1. Mensagem do nosso camarada Eduardo Magalhães Ribeiro (*), ex-Fur Mil de Operações Especiais da CCS/BCAÇ 4612, Cumeré, Mansoa e Brá (1974), com data de 18 de Abril de 2009:
Boa tarde Amigos Tertulianos,
Tenho andado às voltas a construir um blogue com coisas da Guiné (selos, notas e moadas, postais, etc.), e outras, se quiserem dar uma vista de olhos, vejam principalmente em mensagens antigas (para lá chegarem têm que clicar 2 vezes no fundo de cada página em mensagens antigas):
http://coisasdomr.blogspot.com/
É claro que todo o material lá cololado, que o Luís Graça, Vinhal ou Briote acharem interessante, para colocar no "nosso" blogue dos "camaradas da Guiné", é só dizerem que eu envio o mesmo para o efeito.
Também já me disponibilizei totalmente, ao Luís Graça, Vinhal ou Briote, para ajudar no que for preciso para continuar a fazer do "Luís Graça & Camaradas da Guiné", um dos mais consultados blogues da internete, senão o maior de todos, pois tenho andado a treinar no primeiro.
Com os melhores desejos de bom fim-de-semana para todos vós, um abraço deste vosso amigo Piriquito de Mansoa M.R.
O Blogue Coisas do MR pode ser visitado em http://coisasdomr.blogspot.com/
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 10 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4170: Blogoterapia (99): Joaquim Gomes, mais um Comando africano barbaramente assassinado (Magalhães Ribeiro)
Vd. último poste da série de 29 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3814: Blogues da Nossa Blogosfera (15): Companhia de Transportes 2642 - Guiné 69/71 (José Pereira Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 18 de abril de 2009
Guiné 63/74 - P4208: Bandos... A frase, no mínimo infeliz, de um general (15): Curvo-me perante V.Ex.ª, uma vez mais... (Manuel Maia)
Manuel Maia foi Fur Mil na 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, (1972/74).
1. Uma das maneiras de lembrar o vão sacrifício dos camaradas que não voltaram connosco, é exprimir a revolta sentida, perante palavras injustas e ofensivas.
Fogo à peça Manuel, que nunca te falte a arte e o engenho para nos presenteares com os teus textos sempre apropriados.
Mensagem de Manuel Maia (*), com data de 14 de Abril de 2009:
Ainda e Sempre a intervenção no mínimo infeliz de A.B.
P´ra lá da imensa inóspita bolanha,
do medo que gerava ódio, sanha
havia uma tabanca renovada.
Telhados, colmo novo, a evidência
da actividade intensa e resistência
da inimiga gente lá instalada...
Uns quinze dias antes, tropas lusas,
em golpe perpetrado pelos fuzas
ao IN infligem lá duro revés.
Resposta p´las palhotas destroçadas
foi dada às nossas bases, flageladas,
Abril catorze, treze e dia dez...
Saímos da aramada posição
em bandos, mesmo à guiza de excursão,
carentes da enluvada mão de AB...
Retido por Bissau nos matagais
o Rambo dava lustro aos seus metais
gorando a nossa ´sp´rança, já se vê...
No pic-nic feito de seguida,
das gentes lá do sítio é recebida,
mensagem p´ro "manjor" que idolatravam...
-"Nós quer museu de AB, oiçam-nos bem ,
medalhas, lenço "suma ele", tem...
só faltam os ray-ban, salientaram...
Depois deste convívio com o povo,
farpado arame aguarda-nos de novo
para um papel discreto, pouco activo...
D´audácia estão os bandos arredios
sem peitos p´ra medalhas, quais gentios,
d´herói tem já AB o exclusivo...
A minha sentida homenagem (enquanto parte integrante dos bandos que preguiçosamente se espraiavam por trás dos mares de arames farpados, divertindo-se à grande, em jogos de paint-ball fugindo dessa forma à entediante vivência proporcionada nessas opulentas estâncias turísticas do guinéu espaço, onde o dolce far niente era apanágio, e queimando assim as calorias dos inebriantes menús servidos à la carte numa ambiência digna de marajás...) a sua excelência o nosso bem amado herói, figura quase mítica a quem a história dos homens reservou, por certo, um espaço adequado para ali gravar a letras de ouro, todo um historial digno de figurar ao lado de Gamas e Cabrais, dum Medina ou dum Malhoa (tal a precisão do retrato...) dum Teixeira Lopes ou Soares dos Reis, pelas belas páginas de portugalidade que redescobriu, que escreveu, nesses cenários pintados e esculpidos no TOG e nos fez embevecer a todos...
Curvo-me perante V.Ex.ª uma vez mais, esperando ter contribuído minimamente para enaltecer os actos dum português lhano, simples, por isso merecedor de todos os encómios.
Muito agradecido a V.Ex.ª
Manuel Maia
__________
Nota de CV
(*) Vd. poste de 7 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4154: Estória avulsas (26): Estou na Guiné há treze meses e a minha mulher está grávida (Manuel Maia)
Vd. último poste da série de 11 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4172: Bandos... A frase, no mínimo infeliz, de um general (14): Desprestígio e ofensa a quem foi obrigado a combater (Manuel Reis)
1. Uma das maneiras de lembrar o vão sacrifício dos camaradas que não voltaram connosco, é exprimir a revolta sentida, perante palavras injustas e ofensivas.
Fogo à peça Manuel, que nunca te falte a arte e o engenho para nos presenteares com os teus textos sempre apropriados.
Mensagem de Manuel Maia (*), com data de 14 de Abril de 2009:
Ainda e Sempre a intervenção no mínimo infeliz de A.B.
P´ra lá da imensa inóspita bolanha,
do medo que gerava ódio, sanha
havia uma tabanca renovada.
Telhados, colmo novo, a evidência
da actividade intensa e resistência
da inimiga gente lá instalada...
Uns quinze dias antes, tropas lusas,
em golpe perpetrado pelos fuzas
ao IN infligem lá duro revés.
Resposta p´las palhotas destroçadas
foi dada às nossas bases, flageladas,
Abril catorze, treze e dia dez...
Saímos da aramada posição
em bandos, mesmo à guiza de excursão,
carentes da enluvada mão de AB...
Retido por Bissau nos matagais
o Rambo dava lustro aos seus metais
gorando a nossa ´sp´rança, já se vê...
No pic-nic feito de seguida,
das gentes lá do sítio é recebida,
mensagem p´ro "manjor" que idolatravam...
-"Nós quer museu de AB, oiçam-nos bem ,
medalhas, lenço "suma ele", tem...
só faltam os ray-ban, salientaram...
Depois deste convívio com o povo,
farpado arame aguarda-nos de novo
para um papel discreto, pouco activo...
D´audácia estão os bandos arredios
sem peitos p´ra medalhas, quais gentios,
d´herói tem já AB o exclusivo...
A minha sentida homenagem (enquanto parte integrante dos bandos que preguiçosamente se espraiavam por trás dos mares de arames farpados, divertindo-se à grande, em jogos de paint-ball fugindo dessa forma à entediante vivência proporcionada nessas opulentas estâncias turísticas do guinéu espaço, onde o dolce far niente era apanágio, e queimando assim as calorias dos inebriantes menús servidos à la carte numa ambiência digna de marajás...) a sua excelência o nosso bem amado herói, figura quase mítica a quem a história dos homens reservou, por certo, um espaço adequado para ali gravar a letras de ouro, todo um historial digno de figurar ao lado de Gamas e Cabrais, dum Medina ou dum Malhoa (tal a precisão do retrato...) dum Teixeira Lopes ou Soares dos Reis, pelas belas páginas de portugalidade que redescobriu, que escreveu, nesses cenários pintados e esculpidos no TOG e nos fez embevecer a todos...
Curvo-me perante V.Ex.ª uma vez mais, esperando ter contribuído minimamente para enaltecer os actos dum português lhano, simples, por isso merecedor de todos os encómios.
Muito agradecido a V.Ex.ª
Manuel Maia
__________
Nota de CV
(*) Vd. poste de 7 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4154: Estória avulsas (26): Estou na Guiné há treze meses e a minha mulher está grávida (Manuel Maia)
Vd. último poste da série de 11 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4172: Bandos... A frase, no mínimo infeliz, de um general (14): Desprestígio e ofensa a quem foi obrigado a combater (Manuel Reis)
Guiné 63/74 - P4207: In Memoriam (20): Para o António Ferreira e demais camaradas mortos no Quirafo (Juvenal Amado)
1. Mensagem do Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74:
Caros Luís, Carlos,Vírginio e restante Tabanca Grande:
Não vou esconder que este texto é motivado pelo que senti, ouvi e que presenciei, no Saltinho após a tragédia [de Quirafo, em 17 de Abril de 1972].
Efectivamente eu estive no Saltinho, ainda a tempo de ver a caserna abrigo, quase transformada em Santuário. As camas todas feitas de branco sem uma marca, que alguém lá podesse ter deixado.
No entanto, para além de dedicar à mulher (foto à direita) do nosso camarada Ferreira (foto à esquerda), gostaria de o dedicar também a todos que deixaram os seus sonhos naquelas paragens.
Sem mais um abraço
Juvenal Amado
2. SÓ DEUS TEM OS QUE MAIS GOSTA
por Juvenal Amado
O vazio que ficou.
A dor que nos atingiu, vai transformar-se em ausência
e mais tarde saudade.
O calor o suor, cheiro adocicado do sangue e carne queimada
não nos largará mais.
As bocas abertas falam, mas ninguém ouve.
Os gritos estão presos na garganta,
as lágrimas ameaçam soltar-se e cair em cascatas,
abrindo sulcos entre o pó acumulado nos rostos.
Se pudéssemos,
voltaríamos atrás uns breves minutos,
alteraríamos o rumo da história.
O calor que nunca nos dá descanso.
O que não daríamos para poder escolher,
escolhermos outro caminho,
não fazermos da mesma forma.
As mãos estão negras em volta dos punhos das armas.
O silêncio é opressivo,
de nada vale tentar ouvir se até a natureza se calou
perante a violência, de que só o homem é capaz.
Ali jazem sonhos anseios futuros aguardados.
As últimas cartas ainda queimam no bolso,
não vai haver resposta.
Os rostos jovens nas fotos nunca vão envelhecer.
O tempo passará para todos,
menos para quem está naquelas fotos.
O que somos será sempre reflexo das nossas vivências passadas?
Há quem defenda que é um CARMA.
Viemos completar com a passagem por esta vida,
mais um elo para a nossa eternidade
ou vida melhor noutra dimensão.
Aquele é o filho de...
Marido de...
O pai de...
Alguém escreveu que o que separa da Paz e da Guerra são os enterros.
Em Paz os filhos enterram os pais...
Em Guerra os pais enterram os filhos...
Invertem-se assim os valores
tidos como certos pela ordem natural das coisas.
Como diz a canção «Só Deus tem os que mais gosta».
Que este pensamento minimize a dor de todos
que viram partir os seus na flor da idade.
Juvenal Amado
[Fixação / revisão de texto: L.G.]
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 18 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4205: In Memoriam (19): António Ferreira, 1.º Cabo TRMS da CCAÇ 3490, morto em combate no dia 17 de Abril de 1972 (Cátia Félix)
Caros Luís, Carlos,Vírginio e restante Tabanca Grande:
Não vou esconder que este texto é motivado pelo que senti, ouvi e que presenciei, no Saltinho após a tragédia [de Quirafo, em 17 de Abril de 1972].
Efectivamente eu estive no Saltinho, ainda a tempo de ver a caserna abrigo, quase transformada em Santuário. As camas todas feitas de branco sem uma marca, que alguém lá podesse ter deixado.
No entanto, para além de dedicar à mulher (foto à direita) do nosso camarada Ferreira (foto à esquerda), gostaria de o dedicar também a todos que deixaram os seus sonhos naquelas paragens.
Sem mais um abraço
Juvenal Amado
2. SÓ DEUS TEM OS QUE MAIS GOSTA
por Juvenal Amado
O vazio que ficou.
A dor que nos atingiu, vai transformar-se em ausência
e mais tarde saudade.
O calor o suor, cheiro adocicado do sangue e carne queimada
não nos largará mais.
As bocas abertas falam, mas ninguém ouve.
Os gritos estão presos na garganta,
as lágrimas ameaçam soltar-se e cair em cascatas,
abrindo sulcos entre o pó acumulado nos rostos.
Se pudéssemos,
voltaríamos atrás uns breves minutos,
alteraríamos o rumo da história.
O calor que nunca nos dá descanso.
O que não daríamos para poder escolher,
escolhermos outro caminho,
não fazermos da mesma forma.
As mãos estão negras em volta dos punhos das armas.
O silêncio é opressivo,
de nada vale tentar ouvir se até a natureza se calou
perante a violência, de que só o homem é capaz.
Ali jazem sonhos anseios futuros aguardados.
As últimas cartas ainda queimam no bolso,
não vai haver resposta.
Os rostos jovens nas fotos nunca vão envelhecer.
O tempo passará para todos,
menos para quem está naquelas fotos.
O que somos será sempre reflexo das nossas vivências passadas?
Há quem defenda que é um CARMA.
Viemos completar com a passagem por esta vida,
mais um elo para a nossa eternidade
ou vida melhor noutra dimensão.
Aquele é o filho de...
Marido de...
O pai de...
Alguém escreveu que o que separa da Paz e da Guerra são os enterros.
Em Paz os filhos enterram os pais...
Em Guerra os pais enterram os filhos...
Invertem-se assim os valores
tidos como certos pela ordem natural das coisas.
Como diz a canção «Só Deus tem os que mais gosta».
Que este pensamento minimize a dor de todos
que viram partir os seus na flor da idade.
Juvenal Amado
[Fixação / revisão de texto: L.G.]
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd. poste anterior desta série > 18 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4205: In Memoriam (19): António Ferreira, 1.º Cabo TRMS da CCAÇ 3490, morto em combate no dia 17 de Abril de 1972 (Cátia Félix)
Guiné 63/74 - P4206: Memórias de outros tempos (1): Fur Mil Aguinaldo Pinheiro, o morto-vivo do BART 1913 (Jorge Teixeira - Portojo)
1. Mensagem de Jorge Teixeira - Portojo(*), ex-Fur Mil do Pel Canhões S/R 2054, (Catió, 1968/70), com data de 14 de Abril de 2009:
Amigo Carlos
Se der para meter no Blogue, gostaria de contar umas estórias sobre Mortos-Vivos.
Esta é uma delas. As datas estão na história do BART 1913.
O Morto Vivo Pinheiro
História do BART 1913
....
Feridos
....
12JUN68 - Fur Mil Aguinaldo Dias Pinheiro/CCS
....
Abates
13JUN68 - Fur Mil Sap Inf Aguinaldo Dias Pinheiro - Evacuado para o HMP
A minha história
Eu pira com uma dúzia de dias de Catió.
Dia de anos da minha mãe. Dia de reabastecimentos a Cufar.
Saí com o meu Pelotão integrado no Grupo que fazia a segurança e a picagem da estrada Catió-Cufar e ficamos a montar a segurança, segundo me disseram, próximo do cruzamento de Camaiupa. Recomendaram-me muito cuidadinho. Os sapadores do Alf Ganhão seguiam já bem lá à frente. De repente rebentamentos. Uma viatura passou bem rápida no sentido do barulho e regressou passado algum tempo.
A voz corrente foi de que o Fur Pinheiro lerpou ao levantar uma mina. Nunca mais soubemos nada do acidente e realmente todos em Catió ficamos convictos que o Pinheiro tinha ido para o outro lado.
Muitos anos depois, encontro o Victor Condeço e logicamente começamos a conversar do passado. E o Pinheiro veio à baila. Disse-me o Victor que ele estava vivo. Tinha-o encontrado num convívio da CCS
20 de Maio de 2007
Dia de festa para a CCS do Bart 1913 na Serra do Pilar. Estive presente e feliz por rever antigos companheiros com quem passei nove meses de Guiné, e muitos deles reconheci-os à primeira. Mas queria ver o Pinheiro. Embora só tivesse convivido com ele cerca de um mês, a marca que deixou em mim foi grande. E o Pinheiro apareceu vindo lá do sul de Portugal. Foi com alegria que o abracei e pude ouvir parte da história do que lhe aconteceu. Sim, porque ele não sabe contar a outra parte. Só se lembra até... depois desapareceu tudo.
Recordando o após, disse-me fez uma dúzia de intervenções cirúrgicas, já não sabe quantas, mas diz muito galhofeiramente, que até foi bom, pois só ficou sem uma parte do cérebro que era a inútil. E assim reencontrei o Pinheiro e fiquei feliz num dia para recordar para toda a vida.
