domingo, 15 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12043: Agenda cultural (281): Exposição "A Última Fronteira – Lisboa em tempos de guerra". Lisboa, Terreiro do Paço, de 15/7 a 12/12/2013, todos os dias, das 10h00 às 20h00. A não perder.


Lisboa > Sentinela da Legião Portuguesa de serviço no Terreiro do Paço. 1942. ANTT - Arquivo Nacional Torre do Tombo.

Se em 1940 a vida corria tranquila em Lisboa, em 1941 tudo mudou. Começava a falar-se de uma iminente invasão hispano-alemã a Portugal e os exercícios de defesa civil, então confiados à Legião Portuguesa, multiplicavam-se. Protegiam-se os monumentos com tapumes e sacos de areia. Debaixo destas proteções, “desapareceram”, entre outros, o portal da Sé, as arcadas do Terreiro do Paço e as estátuas da cidade. Fonte:
Agênda Cultural de Lisboa ( Reproduzido com a devida vénia).

EXPOSIÇÃO "A ÚLTIMA FRONTEIRA – LISBOA EM TEMPOS DE GUERRA"

Exposição dedicada aos anos 40, época em que Lisboa se tornou um local de esperança, a última fronteira para a liberdade para milhões de pessoas.

Mostra composta por material proveniente de diversos acervos onde se incluem fotografias, documentos, trajes e objetos de decoração, reproduções de cartazes publicitários, mobiliário comercial, doméstico e urbano, maquinaria de comunicação, acessórios e filmes que ilustram o papel da cidade no tempo da Segunda Guerra Mundial.

O ponto de partida para a exposição é o livro Lisboa, uma Cidade em Tempos de Guerra, de Margarida Magalhães Ramalho.

19 julho a 15 dezembro | 2ªf.-dom | 10h00-20h00

Entrada | adultos 3€ | estudantes e reformados 2€ | família (4pax) 8€ | desempregados grátis

Local: Torreão Poente do Terreiro do Paço

Fonte:: Sítio da Câmara Municipal de Lisboa

______________

Nota do editor:

Último poste da série > 4 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12008: Agenda cultural (280): As nossas camaradas Enfermeiras Paraquedistas, Giselda Pessoa, Maria Arminda e Rosa Serra, vão estar amanhã, dia 5, na SIC, no programa Boa Tarde, a partir das 15h30

Guiné 63/74 - P12042: Convívios (531): 5º Encontro de Gerações de Lanceiros Policia Militar/Policia do Exército, Regimento de Lanceiros nº 2 – 26 de Outubro de 2013 (Nuno Esteves)

1. Recebemos do nosso Amigo e visitante, Nuno Esteves, ex-Soldado PE do 1º Turno 94, o pedido de divulgação do seguinte programa festivo. 


6.º Encontro de Gerações de Lanceiros 
Polícia Militar (PM) / Polícia do Exército (PE) 


Caros Camaradas, a exemplo dos Encontros que temos realizado, venho solicitar mais uma vez, a vossa colaboração no sentido de ser divulgado na vossa Tabanca Grande, mais um Encontro de Lanceiros PM/PE a realizar-se desta vez na Casa Mãe: o Regimento de Lanceiros nº 2. 

O programa do Evento será composto por: 
Parte Cultural (organização da Associação de Lanceiros)
Visita opcional ao Mosteiro dos Jerónimos 
09h45 
Concentração em frente ao Mosteiro dos Jerónimos
(Para quem optar fazer a visita)
10h00 às 12h30
Visita guiada com a colaboração da srª Lina Oliveira 
Preços das entradas no Mosteiro dos Jerónimos.
Bilhete Individual: 7 €
Bilhete especial:50%
Idade igual/ superior a 65 anos (mediante comprovativo) 
portadores de deficiência 
Bilhete de Família
50% de desconto para os filhos menores (15-18 anos) desde que 
acompanhados por um dos pais.
Cartão Jovem: 60%

Programa no Regimento
11h00-11h30 
Concentração junto à Porta de Armas do Regimento. 
Missa pelos camaradas falecidos
(carece de confirmação)
Homenagem aos camaradas falecidos 
(deposição de coroa de flores no Monumento aos Mortos)
Visita ao Núcleo Museológico/Regimento
13h00-13h30
Inicio do almoço convivio no Refeitório das Legendas 

Ementa do Almoço
Aperitivos
Martini ou Favaios,sumo.
Entradas
Pastéis de Bacalhau,Croquetes,Rissóis.
Bebidas
Vinho Branco e Tinto,Sumo de laranja,Água.
Sopa
Caldo Verde
Prato
Bifinhos com cogumelos e Arroz.
Dieta (a)
Pescada cozida ou Bife de Perú grelhado com arroz.
Sobremesas
Pudim de ovos caseiro ou Arroz Doce
Fruta da época
café.
Bolo alusivo ao Evento.

(a) Quem desejar dieta,terá de informar a Organização num prazo máximo de 20 dias antes da data do Encontro.

Preço
Por pessoa-22 € 
Crianças até aos 6 anos-Grátis
Crianças dos 6 aos 12 anos-5 €

Contactos para confirmação de presença e nº de acompanhantes (o Encontro é extensivo a familiares)

Contactos
Luis Páscoa
Nuno Esteves 

Prazo máximo de confirmação de presença (*)
30 de Setembro de 2013

(*) A presença só será efectivamente confirmada após transferência bancária de metade do valor total para o NIB 0036.0310.99100010381.29 do Montepio Geral,solicita-se que guardem o talão multibanco para apresentarem no dia do Encontro.O restante valor em falta, terá de ser efectuado no dia do Encontro.O participante,deverá indicar o nº de pessoas que o acompanham e no caso de crianças,indicar a idade das mesmas.

