Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > 1970 > Em primeiro plano, os camiões basculantes Magirus Deutz da TECNIL em operação, na construção da estrada do Xime-Bambadinca. Variante que contornava o planalto de Bambadinca, junto à bolanha, a sul, fazendo a ligação ao troço, já alcatroado (e anterior a 1969), Bambadinca-Bafatá... À esquerda, o morro onde se situava o aquartelamento, o posto administrativo, bem como outras instalações civis (capela, escola, CTT)...
Foto de 1969/70, do ex-Fur Mil Op Esp Humberto Reis (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
Foto: © Humberto Reis (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Estrada (alcatroada) Bambadinca - Xime > Chegada ao Xime, em 9 de Março de 1974, da CCAÇ 3491 (Dulombi, 1971/74), para embarque em LDG, caminho de Bissau. A esta companhia pertencia o nosso camarada Luís Dias. O Xime era a porta de entrada em (e de saída de) a zona leste... As estradas de Bafatá- Nova Lamego, Bambadinca –Xime, e Nova Lamego-Piche-Ponte Caium foram obras da TECNIL durante a guerra colonial. No final da guerra, estava também em construção a estrada Jugudul-Bambadinca (em junho de 1974, estavam alcatroados cerca de 25 km)... Não tenho a certeza, mas esta empreitada devia estar também a cargo da TECNIL, a principal empresa de obras públicas da Guiné antes... e depois da independência.
A TECNIL era também um das grandes empresas de obras públicas em Angola, antes da independência... No meu tempo (CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, maio de 1969/março de 1971), o único troço que estava construído, quando cheguei ao leste, era estrada (alcatroada) Bambadinca-Bafatá (desconheço o ano em que foi construída bem como a empresa construtora)... (LG)
Foto: © Luís Dias (2008). Todos os direitos reservados
Guiné-Bissau > Bissau > 1984 > Porto: Projecto da TECNIL, de construção do novo cais...
Foto: © António Rosinha (2006). Todos os direitos reservados.
Angola > CART 3514, Panteras Negras, 1972/74 > Picada de Ninda, Moxico, Lestte de Angola, 1973 > Frente de trabalho da TECNIL...
"Estavamos em meados de setembro do ano de 73, tinha chegado há poucos dias da metrópole onde passei umas curtas férias, o tempo no leste estava bastante ameno de dia e gelado de noite, próprio da estação do cacimbo no planalto dos Bundas, tínhamos rodado do mato para a 'Pousada', na Colina do Nengo, onde nessa altura havia muito serviço de colunas, no apoio e protecção à TECNIL. Em fins de julho uma Berliett da nossa Companhia acionou uma mina A/C no troço em construção, entre os rios Luce e Luati e em agosto no troço do Mucoio um autotanque da TECNIL foi destruído também por uma mina anticarro, o que levou a empresa a pedir segurança matinal às suas viaturas até ao local da obra. Saíamos do Nengo de madrugada, bem agasalhados e enfiados no poncho, percorríamos 40 kms até Gago Coutinho, onde chegávamos uma hora antes do nascer do sol; no regresso escoltávamos o 'comboio' de viaturas civis até à frente de trabalho, já muito para além do rio Luati, na picada do Ninda" (...).
Foto (e legenda): CART 3514, Panteras Negras, Angola, 1972/74 > 7 de fevereiro de 2012 > António Carvalho > Estórias de Angola... (Reproduzido com a devida vénia).
1. Continuação de notas do caderno do António Rosinha (*)...
De: António Rosinha
Assunto: TECNIL (2ª parte): (In)adaptação de uma empresa da velha Guiné colonial para a nova Guiné, independente e comunista.
Esta empresa e seus idosos administradores aguentaram sem declarar falência durante 7 anos. De 74 a 1981.
Era difícil passar de «patrão» a «camarada», de um dia para outro, não era fácil. Os trabalhadores faziam reivindicações perante a empresa, mas estava tudo tão mau, socialmente, que tudo o que pudessem exigir nem tinha significado económico porque ou era mais um quilo de arroz ou um litro de óleo.