Aqui vai a foto dele, tal como estava há dois anos. Sei que não se chateia de o referir, pois diz nada mais o chatear depois daquele dia 12 de Junho de 1968.
Jorge Teixeira
Aguinaldo Dias Pinheiro, ex-Fur Mil Sap de Inf, felizmente vivo e de boa saúde.
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3987: Recortes de Imprensa (14): Soldados mortos na guerra colonial terão memorial no Porto, JN de 5/3/2009 (Jorge Teixeira)
Guiné 63/74 - P4205: In Memoriam (19): António Ferreira, 1.º Cabo TRMS da CCAÇ 3490, morto em combate no dia 17 de Abril de 1972 (Cátia Félix)
António Ferreira, 1.º Cabo TRMS da CCAÇ 3490, falecido em combate no dia 17 de Abril de 1972, durante uma emboscada no Quirafo.
1. Normalmente costumo apresentar, à esquerda dos postes, uma foto de um jovem militar, garboso, cheio de pose, independente do seu posto militar, porque isso não foi o mais importante para cada um de nós, e à direita um velhote, entradote, nos sessentas, a maioria das vezes, pai e avô.
Desta vez, se à esquerda aparece um militar com a mesma pose altiva, aparece do lado direito a mesma foto, mas... emoldurada com um rendilhado de metal e extraída de uma lápide de cemitério. Nunca tal me havia acontecido.
Este camarada nem sequer teve uma morte natural, se é que morrer aos vinte anos é natural, mas morreu violentamente, vítima de uma guerra que não provocou nem para a qual se ofereceu como voluntário, com o fito de ganhar principesco ordenado.
Feito este desabafo, neste domingo triste e chuvoso, passemos à cerimónia ontem acontecida, na passagem dos 37 anos da emboscada do Quirafo, no Cemitério de Águas Santas, Maia, em memória do nosso camarada António Ferreira.
Que a homenagem de ontem, fosse não só em memória do António Ferreira, mas de todos os nossos camaradas que perderam a sua vida ao serviço do país, na Guerra Colonial. Uma coisa foi a justeza da guerra, discutível, outra o cumprimento do dever para com Portugal.
CV
2. Mensagem da nossa jovem amiga Cátia Félix, datada de 17 de Abril de 2009:
Olá Amigos
O dia de hoje, passado 37 anos da fatídica Tragédia do Quirafo, ficará na memória de muitos como recordação de um dia cheio de amor, paz, amizade, camaradagem... ao contrário de há 37 anos atrás...
Eram 16h e eu, a Cidália e a filha chegavamos ao Cemitério de Águas Santas. Mal entramos na rua principal vemos ao longe um Batalhão de homens. O nosso coração tremeu... O desejo da Cidália iria agora tornar-se realidade. Juntar os camaradas do malugrado Ferreira e fazer a sua devida homenagem, a ele que morreu na emboscada do Quirafo, a todos os militares que não regressaram aos seus lares, aos que continuam entre nós... Apresentações feitas, rumamos juntos até ao talhão reservado a militares da Guerra Colonial naquele cemitério, onde também está António Ferreira.
Camaradas de guerra presentes, representando também os que não estavam entre nós, depositaram sob a campa uma bonita coroa de flores. Acenderam-se velas, deu-se o devido Alfa Bravo e, todos juntos falamos um pouco de toda esta história.
Como sugerido pelo Luís Graça, todos fizemos um minuto de silêncio em homenagem a todos os combatentes que perderam as suas vidas na Guerra Colonial. Digo-vos que esse minuto, sem ninguém contar, ficou marcado pelo tocar dos sinos...
Correram lágrimas...
No fim do merecido reconhecimento, todos abraçamos a Cidália e, os Camaradas presentes entregaram-lhe uma moldura com uma fotografia da Tabanca do Saltinho (penso eu...).
Todos juntos conseguimos que esta Senhora e a sua família enterrassem todas as interrogações que a vinham assombrando durante todos estes anos.
Assim passou 1 hora... Como ainda faltava algum tempo, juntamo-nos perto da Igreja do Marquês.
A missa que aí foi realizada por voltas das 19h15 encerrou dignamente o drama até então vivido.
Amigos, o vosso acto foi NOBRE e, não me canso de agradecer (também em nome da Cidália) tudo o que fizeram.
Pode-vos parecer estranho, mas o sentimento que nutro por todos vós é como o de uma 2.ª família para mim. Que apesar de vos ter conhecido por uma triste razão, foi das melhores coisas que me aconteceram ultimamente.
Irei fazer questão de no dia em que terminar o meu custoso curso de Ciências Farmacêuticas, estejam ao meu lado e me possam "dar 3 fortes bengaladas na minha cartola".
Alguns dos camaradas tiraram fotos do dia de hoje, que certamente chegarão em breve a vós. Se puderem publicá-las no blog, como o encerrar de tudo, ficaria muito grata.
Encerra-se uma história mas não se vão ver livres de mim. Estarei sempre presente na nossa Tabanca Grande e também na Pequena Tabanca de Matosinhos.
Despeço-me por hoje!
Um beijinho
Cátia
Campa de António Ferreira sita no Talhão dos Combatentes falecidos na Guerra Colonial
A jovem Cátia Félix, presta a sua homenagem ao amigo que não conheceu
Alguns dos presentes na cerimónia no cemitério de Águas Santas, Maia
Fotos: © Maria Luís Santiago (2009). Direitos reservados
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4199: In Memoriam (18): Francisco Gomes Nabais, morto por afogamento no Rio Geba, Bafatá, 13/4/65 (José Colaço / Francisco dos Santos)
1. Normalmente costumo apresentar, à esquerda dos postes, uma foto de um jovem militar, garboso, cheio de pose, independente do seu posto militar, porque isso não foi o mais importante para cada um de nós, e à direita um velhote, entradote, nos sessentas, a maioria das vezes, pai e avô.
Desta vez, se à esquerda aparece um militar com a mesma pose altiva, aparece do lado direito a mesma foto, mas... emoldurada com um rendilhado de metal e extraída de uma lápide de cemitério. Nunca tal me havia acontecido.
Este camarada nem sequer teve uma morte natural, se é que morrer aos vinte anos é natural, mas morreu violentamente, vítima de uma guerra que não provocou nem para a qual se ofereceu como voluntário, com o fito de ganhar principesco ordenado.
Feito este desabafo, neste domingo triste e chuvoso, passemos à cerimónia ontem acontecida, na passagem dos 37 anos da emboscada do Quirafo, no Cemitério de Águas Santas, Maia, em memória do nosso camarada António Ferreira.
Que a homenagem de ontem, fosse não só em memória do António Ferreira, mas de todos os nossos camaradas que perderam a sua vida ao serviço do país, na Guerra Colonial. Uma coisa foi a justeza da guerra, discutível, outra o cumprimento do dever para com Portugal.
CV
2. Mensagem da nossa jovem amiga Cátia Félix, datada de 17 de Abril de 2009:
Olá Amigos
O dia de hoje, passado 37 anos da fatídica Tragédia do Quirafo, ficará na memória de muitos como recordação de um dia cheio de amor, paz, amizade, camaradagem... ao contrário de há 37 anos atrás...
Eram 16h e eu, a Cidália e a filha chegavamos ao Cemitério de Águas Santas. Mal entramos na rua principal vemos ao longe um Batalhão de homens. O nosso coração tremeu... O desejo da Cidália iria agora tornar-se realidade. Juntar os camaradas do malugrado Ferreira e fazer a sua devida homenagem, a ele que morreu na emboscada do Quirafo, a todos os militares que não regressaram aos seus lares, aos que continuam entre nós... Apresentações feitas, rumamos juntos até ao talhão reservado a militares da Guerra Colonial naquele cemitério, onde também está António Ferreira.
Camaradas de guerra presentes, representando também os que não estavam entre nós, depositaram sob a campa uma bonita coroa de flores. Acenderam-se velas, deu-se o devido Alfa Bravo e, todos juntos falamos um pouco de toda esta história.
Como sugerido pelo Luís Graça, todos fizemos um minuto de silêncio em homenagem a todos os combatentes que perderam as suas vidas na Guerra Colonial. Digo-vos que esse minuto, sem ninguém contar, ficou marcado pelo tocar dos sinos...
Correram lágrimas...
No fim do merecido reconhecimento, todos abraçamos a Cidália e, os Camaradas presentes entregaram-lhe uma moldura com uma fotografia da Tabanca do Saltinho (penso eu...).
Todos juntos conseguimos que esta Senhora e a sua família enterrassem todas as interrogações que a vinham assombrando durante todos estes anos.
Assim passou 1 hora... Como ainda faltava algum tempo, juntamo-nos perto da Igreja do Marquês.
A missa que aí foi realizada por voltas das 19h15 encerrou dignamente o drama até então vivido.
Amigos, o vosso acto foi NOBRE e, não me canso de agradecer (também em nome da Cidália) tudo o que fizeram.
Pode-vos parecer estranho, mas o sentimento que nutro por todos vós é como o de uma 2.ª família para mim. Que apesar de vos ter conhecido por uma triste razão, foi das melhores coisas que me aconteceram ultimamente.
Irei fazer questão de no dia em que terminar o meu custoso curso de Ciências Farmacêuticas, estejam ao meu lado e me possam "dar 3 fortes bengaladas na minha cartola".
Alguns dos camaradas tiraram fotos do dia de hoje, que certamente chegarão em breve a vós. Se puderem publicá-las no blog, como o encerrar de tudo, ficaria muito grata.
Encerra-se uma história mas não se vão ver livres de mim. Estarei sempre presente na nossa Tabanca Grande e também na Pequena Tabanca de Matosinhos.
Despeço-me por hoje!
Um beijinho
Cátia
Campa de António Ferreira sita no Talhão dos Combatentes falecidos na Guerra Colonial
A jovem Cátia Félix, presta a sua homenagem ao amigo que não conheceu
Alguns dos presentes na cerimónia no cemitério de Águas Santas, Maia
Fotos: © Maria Luís Santiago (2009). Direitos reservados
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4199: In Memoriam (18): Francisco Gomes Nabais, morto por afogamento no Rio Geba, Bafatá, 13/4/65 (José Colaço / Francisco dos Santos)
sexta-feira, 17 de abril de 2009
Guiné 63/74 - P4204: Recortes de Imprensa (15): Identificados mais 12 campas de militares lusos mortos na Guiné, DN de 3/4/2009 (Fernando Barata)
1. Mensagem de Fernando Barata (*), ex-Alf Mil da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72), com data de 14 de Abril de 2009:
Caro Luís
Diário de Notícias de 3 de Abril passado (ver attachment). Um dos três militares que constituiram a equipa que se deslocou à Guiné é o Ten Coronel Carlos Correia que pertenceu, como Alferes Miliciano, à minha Companhia (2700).
Voltarão em Dezembro.
Aproveito para te dar aquele abraço pelo MILHÃO de visualizações da Tabanca. É Obra. Com esta cadência brevemente estaremos no Guinness.
Abração
Fernando Barata
Recorte do Diário de Notícias, com a devida vénia
__________
(*) Vd. poste de 18 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3138: Em busca de... (35): Camaradas da 1.ª COMP/BCAÇ 4815 (Fernando Barata)
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3987: Recortes de Imprensa (14): Soldados mortos na guerra colonial terão memorial no Porto, JN de 5/3/2009 (Jorge Teixeira)
Caro Luís
Diário de Notícias de 3 de Abril passado (ver attachment). Um dos três militares que constituiram a equipa que se deslocou à Guiné é o Ten Coronel Carlos Correia que pertenceu, como Alferes Miliciano, à minha Companhia (2700).
Voltarão em Dezembro.
Aproveito para te dar aquele abraço pelo MILHÃO de visualizações da Tabanca. É Obra. Com esta cadência brevemente estaremos no Guinness.
Abração
Fernando Barata
Recorte do Diário de Notícias, com a devida vénia
__________
(*) Vd. poste de 18 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3138: Em busca de... (35): Camaradas da 1.ª COMP/BCAÇ 4815 (Fernando Barata)
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3987: Recortes de Imprensa (14): Soldados mortos na guerra colonial terão memorial no Porto, JN de 5/3/2009 (Jorge Teixeira)
Guiné 63/74 - P4203: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (6): É uma alegria a notícia de que se vai ser pai
1. Mensagem de António Paiva (*), ex-Soldado Condutor no HM 241 de Bissau, 1968/70, com data de 11 de Abril de 2009:
Caros Luís, Carlos e Virgínio
Como é do conhecimento de todos, o vencimento de um soldado na Guiné era fraquinho, com o prémio de especialidade que era de 500 pesos sempre ajudava a reforçar um pouco mais a algibeira. No hospital ainda tínhamos mais uma vantagem que era de três em três meses lhe podermos acrescentar mais 500 pesos com a dádiva de 0,500 litro de sangue, não dava para grandes aventuras, mas ia dando para umas cervejas, umas sandes, de vez em quando uns jantares fora e uns copitos na cidade.
Aos que eram casados, talvez isso não lhes fosse permitido, pois tinham que deixar cá para sustento da sua cara-metade uma parte elevada do seu vencimento.
Por este motivo vou contar o que se passou com um camarada:
Dormíamos na mesma caserna, eu na cama de cima e ele na de baixo mesmo ao lado, era o vizinho do r/c esquerdo, muito bom rapaz. Como era casado não se podia estender muito, se estava de serviço não estava na cama, se não estava de serviço lá o víamos estendido na cama ocupando o seu tempo com a leitura de umas revistas.
Nunca foi menino que se visse na Cantina a beber uma cerveja ou a comer uma sandes, não fumava e se por vezes o desafiássemos logo respondia que não podia, porque tinha a mulher para sustentar.
Não se podia dizer que fosse mau marido, pois tinha muito em conta o sustento de sua mulher.
Em Novembro de 1968, pela hora do almoço, quando estou a entrar na caserna, dou conta de haver uma grande alegria no seu interior. Fiquei surpreso, o meu vizinho do r/c esquerdo, estava alegre e bem disposto, queria pagar uma cerveja a alguns companheiros de caserna, não era para menos, pois tinha na mão uma carta da mulher a dizer-lhe que já era pai de um rapaz.
Posso dizer que fui um dos premiados. Sem ele, 4 ou 5 juntámo-nos e pensámos no caso.
Ele chegou ao hospital em Dezembro de 1967.
Ele era Enfermeiro.
Esqueci-me de lhe perguntar que data tinha a carta, podia-se ter atrasado na viagem.
Um Abraço
António Paiva
__________
Vd. poste de 5 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4143: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva ) (5): A Justiça Militar ou um processo... kafkiano
Caros Luís, Carlos e Virgínio
Como é do conhecimento de todos, o vencimento de um soldado na Guiné era fraquinho, com o prémio de especialidade que era de 500 pesos sempre ajudava a reforçar um pouco mais a algibeira. No hospital ainda tínhamos mais uma vantagem que era de três em três meses lhe podermos acrescentar mais 500 pesos com a dádiva de 0,500 litro de sangue, não dava para grandes aventuras, mas ia dando para umas cervejas, umas sandes, de vez em quando uns jantares fora e uns copitos na cidade.
Aos que eram casados, talvez isso não lhes fosse permitido, pois tinham que deixar cá para sustento da sua cara-metade uma parte elevada do seu vencimento.
Por este motivo vou contar o que se passou com um camarada:
Dormíamos na mesma caserna, eu na cama de cima e ele na de baixo mesmo ao lado, era o vizinho do r/c esquerdo, muito bom rapaz. Como era casado não se podia estender muito, se estava de serviço não estava na cama, se não estava de serviço lá o víamos estendido na cama ocupando o seu tempo com a leitura de umas revistas.
Nunca foi menino que se visse na Cantina a beber uma cerveja ou a comer uma sandes, não fumava e se por vezes o desafiássemos logo respondia que não podia, porque tinha a mulher para sustentar.
Não se podia dizer que fosse mau marido, pois tinha muito em conta o sustento de sua mulher.
Em Novembro de 1968, pela hora do almoço, quando estou a entrar na caserna, dou conta de haver uma grande alegria no seu interior. Fiquei surpreso, o meu vizinho do r/c esquerdo, estava alegre e bem disposto, queria pagar uma cerveja a alguns companheiros de caserna, não era para menos, pois tinha na mão uma carta da mulher a dizer-lhe que já era pai de um rapaz.
Posso dizer que fui um dos premiados. Sem ele, 4 ou 5 juntámo-nos e pensámos no caso.
Ele chegou ao hospital em Dezembro de 1967.
Ele era Enfermeiro.
Esqueci-me de lhe perguntar que data tinha a carta, podia-se ter atrasado na viagem.