Um forte abraço para toda a Tabanca. 

Com os melhores cumprimentos e com um forte abraço Lanceiro para todos.
Nuno Esteves
ex-Soldado PE
___________
Nota de MR: 

Vd. último poste da série em:


Guiné 63/74 - P12041: Convívios (530): Almoço convívio do pessoal que esteve no HM241 entre os anos 1967 e 1972, Viseu - 5 de Outubro de 2013 (Manuel Freitas)

1. O nosso Camarada Manuel Freitas, que foi 1º Cabo Escriturário no HM 241 - Bissau - 1968/70, solicita-nos a divulgação do próximo convívio do Almoço/Convívio do pessoal que esteve no HM241 entre os anos 1967 e 1972 

Almoço convívio do pessoal que esteve no HM241 entre os anos 1967 e 1972

5 de Outubro de 2013 - Viseu

Caro Luís Graça,

Estou, a exemplo dos anos anteriores, a solicitar-te o favor de publicares no nosso blogue o anúncio, do almoço/convívio para ex-militares que estiveram no HM 241, durante os anos de 1967 a 1972, para o dia 5 de Outubro de 2013, em Viseu, concentração às 10h30 na entrada do Palácio do Gelo seguindo-se almoço no Restaurante Perdigueiro.


Contactos: 
manuel.freitas@equicontas.com 
ou 964498832 - telemóvel. 

Agradeço-te e envio-te um grande abraço, 
Manuel Freitas 
1º Cabo Escriturário do HM 241 
____________ 
Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 




Guiné 63/74 - P12040: Manuscrito(s) (Luís Graça) (10): O dever de servir a Pátria... Éramos todos iguais, mas uns mais do que outros

1. Estimado alfero Cabral:

A octogésima estória cabraliana (*) merece ser saudada, de maneira "discreta", como o alfero gosta, mas também com regozijo da parte dos inúmeros fãs da série, onde se inclui este seu "discreto"  leitor. 

O senhor alfero sabe quanto discretamente o admiro e anseio o lançamento do seu livro para poder ser um dos 10 primeiros, pelo menos, a ter o privilégio de uma dedicatória autografada.

Levanta o meu alfero (que eu tive a honra de conhecer em Bambadinca, nos idos tempos de 1969/71), duas questões interessantes para a história do nosso tempo, em geral, e da guerra colonial (ou do ultramar, como preferir), em particular:

(i) era possível motivar alguns militares da tropa, como o 1º sargento Candeias ou até alguns cadetes de Mafra, com o simples slogan propagandístico "há mulatas em Luanda";

(ii) naquele tempo, de impoluto patriotismo (coisa que os jovens de hoje não sabem muito bem o que é), também funcionava a "valente cunha de última hora", a avaliar pelo inesperado desfecho da situação do cadete Cabral: em vez do almejado tacho no SAM - Secretariado de Administração Militar, com direito a ar condicionado ou, no mínimo, de ventoínho de muitas rotações e garrafeira de uísque velho, puseram-no como apontador de artilharia em pleno coração da Guiné; em vez da ilha de Luanda e das mulatas angolanas, enfim mandaram-no para Fá e para as mandingas (e balantas) da Guiné...

Este último tema (o do "factor C") interessa-me particularmente, já que não tem sido devidamente abordado no nosso blogue, como deveria e eu desejaria.. 

Afinal, a lei era igual para todos ou havia, como hoje, uns mais iguais do que outros ?... 

Em Alcácer Quibir parece que morreu (ou ficou prisioneira dos moiros) a fina flor na Nação... Mas na Guiné a sociodemografia da guerra e da morte foi muito mais nivelada por baixo... Houve muito boa gente que se safou  de ir parar ao chamado Vietname português...

Ainda ontem um amigo e conterrâneo meu, mais novo, me contava como um  primo seu, mais velho, da minha geração, ficou livre da tropa (e portanto de ir parar à Guiné ou a outros sítios indesejáveis do vasto império onde havia guerra) mediante "cunha valente de última hora"...

A avó (de ambos) pagou 200 contos (o que na época dava para comprar um apartamento) para livrar o querido netinho da servidão militar... O patriota impoluto que conseguiu livrar o mancebo era nem mais nem menos do que uma das figuras gradas do regime de então, médico, militar,  de muitos galões, poderoso e influente... que esteve à frente de respeitáveis instituições como o Hospital Militar Principal... 

A senhora era vizinha da tal figura grada da Nação, morava ali para os lados da Estrela, e adorava aquele netinho (filho único da sua querida filha, viúva) e tinha bagalhoça. (Pessoa de resto que eu bem conheci e a quem fiquei a dever favores, diga-se de passagem).

 O menino pôde fazer a sua carreira, académica e depois profissional,  tranquilamente, tendo-se em licenciado em economia e arranjado um bom emprego numa instituição bancária, enquanto os jovens da sua geração andaram a matar e a morrer em Angola, Guiné, Moçambique...