Era difícil passar de «patrão» a «camarada», de um dia para outro, não era fácil. Os trabalhadores faziam reivindicações perante a empresa, mas estava tudo tão mau, socialmente, que tudo o que pudessem exigir nem tinha significado económico porque ou era mais um quilo de arroz ou um litro de óleo.
Como não era fácil para certos ministros e o próprio Luís Cabral administrar e sustentar aquela «familiaridade/camaradagem» adquirida, principalmente pelo uso e abuso por parte principalmente dos «camaradas» do Partido. É que o fim de Luís Cabral e seu governo apenas antecedeu uns meses o fim da TECNIL (**).
Pessoalmente considero o desaparecimento de Luís e da TECNIL, o desaparecimento de duas imagens muito fortes de uma fraca portugalidade que vai desaparecendo cada vez mais da Guiné.
Se a Guiné-Bissau foi uma terra em que os povos viviam em 1974 com os seus usos e costumes de há 500 anos, apenas com uma pequena introdução de hábitos cristãos e muçulmanos, de um momento para o outro vieram ateus, comunistas, maoístas, capitalistas, socialista, idealistas, mais cristãos e muçulmanos, com as mais variadas ideias para fazer o que Portugal não fez em 500 anos, «ajudar e ensinar os guineenses».
Se a Guiné-Bissau foi uma terra em que os povos viviam em 1974 com os seus usos e costumes de há 500 anos, apenas com uma pequena introdução de hábitos cristãos e muçulmanos, de um momento para o outro vieram ateus, comunistas, maoístas, capitalistas, socialista, idealistas, mais cristãos e muçulmanos, com as mais variadas ideias para fazer o que Portugal não fez em 500 anos, «ajudar e ensinar os guineenses».
Exceptuando a TECNIL, mais duas ou três pequenas empresas e uns pequenos comerciantes, pouco ficou de decisivo nas mãos de gente da era colonial, após a independência. Ao contrário das ex-colónias inglesas e francesas, em que os velhos cólon continuaram a «ensinar» os seus povos, no caso da Guiné, avançaram as "Nações Unidas" em força. Eu já tinha visto isso no Congo Belga, no tempo de Hammarskjöld [1905-1961, sueco, o segundo secretário-geral das Nações Unidas].
A TECNIL funcionava quase como a empresa oficial das Obras Públicas. Luís Cabral entregou-lhe por concurso público as 3 maiores obras com financiamentos de doadores europeus uns e árabes outros: (i) prolongamento e modernização do aeroporto; (ii) Avenida Bissau-aeroporto (ex-Unidade Guiné-Caboverde); e (iii) Liceu no Bairro da Ajuda, este em sociedade com Soares da Costa.
Podia dizer-se que era o mundo inteiro a ensinar "este povo", como diziam em várias línguas, e a TECNIL, Soares da Costa e e dois ou três ministros a cortar árvores para exportar, a única actividade produtiva, a sério.
Como não sou economista não sei explicar tecnicamente como se leva um empreiteiro à falência. Mas como conheço algumas regras de Obras Públicas que aprendi estes últimos anos na Expo 98 e na Ilha da Madeira nos túneis e viadutos e em trabalhos para a Refer para o Alfa Pendular, posso compreender hoje o que aconteceu ao velho engº Ramiro Sobral (75 anos), em 1980, e à sua velha TECNIL...
Devido à idade, a TECNIL e os seus idosos administradores já não tinham jogo de cintura para uma coisa moderna que antes não existia em obras do Estado Novo: "DERRAPAGENS ORÇAMENTAIS", o que por falta de prática levou muita gente a morrer na praia, deixando-se ultrapassar por gente mais "moderna".
Podia dizer-se que era o mundo inteiro a ensinar "este povo", como diziam em várias línguas, e a TECNIL, Soares da Costa e e dois ou três ministros a cortar árvores para exportar, a única actividade produtiva, a sério.