Um Abraço
António Paiva
__________
Vd. poste de 5 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4143: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva ) (5): A Justiça Militar ou um processo... kafkiano
Guiné 63/74 - P4202: Dia 17 de Abril de 1972. A emboscada do Quirafo, 37 anos depois (Mário Migueis)
1. Ainda a extensa mensagem do dia 12 de Abril de 2009, nosso camarada Mário Migueis, reparem que já vamos no terceiro poste, desta feita com uma mensagem não enviada ao Paulo Santiago.
O fim é dramático. Um homem só, entregue aos seus sentimentos de revolta e impotência.
Hoje perguntamos, quem mandou fazer as guerra e porquê. Que fomos nós? Peões manejados em nome da defesa de um Império desajustado à realidade do País e dos tempos. Mortos, feridos, estropiados, para quê?
Foi preciso derrubar o regime para acabar com a guerra. Descolonização precipitada, face à desorganização própria de um país em mudança.
As mortes continuaram nos países palcos da guerra. Não foram perdoados aqueles que se sentindo portugueses, lutaram ao nosso lado. Foram abandonados à sua sorte, e nós, ainda que sãos e salvos na nossa terra, fomos esquecidos, pior ignorados.
Passados tantos anos, quanta dor ainda persiste nos ex-combatentes e seus familiares.
CV
2. Continuação da mensagem de Mário Migueis da Silva, iniciada no poste 4194 (1)
Carlos Vinhal:
Peço-te desculpa, mas, ao mexer para aqui nos meus canhenhos, já após ter concluído o texto acima (1), fui encontrar o print de uma mensagem inacabada (escrita entre Outubro e Novembro/2006 – o print não tem data), a dirigir ao Paulo Santiago, via e-mail, mas que, devido àquele problema de saúde a que atrás aludi, não cheguei a expedir.
Como sei que o Paulo é homem para, uma vez mais, me perdoar, até porque, curiosamente, fica aqui comprovado que eu poderia tê-lo ajudado a desmontar aquela confusão de nomes do desaparecido na emboscada e não o fiz, vou pôr à tua consideração a publicação de parte da inédita mensagem (desde que o Paulo aprove, claro…)
Ora, aí vai:
Caro Paulo Santiago:
Acabo de constatar que tomaste a liberdade de providenciar a publicação da minha msg no blogue do Luís Graça. Não estava a contar que o fizesses, caso contrário não teria falado das eventuais “imprecisões da emboscada do Quirafo”, já que tal poderia levar os nossos amigos tertulianos a pensarem que a história estava muito mal contadinha. E, na verdade, não é assim. O teu relato corresponde ao que basicamente se passou e as imprecisões a que quis aludir são meramente de pormenor . Não te vou falar ainda em concrecto sobre elas, como me pedes, porque, como te disse anteriormente, quero, antes disso, trocar impressões com, pelo menos, um ou dois elementos da companhia do Lourenço, o que espero poder fazer brevemente. É que há alguns pormenores a que fazes referência que me surpreendem e, em relação aos quais, acabei, eu próprio, por ficar com dúvidas. Por exemplo (apenas um, por agora), nunca me constou, e considero tal inverosímil, que, em Madina Bucô, o Armandino tivesse sido avisado de movimentos suspeitos para os lados do Quirafo na véspera (domingo), conforme te deram a conhecer (suponho que durante as visitas que, entretanto, fizeste à Guiné). Tu próprio, aliás, te mostraste incrédulo (“qual a razão que levou o Armandino a não acreditar?...”). E, por outro lado, nem estou a imaginar o Armandino, com avisos ou sem eles, a obrigar civis e milícias a entrarem para a GMC. Como sabes, a malta da Companhia tinha pouco mais de três meses no Saltinho , não tendo qualquer ascendente sobre as populações locais. Para além do mais, seria, no mínimo, absurdo que, perante um pequeno sinal de perigo que fosse, o Armandino e o Santos permitissem que fosse tudo para ali ao monte dentro da GMC, como passarinhos indefesos numa gaiola. (…)
A propósito de mentiras inocentes, onde é que o Cosme, esse desinformador do caraças (um abraço para ele!), foi descobrir que o desaparecido em combate se chamava Ferreira?!... O desaparecido chamava-se e chama-se BATISTA, aliás, ANTÓNIO DA SILVA BATISTA, aliás, MORTO-VIVO, que é assim que, ainda hoje, é conhecido na terra em que foi sepultado (salvo seja!...), e mora aqui para os lados do Porto. Falei com um grupo de “velhos camaradas da sueca” de Pedras Rubras – aquela malta que, em dias de sol, se diverte a bater umas cartitas ao ar livre – os quais me remeteram para a mercearia lá do sítio, onde a filha do dono me apresentou ao pai, que me disse conhecer bem o Batista (até assistiu ao seu funeral, que passou mesmo ao pé da porta do estabelecimento!...) e me remeteu, por sua vez ( anunciando-me prévia e educadamente por telefone), para o farmacêutico, que ficava para os lados do estabelecimento prisional de Stª Cruz do Bispo, que me passou para o barbeiro ao lado (este com origens no interior montanhoso, mas casado em Santa Cruz já vai um “rôr” de anos), que logo incumbiu um amigo, que passava ao pé da porta, e que, por sinal, era antigo guarda prisional do hotel em frente, de me ir indicar o café do filho do Batista, aquele que morreu na tropa e depois apareceu na terra.
(“Tás a ver a trabalhêra?!...)*. Como, com tanto “passa a palavra”, se fez entretanto noite e me recomendaram ao ouvido algum cuidado, àquelas horas, ali pelas imediações da prisão – “algumas visitas, sabe!”, explicava em surdina o meu guia de circunstância(?!) -, regressei à base sem ter chegado ao Batista. Mas, um dia destes, com mais vagar, vou procurá-lo de novo, para que ele diga também de sua justiça.
Devo ter ainda no sótão, lá no meu baú da guerra, as notícias do regresso dele, após o 25 de Abril. Achas que seria interessante a sua publicação no blogue? Devo ter também, pelo menos, cópia do croquis da emboscada. Fotografias não há, que ninguém teve a ousadia… Recordo-me de que, naquele dia, na messe, só eu consegui almoçar. Três da tarde, cheio de fome, cansado de esperar que aparecesse mais alguém, fui-me servir ao panelão abandonado na cozinha. Era jardineira, nunca mais me esqueci, dadas as circunstâncias. Enquanto comia, o aroma do guisado misturava-se com o cheio horrível dos corpos queimados, que vinha pelas portas abertas adentro. Um cheiro enjoativo, acre!... Contudo, saciei a fome descontraidamente. Com a maior naturalidade. O sentido da sobrevivência é realmente extraordinário!... Ao jantar, o enfesado transmontano do bar serviu-me a correr e pirou-se, logo a seguir, para o abrigo: o tipo já sabia que ninguém mais iria aparecer. E, assim foi. Passei toda a noite sozinho, a escrever, enquanto, a cinco metros de distância, na parada, trabalhavam os cangalheiros (chegados, ao anoitecer, penso que de Bissau) naquela infinidade de urnas. A cada martelada, eu recordava já com saudade os infortunados Armandino e Francisco Santos (aqueles que, como sabes, me eram mais próximos) e ia escrevendo “à toa”, para ninguém:
“Vinte e duas horas. Do dia mais triste da minha vida.
Aqui, na desoladora messe de sargentos, apenas eu! Nem o moço do bar ficou. Todos recolheram à solidão dos abrigos, possivelmente para meditar.
Lá fora, um silêncio de morte! Um silêncio sepulcral de que faz parte o bater seco e cadenciado de um martelar, que tende a rebentar-me os tímpanos e o sistema nervoso! Já o não suporto mais.
Corro para a porta, a fechá-la. E não posso evitar um fugidio olhar! Um fugidio olhar suficiente para que sinta o coração esfrangalhar-se-me e este terrível nó seco na garganta, que me comprime a alma: o cangalheiro, rodeado de urnas por todo o lado, trabalha. Sereno. Indiferente.
A certa altura, parece-me ouvir alguém assobiar baixinho ou a trautear uma qualquer cantilena!... Volto a correr para a porta, enraivecido...Nada!... O cangalheiro prossegue no seu trabalho. Com a mesma serenidade, a mesma indiferença. E o sentimento de revolta apodera-se de mim com mais intensidade! Sinto vontade de lhe cair em cima. De o agredir, de lhe dar dois murros!...
Mas, contenho-me. Volto covardemente para o meu canto, como um cão lazarento com o rabo entre as pernas, e ponho-me a pensar. A tentar reflectir sobre o que se passa comigo e com a cena macabra que me envolve.
Vêm-me à cabeça as lágrimas, os abraços e os lenços brancos das despedidas, lá no cais de não sei quantos, em Lisboa. Meu Deus!… , e os pais?!... Que será dos pobres pais, coitados!, quando souberem da triste nova?!... Eles que, cada dia, antes da deita, caem de joelhos aos pés de Cristo, da Virgem, do Anjo da Guarda e de todos os santos protectores, a pedirem a salvação dos seus filhinhos?!...
“Era tão bom, tão alegre, tão cheio de vida!...”, é isso que vos espera, camaradas, lá no outro lado do mundo: o choro, o lamento, a recordação. E nós, por cá,…
…Nós, por cá, todos bem, graças a Deus!... Beijos para os manos, tios e priminhos. Para todos, votos de um Feliz Natal e um Ano Novo cheio de prosperidade! Adeus, até ao meu regresso!
Saltinho, 17 de Abril de 1972
Mário Migueis Ferreira da Silva
* - Observação actual do autor àquela “trabalhêra” toda, confessada ao Paulo Santiago: o Álvaro Basto, fino!, pegou numa lista telefónica e resolveu o problema da localização do Batista num minuto. Como diria o saudoso Fernando Pessa: “E esta, heim?!...
__________
Nota de CV:
(1) Ver poste de 17 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4200: Ainda e sempre a tragédia do Quirafo. Sortes distintas para António Batista e António Ferreira (Mário Migueis / Paulo Santiago)
O fim é dramático. Um homem só, entregue aos seus sentimentos de revolta e impotência.
Hoje perguntamos, quem mandou fazer as guerra e porquê. Que fomos nós? Peões manejados em nome da defesa de um Império desajustado à realidade do País e dos tempos. Mortos, feridos, estropiados, para quê?
Foi preciso derrubar o regime para acabar com a guerra. Descolonização precipitada, face à desorganização própria de um país em mudança.
As mortes continuaram nos países palcos da guerra. Não foram perdoados aqueles que se sentindo portugueses, lutaram ao nosso lado. Foram abandonados à sua sorte, e nós, ainda que sãos e salvos na nossa terra, fomos esquecidos, pior ignorados.
Passados tantos anos, quanta dor ainda persiste nos ex-combatentes e seus familiares.
CV
2. Continuação da mensagem de Mário Migueis da Silva, iniciada no poste 4194 (1)
Carlos Vinhal:
Peço-te desculpa, mas, ao mexer para aqui nos meus canhenhos, já após ter concluído o texto acima (1), fui encontrar o print de uma mensagem inacabada (escrita entre Outubro e Novembro/2006 – o print não tem data), a dirigir ao Paulo Santiago, via e-mail, mas que, devido àquele problema de saúde a que atrás aludi, não cheguei a expedir.
Como sei que o Paulo é homem para, uma vez mais, me perdoar, até porque, curiosamente, fica aqui comprovado que eu poderia tê-lo ajudado a desmontar aquela confusão de nomes do desaparecido na emboscada e não o fiz, vou pôr à tua consideração a publicação de parte da inédita mensagem (desde que o Paulo aprove, claro…)
Ora, aí vai:
Caro Paulo Santiago:
Acabo de constatar que tomaste a liberdade de providenciar a publicação da minha msg no blogue do Luís Graça. Não estava a contar que o fizesses, caso contrário não teria falado das eventuais “imprecisões da emboscada do Quirafo”, já que tal poderia levar os nossos amigos tertulianos a pensarem que a história estava muito mal contadinha. E, na verdade, não é assim. O teu relato corresponde ao que basicamente se passou e as imprecisões a que quis aludir são meramente de pormenor . Não te vou falar ainda em concrecto sobre elas, como me pedes, porque, como te disse anteriormente, quero, antes disso, trocar impressões com, pelo menos, um ou dois elementos da companhia do Lourenço, o que espero poder fazer brevemente. É que há alguns pormenores a que fazes referência que me surpreendem e, em relação aos quais, acabei, eu próprio, por ficar com dúvidas. Por exemplo (apenas um, por agora), nunca me constou, e considero tal inverosímil, que, em Madina Bucô, o Armandino tivesse sido avisado de movimentos suspeitos para os lados do Quirafo na véspera (domingo), conforme te deram a conhecer (suponho que durante as visitas que, entretanto, fizeste à Guiné). Tu próprio, aliás, te mostraste incrédulo (“qual a razão que levou o Armandino a não acreditar?...”). E, por outro lado, nem estou a imaginar o Armandino, com avisos ou sem eles, a obrigar civis e milícias a entrarem para a GMC. Como sabes, a malta da Companhia tinha pouco mais de três meses no Saltinho , não tendo qualquer ascendente sobre as populações locais. Para além do mais, seria, no mínimo, absurdo que, perante um pequeno sinal de perigo que fosse, o Armandino e o Santos permitissem que fosse tudo para ali ao monte dentro da GMC, como passarinhos indefesos numa gaiola. (…)
A propósito de mentiras inocentes, onde é que o Cosme, esse desinformador do caraças (um abraço para ele!), foi descobrir que o desaparecido em combate se chamava Ferreira?!... O desaparecido chamava-se e chama-se BATISTA, aliás, ANTÓNIO DA SILVA BATISTA, aliás, MORTO-VIVO, que é assim que, ainda hoje, é conhecido na terra em que foi sepultado (salvo seja!...), e mora aqui para os lados do Porto. Falei com um grupo de “velhos camaradas da sueca” de Pedras Rubras – aquela malta que, em dias de sol, se diverte a bater umas cartitas ao ar livre – os quais me remeteram para a mercearia lá do sítio, onde a filha do dono me apresentou ao pai, que me disse conhecer bem o Batista (até assistiu ao seu funeral, que passou mesmo ao pé da porta do estabelecimento!...) e me remeteu, por sua vez ( anunciando-me prévia e educadamente por telefone), para o farmacêutico, que ficava para os lados do estabelecimento prisional de Stª Cruz do Bispo, que me passou para o barbeiro ao lado (este com origens no interior montanhoso, mas casado em Santa Cruz já vai um “rôr” de anos), que logo incumbiu um amigo, que passava ao pé da porta, e que, por sinal, era antigo guarda prisional do hotel em frente, de me ir indicar o café do filho do Batista, aquele que morreu na tropa e depois apareceu na terra.
(“Tás a ver a trabalhêra?!...)*. Como, com tanto “passa a palavra”, se fez entretanto noite e me recomendaram ao ouvido algum cuidado, àquelas horas, ali pelas imediações da prisão – “algumas visitas, sabe!”, explicava em surdina o meu guia de circunstância(?!) -, regressei à base sem ter chegado ao Batista. Mas, um dia destes, com mais vagar, vou procurá-lo de novo, para que ele diga também de sua justiça.
Devo ter ainda no sótão, lá no meu baú da guerra, as notícias do regresso dele, após o 25 de Abril. Achas que seria interessante a sua publicação no blogue? Devo ter também, pelo menos, cópia do croquis da emboscada. Fotografias não há, que ninguém teve a ousadia… Recordo-me de que, naquele dia, na messe, só eu consegui almoçar. Três da tarde, cheio de fome, cansado de esperar que aparecesse mais alguém, fui-me servir ao panelão abandonado na cozinha. Era jardineira, nunca mais me esqueci, dadas as circunstâncias. Enquanto comia, o aroma do guisado misturava-se com o cheio horrível dos corpos queimados, que vinha pelas portas abertas adentro. Um cheiro enjoativo, acre!... Contudo, saciei a fome descontraidamente. Com a maior naturalidade. O sentido da sobrevivência é realmente extraordinário!... Ao jantar, o enfesado transmontano do bar serviu-me a correr e pirou-se, logo a seguir, para o abrigo: o tipo já sabia que ninguém mais iria aparecer. E, assim foi. Passei toda a noite sozinho, a escrever, enquanto, a cinco metros de distância, na parada, trabalhavam os cangalheiros (chegados, ao anoitecer, penso que de Bissau) naquela infinidade de urnas. A cada martelada, eu recordava já com saudade os infortunados Armandino e Francisco Santos (aqueles que, como sabes, me eram mais próximos) e ia escrevendo “à toa”, para ninguém:
“Vinte e duas horas. Do dia mais triste da minha vida.