Claro que, também aqui, nesta história nem todos os netos são ou eram iguais...Um deles, meu amigo, e irmão do meu informante, foi parar com os costados à Guiné, tal como eu... Enfim, já naquele tempo havia netos ricos e netos pobres... E, claro, médicos militares, figuras da mais fina flor da Nação, com diferentes leituras do valor do "patriotismo impoluto"...

Ouvindo histórias aqui e acolá, vamos juntando as pontas e reconstituíndo o "puzzle": 

(i)  o sistema estava longe de tratar todos por igual (na escola, na tropa, na vida civil...); 

(ii) a classe social também contava (e se contava!); 

(iii) o "capital de relações sociais" também contava muito (o pessoal do "downstairs" que servia o pessoal do "upstairs", também tiravam partido dessa condião e, muitas das v vezes, eram as pessoas certas a quem o pobre necessitado devia meter um cunha); 

(iv) os resultados dos testes psicotécnicos, por mais válidos e fiáveis que fossem (segundo as garantias dos psicólogos militares) podiam ser, nalguns casos,  desvirtuados na secretaria...

Por outro lado, a sociedade portuguesa é marcada por séculos de relações clientelares... E o poder manifestava-se, também,  através do favor (e da sua simbologia): "com favor não te conhecerás, sem ele não te conhecerão"... 

Por outro lado, essas relações de poder eram assimétricas: como se diz na nossa terra, "dou um presunto a quem me der um porco"... E, em boa verdade, quem é que não estaria disposto, no nosso tempo, a dar 200 notas de conto, se as tivesse, só para se safar do alegado inferno da Guiné ? (**)
________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12035: Estórias cabralianas (80): As mulatas de Luanda (Jorge Cabral)

(**) Último poste da série > 19 de agosto de 2013 > Guiné 63/74 - P11955: Manuscrito(s) (Luís Graça) (9): Em honra da Lourinhã e da(s) sua(s) banda(s) filarmónica(s)

Guiné 63/74 - P12039: Parabéns a você (626): Ribeiro Agostinho, ex-Soldado da CCS/QG/CTIG (Guiné, 1968/70)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 10 de Setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12022: Parabéns a você (625): Rui Baptista, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3489 (Guiné, 1971/74) e Tony Grilo, ex-Soldado Apontador Obus do BAC-1 (Guiné, 1966/68)

sábado, 14 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12038: Blogpoesia (354): Por cada bombeiro que morre... e outros poemas de setembro (J. L. Mendes Gomes)

Por cada bombeiro que morre...


Choro a vida de cada bombeiro,
Que, cada ano,
É sacrificada aos incêndios malvados
De miseráveis mãos que os ateiam,
A soldo, de horrendos criminosos...
Devem ser rechaçados, sem clemência!...

Choro as lágrimas dolorosas
Dos seus pais e dos seus filhos,
Com seus irmãos,
E da gente toda da aldeia
Que carinhosamente os viu nascer!...

Choro...choro...até morrer...
Por esta prova de amor,
Gratuita, mesmo divina,
De cada bombeiro que morre,
Nosso irmão!...

Berlim, 6 de Setembro de 2013
9h30m

Somos como somos...

O que somos e temos cá dentro a fervilhar,
Acaba por vir ao de cima
E tudo comandar,
Nas sendas da nossa vida.

Cada um não é um fruto do acaso.
Tem, para trás,
Uma árvore, muito antiga,
Com raízes, de tão fundas,
Se perdem nos negrumes,
Como segredos enigmáticos
Que correm nas nossas veias...

Se enlaçam, se engrenham uns aos outros,
Segundo a lei da sorte,
Que o destino nos ofereceu,
E se enriquecem com a arte
Que nos desabrocha espontânea,
À luz e força
Da nossa mente
E nossa vontade,
Como forja que se acende,
À chuva e vento,
Do ambiente que nos rodeia...

É assim que somos.
Uma mistura livre
E determinada,
Entre a herança que herdamos
E o que alcança
Nosso corpo e nossa alma...

Ouvindo Hélène Grimud, em Jean S.Bach

Berlim, 11 de Setembro de 2013
7h14m

Regresso a casa...

Aqui em Mulhouse,
Há uma cortina de plátanos verde-amarelados,
Frente à minha janela.
Grossos braços levantados,
Parecem não acordar.
Nada bole.

Só a brancura de dois cisnes,
Suavemente deslizantes
Sobre o lago,
Fazem ondinhas,
À flor da água,
Que se espraiam
Como fumo.
O céu de cinza tão opaco
Nada escreve...
Quase toca nos meus olhos,
A despertar.

Está na hora de fazer as malas
E ir para a estrada...
Nova etapa,
Rumo a casa,
Que me espera,
Tão distante,
Depois de França,
Toda a Ibéria,
Com saudade,
Junto ao mar.

Mulhouse, 14 de Setembro de 2013

Joaquim Luís Mendes Gomes

[ex-alf mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau,  1964/66; jurista, reformado]

______________

Nota do editor:
Último poste da série > 31 de agosto de 2013 > Guiné 63/74 - P11996: Blogpoesia (353): Pôr-do-sol (Juvenal Amado)

Guiné 63/74 - P12037: Os nossos médicos (68): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (4): Bacar




1. Enviada pelo nosso camarada Mário Vasconcelos (ex-Alf Mil TRMS do BCAÇ 3872), a quem agradecemos desde já, chegou até nós mais uma memória do ex-Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho [foto actual à esquerda] que esteve integrado nos BCAÇ 3872 e 4518 (Galomaro, 1973/74), esta dedicada ao seu "braço direito", Bacar Djaló.


