o camarada Jorge Picado. Tiradas antes da partida para as 15 voltas pela Avenida Principal de Teixeira Pinto, que se completaram no tempo de 1 hora e 5 minutos.
Pena que viessem em tão mau estado. O que se conseguiu é muito pouco, em termos de resolução.

_____________

Nota de CV

Vd. último poste de Jorge Picado de 28 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3369: Em busca de... (49): Resultado das buscas da causa da morte do conterrâneo de Jorge Picado, João Nunes Redondo, ex-Fur Mil Sap

Guiné 63/74 - P3401: Blogoterapia (70): Notícias da Tabanca Grande (Carlos Vinhal)

I. O Carlos Vinhal, que é um mouro de trabalho, mandou-nos hoje, a todos nós, um ficheiro pdf com a lista, actualizada dos nomes e dos endereços de email do pessoal da Tabanca Grande (ou tertúlia, como dizíamos originalmente, com algum pretensiosismo).

Garantimos que essa lista está em boas mãos, não correndo o risco de ir parar, por exemplo, aos ficheiros dos recrutadores de mancebos para guerras futuras. A verdade é que já somos, entre amigos e camaradas da Guiné, cerca de 280, residentes nas mais diversas partes do país, desde Miranda do Douro a Faro, e da Madeira aos Açores, e até no estrangeiro, na diáspora portuguesa (Austrália, Brasil, Canadá, EUA, França, Holanda, República Checa...). Sem esquecer a nossa querida Guiné-Bissau...

O Carlos aproveitou a oportunidade para esclarecer algumas dúvidas sopbre o envio de comentários, que voltamos a reproduzir aqui:

Caros camaradas e amigos tertulianos

Junto vos envio lista actualizada dos endereços da tertúlia.

Como aparecem amiúde camaradas a solicitar endereços, sugiro que a guardem em ficheiro nos vossos PCs e que a substituam sempre que vos envie outra mais actualizada.

Por outro lado, aparecem camaradas a queixarem-se de que não conseguem fazer comentários no Blogue por não terem conta no Google e lhes ser sugerido abertura de uma.

Deixo uns tópicos para deixarem o vosso comentário. Lembro que é uma forma fácil e rápida de interagirem com os camaradas que escrevem.

1 - Clicar na palavra Comentários existente no fim da cada postagem
2 - Escrever o texo na caixa, não esquecendo de indicar o nome para evitar o anonimato
3 - Introduzir os caracteres produzidos pelo Google na caixa de Verificação de palavras
4 - Na área de Seleccionar uma identidade, escolher a opção Anónimo
5 - Finalmente clicar em Publicar o seu comentário

Os editores estão disponíveis para, dentro dos seu conhecimentos, ajudar nas eventuais dificuldades que possam surgir aos tertulianos.

Pelos editores
Carlos Vinhal



II. Aproveitamos para reforçar o pedido da equipa editorial para que toda a gente participe também no blogue, regularmente, com os seus comentários, críticas ou sugestões. Participar significa, etimologicamente falando, tomar parte em, ser protagonista, ser actor... Não queremos que sejam sempre os mesmos a mandar bitaites. Além disso, já ninguém precisa mais de pedir licença e pôr-se em sentido, para fazer o seu comentário, crítica ou sugestão. Estamos todos na peluda e esquecemos o famigerado RDM:

Amigo ou camarada da Guiné:

A tua opinião é muito importante para nós. Podes (e deves) escrever, no final de cada poste ou texto, o que te aprouver: um pequeno comentário, uma nota adicional, um reparo, uma crítica, uma sugestão... Basta clicares duas vezes sobre comentários que aparece no fim de cada texto, antes dos Marcadores (palavras-chave).

O teu comentário será publicado instantaneamente, sem moderação. Se voltares ao blogue (clicando no ícone Refresh, por exemplo) , encontrarás logo o teu texto. Escreve com total liberdade e inteira responsabilidade (o que significa respeitar as boas regras de convívio que estão em vigor entre nós: por exemplo, não nos insultamos uns aos outros, somos capazes de conviver com as nossas diferenças, discordamos sem puxar da G3...).