Aqui, na desoladora messe de sargentos, apenas eu! Nem o moço do bar ficou. Todos recolheram à solidão dos abrigos, possivelmente para meditar.
Lá fora, um silêncio de morte! Um silêncio sepulcral de que faz parte o bater seco e cadenciado de um martelar, que tende a rebentar-me os tímpanos e o sistema nervoso! Já o não suporto mais.
Corro para a porta, a fechá-la. E não posso evitar um fugidio olhar! Um fugidio olhar suficiente para que sinta o coração esfrangalhar-se-me e este terrível nó seco na garganta, que me comprime a alma: o cangalheiro, rodeado de urnas por todo o lado, trabalha. Sereno. Indiferente.
A certa altura, parece-me ouvir alguém assobiar baixinho ou a trautear uma qualquer cantilena!... Volto a correr para a porta, enraivecido...Nada!... O cangalheiro prossegue no seu trabalho. Com a mesma serenidade, a mesma indiferença. E o sentimento de revolta apodera-se de mim com mais intensidade! Sinto vontade de lhe cair em cima. De o agredir, de lhe dar dois murros!...
Mas, contenho-me. Volto covardemente para o meu canto, como um cão lazarento com o rabo entre as pernas, e ponho-me a pensar. A tentar reflectir sobre o que se passa comigo e com a cena macabra que me envolve.
Vêm-me à cabeça as lágrimas, os abraços e os lenços brancos das despedidas, lá no cais de não sei quantos, em Lisboa. Meu Deus!… , e os pais?!... Que será dos pobres pais, coitados!, quando souberem da triste nova?!... Eles que, cada dia, antes da deita, caem de joelhos aos pés de Cristo, da Virgem, do Anjo da Guarda e de todos os santos protectores, a pedirem a salvação dos seus filhinhos?!...
“Era tão bom, tão alegre, tão cheio de vida!...”, é isso que vos espera, camaradas, lá no outro lado do mundo: o choro, o lamento, a recordação. E nós, por cá,…
…Nós, por cá, todos bem, graças a Deus!... Beijos para os manos, tios e priminhos. Para todos, votos de um Feliz Natal e um Ano Novo cheio de prosperidade! Adeus, até ao meu regresso!
Saltinho, 17 de Abril de 1972
Mário Migueis Ferreira da Silva
* - Observação actual do autor àquela “trabalhêra” toda, confessada ao Paulo Santiago: o Álvaro Basto, fino!, pegou numa lista telefónica e resolveu o problema da localização do Batista num minuto. Como diria o saudoso Fernando Pessa: “E esta, heim?!...
__________
Nota de CV:
(1) Ver poste de 17 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4200: Ainda e sempre a tragédia do Quirafo. Sortes distintas para António Batista e António Ferreira (Mário Migueis / Paulo Santiago)
Guiné 63/74 - P4201: Em busca de... (71): Quem identifica o camarada da fotografia, pertencente a uma das Companhias do BART 2917? (Benjamim Durães)
1. Mensagem do nosso camarada Benjamim Durães com data de 11 de Abril de 2009:
QUEM PODE AJUDAR A IDENTIFICAR ESTE NOSSO CAMARADA DE ARMAS DO BART 2917 [ BAMBADINCA, 1970/72 ] ?
SÓ SEI QUE PERTENCIA A UMA DAS COMPANHIAS OPERACIONAIS DO BART 2917 [ CART 2714, MANSAMBO, CART 2715, XIME, CART 2716, XITOLE].
O PEDIDO É FEITO PELO NOSSO CAMARADA LUÍS MOREIRA, ALFERES MILICIANO SAPADOR DA CCS/BART 2917 (*).
UM ABRAÇO
DURÃES
É este o camarada de uma das Companhias operacionais do BART 2917 que se pretende seja identificado (**).~
Qualque informação pode ser enviada para Benjamim Durães(duraes.2917@hotmail.com).
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 13 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - XCLXXXVII: Luís Moreira, Alf Mil Sapador, CCS/ BART 2917
(...) Estive em Bambadinca na CCS [do BART 2917] e sou o ex-alferes sapador Luís Moreira que fui ao ar com uma mina anti-carro no reordenamento dos Nhabijões (espero não estar a errar no nome).
Na sequência desse acidente [, em 13 de Janeiro de 1971,] passei aos serviços auxiliares e fui colocado no Batalhão de Engenharia, em Bissau, até ao fim da minha comissão que terminou já depois de vocês terem regressado e que fez com que eu hoje faça parte do grupo dos DFA [Deficientes das Forças Armadas].
Infelizmente não me recordo do nome da maioria dos camaradas com quem convivi, talvez devido ao traumatismo craneano que sofri na sequência do acidente. No entanto gostaria de recordar e contactar com o maior número de camaradas para tentar reconstituir esse período de quase um ano que passei em Bambadinca (...).
(**) Vd. último poste da série de 3 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4135: Em busca de... (70): Fur Mil Andrade e Cabrita Martins que estiveram em Fajonquito entre 1971/73 (Afonso Sousa)
QUEM PODE AJUDAR A IDENTIFICAR ESTE NOSSO CAMARADA DE ARMAS DO BART 2917 [ BAMBADINCA, 1970/72 ] ?
SÓ SEI QUE PERTENCIA A UMA DAS COMPANHIAS OPERACIONAIS DO BART 2917 [ CART 2714, MANSAMBO, CART 2715, XIME, CART 2716, XITOLE].
O PEDIDO É FEITO PELO NOSSO CAMARADA LUÍS MOREIRA, ALFERES MILICIANO SAPADOR DA CCS/BART 2917 (*).
UM ABRAÇO
DURÃES
É este o camarada de uma das Companhias operacionais do BART 2917 que se pretende seja identificado (**).~
Qualque informação pode ser enviada para Benjamim Durães(duraes.2917@hotmail.com).
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 13 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - XCLXXXVII: Luís Moreira, Alf Mil Sapador, CCS/ BART 2917
(...) Estive em Bambadinca na CCS [do BART 2917] e sou o ex-alferes sapador Luís Moreira que fui ao ar com uma mina anti-carro no reordenamento dos Nhabijões (espero não estar a errar no nome).
Na sequência desse acidente [, em 13 de Janeiro de 1971,] passei aos serviços auxiliares e fui colocado no Batalhão de Engenharia, em Bissau, até ao fim da minha comissão que terminou já depois de vocês terem regressado e que fez com que eu hoje faça parte do grupo dos DFA [Deficientes das Forças Armadas].
Infelizmente não me recordo do nome da maioria dos camaradas com quem convivi, talvez devido ao traumatismo craneano que sofri na sequência do acidente. No entanto gostaria de recordar e contactar com o maior número de camaradas para tentar reconstituir esse período de quase um ano que passei em Bambadinca (...).
(**) Vd. último poste da série de 3 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4135: Em busca de... (70): Fur Mil Andrade e Cabrita Martins que estiveram em Fajonquito entre 1971/73 (Afonso Sousa)
Guiné 63/74 - P4200: Ainda e sempre a tragédia do Quirafo. Sortes distintas para António Batista e António Ferreira (Mário Migueis / Paulo Santiago)
1. Na sua mensagem de apresentação, o nosso camarada Mário Migueis da Silva incluia este precioso testemunho sobre o caso da emboscada do Quirafo. Deixámos propositadamente esta parte da mensagem para hoje, dia em que se completam 37 anos de tão infausto acontecimento.
Incluímos ainda uma mensagem do camarada Paulo Santiago, que se interessou pelo caso Batista e pela completa informação à viúva do nosso camarada António Ferreira, ajudando a acabar com as dúvidas que ainda persistiam no íntimo da D. Cidália.
Este caso carregou muita carga dramática, pelos motivos já falados, e aflorados de novo hoje. Coincidências tristes originaram incertezas e sofrimento que só os protagonistas poderão descrever. A guerra e a sua bestialidade. CV
2. Continuação da mensagem de Mário Migueis da Silva, iniciada no poste 4194 (*)
[...] Dito isto – bem digo eu que, quando um antigo combatente começa a falar da guerra, não se cala mais! -, vamos, então, ao que me leva, assim de repente, a interromper o meu silêncio.
Após a minha mensagem de 2006, atrás referida (a), ao Paulo Santiago, era minha intenção vir, mais à frente, a intervir directamente no blogue, a dar conta da minha própria experiência nas unidades por onde passei e, muito especialmente, a dar o meu testemunho sobre a tragédia do Quirafo, que vivi de muito perto, já que me encontrava na altura no Saltinho, conhecendo todos os malogrados camaradas que tombaram sob o fogo impiedoso e traiçoeiro das armas inimigas.
Tinha, inclusivamente, prometido ao Paulo que iria tratar de localizar o Baptista – o nosso querido morto-vivo - e, com efeito, andei por Pedras Rubras e Santa Cruz do Bispo, a perguntar pelo nosso homem. O que é facto é que, quando já tinha o cerco montado à residência do procurado, tive que, por razões de força maior, adiar o golpe de mão para melhor oportunidade. Pelos vistos, o Paulo é que não ficou à espera das minhas diligências – estava ele bem servido! – e, com a colaboração da Tabanca de Matosinhos, tratou de apanhar o Baptista à mão – uma vez mais, chiça!... - e de o obrigar a confessar tudo.
Superado, entretanto, o problema que eu vinha tendo com o meu pobre sistema ocular e cujo agravamento me obrigou a afastar do computador durante os dois anos de tratamento a que me sujeitei, passei, muito recentemente, a aceder de novo ao blogue e confesso que tenho lutado muito comigo mesmo para contrariar a vontade de intervir em algumas das discussões vindas a lume, já que receio forçar a vista e voltar à estaca zero. Porém, estes últimos postes com intervenções relacionadas com o nosso camarada António Ferreira, um dos nossos mortos em combate no maldito Quirafo, obriga-me a acrescentar – e com a urgência possível - alguma coisa ao já relatado, sob pena de não ficar de bem com a minha consciência.
Não sou muito de dramatizar situações mas, algo comovido com a história da viúva do António Ferreira (pudesse eu adivinhar que, a apenas 40km de distância da minha casa, alguém, ao longo de anos a fio, se recusava a perder a esperança de um dia rever o marido, que, afinal, eu sabia garantidamente morto!...), li e reli todos os textos publicados no blogue sobre a emboscada do Quirafo – quase todos da autoria do Paulo Santiago, um combatente de raça, podem crer! - , a fim de tentar perceber melhor o fundamento de algumas das afirmações e comentários sobre pormenores do acontecido, já que, no P4117 (b), de 02 do corrente mês, é referido que “…o Álvaro Basto, ex-Furriel Mil Enf da Cart 3492 (Xitole, 1971/74) constatou pessoalmente, no Saltinho, a impossibilidade de reconhecer os cadáveres dos nossos camaradas da CCaç 3490, que morreram na emboscada do Quirafo, incluindo o António Ferreira…” .
Ora, esta alegada constatação do Álvaro Basto, cuja presença no Saltinho, bem como a do Alf Médico Alfredo Pinheiro de Azevedo, me passou despercebida no meio daquela verdadeira barafunda – pelo menos, não me lembro de os ter visto -, leva (ou pode levar) os leitores a concluírem que nenhum dos mortos terá sido identificado e os familiares a interrogarem-se mesmo sobre a realidade (o quê ou quem?) escondida naquelas urnas seladas, chumbadas,(**) que um dia lhes remeteram para casa.
Recuando, então, até aos postes de 2006, fui extraindo alguns dos tais comentários e achegas referentes ao tema em questão, susceptíveis (na minha opinião) de, ao longo do tempo, terem vindo a alimentar alguma escusada inquietação e ansiedade por parte dos familiares dos nossos camaradas mortos, os quais passo a transcrever, por ordem cronológica, para , em seguida, prestar o esclarecimento que julgo pertinente:
- P984 / Fur António Duarte/Mansambo:
“…Daquilo que me lembro, havia dois ou três companheiros, vítimas da emboscada, que foram dados como desaparecidos…” (c)
- P987 (Julho/2006)- Comentários do L.G.:
“… O que nos choca, ainda hoje, é o cinismo, o desprezo, o despudor das autoridades militares da época, que, incapazes de falar a verdade às famílias………………., mandavam para os nossos cemitérios caixões de chumbo….vazios!!!............. …….Infelizmente, em muitos casos, manteve-se a suspeita de que os caixões que vinham do Ultramar (e da Guiné, em particular) não traziam os restos mortais dos nossos soldados, mas apenas pedras…” (d)
- P990 (Julho/2006):
“…há um 1º.Cabo de Transmissões que, a certa altura, se levanta, salta com o AVP1 às costas, apanha um tiro num braço e corre em direcção aos atacantes. É apanhado à mão….” (e)
- P1000 (Julho/2006):
“…um dos sobreviventes fala no caso do transmissões que viu ser apanhado à mão, e que estava ferido num braço”. E, mais à frente: “O homem das transmissões desaparecera e iria ser dado como morto”. (f)
- P1230 (Out2006):
O Paulo Santiago, dirigindo-se a mim: “…há dias, o Cosme, um dos meus cabos, disse que o cabo apanhado à mão no Quirafo se chamava Ferreira, e não Batista, nome que utilizei no relato, pois era o que tinhas indicado quando almoçámos em Aveiro e falámos do caso. “ (g)
- P1985 (22/07/2007: “… O Álvaro Basto tem uma questão pertinente. No dia da emboscada, ele e o Alf. Médico Azevedo, que prestava assistência no Xitole e no Saltinho, foram a este último quartel, a fim de passarem as respectivas certidões de óbito. O Dr. Azevedo, apesar da insistência do Lourenço (capitão da CCaç.3490) recusou-se a passar certidões daqueles corpos carbonizados e desmembrados…”(h)
Ainda no mesmo post:
“… o António Batista é assaltado por outra perplexidade: - Tenho desde sexta feira outra dúvida – diz ele – um conterrâneo meu, da Maia, António Oliveira Azevedo, ia também a monte na GMC, tendo sido dado como desaparecido em combate. Nunca apareceu…”
- P4046 / Comentários do Luís Graça:
“…Como houve pelo menos um caso de troca de identidades……….e, além do mais, os cadáveres estavam irreconhecíveis, desmembrados e carbonizados (de acordo com o testemunho do Alf Médico Alfredo Pinheiro de Azevedo e do Fur Mil Enf Álvaro Basto),…., ficou, fica, ficará sempre a atroz dúvida: será que o meu marido morreu mesmo na emboscada?”(i)
Após a leitura destes excertos dos postes assinalados, é fácil, afinal, perceber as dúvidas que vieram assaltando até agora a D. Cidália Cunha, viúva do nosso camarada António Ferreira, de facto o único especialista de transmissões presente no grupo emboscado!... A confusão do número de desaparecidos, o radiotelegrafista apanhado à mão, o 1.º Cabo de Transmissões que, com um AVP 1 às costas… Enfim, parece que tudo se conjugava para lhe transmitir a ideia de que o marido, em vez de, irremediavelmente, morto, poderia, afinal, ter simplesmente desaparecido, ter sido aprisionado e voltar ainda um dia, quem sabe?... “Mas, e a urna?”, - perguntar-se-ia. “Sabe-se lá o que contém a urna!...”, - resposta de alguém…
Vamos, então, aos comentários e esclarecimentos prometidos, que visam, no final de contas, confirmar a generalidade das últimas conclusões do Paulo Santiago e desfazer a ideia de que os corpos estavam mesmo irreconhecíveis.
Malgrado toda a confusão gerada pelas informações deste e daquele de que alguém das transmissões teria sido apanhado à mão, o que é facto é que, na emboscada do Quirafo, apenas foi, com toda a certeza, capturado o soldado António da Silva Batista (Atirador de Infantaria) e, muito provavelmente, um nativo que seguia igualmente na GMC para os trabalhos de desmatação da picada, conforme referido pelo Batista na entrevista que concedeu ao “Comércio do Porto”, em 18/09/1974, após a sua libertação e regresso a casa.
Nenhum outro militar da CCaç 3490 foi capturado pelo IN, correspondendo o número de cadáveres recuperados ao número dos elementos das NT em falta menos um, o qual, assim se justificava, foi dado como desaparecido. Foi possível distinguir os cadáveres dos elementos POP e milícias mortos, os quais, segundo me informaram na altura, foram devidamente identificados pela população de Madina Bucô – a mais próxima do Quirafo -, de onde eram originários, tendo os respectivos parentes assumido a responsabilidade da sua guarda e inumação.