____________

Nota do editor

(*) Vd. poste de 7 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11811: Os nossos médicos (60): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (3): Binta e Jamba (Mário Vasconcelos / Rui Vieira Coelho)

Último poste da série de 11 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11930: Os nossos médicos (67): Maximino [José Vaz da] Cunha, natural de Chaves, ex-alf mil médico, BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto) e HM 241 (Bissau, 1968/70)

Guiné 63/74 - P12036: Bom ou mau tempo na bolanha (31): O computador na guerra (Tony Borié)

Trigésimo primeiro episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



O lápis, afiado à mão, que se consumia até se conseguir segurar nos dedos, e a esferográfica “Bic”, eram os utensílios de trabalho mais usados pelo Cifra nas suas tarefas de cifrar e decifrar mensagens. Escrevia, escrevia, apagava, apagava, riscava por cima, rasgava o papel, ia buscar o papel de novo ao caixote do lixo para rectificar determinada palavra que lhe passou, e depois não fazia sentido no texto. Também lá havia uma caneta de madeira com um aparo, e um frasco com tinta, mas todos ignoravam estes objectos, pois às vezes eram páginas e páginas, com resumo de operações, onde era mencionado o nome dos feridos e mortos, e às vezes havia mesmo “desculpas esfarrapadas” para justificar o sucedido, mas algumas mencionavam secamente, morreu em combate, com duas balas, uma na região do coração e outra mais abaixo no estômago, ou, a parte do seu corpo, a partir do peito para cima ficou desfeita, irreconhecível.

O Cifra escrevia isto tudo e rectificava para ver se estava enganado, portanto depois de ler estes textos duas ou três vezes, ficava-lhe na memória por algum tempo, e como era um razoável militar, mas um fraco, mesmo fraco guerreiro, e não tinha lá muita coragem, isto tudo ainda o atormentava mais.

Certa vez acabaram-se os lápis por algum tempo, era tudo feito a esferográfica, era só riscos em cima das palavras, algumas mensagens iam com o teor do assunto trocado, o que em alguns casos era perigoso, pois era a vida dos militares que estava em jogo, se uma ordem fosse compreendida fora do seu verdadeiro contexto podia matar pessoas.

Às vezes o Cifra pensava que estava numa guerra, onde o lápis e a esferográfica eram tão ou mais importantes que a “minha querida G-3”, como dizia o furriel miliciano, que andava sempre a fumar um cigarro feito à mão.

Mas agora, esqueçamos a guerra e perdoem lá, de vir a foto de uma criança e de um casal de noivos, que não estão de modo nenhum ligados aos acontecimentos que o Cifra e os seus amigos, antigos combatentes viveram em cenário de guerra, e vamos só fazer a comparação, sem o Cifra ser cifra, e ver como devia ser mais fácil todo esse conjunto de processos de cifra e escrita, com os COMPUTADORES, que a nova geração não larga, e já não pode viver sem eles!

Adeus, lápis e esferográfica “Bic”, a continuar assim ninguém mais sabe, desenhar as letras!

Tony Borie, 2011

____________

Nota do editor

Último poste da série de 3 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12005: Bom ou mau tempo na bolanha (30): O "Zé Quina" que já foi o "Marafado" (Toni Borié)

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12035: Estórias cabralianas (80): As mulatas de Luanda (Jorge Cabral)



Mafra  > Sobreiro > 1968 >  O cadete Cabral, discursando no jantar comemorativo do fim da recruta, na EPI.

Fotos (e legenda): © Jorge Cabral (2013). Todos os direitos reservados

1. Mais uma estória cabraliana, que nos chega pela amável e  caixa de correio da Anabela Martins, com data de hoje à tarde ("Encarrega-me o senhor Prof. Jorge Cabral de enviar o anexo. Com os melhores cumprimentos"):


1. Estórias cabralianas > As Mulatas de Luanda

por Jorge Cabral [ex-comandante do Pel Caç Nat 63, Bambadinca, Fá Mandinga, Missirá, 1969/71]


Numa noite, no início de Maio de 1968, apareceu-me irritado o meu amigo Filipe. Ia para a tropa.
– Tens a certeza Filipe? Olha vamos passar por lá, pela Junta de Freguesia. (Onde à porta afixavam as listas).

E fomos. Corri os olhos pelo edital e era verdade. Lá constava, Filipe Narciso Gonçalves da Silva. Só que, um pouco mais abaixo, encontrei o meu nome, Jorge Pedro de Almeida Cabral. Devia ser engano, um erro, eu tinha direito a adiamento. Que o Filipe fosse, não era para admirar. De igual idade e entrados ao mesmo tempo na Faculdade, ele não passara do primeiro ano, enquanto eu contava acabar o curso no ano seguinte.
–  Vamos os dois. Sabes que não discuto o destino.
 – Eu não vou –  gritou-me ele. (E não foi...).

E.P.I, Mafra, 15 de Junho, era o que estava escrito. Porque me teriam chamado? Política?

Era do contra mas discreto, tal como continuei a ser toda a vida. Aliás, há quem diga que o sou em demasia. Agora até as minhas doenças são discretas. Não há ecografia que não acuse... tudo, mas discreto (...discreta litíase, discreto enfisema...).

Porém, precisava saber a razão do chamamento.