Como não sou economista não sei explicar tecnicamente como se leva um empreiteiro à falência. Mas como conheço algumas regras de Obras Públicas que aprendi estes últimos anos na Expo 98 e na Ilha da Madeira nos túneis e viadutos e em trabalhos para a Refer para o Alfa Pendular, posso compreender hoje o que aconteceu ao velho engº Ramiro Sobral (75 anos), em 1980, e à sua velha TECNIL...
Devido à idade, a TECNIL e os seus idosos administradores já não tinham jogo de cintura para uma coisa moderna que antes não existia em obras do Estado Novo: "DERRAPAGENS ORÇAMENTAIS", o que por falta de prática levou muita gente a morrer na praia, deixando-se ultrapassar por gente mais "moderna".
Mas porque Luís Cabral lhe entregou, à TECNIL, um tal volume de trabalhos?
Como já fui encontrar tudo muito complicado em termos de atrasos de obra, falta de equipamentos, as facturas batiam no Banco e nas Finanças sempre "com atraso", ou seja, "se tens vindo ontem tínhamos dinheiro, mas hoje, patacão ká tem".
Sei que uma das principais razões de o governo entregar tanto trabalho à TECNIL, foi a confiança que havia na seriedade das pessoas, mas principalmente porque as outras empresas concorrentes, francesas e portuguesas, exigiam toda a facturação em DÓLAR, nada ou quase nada em PESOS.
A falta de previsão do futuro dos velhos senhores/camaradas da TECNIL fê-los esquecer que a rotina colonial sem inflação, as compras de equipamentos em escudos/pesos e o combustível era ir à bomba, ia acabar tudo na Pátria de Cabral.
E deixando-nos de ingenuidades, aquilo que os guineenses chamam «súcu di bass», corrupção, começou a fiar mais fino no que toca a grandes empreitadas. Para encher a "barriga aos barrigudos", em democracia só com grandes DERRAPAGENS, o que no tempo da ditadura de Salazar era tudo pró pequenino, passou tudo a ser à grande e à francesa, o que deixou a TECNIL completamente ultrapassada. (Sei o que era corrupção antigamente em Angola, soube depois 5 anos no Brasil, soube depois na Guiné, mas bom mesmo foi no nosso portugalinho, principalmente na Madeira e na Expo 98, o dinheiro via-se deslizar, até posso promover visitas guiadas por onde escorreu algum).
É que cá em Portugal a TECNIL ainda fez umas tentativas, mas com a mesma falta de dinâmica democrática que sobrava aos novos empreiteiros, o que também ajudou ao afundanço da empresa.
Sei que uma das principais razões de o governo entregar tanto trabalho à TECNIL, foi a confiança que havia na seriedade das pessoas, mas principalmente porque as outras empresas concorrentes, francesas e portuguesas, exigiam toda a facturação em DÓLAR, nada ou quase nada em PESOS.
A falta de previsão do futuro dos velhos senhores/camaradas da TECNIL fê-los esquecer que a rotina colonial sem inflação, as compras de equipamentos em escudos/pesos e o combustível era ir à bomba, ia acabar tudo na Pátria de Cabral.
E deixando-nos de ingenuidades, aquilo que os guineenses chamam «súcu di bass», corrupção, começou a fiar mais fino no que toca a grandes empreitadas. Para encher a "barriga aos barrigudos", em democracia só com grandes DERRAPAGENS, o que no tempo da ditadura de Salazar era tudo pró pequenino, passou tudo a ser à grande e à francesa, o que deixou a TECNIL completamente ultrapassada. (Sei o que era corrupção antigamente em Angola, soube depois 5 anos no Brasil, soube depois na Guiné, mas bom mesmo foi no nosso portugalinho, principalmente na Madeira e na Expo 98, o dinheiro via-se deslizar, até posso promover visitas guiadas por onde escorreu algum).