Ouvi, rodeado de um pequeno grupo de soldados aterrorizados (os mortos vinham a caminho!), as primeiras declarações do Maximiano, condutor da GMC, ao encontro do qual me dirigi nas imediações do aquartelamento do Saltinho, onde ele, em visível estado de choque, acabava de chegar pelos próprios meios (correndo, a corta-mato), desde o local da emboscada. Transmitiu-me repetidamente - entre outros pormenores, obviamente - que o Batista conseguira saltar da viatura antes desta ter explodido e que o vira a correr, ensanguentado, pelo mato.
Ora, como todos os mortos recolhidos se encontravam na picada, e a fazer fé no testemunho do Maximiano, nenhum dos corpos podia, pois, ser o do Batista, cujo nome, confesso, nada me dizia. Aliás, no dia seguinte, foi feito o reconhecimento ao local da emboscada com reforços chegados de outra(s) Companhia(s) do Batalhão (e, eventualmente, de outros vizinhos, mas disso já não tenho a certeza) e apoio de um helicóptero, visando, inclusivamente, detectar e recuperar o tal homem desaparecido. Como não tivéssemos sido bem sucedidos nas buscas efectuadas, concluiu-se que o mesmo, das duas, uma: ou tinha sido capturado pelo IN ou, provavelmente ferido com gravidade, teria sucumbido algures em plena mata - “devorado até pelas feras, quem sabe?“, conjecturou-se, na altura.
Não acredito na história de que “…só o Cap Lourenço afirmava que ele tinha morrido, o resto da companhia (a CCaç 3490) afirmava que ele estava vivo…” (P987, de Julho/06), ou melhor, não acredito que as duas versões tivessem constado simultaneamente no Saltinho, conforme somos levados a supor pela leitura do post (pelo menos até 20/10/1972, altura em que regressei à Metrópole, tal não aconteceu). Agora, o que parece ser claro é que, se porventura, mais tarde, aqueles que, como eu, tinham ouvido da boca do Maximiano a informação de que o Batista saltara da viatura e conseguira atingir a mata, perguntassem ao Cap Lourenço quem tinha realmente desaparecido, este responderia imediatamente (ou após consulta dos papéis, era o mais certo!) que era o António Oliveira Azevedo, uma vez que era este que, como tal, constava na listagem oficial em seu poder. E, então sim, seria imediatamente contestado e passariam a coexistir publicamente as duas versões.
Mas, a verdade é que toda a gente terá ficado convencida (poderá admitir-se alguma excepção, claro) de que o Batista tinha igualmente acabado por perecer, embora o corpo não tivesse sido encontrado. O próprio comunicado de guerra do PAIGC relativo à emboscada (fazia parte da minha rotina ouvir e gravar estes comunicados do IN na Rádio Conacri) era omisso quanto à captura de prisioneiros, o que terá reforçado a tese do comando, ao qual dei a gravação a ouvir, de que o desaparecido terá morrido algures na mata, embora eu tenha sempre chamado a atenção – lembro-me bem disso - para o facto de ser prática conhecida, nossa como do IN, não dar a saber ao adversário a existência de prisioneiros, por forma a poder explorar, eventualmente, informações a recolher dos mesmos (era dos livros!).
Essa possibilidade em aberto, nunca deixei de a considerar, até porque, por incrível que possa parecer - dados os milhares de soldados que, ao longo de uma década, passaram pela Guiné -, quando, um colega do banco onde eu, na altura, trabalhava, chegou com a história de que vinha nos jornais a notícia do regresso de um militar que fora dado como morto na Guiné, comentei imediatamente: - Nunca se sabe se não é um soldado que nos desapareceu durante uma emboscada e que nunca mais voltámos a ver!. No minuto seguinte, estava a comprar o JN - Jornal de Notícias e o Comércio do Porto. O resto, já todos sabeis.
Ah!..., mas dizia eu que toda a malta estava convencida de que o Batista fora repasto para alguma fera e, como tal, quem quereria saber de questionar pormenores?!... Cada um tratou de se remeter ao seu canto e ao seu silêncio. Os mortos estavam a caminho de ser enterrados e o que era preciso era cuidar dos vivos, que a missão ainda nem no adro ia.
Para os camaradas que o conheciam bem, o desaparecido em combate teria o nome de Batista e assim seria recordado. Para o Cap Lourenço e para o Alf Rainha, a listagem que tinham elaborado era de nomes próprios que, porventura, não lhes diziam muito (pertenciam ao grupo do Alf Armandino) e, se calhar, nunca lhes deu para reverem, uma vez que fosse, as cópias da papelada que tinha acompanhado os corpos ou para comentarem os seus termos com quem quer que fosse e, muito menos ainda, para difundirem a listagem pelos restantes elementos da Companhia. Inclino-me até a acreditar que esqueceram rapidamente quem foi e quem não foi que fizeram constar como mortos, feridos e desaparecidos, excepção feita para os casos do alferes e do furriel. E, como atrás já referi, nunca ouvi de ninguém, durante os seis meses que ainda permaneci no Saltinho, qualquer comentário sobre eventual equívoco na identificação das vítimas.
Até à publicação no blogue da lista oficial dos mortos, feridos e desaparecido, que foi elaborada no gabinete do Comandante, onde eu próprio trabalhava (duas secretárias a dois metros de distância uma da outra: a do Cap Lourenço e a minha), nunca me passou pela cabeça que pudesse não estar correcta (nunca senti ou tive necessidade de a consultar e o ambiente - de cortar à faca, com uma atitude hostil da minha parte em relação ao Comando - não era favorável a grande troca de impressões, evitando eu imiscuir-me tanto quanto possível naquilo que não me dizia respeito), sendo minha convicção que o lapso verificado na identificação do corpo - evidenciado publicamente após o regresso do Batista - tivesse acontecido em Bissau, durante a trasladação dos cadáveres para a metrópole.
Mas, o que terá, então, induzido em erro o Lourenço e o Rainha, levando-os àquela troca de condição (morto ou desaparecido) entre os soldados António Batista e António Azevedo?
Penso (mas já não posso garantir) que, em primeiro lugar, foi feito o levantamento dos elementos em falta no Grupo de Combate e, só em seguida, a verificação e reconhecimento dos cadáveres, com a colaboração dos camaradas que lhes eram mais próximos. Talvez aqui se tenha verificado o lapso, quando alguém, que não ouvira o Maximiano, apontou o corpo do António Azevedo como sendo o do Batista. E como, estando os restantes corpos identificados, ficava a faltar o corpo do primeiro (o do António Azevedo), foi este dado como desaparecido. Mas, atenção!, isto não passa de uma mera teoria, podendo, como tal, corresponder à realidade ou não.
Como o Alf Rainha já não se encontra, infelizmente, entre nós, caberá (caberia?) ao Cap Lourenço (porque não?...) prestar o devido esclarecimento, já que foram os dois quem superintendeu na elaboração das listagens e relatórios, impondo-se, a bem da verdade, que se acrescente que, quem, como eu, pôde testemunhar todo o terror e desorientação provocados por aquela verdadeira tragédia, no seio de uma Companhia de jovens soldados com apenas três meses de Guiné, compreende, sem grande esforço, que qualquer falha deste tipo pudesse facilmente acontecer, pese, embora, a gravidade das eventuais consequências – mas, quem estaria tão responsavelmente preocupado com isso naquele momento?! Não éramos, afinal, todos uns miúdos, como escreveu ou disse algures o nosso antigo camarada de armas António Lobo Antunes?!...
Já agora, quanto à guerra dos papéis (que, ficámos a saber, havia de se revelar desastrosa), a mim, que era carta fora do baralho, tocou-me apenas a parte artística (perdoai-me o cinismo), ou seja, fui solicitado - embora tal não me competisse - para a feitura do croquis da emboscada, do qual conservo ainda uma cópia (claro que fiz igualmente a parte que me competia realmente a nível do SIM, que era elaborar e remeter para o Com-Chefe o Relatório de Informações relativo à emboscada).
Avancemos, agora, em passo mais rápido, para o resto do esclarecimento, que já tarda.
O Paulo Santiago, altamente motivado pelo Luís Graça (penso que os restantes co-editores só apareceram mais à frente), teve o grande mérito de, paulatinamente, ir recolhendo novas pistas, novos depoimentos, embora vagos e algo imprecisos, que o foram levando a correcções de pormenor, as quais poderiam parecer irrelevantes, mas, para os familiares de alguns dos nossos camaradas mortos, que – soube-se agora – seguiam atentamente toda a informação difundida no blogue, viriam a revelar-se importantíssimas, já que ajudavam a desfazer dúvidas que os atormentavam desde sempre ou que os passaram a inquietar a partir de determinada altura. Para além do mérito do seu excelente esforço de pesquisa aquém e além-mar – só mesmo alguém com a generosidade e pertinácia do Paulo! -, é justo que se saliente a sua honestidade intelectual – que grande palavrão! -, quando, a páginas tantas do P4046, de Março de 2009, assume que “…talvez tenha lançado algumas dúvidas no espírito da Cidália, ela não me disse, mas até encontrar o Batista, estava convencido que o militar apanhado à mão no Quirafo – penso que está nos meus postes – era de transmissões e também havia a troca de nomes”.
Infelizmente, eu tinha deixado entretanto de aceder ao blogue e perdi, assim, a oportunidade de o rectificar, já que estava à vontade para insistir que o desaparecido se chamava mesmo Batista e tinha a especialidade de Atirador, conforme nossa conversa anterior em Aveiro. Mas, há ainda um antecedente curioso - para não lhe chamar outra coisa! – no meio de tudo isto. Vejam só:
Em 18 de Setembro de 1974, o JN entrevista o Batista, acabado de regressar à terra, após a sua libertação, e deixa, entre outras, a informação do seu nome completo (António da Silva Batista) e da respectiva especialidade (Atirador de Infantaria). Como explicar, então, que as fontes de informação do Paulo Santiago tivessem, posteriormente, feito tanta confusão com a especialidade do desaparecido (“era de informações(!); era radiotelegrafista(!)”)?...
Com toda a sinceridade, acho que, involuntariamente (tal como o Paulo Santiago), contribuí para a confusão. E passo a explicar porquê:
No conto de minha autoria “O Morto-Vivo”, inspirado na história do Batista e publicado pelo JN em 28 de Setembro de 1985, o “dito-cujo” tem a especialidade de “Transmissões”, tendo sido, por castigo, destacado para aquela missão, em que desapareceria sem deixar rasto.
Já todos perceberam onde quero chegar, é isso mesmo! Admito como muito provável que vários dos nossos camaradas que tiveram acesso à leitura do conto (não pela sua qualidade literária – coitadinho do conto! -, mas pelo seu título apelativo e já familiar e, acima de tudo, pelo facto de ter sido publicado no jornal de maior tiragem no nossos país), tenham ficado com o registo no subconsciente de que aquele tal desaparecido no Quirafo, de que muito se falou, era mesmo de Transmissões, quando, na verdade, a especialidade por mim escolhida para a personagem era, também ela, mera ficção.
Vamos, agora, à parte mais delicada deste assunto, razão fundamental desta minha intervenção no blogue, que é a das dúvidas quanto ao conteúdo das urnas.
É verdade que, como o Luís Graça refere no P987, de Julho/2006, sempre constou que mandavam para os nossos cemitérios caixões de chumbo vazios ou com pedras. Porém, felizmente, não terá sido esse o caso na situação em análise, já que testemunhei a transferência dos cadáveres dos balneários, onde estiveram temporariamente expostos, para as respectivas urnas, as quais, quando chegaram ao Saltinho, foram depositadas na parada, junto à messe (parte nascente). Cada uma delas, após fechada e selada, foi marcada a tinta com um número de ordem - precedido de um “X” (?) -, correspondente ao de cada morto constante na listagem oficial, por forma a não haver equívocos. Despachadas as urnas para Bissau, acompanhadas da listagem referida, não havia razão nenhuma para que não viessem a chegar ao respectivo destino no continente com a identificação devidamente controlada.
É claro que a responsabilidade da identificação dos corpos coube ao comando, que contou, para o efeito, com a colaboração de todos quantos foram capazes de ir reconhecer nos cadáveres expostos os alegres amigos e camaradas de umas horas antes, como foi o meu próprio caso. Não tendo uma relação muito próxima com a quase totalidade dos soldados, dado que, para além de não lidar directamente com eles, a Companhia encontrava-se no Saltinho há apenas três meses, reconheci prontamente alguns dos seus cadáveres (quase podia jurar que o fiz também em relação ao António Ferreira, cuja foto, agora publicada no blogue, me avivou a recordação da sua figura). Outros, pese embora o facto de se encontrarem carbonizados, foram identificados sem qualquer hesitação pelos camaradas mais chegados, tal como eu fiz em relação ao Alf Armandino e ao Fur Santos.
Não corresponde, pois, à realidade a ideia de que não terá sido possível a identificação dos corpos, conforme poderia inferir-se do teor do P4117. Na verdade, o Fur Álvaro Basto e o Alf Médico Alfredo Azevedo poderão não o ter conseguido fazer (e, se calhar, é justamente isso que o Álvaro pretende dizer), justificando-se perfeitamente a eventual recusa de emissão das certidões de óbito (não conhecendo pessoalmente as vítimas e perante corpos tão maltratados, mais não se lhes poderia exigir, mesmo disponibilizando-lhes os documentos de identificação, com foto, da totalidade das vítimas). Mas, outros puderam fazê-lo com segurança: traços fisionómicos e/ou outros característicos permitiram, felizmente, esse reconhecimento, pelo que não havia razões para inventar nada, como terá sido o caso em situações análogas (constava, não sei se de facto existiram) verificadas nos três teatros de operações. De qualquer modo, acredito que, na Guiné, durante o consulado de António de Spínola, isso seria absolutamente desaconselhável de tentar, dado o pendor patriarcal do General e a sua reputação de Comandante-Chefe implacável para com os incompetentes e irresponsáveis.
Assim, e em síntese, não haverá razões para duvidar de que, com excepção da urna remetida para a família do Batista, que, tudo leva a supor, continha o corpo do António Oliveira Azevedo, todas as restantes enviadas para a Metrópole continham os cadáveres efectivamente correspondentes às fichas de identificação que as acompanhavam, podendo os familiares dos nossos camaradas mortos em 17 de Abril de 1972, na emboscada do Quirafo, ficar sossegados sob esse ponto de vista, tal como poderá a D. Cidália continuar a venerar a memória do seu marido na sua sepultura de sempre, na certeza de que ali estarão os seus restos mortais.
(**) estes dois últimos adjectivos foram propositadamente extraídos dos comentários do Luís Graça no P4046
Esposende, 09/Abril/2009
Mário Migueis Ferreira da Silva
migueisdasilva@gmail.com
Nota: Gostaria de, através do blogue ou outra forma de contacto, saber notícias da malta da tão sacrificada “3490” (Que é feito de ti, Custódio Henriques?!... E de ti, Fonseca?!...Ninguém fala, ninguém diz nada!...).
3. Mensagem de Paulo Santiago com data de 15 de Abril de 2009:
Vinhal:
Estou a enviar-te esta mensagem porque serve para melhor compreendermos as causas do Luto Traumático da Cidália, viúva do 1.º Cabo Radiotelegrafista António Ferreira, morto em combate no Quirafo em 17 de Abril de 1972.
Em Junho de 1972, dia 6, chegou a Águas Santas o Armão Militar transportando a urna com o corpo do António Ferreira que foi depositado no Mosteiro, para as respectivas cerimónias fúnebres com Honras Militares. O mesmo armão seguiu para Moreira da Maia transportando outra urna que vinha identificada como sendo do Soldado António da Silva Baptista.
Em Setembro de 1974, trabalhava a Cidália numa fábrica de confecções em Rio Tinto, recebe, nesse seu local de trabalho, um telefonema informando-a que o António Ferreira estava vivo e a chegar a casa. Imaginem a situação. O patrão, acompanhado pela esposa, agarram no carro e transportam a Cidália até Águas Santas, onde se encontrava uma verdadeira multidão, tanto assim que resolveram deixar o automóvel e irem a pé até à residência da Cidália, onde esta entrou e não encontrou o amado marido. Algumas pessoas dirigem-se a ela perguntando-lhe:
- Onde está o Ferreira?
- Não está aqui - responde-lhes.
Alguém chega e diz:
- Quem já chegou foi aquele, o Baptista, de Moreira da Maia, sepultado no mesmo dia do Ferreira.
Lá segue a Cidália ao encontro do Baptista, onde se encontrava outra multidão. Falou com ele, lembrava-se do Ferreira mas não tinha qualquer recordação se ele ía na coluna, emboscada no Quirafo.
A Cidália confessou à Cátia que aquele dia de Setembro foi o mais feliz e o mais traumático da vida dela.