Assim, dois dias depois, desloquei-me ao Distrito de Recrutamento. Recebeu-me um Primeiro Sargento, Candeias de seu nome. Expostas as razões e documentos, o militar consultou as normas e declarou:
– Tem razão. Mas,  se não vai agora, vai para o ano. Eu acabei de chegar de Angola, de Luanda, que cidade! As mulatas...

E durante uma hora, falou-me das mulatas.
– Mulheres assim não encontramos cá! E você é capaz de ser colocado numa secretaria em Luanda. Mas faça um requerimento. Não demore é muito.

Saí animado. Com a hipótese de não ir para a tropa? Não, com as mulatas de Luanda...

Esqueci o requerimento. Qual tropa, qual quê! Ia era fazer uma espécie de estágio. E depois, depois... as mulatas de Luanda. Chegado a Mafra, logo na primeira saída no café em frente do Convento, apresentaram-me Nasciolinda, a filha do escrivão. Então, não é que era mulata! Bem, não era de Luanda... mas representava um presságio do que me estava destinado. E as coisas até corriam bem com a Narciolinda, se eu não lhe tivesse escrito um poema, no qual jogava com as palavras, dizendo que a queria ver na Tapada, mas destapada...Não gostou. Paciência... Continuei vida fora a brincar com as palavras e a inventar trocadilhos, o que me ocasionou inúmeros dissabores.

A Recruta correu bem. Ágil e resistente, não senti qualquer dificuldade. Claro que,  na carreira de tiro, fui um desastre. Nem uma vez acertei no alvo. Estranho, porque nas barraquinhas do Parque Mayer, fui sempre o melhor...

Mafra chegou ao fim. O pelotão reuniu-se num jantar no Sobreiro. Discursei. No regresso ao Quartel, o Tenente Comandante, disse-me:
–  O Cabral vai para o Lumiar, Secretariado.

Na manhã do dia seguinte em formatura, distribuiram as respectivas guias de marcha. A minha dizia:
– E.P.A. Vendas Novas.

Ainda pensei que fosse secretariado de artilharia...mas não, era mesmo atirador.
– Então, meu Tenente ?  – perguntei.
– Devo ter visto mal  – respondeu-me.

Mais uma vez, não discuti o destino.

Fiquei a ganhar. Se fosse um ano depois, o mais certo era ter sido Capitão, como quase todos os meus colegas. Não imagino, nem ninguém consegue imaginar, o que seria uma Companhia Cabraliana...Se tivesse ído para Secretariado, atrasaria o expediente, perderia os papeis e não me teria sido possível, organizar, como fiz em Missirá, um original arquivo debaixo da cama, partilhado por insetos onde as garrafas vazias se misturavam com mensagens secretas...

Mas,  afinal, que teria acontecido para me terem reclassificado de madrugada? Perigoso subversivo? Operacional insubstituível?

Nada disso. Apenas uma valente cunha de última hora. Eu ganhei. O da cunha também Perderam as mulatas de Luanda.

Coitadas...

Jorge Cabral

PS – Anexo foto do tal jantar de fim da recruta. Cadete Cabral discursando.
____________

Nota do editor:

Último poste da série > 17 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11720: Estórias cabralianas (79): O Capitão-Tenente dos Submarinos (Jorge Cabral)

(...) Qual Guiné? São tantas. Cada um cria a sua ou inventa... E quem diz Guiné, diz Guerra. Por mim conheço muitas... Mas como esta, que mora no Beco do Cotovelo, à beira da Mouraria, não deve haver mais nenhuma. É na tasca da Conceição, onde às vezes abanco com três ex-combatentes da Guiné. Todos eles lá estiveram, em lugares e tempos diferentes e todos davam pelo nome de Mouraria. (...)

Guiné 63/74 - P12034: Os nossos seres, saberes e lazeres (56): De comboio, até ao Pocinho, e visita ao Museu do Côa, com os grã-tabanqueiros Margarida e Joaquim Peixoto (Luís Graça / Alice Carneiro)


Marco de Canaveses, Paredes de Viadores, Candoz, Tabanca de Candoz > 3 de setembro de 2013 > Nascer do sol, do lado do concelho de Baião, em frente. O rio Douro corre ao fundo vale, do lado direito. Serra de Montemuro (e Cinfães, não visível), também do lado direito,



Baião > Mosteirô > Linha do Douro > Estação de Mosteirô > 3 de setembro de 2013 > É aqui apanhamos comboio para o Pocinho, nós, os da tabanca de Candoz (eu, a Alice e os meus cunhados Gusto e Nitas), que fica a 10/15 minutos, de carro, da estação de Mosteirô. Aguardamos aqui os nossos amigos Laura, do Porto, e o casal Peixoto, Joaquim e Margarida, de Penafiel.


Linha do Douro, a caminho do Pocinho > 3 de setembro de 2013 > Os "novos" comboios da REFER, comprados aos espanhois em segunda mão, num negócio discutível... Têm ar condicionado, as janelas não se podem abrir, os vidros andam sujos, para desespero dos amantes da fotografia.... Cartão vermelho para a CP.





Linha do Douro, a caminho do Pocinho > 3 de setembro  de 2013 > Alice e Marharida, em primeiro plano.


Linha do Douro, a caminho do Pocinho > 3 de setembro  de 2013 > O "Doruo Azul" navegando no Rio Douro, paralelo ao comboio.


Linha do Douro, a caminho do Pocinho > 3 de setembro  de 2013 > Paragem no Tua. Em primeiro plano, o Joaquim Peixoto.