É que cá em Portugal a TECNIL ainda fez umas tentativas, mas com a mesma falta de dinâmica democrática que sobrava aos novos empreiteiros, o que também ajudou ao afundanço da empresa.
Como faço uma ligação ao fim da TECNIL e de Luís Cabral, tenho a dizer que, à parte a política, houve muito incómodo para a cidade e cidadãos de Bissau, com a construção da Av Bissau-aeroporto, o que acumulou a outras coisas o descontentamento das pessoas.
É que, além de já não haver regularmente nem água nem luz, na cidade, as obras obrigavam ao derrube de casas, sem explicar devidamente às pessoas, ou até indemnizar previamente os donos, a obra parava dias e dias por falta de combustível, os jovens que devoravam toneladas de livros nos bancos e à luz dos candeeiros do jardim do Alto Crim, este simplesmente foi destruído com muita pena no rosto de toda a gente, até da minha parte achei um crime. Já falei nessa «desgraça» noutra altura. Passados muitos anos está lá a Assembleia Popular.
As obras chegavam a parar por falta de alimentos essenciais à venda para os operários e suas famílias se alimentarem.
As obras chegavam a parar por falta de alimentos essenciais à venda para os operários e suas famílias se alimentarem.
Tudo acumulado, sem dar explicações ao povo, nem explicações políticas nem técnicas nem sociais, aproximava-se o fim do ano de 1980 e em 14 de Novembro Luís Cabral é derrubado.
Luís Graça, como tive um episódio num trabalho pessoal para o Luís Cabral, em que entrou o velhote Ramiro Sobral, e este previu para mim o fim de Luís Cabral, queria guardar para uma terceira e última parte o fim propriamente dito da própria TECNI. Em que houve episódios desagradáveis, em que o último director de Obra era um Engenheiro Civil saído da engenharia do exército, que havia servido como capitão na engenharia na Guiné.
Um abraço,
António Rosinha
_______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 29 de Novembro de 2006 >Guiné 63/74 - P1327: Tabanca Grande (3): António Rosinha, ex-Fur Mi em Angola, em 1961; topógrafo da TECNIL, em Bissau, em 1979
(...) Texto do António Rosinha, com data de 6 de Novembro de 2006, que, depois de algum tempo para ponderação, acabou por aceitar o meu convite, bem como o do Vitor Junqueira e do Amílcar Mendes, para se juntar à nossa tertúlia de Amigos & Camaradas da Guiné:
Estimados L. Graça, V. Junqueira e A. Mendes:
Vou decidir aceitar o vosso convite. Faço-o, mas sem jamais me considerar no mesmo patamar de qualquer outro tertuliano, que, digamos, é do Quadro... Considerar-me-ei um tertuliano do Dia Seguinte. Mas, ao aceitar, pretendo pagar as cotas por inteiro, isto é, assumir as responsabilidades de tertuliano que me possam ser imputadas.
Penso que o blogue está para se expandir imenso, e serei o primeiro a dar espaço a outros do quadro. Envio umas fotos da minha guerra que, a par da vida civil que passei em Angola, foi simplesmente um tempo inesquecível de vivência de trabalho e, tirando o ano de 1961, eu posso dizer de paz.
Só vim compreender essa paz quando em 1979 faço um contrato com a TECNIL, e vi que os IN se tinham concentrado à volta da Guiné, e era a maneira mais económica de atingir os objectivos. Envio umas fotos da minha actividade como topógrafo (lembro que não era muito aconselhável nesse tempo andar de máquina a tiracolo): era porto, aeroporto, junto a quartéis, poucos lugares me passaram ao lado, em trabalho. Logo que encontre, vou mandar foto pessoal daquele tempo, nem que seja dos passaportes. As fotos da Guiné não abundam. Termino com um abraço. (...).
(**) Vd. poste anterior da série > 3 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9555: Caderno de notas de um Mais Velho (19): TECNIL, importante empresa de obras públicas, que desaparece do mapa (Parte I)