Paulo Santiago
__________
Notas de CV:
(a) Vd. poste de 31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1230: Onde se fala do Henriques da CCAÇ 12, do ranger Eusébio e da tragédia do Quirafo (Mário Miguéis)
(b) Vd. poste de 31 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4117: A tragédia do Quirafo: 37 anos para fazer o luto pelo António Ferreira (Paulo Santiago / Cátia Félix)
(c) Vd. poste de 24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)
(d) Vd. poste de 25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P987: A propósito do morto-vivo da CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74) (Paulo Santiago]
(e) Vd. poste de 26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)
(f) Vd. poste de 28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago)
(g) Vd. poste de 31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1230: Onde se fala do Henriques da CCAÇ 12, do ranger Eusébio e da tragédia do Quirafo (Mário Miguéis)
(h) Vd. poste de 22 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1985: Prisioneiro do PAIGC: António da Silva Batista, ex-Sold At Inf, CCAÇ 3490 / BCAÇ 3872 (2) (Álvaro Basto / João e Paulo Santiago)
(i) Vd. poste de 18 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4046: Ainda a atroz dúvida da Cidália, 37 anos depois: O meu marido morreu mesmo na emboscada do Quirafo ? (Paulo Santiago)
(*) Vd. poste de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4194: Tabanca Grande (134): Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf (Guiné 1970/72)
Incluímos ainda uma mensagem do camarada Paulo Santiago, que se interessou pelo caso Batista e pela completa informação à viúva do nosso camarada António Ferreira, ajudando a acabar com as dúvidas que ainda persistiam no íntimo da D. Cidália.
Este caso carregou muita carga dramática, pelos motivos já falados, e aflorados de novo hoje. Coincidências tristes originaram incertezas e sofrimento que só os protagonistas poderão descrever. A guerra e a sua bestialidade. CV
2. Continuação da mensagem de Mário Migueis da Silva, iniciada no poste 4194 (*)
[...] Dito isto – bem digo eu que, quando um antigo combatente começa a falar da guerra, não se cala mais! -, vamos, então, ao que me leva, assim de repente, a interromper o meu silêncio.
Após a minha mensagem de 2006, atrás referida (a), ao Paulo Santiago, era minha intenção vir, mais à frente, a intervir directamente no blogue, a dar conta da minha própria experiência nas unidades por onde passei e, muito especialmente, a dar o meu testemunho sobre a tragédia do Quirafo, que vivi de muito perto, já que me encontrava na altura no Saltinho, conhecendo todos os malogrados camaradas que tombaram sob o fogo impiedoso e traiçoeiro das armas inimigas.
Tinha, inclusivamente, prometido ao Paulo que iria tratar de localizar o Baptista – o nosso querido morto-vivo - e, com efeito, andei por Pedras Rubras e Santa Cruz do Bispo, a perguntar pelo nosso homem. O que é facto é que, quando já tinha o cerco montado à residência do procurado, tive que, por razões de força maior, adiar o golpe de mão para melhor oportunidade. Pelos vistos, o Paulo é que não ficou à espera das minhas diligências – estava ele bem servido! – e, com a colaboração da Tabanca de Matosinhos, tratou de apanhar o Baptista à mão – uma vez mais, chiça!... - e de o obrigar a confessar tudo.
Superado, entretanto, o problema que eu vinha tendo com o meu pobre sistema ocular e cujo agravamento me obrigou a afastar do computador durante os dois anos de tratamento a que me sujeitei, passei, muito recentemente, a aceder de novo ao blogue e confesso que tenho lutado muito comigo mesmo para contrariar a vontade de intervir em algumas das discussões vindas a lume, já que receio forçar a vista e voltar à estaca zero. Porém, estes últimos postes com intervenções relacionadas com o nosso camarada António Ferreira, um dos nossos mortos em combate no maldito Quirafo, obriga-me a acrescentar – e com a urgência possível - alguma coisa ao já relatado, sob pena de não ficar de bem com a minha consciência.
Não sou muito de dramatizar situações mas, algo comovido com a história da viúva do António Ferreira (pudesse eu adivinhar que, a apenas 40km de distância da minha casa, alguém, ao longo de anos a fio, se recusava a perder a esperança de um dia rever o marido, que, afinal, eu sabia garantidamente morto!...), li e reli todos os textos publicados no blogue sobre a emboscada do Quirafo – quase todos da autoria do Paulo Santiago, um combatente de raça, podem crer! - , a fim de tentar perceber melhor o fundamento de algumas das afirmações e comentários sobre pormenores do acontecido, já que, no P4117 (b), de 02 do corrente mês, é referido que “…o Álvaro Basto, ex-Furriel Mil Enf da Cart 3492 (Xitole, 1971/74) constatou pessoalmente, no Saltinho, a impossibilidade de reconhecer os cadáveres dos nossos camaradas da CCaç 3490, que morreram na emboscada do Quirafo, incluindo o António Ferreira…” .
Ora, esta alegada constatação do Álvaro Basto, cuja presença no Saltinho, bem como a do Alf Médico Alfredo Pinheiro de Azevedo, me passou despercebida no meio daquela verdadeira barafunda – pelo menos, não me lembro de os ter visto -, leva (ou pode levar) os leitores a concluírem que nenhum dos mortos terá sido identificado e os familiares a interrogarem-se mesmo sobre a realidade (o quê ou quem?) escondida naquelas urnas seladas, chumbadas,(**) que um dia lhes remeteram para casa.
Recuando, então, até aos postes de 2006, fui extraindo alguns dos tais comentários e achegas referentes ao tema em questão, susceptíveis (na minha opinião) de, ao longo do tempo, terem vindo a alimentar alguma escusada inquietação e ansiedade por parte dos familiares dos nossos camaradas mortos, os quais passo a transcrever, por ordem cronológica, para , em seguida, prestar o esclarecimento que julgo pertinente:
- P984 / Fur António Duarte/Mansambo:
“…Daquilo que me lembro, havia dois ou três companheiros, vítimas da emboscada, que foram dados como desaparecidos…” (c)
- P987 (Julho/2006)- Comentários do L.G.:
“… O que nos choca, ainda hoje, é o cinismo, o desprezo, o despudor das autoridades militares da época, que, incapazes de falar a verdade às famílias………………., mandavam para os nossos cemitérios caixões de chumbo….vazios!!!............. …….Infelizmente, em muitos casos, manteve-se a suspeita de que os caixões que vinham do Ultramar (e da Guiné, em particular) não traziam os restos mortais dos nossos soldados, mas apenas pedras…” (d)
- P990 (Julho/2006):
“…há um 1º.Cabo de Transmissões que, a certa altura, se levanta, salta com o AVP1 às costas, apanha um tiro num braço e corre em direcção aos atacantes. É apanhado à mão….” (e)
- P1000 (Julho/2006):
“…um dos sobreviventes fala no caso do transmissões que viu ser apanhado à mão, e que estava ferido num braço”. E, mais à frente: “O homem das transmissões desaparecera e iria ser dado como morto”. (f)
- P1230 (Out2006):
O Paulo Santiago, dirigindo-se a mim: “…há dias, o Cosme, um dos meus cabos, disse que o cabo apanhado à mão no Quirafo se chamava Ferreira, e não Batista, nome que utilizei no relato, pois era o que tinhas indicado quando almoçámos em Aveiro e falámos do caso. “ (g)
- P1985 (22/07/2007: “… O Álvaro Basto tem uma questão pertinente. No dia da emboscada, ele e o Alf. Médico Azevedo, que prestava assistência no Xitole e no Saltinho, foram a este último quartel, a fim de passarem as respectivas certidões de óbito. O Dr. Azevedo, apesar da insistência do Lourenço (capitão da CCaç.3490) recusou-se a passar certidões daqueles corpos carbonizados e desmembrados…”(h)
Ainda no mesmo post:
“… o António Batista é assaltado por outra perplexidade: - Tenho desde sexta feira outra dúvida – diz ele – um conterrâneo meu, da Maia, António Oliveira Azevedo, ia também a monte na GMC, tendo sido dado como desaparecido em combate. Nunca apareceu…”
- P4046 / Comentários do Luís Graça:
“…Como houve pelo menos um caso de troca de identidades……….e, além do mais, os cadáveres estavam irreconhecíveis, desmembrados e carbonizados (de acordo com o testemunho do Alf Médico Alfredo Pinheiro de Azevedo e do Fur Mil Enf Álvaro Basto),…., ficou, fica, ficará sempre a atroz dúvida: será que o meu marido morreu mesmo na emboscada?”(i)
Após a leitura destes excertos dos postes assinalados, é fácil, afinal, perceber as dúvidas que vieram assaltando até agora a D. Cidália Cunha, viúva do nosso camarada António Ferreira, de facto o único especialista de transmissões presente no grupo emboscado!... A confusão do número de desaparecidos, o radiotelegrafista apanhado à mão, o 1.º Cabo de Transmissões que, com um AVP 1 às costas… Enfim, parece que tudo se conjugava para lhe transmitir a ideia de que o marido, em vez de, irremediavelmente, morto, poderia, afinal, ter simplesmente desaparecido, ter sido aprisionado e voltar ainda um dia, quem sabe?... “Mas, e a urna?”, - perguntar-se-ia. “Sabe-se lá o que contém a urna!...”, - resposta de alguém…
Vamos, então, aos comentários e esclarecimentos prometidos, que visam, no final de contas, confirmar a generalidade das últimas conclusões do Paulo Santiago e desfazer a ideia de que os corpos estavam mesmo irreconhecíveis.
Malgrado toda a confusão gerada pelas informações deste e daquele de que alguém das transmissões teria sido apanhado à mão, o que é facto é que, na emboscada do Quirafo, apenas foi, com toda a certeza, capturado o soldado António da Silva Batista (Atirador de Infantaria) e, muito provavelmente, um nativo que seguia igualmente na GMC para os trabalhos de desmatação da picada, conforme referido pelo Batista na entrevista que concedeu ao “Comércio do Porto”, em 18/09/1974, após a sua libertação e regresso a casa.
Nenhum outro militar da CCaç 3490 foi capturado pelo IN, correspondendo o número de cadáveres recuperados ao número dos elementos das NT em falta menos um, o qual, assim se justificava, foi dado como desaparecido. Foi possível distinguir os cadáveres dos elementos POP e milícias mortos, os quais, segundo me informaram na altura, foram devidamente identificados pela população de Madina Bucô – a mais próxima do Quirafo -, de onde eram originários, tendo os respectivos parentes assumido a responsabilidade da sua guarda e inumação.
Ouvi, rodeado de um pequeno grupo de soldados aterrorizados (os mortos vinham a caminho!), as primeiras declarações do Maximiano, condutor da GMC, ao encontro do qual me dirigi nas imediações do aquartelamento do Saltinho, onde ele, em visível estado de choque, acabava de chegar pelos próprios meios (correndo, a corta-mato), desde o local da emboscada. Transmitiu-me repetidamente - entre outros pormenores, obviamente - que o Batista conseguira saltar da viatura antes desta ter explodido e que o vira a correr, ensanguentado, pelo mato.
Ora, como todos os mortos recolhidos se encontravam na picada, e a fazer fé no testemunho do Maximiano, nenhum dos corpos podia, pois, ser o do Batista, cujo nome, confesso, nada me dizia. Aliás, no dia seguinte, foi feito o reconhecimento ao local da emboscada com reforços chegados de outra(s) Companhia(s) do Batalhão (e, eventualmente, de outros vizinhos, mas disso já não tenho a certeza) e apoio de um helicóptero, visando, inclusivamente, detectar e recuperar o tal homem desaparecido. Como não tivéssemos sido bem sucedidos nas buscas efectuadas, concluiu-se que o mesmo, das duas, uma: ou tinha sido capturado pelo IN ou, provavelmente ferido com gravidade, teria sucumbido algures em plena mata - “devorado até pelas feras, quem sabe?“, conjecturou-se, na altura.
Não acredito na história de que “…só o Cap Lourenço afirmava que ele tinha morrido, o resto da companhia (a CCaç 3490) afirmava que ele estava vivo…” (P987, de Julho/06), ou melhor, não acredito que as duas versões tivessem constado simultaneamente no Saltinho, conforme somos levados a supor pela leitura do post (pelo menos até 20/10/1972, altura em que regressei à Metrópole, tal não aconteceu). Agora, o que parece ser claro é que, se porventura, mais tarde, aqueles que, como eu, tinham ouvido da boca do Maximiano a informação de que o Batista saltara da viatura e conseguira atingir a mata, perguntassem ao Cap Lourenço quem tinha realmente desaparecido, este responderia imediatamente (ou após consulta dos papéis, era o mais certo!) que era o António Oliveira Azevedo, uma vez que era este que, como tal, constava na listagem oficial em seu poder. E, então sim, seria imediatamente contestado e passariam a coexistir publicamente as duas versões.
Mas, a verdade é que toda a gente terá ficado convencida (poderá admitir-se alguma excepção, claro) de que o Batista tinha igualmente acabado por perecer, embora o corpo não tivesse sido encontrado. O próprio comunicado de guerra do PAIGC relativo à emboscada (fazia parte da minha rotina ouvir e gravar estes comunicados do IN na Rádio Conacri) era omisso quanto à captura de prisioneiros, o que terá reforçado a tese do comando, ao qual dei a gravação a ouvir, de que o desaparecido terá morrido algures na mata, embora eu tenha sempre chamado a atenção – lembro-me bem disso - para o facto de ser prática conhecida, nossa como do IN, não dar a saber ao adversário a existência de prisioneiros, por forma a poder explorar, eventualmente, informações a recolher dos mesmos (era dos livros!).
Essa possibilidade em aberto, nunca deixei de a considerar, até porque, por incrível que possa parecer - dados os milhares de soldados que, ao longo de uma década, passaram pela Guiné -, quando, um colega do banco onde eu, na altura, trabalhava, chegou com a história de que vinha nos jornais a notícia do regresso de um militar que fora dado como morto na Guiné, comentei imediatamente: - Nunca se sabe se não é um soldado que nos desapareceu durante uma emboscada e que nunca mais voltámos a ver!. No minuto seguinte, estava a comprar o JN - Jornal de Notícias e o Comércio do Porto. O resto, já todos sabeis.
Ah!..., mas dizia eu que toda a malta estava convencida de que o Batista fora repasto para alguma fera e, como tal, quem quereria saber de questionar pormenores?!... Cada um tratou de se remeter ao seu canto e ao seu silêncio. Os mortos estavam a caminho de ser enterrados e o que era preciso era cuidar dos vivos, que a missão ainda nem no adro ia.
Para os camaradas que o conheciam bem, o desaparecido em combate teria o nome de Batista e assim seria recordado. Para o Cap Lourenço e para o Alf Rainha, a listagem que tinham elaborado era de nomes próprios que, porventura, não lhes diziam muito (pertenciam ao grupo do Alf Armandino) e, se calhar, nunca lhes deu para reverem, uma vez que fosse, as cópias da papelada que tinha acompanhado os corpos ou para comentarem os seus termos com quem quer que fosse e, muito menos ainda, para difundirem a listagem pelos restantes elementos da Companhia. Inclino-me até a acreditar que esqueceram rapidamente quem foi e quem não foi que fizeram constar como mortos, feridos e desaparecidos, excepção feita para os casos do alferes e do furriel. E, como atrás já referi, nunca ouvi de ninguém, durante os seis meses que ainda permaneci no Saltinho, qualquer comentário sobre eventual equívoco na identificação das vítimas.
Até à publicação no blogue da lista oficial dos mortos, feridos e desaparecido, que foi elaborada no gabinete do Comandante, onde eu próprio trabalhava (duas secretárias a dois metros de distância uma da outra: a do Cap Lourenço e a minha), nunca me passou pela cabeça que pudesse não estar correcta (nunca senti ou tive necessidade de a consultar e o ambiente - de cortar à faca, com uma atitude hostil da minha parte em relação ao Comando - não era favorável a grande troca de impressões, evitando eu imiscuir-me tanto quanto possível naquilo que não me dizia respeito), sendo minha convicção que o lapso verificado na identificação do corpo - evidenciado publicamente após o regresso do Batista - tivesse acontecido em Bissau, durante a trasladação dos cadáveres para a metrópole.
Mas, o que terá, então, induzido em erro o Lourenço e o Rainha, levando-os àquela troca de condição (morto ou desaparecido) entre os soldados António Batista e António Azevedo?
Penso (mas já não posso garantir) que, em primeiro lugar, foi feito o levantamento dos elementos em falta no Grupo de Combate e, só em seguida, a verificação e reconhecimento dos cadáveres, com a colaboração dos camaradas que lhes eram mais próximos. Talvez aqui se tenha verificado o lapso, quando alguém, que não ouvira o Maximiano, apontou o corpo do António Azevedo como sendo o do Batista. E como, estando os restantes corpos identificados, ficava a faltar o corpo do primeiro (o do António Azevedo), foi este dado como desaparecido. Mas, atenção!, isto não passa de uma mera teoria, podendo, como tal, corresponder à realidade ou não.