Linha do Douro, a caminho do Pocinho > 3 de setembro  de 2013 > Um trecho fabuloso do Rio Douro...  A seguir ao Cachão da Valeira, não posso precisar onde.


Vila Nova de Foz Coa > Pocinho > 3 de setembro de 2013 > A empresa "Douro Total" leva-nos, de jipe (9 lugares), ao museu de Foz Coa.



Vila Nova de Foz Coa > Restaurante do Museu do Côa >  3 de setembro de 2013 > Almoço: excelente menu, excelente carta de vinhos, serviço profissional... O menu turístico são 11 euros... Mais garrafas de vinho "Tons de Duorum Doc Douro Tinto 2011" (magnífico!), pagamos menos de 15 euros cada um... Vista soberba sobre o rio e as suas margens... Durante a refeição, o nome de alguns camaradas da Guiné vieram à baila, por várias razões: o Zé Manel Lopes, produtor de vinhos Douro Doc; o João Crisóstomo, que ajudou, com a sua campanha internacional, a salvar as gravuras de Foa Coa mas também toda esta fantástica região, incluindo a famosa Quinta da Erva Moira (onde já foi recebido principescamente, segundo ele próprio me contou)...


Vila Nova de Foz Coa > Museu  do Côa > 3 de setembro de 2013 >  Da direita para a esquerda, Laura Fonseca, Margarida Peixota e Ana Soares (Nitas).


Vila Nova de Foz Coa >  Museu  do Côa > 3 de setembro de 2013 > Alguns dos conteúdos (1)


Vila Nova de Foz Coa > Museu  do Côa  > 3 de setembro de 2013 > Alguns dos conteúdos (2)


Vila Nova de Foz Coa > Pocinho > 3 de setembro de 2013 > Alguns dos conteúdos (3)


Vila Nova de Foz Coa > Museu  do Côa  > 3 de setembro de 2013 > Alguns dos conteúdos (4)


Vila Nova de Foz Coa > Museu  do Côa  3 de setembro de 2013 > Saída exterior do edifício (que é da autoria de jovens arquitetos da escola do Porto, Tiago Pimentel e Camilo Rebelo). Regresso a casa no comboio das 17 e picos... 

É um dos passeios mais bonitos e emocionantes (e mais baratos) que o pobre do tuga pode ainda hoje fazer na sua terra (que, para muitos, está por descobrir)... É a 3ª vez que vou ao Pocinho, de comboio... Mas o plano original era ir de barco (da empresa Douro Total) até Barca de Alva. Estvámos  a pensar em convidar vários casais. Uma avaria de última hora, no braco (que leva até 16 pessoas),  estragou-nos os planos. Fica para a próxima. A solução de recurso também não foi pior, na opinião dos meus amigos e companheiros de viagem. Todavia, a Alice achou, desta vez,  o Douro "mais descuidado"... Há muita gente a mandar ou a querer mandar. Ou se calhar há aqui um problema de autoridade... E as populações locais, por seu turno,  pouco ou nada ganham com os cruzeiros do Douro Azul & quejandos... Por favor, tugas, não matem a galinha dos ovos de ouro, como fizeram com o Algarve e se preparam para fazer com a costa vicentina alentejana... Neste país, parece que  não se sabe amar sem violar,,, (LG).

Fotos (e legendas): © Luís Graça  (2013). Todos os direitos reservados

1. Mensagem dos nossos tabanqueiros Margarida e do Joaquim Peixoto, de 7 do corrente:

Aos meus amigos Alice e Luís Graça quero agradecer o maravilhoso passeio de comboio que nos proporcionaram, até ao Pocinho, seguindo de carro até Foz Côa, onde degustámos no restaurante do Museu um delicioso almoço confeccionado com carne da região acompanhado por um delicioso vinho.

A viagem de comboio foi cheia de emoções e alegria, não só pela maravilhosa paisagem que o nosso olhar abrange ao longo do inigualável rio Douro, ora correndo em estreito leito ladeado por escarpas, rochas com efeitos fabulosos, ora deslizando num largo e aprazível leito, onde a encosta desenhada com as famosas vinhas do Douro, ( onde se destacam aqui e ali as majestosas casas e quintas dos produtores vinhateiros, que levam o seu néctar a outros mundos), refletem nas águas do rio as suas belas folhagens.

A paisagem é deslumbrante, a costa muda constantemente de aspeto conforme o comboio vai serpenteando a linha férrea ou a luz do sol pinta de cores diferentes a vegetação, contrastando o azul do céu com as águas calmas do rio, onde a paisagem e a cor do azul celestial se confundem com o verde caudal, transportando-nos a quais telas pintadas por famosos pintores que traduzem para quadros valiosos o que a Natureza se encarrega de embelezar no mundo em que vivemos..

Foi um dia repleto de boas sensações, de esquecimento do quotidiano, de bem estar, não só, como já referi, pelo magnífico panorama que desfrutámos, mas também,  e ainda mais importante, pela companhia que tivemos.

Obrigados,  Nitas e marido, Gusto,  pela vossa amizade e camaradagem.

Obrigados,  Laura,  pela simpatia e naturalidade em nos integrar nas suas amizades.

Bem hajam, Alice e Luís,  por, mais uma vez, mostrarem a vossa amizade, camaradagem e solidariedade compartilhando as vossas amizades connosco.

Da nossa parte retribuímos com todo o carinho a nossa amizade e sensibilidade.