Não precisas de ter uma conta Google/Blogger. Podes fazer um comentário como anónimo, mas é conveniente (e desejável) que deixes sempre um contacto teu (nome, localidade, antiga unidade e, se possível, e-mail, no caso de ainda não pertenceres à nossa Tabanca Grande). Os amigos e os camaradas da Guiné não se escondem no anonimato, são pessoas habituadas a dar a cara.

Um Alfa Bavo (ABraço).
Os editores LG/CV/VB

Guiné 63/74 - P3400: Histórias engraçadas (António Matos) (1): A fábrica de Mafra ou como se fazia um militar

1. Mensagem de 2 de Novembro, enviada pelo António Matos, ex-Alf Mil, CCAÇ 2790, Bula, 1970/72 (*):

O ser humano, quando transformado em militar, mesmo que à força, adquire características ímpares que lhe permitem graus de sobrevivência excelentes ainda que, para alcançar esse estádio, passe por situações e provações complicadas mas, por vezes, hilariantes.

Desde os bancos da escola (leia-se recruta) que nos habituámos a chafurdar em charcos nauseabundos e a sermos obrigados, ao chegar ao quartel, a apresentarmo-nos 10 minutos depois lavados, penteados, barba feita, fardados a preceito e, calcule-se, com aquelas botas engraxadas e a brilharem !!!

E não é que todos conseguíamos a façanha ?

Desde miúdo de tenra idade que, em minha casa, eu era obrigado ( felizmente !!) a fazer a minha cama antes de sair para a escola. Essa especialização deu-me a facilidade para na tropa não ter essa função como um quebra-cabeças em oposição a alguns camaradas que não tinham como hábito aquela arte de bem esticar lençóis sem deixar ruga que os levava a cumprir 100 flexões!

Em minha casa havia a célebre expressão do saudoso Pai que dizia Aqui não há não gosto!, e com isso tudo o que caía no prato era devorado com prazer. Em oposição, na tropa, todos vimos camaradas a revirarem as tripas quando eram confrontados com a necessidade de enfardarem com aquelas comidas enlatadas que, para eles, eram intragáveis.

Aliás cheguei a fazer verdadeiros banquetes com os pitéus que alguns desprezavam ...

Na tropa, muitos fomos barbeiros de ocasião na tentativa de safar o camarada que se descuidara e não cortara a trunfa o suficiente que lhe permitisse gozar o fim de semana.

Também o fui e, de tesoura em riste, aparei a guedelha ao Teófilo Leite, em Mafra, ao fim de cuja operação de estética, ele ganhou o fim de semana e eu habilitei-me à forca ! Qualquer semelhança da cabeça dele com um parafuso sextavado, não era pura coincidência !

Eu assentei praça em Mafra. A complexidade arquitectónica do Convento transformado em quartel dava-nos durante a 1ª semana uma certa condescendência da parte dos instrutores para pequenos atrasos à formatura pois não raras eram as vezes em que um tipo se perdia nos corredores e primeiro que desse com a saída ....

Eu vivia em Guimarães, de onde me deslocava todos os fins de semana para uma verdadeira transformação física e psicológica bem ao jeito da Laranja Mecânica. Nessa altura, um dos meus camaradas de viagens e de pelotão era o Abreu.

O Abreu usufruía do beliche de cima (1º dtº), do par de beliches ao lado do meu, sendo que eu habitava o rés-do-chão esquerdo. Certa madrugada, o Abreu terá sofrido duma violenta diarreia e começou a chamar pelo camarada do 1º esqº (o Barbosa, pegador de touros ) do qual pretendia que lhe indicasse onde raio eram os sanitários. As altas horas dessa madrugada não permitiram que o Barbosa acordasse daquele sono rônquico e, entretanto, o Abreu continuava a chamá-lo na tentativa de o acordar.

O Abreu acaba por se calar no preciso momento em que o Barbosa despertou virando-se para ele:
- Eh pá o que foi ? o que queres ?

Com cara de desesperado, o Abreu apenas lhe disse:
- Nada ! Já me caguei!

Um abraço,
António Matos

________________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores:

1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3390 Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)

2 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3392: Blogoterapia (67): Homenagem aos que choram (António Matos)