Como o Alf Rainha já não se encontra, infelizmente, entre nós, caberá (caberia?) ao Cap Lourenço (porque não?...) prestar o devido esclarecimento, já que foram os dois quem superintendeu na elaboração das listagens e relatórios, impondo-se, a bem da verdade, que se acrescente que, quem, como eu, pôde testemunhar todo o terror e desorientação provocados por aquela verdadeira tragédia, no seio de uma Companhia de jovens soldados com apenas três meses de Guiné, compreende, sem grande esforço, que qualquer falha deste tipo pudesse facilmente acontecer, pese, embora, a gravidade das eventuais consequências – mas, quem estaria tão responsavelmente preocupado com isso naquele momento?! Não éramos, afinal, todos uns miúdos, como escreveu ou disse algures o nosso antigo camarada de armas António Lobo Antunes?!...
Já agora, quanto à guerra dos papéis (que, ficámos a saber, havia de se revelar desastrosa), a mim, que era carta fora do baralho, tocou-me apenas a parte artística (perdoai-me o cinismo), ou seja, fui solicitado - embora tal não me competisse - para a feitura do croquis da emboscada, do qual conservo ainda uma cópia (claro que fiz igualmente a parte que me competia realmente a nível do SIM, que era elaborar e remeter para o Com-Chefe o Relatório de Informações relativo à emboscada).
Avancemos, agora, em passo mais rápido, para o resto do esclarecimento, que já tarda.
O Paulo Santiago, altamente motivado pelo Luís Graça (penso que os restantes co-editores só apareceram mais à frente), teve o grande mérito de, paulatinamente, ir recolhendo novas pistas, novos depoimentos, embora vagos e algo imprecisos, que o foram levando a correcções de pormenor, as quais poderiam parecer irrelevantes, mas, para os familiares de alguns dos nossos camaradas mortos, que – soube-se agora – seguiam atentamente toda a informação difundida no blogue, viriam a revelar-se importantíssimas, já que ajudavam a desfazer dúvidas que os atormentavam desde sempre ou que os passaram a inquietar a partir de determinada altura. Para além do mérito do seu excelente esforço de pesquisa aquém e além-mar – só mesmo alguém com a generosidade e pertinácia do Paulo! -, é justo que se saliente a sua honestidade intelectual – que grande palavrão! -, quando, a páginas tantas do P4046, de Março de 2009, assume que “…talvez tenha lançado algumas dúvidas no espírito da Cidália, ela não me disse, mas até encontrar o Batista, estava convencido que o militar apanhado à mão no Quirafo – penso que está nos meus postes – era de transmissões e também havia a troca de nomes”.
Infelizmente, eu tinha deixado entretanto de aceder ao blogue e perdi, assim, a oportunidade de o rectificar, já que estava à vontade para insistir que o desaparecido se chamava mesmo Batista e tinha a especialidade de Atirador, conforme nossa conversa anterior em Aveiro. Mas, há ainda um antecedente curioso - para não lhe chamar outra coisa! – no meio de tudo isto. Vejam só:
Em 18 de Setembro de 1974, o JN entrevista o Batista, acabado de regressar à terra, após a sua libertação, e deixa, entre outras, a informação do seu nome completo (António da Silva Batista) e da respectiva especialidade (Atirador de Infantaria). Como explicar, então, que as fontes de informação do Paulo Santiago tivessem, posteriormente, feito tanta confusão com a especialidade do desaparecido (“era de informações(!); era radiotelegrafista(!)”)?...
Com toda a sinceridade, acho que, involuntariamente (tal como o Paulo Santiago), contribuí para a confusão. E passo a explicar porquê:
No conto de minha autoria “O Morto-Vivo”, inspirado na história do Batista e publicado pelo JN em 28 de Setembro de 1985, o “dito-cujo” tem a especialidade de “Transmissões”, tendo sido, por castigo, destacado para aquela missão, em que desapareceria sem deixar rasto.
Já todos perceberam onde quero chegar, é isso mesmo! Admito como muito provável que vários dos nossos camaradas que tiveram acesso à leitura do conto (não pela sua qualidade literária – coitadinho do conto! -, mas pelo seu título apelativo e já familiar e, acima de tudo, pelo facto de ter sido publicado no jornal de maior tiragem no nossos país), tenham ficado com o registo no subconsciente de que aquele tal desaparecido no Quirafo, de que muito se falou, era mesmo de Transmissões, quando, na verdade, a especialidade por mim escolhida para a personagem era, também ela, mera ficção.
Vamos, agora, à parte mais delicada deste assunto, razão fundamental desta minha intervenção no blogue, que é a das dúvidas quanto ao conteúdo das urnas.
É verdade que, como o Luís Graça refere no P987, de Julho/2006, sempre constou que mandavam para os nossos cemitérios caixões de chumbo vazios ou com pedras. Porém, felizmente, não terá sido esse o caso na situação em análise, já que testemunhei a transferência dos cadáveres dos balneários, onde estiveram temporariamente expostos, para as respectivas urnas, as quais, quando chegaram ao Saltinho, foram depositadas na parada, junto à messe (parte nascente). Cada uma delas, após fechada e selada, foi marcada a tinta com um número de ordem - precedido de um “X” (?) -, correspondente ao de cada morto constante na listagem oficial, por forma a não haver equívocos. Despachadas as urnas para Bissau, acompanhadas da listagem referida, não havia razão nenhuma para que não viessem a chegar ao respectivo destino no continente com a identificação devidamente controlada.
É claro que a responsabilidade da identificação dos corpos coube ao comando, que contou, para o efeito, com a colaboração de todos quantos foram capazes de ir reconhecer nos cadáveres expostos os alegres amigos e camaradas de umas horas antes, como foi o meu próprio caso. Não tendo uma relação muito próxima com a quase totalidade dos soldados, dado que, para além de não lidar directamente com eles, a Companhia encontrava-se no Saltinho há apenas três meses, reconheci prontamente alguns dos seus cadáveres (quase podia jurar que o fiz também em relação ao António Ferreira, cuja foto, agora publicada no blogue, me avivou a recordação da sua figura). Outros, pese embora o facto de se encontrarem carbonizados, foram identificados sem qualquer hesitação pelos camaradas mais chegados, tal como eu fiz em relação ao Alf Armandino e ao Fur Santos.
Não corresponde, pois, à realidade a ideia de que não terá sido possível a identificação dos corpos, conforme poderia inferir-se do teor do P4117. Na verdade, o Fur Álvaro Basto e o Alf Médico Alfredo Azevedo poderão não o ter conseguido fazer (e, se calhar, é justamente isso que o Álvaro pretende dizer), justificando-se perfeitamente a eventual recusa de emissão das certidões de óbito (não conhecendo pessoalmente as vítimas e perante corpos tão maltratados, mais não se lhes poderia exigir, mesmo disponibilizando-lhes os documentos de identificação, com foto, da totalidade das vítimas). Mas, outros puderam fazê-lo com segurança: traços fisionómicos e/ou outros característicos permitiram, felizmente, esse reconhecimento, pelo que não havia razões para inventar nada, como terá sido o caso em situações análogas (constava, não sei se de facto existiram) verificadas nos três teatros de operações. De qualquer modo, acredito que, na Guiné, durante o consulado de António de Spínola, isso seria absolutamente desaconselhável de tentar, dado o pendor patriarcal do General e a sua reputação de Comandante-Chefe implacável para com os incompetentes e irresponsáveis.
Assim, e em síntese, não haverá razões para duvidar de que, com excepção da urna remetida para a família do Batista, que, tudo leva a supor, continha o corpo do António Oliveira Azevedo, todas as restantes enviadas para a Metrópole continham os cadáveres efectivamente correspondentes às fichas de identificação que as acompanhavam, podendo os familiares dos nossos camaradas mortos em 17 de Abril de 1972, na emboscada do Quirafo, ficar sossegados sob esse ponto de vista, tal como poderá a D. Cidália continuar a venerar a memória do seu marido na sua sepultura de sempre, na certeza de que ali estarão os seus restos mortais.
(**) estes dois últimos adjectivos foram propositadamente extraídos dos comentários do Luís Graça no P4046
Esposende, 09/Abril/2009
Mário Migueis Ferreira da Silva
migueisdasilva@gmail.com
Nota: Gostaria de, através do blogue ou outra forma de contacto, saber notícias da malta da tão sacrificada “3490” (Que é feito de ti, Custódio Henriques?!... E de ti, Fonseca?!...Ninguém fala, ninguém diz nada!...).
3. Mensagem de Paulo Santiago com data de 15 de Abril de 2009:
Vinhal:
Estou a enviar-te esta mensagem porque serve para melhor compreendermos as causas do Luto Traumático da Cidália, viúva do 1.º Cabo Radiotelegrafista António Ferreira, morto em combate no Quirafo em 17 de Abril de 1972.
Em Junho de 1972, dia 6, chegou a Águas Santas o Armão Militar transportando a urna com o corpo do António Ferreira que foi depositado no Mosteiro, para as respectivas cerimónias fúnebres com Honras Militares. O mesmo armão seguiu para Moreira da Maia transportando outra urna que vinha identificada como sendo do Soldado António da Silva Baptista.
Em Setembro de 1974, trabalhava a Cidália numa fábrica de confecções em Rio Tinto, recebe, nesse seu local de trabalho, um telefonema informando-a que o António Ferreira estava vivo e a chegar a casa. Imaginem a situação. O patrão, acompanhado pela esposa, agarram no carro e transportam a Cidália até Águas Santas, onde se encontrava uma verdadeira multidão, tanto assim que resolveram deixar o automóvel e irem a pé até à residência da Cidália, onde esta entrou e não encontrou o amado marido. Algumas pessoas dirigem-se a ela perguntando-lhe:
- Onde está o Ferreira?
- Não está aqui - responde-lhes.
Alguém chega e diz:
- Quem já chegou foi aquele, o Baptista, de Moreira da Maia, sepultado no mesmo dia do Ferreira.
Lá segue a Cidália ao encontro do Baptista, onde se encontrava outra multidão. Falou com ele, lembrava-se do Ferreira mas não tinha qualquer recordação se ele ía na coluna, emboscada no Quirafo.
A Cidália confessou à Cátia que aquele dia de Setembro foi o mais feliz e o mais traumático da vida dela.
Paulo Santiago
__________
Notas de CV:
(a) Vd. poste de 31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1230: Onde se fala do Henriques da CCAÇ 12, do ranger Eusébio e da tragédia do Quirafo (Mário Miguéis)
(b) Vd. poste de 31 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4117: A tragédia do Quirafo: 37 anos para fazer o luto pelo António Ferreira (Paulo Santiago / Cátia Félix)
(c) Vd. poste de 24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)
(d) Vd. poste de 25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P987: A propósito do morto-vivo da CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74) (Paulo Santiago]
(e) Vd. poste de 26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)
(f) Vd. poste de 28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago)
(g) Vd. poste de 31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1230: Onde se fala do Henriques da CCAÇ 12, do ranger Eusébio e da tragédia do Quirafo (Mário Miguéis)
(h) Vd. poste de 22 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1985: Prisioneiro do PAIGC: António da Silva Batista, ex-Sold At Inf, CCAÇ 3490 / BCAÇ 3872 (2) (Álvaro Basto / João e Paulo Santiago)
(i) Vd. poste de 18 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4046: Ainda a atroz dúvida da Cidália, 37 anos depois: O meu marido morreu mesmo na emboscada do Quirafo ? (Paulo Santiago)
(*) Vd. poste de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4194: Tabanca Grande (134): Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf (Guiné 1970/72)
Marcadores:
Alvaro Basto,
António da Silva Batista,
António Ferreira,
Cátia Félix,
CCAÇ 3490,
emboscadas,
Mário Migueis da Silva,
Paulo Santiago,
Quirafo,
Saltinho
quinta-feira, 16 de abril de 2009
Guiné 63/74 - P4199: In Memoriam (18): Domingos Gomes Nabais, morto por afogamento no Rio Geba, Bafatá, 13/4/65 (José Colaço / Francisco dos Santos)
Guiné > Zona Leste > Bafatá > 1970 > Vista aérea de Bafatá, com o Rio Geba (o chamado Geba Estreito) do lado direito. Foto tirada de helicóptero, do lado oeste, pelo ex-Fur Mil Op Esp Humberto Reis (CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71). Aqui morreu, por afogamento, o Domingos Gomes Nabais, natural de Sabugal, em 13 de Abrild e 1965. Pertencia à CCAÇ 557, que tinha vindo da Il
ha do Como...
Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados
1. Quem era o Nabais, da CCAÇ 557, e em que circunstâncias morreu ? Curiosidade desperta pelos versos do Francisco dos Santos (*) e logo satisfeito pelo seu e nosso camarada José Colaço
(...) Éramos a família unida,
Por isso não digo nomes,
Sacrificámos a vida,
Que heróis todos nós fomos.
Mas veio então a mudança,
Bafatá que era a norte,
Havia mais esperança
E talvez melhor sorte.
Não queríamos muito mais,
O tempo passa a correr,
Mas o soldado Nabais
No rio viria a morrer.
A morte por afogamento
Que já ninguém o previa,
Este triste acontecimento
Chocou muito a Companhia....)
Francisco dos Santos
2. Ficha necrológica (**):
Nome: Domingos Gomes Nabais,
Psto: Soldado
Subunidade: CCAÇ 557, Cachil, Bissau e
Bafatá, 1963/65,
Local e data: Bafatá, Rio Geba, 13 de Abril de 1965
Causa: Afogamento
Naturalidade: Aldeia Velha, Sabugal
Última morada: Cemitério de Bafatá, Guiné-Bissau
3. Diz o José Colaço (***):
o Nabais era um rapaz muito simples, por esse motivo era muito apoiado por todos os camaradas. Quem lhe escrevia as cartas os aerogramas era o Francisco dos Santos.
A sua morte não teve nada a ver com combates de guerra, não sei se por ironia do destino, ou sei lá, assisti praticamente aos últimos minutos de vida do Nabais.
Era uma tarde bonita, cheia de sol, o Geba [ em Bafatá,] convidava-nos a tomar banho. Então um grupo de 1o ou 12 militares fomos tomar banho. O Nabais não sabia nadar, ele estava neste caso mais ou menos à beira rio...
Entretanto notou-se a falta do Nabais mas, como do grupo nenhum sabia mergulhar com capacidade para procurar o Nabais, houve uma corrida até ao quartel para chamar o Fernando, Cabo condutor, óptimo mergulhador que, em poucos segundos, aparece com o Nabais na palma da mão ao cimo da água mas sem sinais de vida.
Ainda se tentou a recuperação mas o Nabais estava morto, não se sabe se por afogamento ou problemas por estar a fazer a digestão.
Ficou sepultado em Bafatá no talhão dos militares. Morreu em 13/04/1965.
Quanto ao Francisco dos Santos, darei notícias, somos muito amigos.
Um abraço, Colaço.
___________
Notas de L.G.:
(*) 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4196: Blogpoesia (39): CCAÇ 557, Missão cumprida na Guiné (José Colaço/Francisco dos Santos)
(**) 30 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2802: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (2): 1965 (A. Marques Lopes)
(***) Vd. último poste desta série > 11 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3723: In Memoriam (17): Morreu o Capitão Sucena, um Homem bom (António Matos)
Guiné 63/74 - P4198: Convívios (113): 3.º Encontro/Convívio do pessoal da CCS/BART 2917, dia 16 de Maio de 2009, em Viana do Castelo (Benjamim Durães)
1. Mensagem de Benjamim Durães, ex-Fur Mil do Pel Rec, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72), com data de 11 de Abril de 2009
Ex-Camarada de Armas,
Vamos este ano efectuar o 3º ENCONTRO-CONVÍVIO da CCS/BART 2917, terá lugar em VIANA DO CASTELO no próximo dia 16 DE MAIO.
A concentração será entre as 10 horas e as 11 horas na Fortaleza (Castelo) de SANTIAGO DA BARRA, quartel este que nos viu partir (BART 2917 e CART’S 2714; 2715 e 2716) no dia 16 de Maio de 1970, rumo a LISBOA para embarcarmos para a Guiné, agora está transformado em Centro de Congressos.
Às 11 horas rumamos em direcção ao Templo de Santa Luzia para uma visita.