A todos vós, em especial a ti, Alice, e ao Luís,  um forte e carinhoso abraço dos amigos,

Margarida e Joaquim Peixoto.

Guiné 63/74 - P12033: Notas de leitura (519): "País Sem Rumo", por António de Spínola (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Maio de 2013:

Queridos amigos,
O intuito é compendiar a documentação que contribua para entender a guerra e o processo de paz, neste caso o Acordo de Argel e o reconhecimento da Guiné-Bissau por Portugal.
O que Spínola escreve neste seu livro é hoje matéria que se dissemina por muitas obras, mesmo que não se formule o contraditório. Em termos militares, Spínola é a favor do recuo do dispositivo da manobra; como o governador, é manifestamente hostil. Sabe que “Portugal e o Futuro” já vem tarde mas é imperativo da sua consciência.
Na sua explanação, é tudo luminoso quanto às suas intenções, nunca se toma o pulso da impetuosidade que foi o 25 de Abril nem se busca o entendimento porque logo, em 26 de Abril, se começaram a tomar medidas para a liquidação da guerra.
É por estas e por outras que todo este estudo é poliédrico e não pode argamassar-se em palpites ou paixões.

Um abraço do
Mário


“País sem rumo”: A Guiné, por António de Spínola

Beja Santos

É certo que as justificações apresentadas pelo primeiro presidente da República do pós-25 de Abril sobre as questões mais prementes da Guiné e da respetiva descolonização têm aparecido publicadas por diferentes autores, mas aqui a intenção é de deixar compilados os argumentos que ele utilizou, alguns dos quais já não é possível o contraditório, mas a História não pode prescindir das suas tomadas de posição, mesmo aquelas que decorrem de suposições ou conjeturas. A obra intitula-se “País sem Rumo, Contributo para a história de uma revolução”, por António de Spínola, Editorial SCIRE, 1978.

Primeiro, passou a entrevista com Salazar, tendo como ponto de partida a sua posição crítica face ao desenvolvimento da guerra e à tese da defesa do Ultramar pela força das armas, Spínola diz que se pronunciou junto de Salazar de que o conceito de unidade estava ultrapassado, que o fundamental na Guiné era a batalha do desenvolvimento, mediante uma “dinâmica revolucionária”, única hipótese de sustar o processo subversivo. Qual não foi a sua surpresa quando Salazar respondeu, sem quaisquer comentários ao que proferira: “É urgente que embarque para a Guiné”.

Segundo, dedica um capítulo aos seus esforços de estabelecer contactos com chefes de guerrilha do PAIGC, relata o seu encontro secreto com o presidente de Senghor e qual a reação de Marcelo Caetano. Na ótica de Spínola, era a derradeira oportunidade, já tinham sido pedidos novos meios ofensivos à URSS, naquele preciso momento, em 1972, havia notícia de um sério desgaste, ou era naquela ocasião ou nunca. Assim se queimou a última oportunidade, suspenderam-se os contactos com Senghor, Amílcar Cabral teria proposto, em Outubro de 1972 encontrar-se com Spínola em território português, eventualmente em Bissau. É nestas conversações que surge a expressão “derrota militar” se necessário, acordo político nunca.

Terceiro, desaparecido Cabral, a guerra recrudesceu a partir de Março de 1973, em Maio Spínola dirige-se a Costa Gomes dando-lhe conhecimento da gravidade da situação e da necessidade inadiável de mais meios de toda a ordem e é nesse contexto que escreve ao ministro do Ultramar e usa a expressão “aproximamo-nos, cada vez mais, da contingência do colapso militar”. Costa Gomes visita a Guiné em Junho e delibera a redução do número de guarnições do dispositivo. Spínola volta a escrever ao ministro do Ultramar: “Esta alteração da manobra obriga, porém, necessariamente, a abandonar áreas geográficas e, o que é bem pior, a entregar à sua sorte populações a que não podemos fornecer meios adequados de defesa, populações que confiaram em nós e haviam aderido a uma política que visa a realização das suas legítimas aspirações”. E conclui: “Não poderei ser eu a abandonar áreas e as correspondentes populações em cuja proteção, justa administração e desenvolvimento socioeconómico me empenhei pessoalmente. A aceitação de tal manobra – que como Comandante-Chefe considero absolutamente necessária – lançaria o rótulo amargo de demagogia sobre a autenticidade do ideário nacional que prossegui, até agora, com isenção e fé”. Em Setembro, tomou posse o novo governador. Spínola irá escrever “Portugal e o Futuro”, com base no documento que enviara a Marcelo Caetano, anos antes, quando fora convidado a pronunciar-se sobre a revisão constitucional. Spínola atribui a Costa Gomes razões perversas sobre a “manobra em retirada” dizendo que se integravam numa maquiavélica manobra política mais tarde claramente revelada, não diz qual nem apresenta documentação plausível. Sobre o seu ideário recomenda um extrato da ata da sessão do Conselho Legislativo da Guiné, de 16 de Outubro de 1972, que vem em anexo, aí se refere a ampla autonomia, a institucionalização de Congressos, seria estas as formas renovadas para uma duradoura unidade nacional.