Pelas 12,30 horas rumamos em direcção à ”QUINTA DA PRESA”, que fica localizada na encosta da Meadela, a 2 Km de Viana do Castelo, (na Rua da Presa, Nº 110, em Meadela), perto da saída da Auto Estrada.
Ali chegados, temos umas entradas bem regadas, seguido do almoço que consiste de sarrabulho à moda do Minho, e em alternativa temos um arroz branco com Rojões à Minhota ou ainda prato de dieta para quem marcar com antecedência.
À tarde temos o Lanche que consiste de pataniscas, bolos de bacalhau, croquetes, rissóis, etc. etc., com animação folclórica.
Para quem quiser pernoitar em Viana do Castelo, a Cidade tem diversas ofertas de pernoitas, mas foi contactado o “HOTEL DO PARQUE” para dar alojamento a quem quiser lá pernoitar, e com os seguintes preços:
QUARTO SINGLER – 40,00€
QUARTO DUPLO - 48,00€ (2 Pax); e
QUARTO TRIPLO – 58,00 € (3 Pax).
Para efeitos destes preços (com desconto), na marcação deve-se referir que é elemento do “ENCONTRO DA CCS/BART 2917”.
O “HOTEL DO PARQUE” fica situado na Praça da Galiza, na margem direita do Rio Lima, a cerca de 500 metros do centro da Cidade,
com o telefone 258 828 605;
fax 258 828 612;
e-mail hparque@nortenet.pt
O CONVÍVIO-ENCONTRO tem o mesmo custo das anteriores edições, ou seja 35,00 €uros para adultos e 20,00 €uros para crianças até aos 10 anos.
Responde a esta missiva indicando quantas pessoas estarão presentes, para:
BENJAMIM DURÃES
RUA FLORBELA ESPANCA, Nº 10
2950 – 296 PALMELA
TELEMÓVEL – 93 93 93 315 ou 93 93 93 939
E-MAIL – duraes.2917@hotmail.com
Ou
ANTÓNIO BASTO
TELEFONE: - 258 824 230
TELEMÓVEL: - 96 502 06 54
E-MAIL: - antoniobasto@sapo.pt
CONFIRMA A PRESENÇA ATÉ DIA 30 DE ABRIL DE 2009, PARA:
BENJAMIM DURÃES
TELEMÓVEL – 93 93 93 315 ou 93 93 93 939
__________
Nota de CV:
Vd. poste de 14 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3622: Brasões, guiões ou crachás (6): BART 2917 e 2924, BCAÇ 507 e 512, CCAV 1484, Pel Caç Nat 52 e Pel Mort 4574 (José Martins)
Vd. último poste da série de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4193: Convívios (110): Pessoal da CCAÇ 2660/BCAÇ 2905, dia 2 de Maio de 2009 em Alvarenga (Paulino Pereira)
Ex-Camarada de Armas,
Vamos este ano efectuar o 3º ENCONTRO-CONVÍVIO da CCS/BART 2917, terá lugar em VIANA DO CASTELO no próximo dia 16 DE MAIO.
A concentração será entre as 10 horas e as 11 horas na Fortaleza (Castelo) de SANTIAGO DA BARRA, quartel este que nos viu partir (BART 2917 e CART’S 2714; 2715 e 2716) no dia 16 de Maio de 1970, rumo a LISBOA para embarcarmos para a Guiné, agora está transformado em Centro de Congressos.
Às 11 horas rumamos em direcção ao Templo de Santa Luzia para uma visita.
Pelas 12,30 horas rumamos em direcção à ”QUINTA DA PRESA”, que fica localizada na encosta da Meadela, a 2 Km de Viana do Castelo, (na Rua da Presa, Nº 110, em Meadela), perto da saída da Auto Estrada.
Ali chegados, temos umas entradas bem regadas, seguido do almoço que consiste de sarrabulho à moda do Minho, e em alternativa temos um arroz branco com Rojões à Minhota ou ainda prato de dieta para quem marcar com antecedência.
À tarde temos o Lanche que consiste de pataniscas, bolos de bacalhau, croquetes, rissóis, etc. etc., com animação folclórica.
Para quem quiser pernoitar em Viana do Castelo, a Cidade tem diversas ofertas de pernoitas, mas foi contactado o “HOTEL DO PARQUE” para dar alojamento a quem quiser lá pernoitar, e com os seguintes preços:
QUARTO SINGLER – 40,00€
QUARTO DUPLO - 48,00€ (2 Pax); e
QUARTO TRIPLO – 58,00 € (3 Pax).
Para efeitos destes preços (com desconto), na marcação deve-se referir que é elemento do “ENCONTRO DA CCS/BART 2917”.
O “HOTEL DO PARQUE” fica situado na Praça da Galiza, na margem direita do Rio Lima, a cerca de 500 metros do centro da Cidade,
com o telefone 258 828 605;
fax 258 828 612;
e-mail hparque@nortenet.pt
O CONVÍVIO-ENCONTRO tem o mesmo custo das anteriores edições, ou seja 35,00 €uros para adultos e 20,00 €uros para crianças até aos 10 anos.
Responde a esta missiva indicando quantas pessoas estarão presentes, para:
BENJAMIM DURÃES
RUA FLORBELA ESPANCA, Nº 10
2950 – 296 PALMELA
TELEMÓVEL – 93 93 93 315 ou 93 93 93 939
E-MAIL – duraes.2917@hotmail.com
Ou
ANTÓNIO BASTO
TELEFONE: - 258 824 230
TELEMÓVEL: - 96 502 06 54
E-MAIL: - antoniobasto@sapo.pt
CONFIRMA A PRESENÇA ATÉ DIA 30 DE ABRIL DE 2009, PARA:
BENJAMIM DURÃES
TELEMÓVEL – 93 93 93 315 ou 93 93 93 939
__________
Nota de CV:
Vd. poste de 14 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3622: Brasões, guiões ou crachás (6): BART 2917 e 2924, BCAÇ 507 e 512, CCAV 1484, Pel Caç Nat 52 e Pel Mort 4574 (José Martins)
Vd. último poste da série de 16 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4193: Convívios (110): Pessoal da CCAÇ 2660/BCAÇ 2905, dia 2 de Maio de 2009 em Alvarenga (Paulino Pereira)
Guiné 63/74 - P4197: FAP (23): O poder aéreo no CTIG, 'case study' numa tese de doutoramento nos EUA (Matt Hurley / Luís Graça)
Vídeo (2' 35''): Jorge Félix / You Tube (2008). (com a devida autorização do autor...).
Agradecimentos são devidos: (i) ao Bana, ao Luís Morais e ao extinto grupo musical, fabuloso, mítico, Voz de Cabo Verde... De um lado e doutro da barricada, se calhar ouvíamos a mesma música... Pelo menos, os tugas e os caboverdianos do PAIGC... É um privilégio poder ouvir (e dar a ouvir...) a música destes grandes nomes da música de Cabo Verde (que eu aprendi a gostar na Guiné, durante a guerra...)
;
(ii) Ao nosso camarada, membro da Tabanca Grande e da Tabanca de Matosinhos, Jorge Félix, ex-Alf Mil Pil AL III (BA 12, Bissalanca, 1968/70) (*).
No espaço de um ano, este vídeo já teve mais de 3500 visualizações. Parabéns ao Jorge, que eu tive o grato prazer de conhecer pessoalmente na véspera da Páscoa, em Matosinhos, no Restaurante Milho Rei, sede da Tabanca de Matosinhos.... Boa saúde, Jorge! (LG)
1. Mensagem que foi enviada em 30 de Março último ao Ten Cor Matt Hurley, da Força Aérea dos EUA (*):
Meu caro Matt:
Já encaminhei o pedido para o meu camarada Miguel Pessoa, coronel piloto aviador, reformado... Ele terá, por certo, todo o gosto em colaborar no seu projecto... Permita-me uma ou duas perguntas: (i) o Matt é de origem portuguesa, ou descendente de portugueses ? (ii) domina o português escrito... e falado ?; (iii) porquê o seu interesse pela guerra colonial na Guiné e em especial a guerra do ar/air warfare ?
Disponha do nosso blog, inclusive para publicar algum texto que entenda poder disponibilizar, sobre o tema da sua pesquisa, para os antigos "camaradas da Guiné"... Em português ou em inglês.
Best regards, Luis Graça, blogmaster
2. Resposta (em inglês) do nosso leitor, com data de 6 de Abril:
Exmo. Senhor Professor Graça,
Thank you for the reply, and also for the opportunity to write in English. I can read Portuguese much better than I speak or write it.
To answer your other questions, I am not of Portuguese descent; my people are Irish and Italian. However, I have studied subversive war and counter-insurgency for many years. I first became aware of the Portuguese experience in Africa when I was an instructor at the NATO Tactical Leadership Programme, during discussions with FAP pilots there. The case of Guinea is, in my opinion, a very important and illuminating example fo the uses and vulnerabilities of airpower against guerrillas and terrorists.
For more than two years, I have been studying the war in Guinea for my PhD dissertation. Therefore, I was familiar with Miguel Pessoa's name and story before they appeared on your blog. However, I wanted to make contact with him in order to verify his identity to satisfy my examiners.
Overall, I have found your blog to be a very useful source of information about the war. Whenever I use information in my paper, I will of course give the proper credit and thanks to the authors and to you as editor.
Muito obrigado!
- Lt Col Matt Hurley, USAF
3. Tradução de L.G. (c/ uma ajudinha do... Google Traslator, uma preciosa ferramenta para os bloguistas)
Exmo. Senhor Professor Graça,
Obrigado pela sua resposta, e também pela oportunidade que me dá de escrever em Inglês. Leio melhor do que falo ou escrevo o Português.
Respondendo às suas outras perguntas, não sou descendente de portugueses, mas sim de irlandeses e italianos. No entanto, estudei durante muitos anos a guerra subversiva e a contra-subversão. Tive um primeiro contacto com a experiência portuguesa em África quando era instrutor do OTAN Tactical Leadership Programme [Programa de Comando Táctico, da NATO], na sequência de debates com pilotos da FAP - Força Aérea Portuguesa. O caso da Guiné é, em minha opinião, um exemplo muito importante e esclarecedor dos pontos fortes e fracos do uso da força aérea contra guerrilheiros e terroristas.
Durante mais de dois anos, estudei a guerra na Guiné no âmbito da minha tese de dissertação para obtenção do Grau de Doutor. Por essa razão, o nome e a história do Miguel Pessoa eram-me familiares, mesmo antes de ele aparecer no vosso blogue. No entanto, quis contactá-lo a fim de confirmar a sua identidade junto do meu orientador e do meu júri de provas públicas.
Em termos gerais, considero ser o vosso blogue uma fonte de informação muito útil sobre a guerra. No caso de usar informação retirada do blogue, irei obviamente citá-lo e agraceder tanto aos autores como ao editor.
(a) Tenente Coronel Matt Hurley, Força Aérea Norte-Americana
__________
Notas de L.G.
(*) Vd. poste de 12 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2627: Vídeos da Guerra (8): Nha Bolanha (Jorge Félix, ex-Alf Mil Piloto Aviador, 1968/70)
(**) 2 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4127: O mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande (1): 4 anos, um milhão de páginas visitadas... (Luís Graça / Carlos Vinhal)
Guiné 63/74 - P4196: Blogpoesia (39): CCAÇ 557, Missão cumprida na Guiné (José Colaço/Francisco dos Santos)
1. Mensagem de José Colaço (*), ex-Sold de Trms da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65, com data de 13 de Abril de 2009:
Carlos, agora que tanto se fala de poesia, e eu que não sei rimar duas palavras, mas na CCaç 557 temos o ex-camarada de armas Francisco dos Santos, poeta popular, que todos os anos no almoço da Companhia nos presenteia com um poema dele. Lembrei-me de te enviar este. Se achares que merece honras de blogue, publica.
Um ligeiro apanhado da missão cumprida pela CCaç 557 na Guiné
Fomos a 557
Companhia que cumpriu
A história não se repete
Regressamos com muito brio
Foi de Évora que partimos
No ano de sessenta e três
A nossa missão cumprimos
Com altos e baixos... talvez
Chegamos à Guiné-Bissau
Com novo clima a pairar
Em guerra é tudo mau
Tudo isto há que encarar
De Bissau partimos um dia
Para o mato com coragem
Quase ninguém sabia
Que o Como era a paragem
Mal a gente tinha chegado
O pior aconteceu
Com um tiro transviado
Um nosso colega morreu
Onze meses foi a paragem
Foi amargo como o fel
Trabalhamos com coragem
construímos o quartel
Num espaço de labirinto
Havia muitas madeiras
Fizemos o nosso recinto
Só com troncos de palmeiras
O que mais fazia falta
Era a água potável
A Catió ia a malta
Num serviço impecável
No local a sobrevivência
Só por si era uma luta
Havia que ter paciência
Pois a guerra era a disputa
Nas matas desta Guiné
Lutamos bem com genica
Nunca perdemos a fé
Éramos uma grande equipa
Fomos grandes camaradas
Nestas terras promotoras
Mesmo com as morteiradas
E o som das metralhadoras
Mês após mês passava
Num total isolamento
A comida escasseava
Mas não perdíamos o alento
Éramos a família unida
Por isso não digo nomes
Sacrificamos a vida
Que heróis todos nós fomos
Mas veio então a mudança
Bafatá que era a norte
Havia mais esperança
E talvez melhor sorte
Não queríamos muito mais
O tempo passa a correr
Mas o soldado Nabais
No rio viria a morrer
A morte por afogamento
Que já ninguém o previa
Este triste acontecimento
Chocou muito a Companhia
Há muito mais para contar
Em toda esta aventura
Só pensávamos em regressar
Para dar e receber ternura
E isso aconteceu
Em Novembro foi o dia
O passado morreu
Dêmos largas à alegria.
Francisco dos Santos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 19 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4052: Por que é que, no auge da Op Tridente, não se decapitou o PAIGC em Cassacá, em Fevereiro de 1964 ? (José Colaço)
Vd. último poste da série de 6 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4147: Blogpoesia (38): A Criatura e Rambo Guinéu (Manuel Maia)
Carlos, agora que tanto se fala de poesia, e eu que não sei rimar duas palavras, mas na CCaç 557 temos o ex-camarada de armas Francisco dos Santos, poeta popular, que todos os anos no almoço da Companhia nos presenteia com um poema dele. Lembrei-me de te enviar este. Se achares que merece honras de blogue, publica.
Um ligeiro apanhado da missão cumprida pela CCaç 557 na Guiné
Fomos a 557
Companhia que cumpriu
A história não se repete
Regressamos com muito brio
Foi de Évora que partimos
No ano de sessenta e três
A nossa missão cumprimos
Com altos e baixos... talvez
Chegamos à Guiné-Bissau
Com novo clima a pairar
Em guerra é tudo mau
Tudo isto há que encarar
De Bissau partimos um dia
Para o mato com coragem
Quase ninguém sabia
Que o Como era a paragem
Mal a gente tinha chegado
O pior aconteceu
Com um tiro transviado
Um nosso colega morreu
Onze meses foi a paragem
Foi amargo como o fel
Trabalhamos com coragem
construímos o quartel
Num espaço de labirinto
Havia muitas madeiras
Fizemos o nosso recinto
Só com troncos de palmeiras
O que mais fazia falta
Era a água potável
A Catió ia a malta
Num serviço impecável
No local a sobrevivência
Só por si era uma luta
Havia que ter paciência
Pois a guerra era a disputa
Nas matas desta Guiné
Lutamos bem com genica
Nunca perdemos a fé
Éramos uma grande equipa
Fomos grandes camaradas
Nestas terras promotoras
Mesmo com as morteiradas
E o som das metralhadoras
Mês após mês passava
Num total isolamento
A comida escasseava
Mas não perdíamos o alento
Éramos a família unida
Por isso não digo nomes
Sacrificamos a vida
Que heróis todos nós fomos
Mas veio então a mudança
Bafatá que era a norte
Havia mais esperança
E talvez melhor sorte
Não queríamos muito mais
O tempo passa a correr
Mas o soldado Nabais
No rio viria a morrer
A morte por afogamento
Que já ninguém o previa
Este triste acontecimento
Chocou muito a Companhia
Há muito mais para contar
Em toda esta aventura
Só pensávamos em regressar
Para dar e receber ternura
E isso aconteceu
Em Novembro foi o dia
O passado morreu
Dêmos largas à alegria.
Francisco dos Santos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 19 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4052: Por que é que, no auge da Op Tridente, não se decapitou o PAIGC em Cassacá, em Fevereiro de 1964 ? (José Colaço)
Vd. último poste da série de 6 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4147: Blogpoesia (38): A Criatura e Rambo Guinéu (Manuel Maia)
Subscrever:
Mensagens (Atom)