Quarto, no capítulo sobre a descolonização, Spínola tece críticas amargas aos condutores pela descolonização da Guiné embora confesse que “Quando escrevi Portugal e o Futuro tinha verdadeiramente a noção de que já era tarde. Mas o grito de alerta era exigido pela minha consciência, pois, apesar de tudo, sonhava ainda na edificação de um Mundo de raízes portuguesas”. Spínola confiara em Carlos Fabião, dera-lhe diretivas claras e concisas para a Guiné: pôr termo aos desmandos que ali se estavam a praticar; negociar com o PAIGC, mas continuara o esforço defensivo de guerra até à assinatura do acordo de cessar-fogo; dar continuidade ao processo político de autodeterminação iniciado por Spínola e que apontava para uma consulta popular; e preparar a visita de Spínola à província com vista a assegurar o respeito total por decisões tomadas em congresso do povo. Na conceção de Spínola, eram objetivos praticáveis, o único perigo militar que ele considerava no imediato era o agravamento das fronteiras, devido ao apoio que o PAIGC recebia dos países vizinhos. Não há uma palavra à doutrina das Nações Unidas quanto ao reconhecimento do PAIGC como único interlocutor dentro da Guiné-Bissau.

Responsabiliza a Comissão Coordenadora do MFA como responsável pela campanha de anarquização e o descalabre das forças armadas e insinua que Costa Gomes lhe dava beneplácito. E escreve: “A situação interna da província agravara-se sensivelmente. O brigadeiro Fabião não só se revelara incapaz de dominar a situação como se havia transformado, praticamente, num mero agente do PAIGC. A própria rádio oficial difundia mensagens do PAIGC apelando para a expulsão dos portugueses, incitando os africanos a fazer correr o sangue dos “colonialistas portugueses” e a “violarem as mulheres brancas”. Considera ter havido um clima de generalizada cobardia moral e traição. Acrescia, dentro desta atmosfera de gravidade, que o Conselho de Segurança se iria em breve pronunciar sobre a admissão da Guiné-Bissau. Assim se chegou aos acordos de Argel, o Estado português viu-se obrigado a reconhecer de jure a Guiné-Bissau.

Spínola refere o anexo do acordo onde se diz taxativamente quais as medidas prescritas para salvaguardar o que ainda regressava da honra e dignidade da Pátria, haveria a reintegração na vida civil de todos aqueles que tinham prestado serviço nas Forças Armadas Portuguesas, "em especial os graduados das Companhias e Comandos Africanos". Carlos Fabião, neste texto de Spínola, é considerado o mau da peça, tudo ali foi possível pela despersonalização de Fabião que chegou a envergar uma farda semelhante à do PAIGC e escreve que esta atitude “foi objeto da mais veemente reprovação por parte da população civil que assistiu a tão indecorosa afronta”.

Esta descolonização, escreve, foi planeada pela fação “progressista” do MFA e localmente conduzida por um grupo de militares marxista sobre a responsabilidade direta de Carlos Fabião. Conclui dizendo que a descolonização da Guiné terminou num quadro de traição, de ignomínia e de indignidade, a cujo julgamento da história os seus responsáveis não poderão furtar-se.
Em anexo, junta a síntese do trabalho programático “A Descolonização e as Nações Unidas” e o teor do Acordo de Argel.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 de Setembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12019: Notas de leitura (518): "Crónica dos Novos Feitos da Guiné", por António Ferra (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12032: Convívios (529): XVIII Encontro dos ex-combatentes da Guiné da Vila de Guifões/Matosinhos, dia 5 de Outubro de 2013 em Lousada (Albano Costa)

1. Mensagem do nosso camarada Albano Costa (ex-1.º Cabo da CCAÇ 4150, Bigene e Guidaje, 1973/74), com data de 12 de Setembro de 2013:

Caros amigos
Gostaria, se fosse possível, que se publicasse a notícia do encontro dos ex-combatentes na Guiné-Bissau da Vila de Guifões - Matosinhos, que já vai na sua XVIII edição. .
Este encontro tem sempre lugar em locais diferentes de ano para ano, e desta vez vai realizar-se em Lousada, na Quinta do Caseiro.
A deslocação é sempre feitas em dois autocarros.
Segue circular em anexo.

Sem mais de momento,
Albano Costa

____________

Nota do editor

Último poste da série de 9 DE SETEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12020: Convívios (528): 15.º Encontro do pessoal da CCAÇ 4544/73, levado a efeito no passado dia 8 de Setembro de 2013 em Miranda do Corvo (António Agreira)

Guiné 63/74 - P12031: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (31): "Deixem-nos trabalhar"

1. Em mensagem do dia 2 de Setembro de 2013, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, CatióCabeduGandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta "boa memória da sua guerra", mais uma vez apimentada qb:


Memórias boas da minha guerra

31 - "Deixem-nos trabalhar!"


Antigo RAP 2 

- Ó Silva, estás tramado para este fim-de-semana. Estás de serviço de Ronda no Domingo. – Gritou o Mariz de Anadia.
- Não vou a Lisboa, este fim-de-semana, mas não olhes para mim, porque não te vou fazer esse serviço. Quero ir até ao Minho, conhecer alguma coisa. E espero encontrar uma garina. – Interveio o Machado.
- E qual é o meu papel? – Perguntei a quem me quisesse responder.

Logo o Sargento Bagaço:
- Fazer o percurso das Pontes D. Luís, Vila Chã, Sé, Rua Escura, Bainharia, Ribeira…
- …Zona das putas. – Interpôs o Delfim Nora, de Matosinhos, que aproveitou para fazer o convite:
- Não caias nessa merda. Vem, mas é, até Matosinhos para visitarmos as casas de trabalho da Rua Brito Capelo.

Deixei-me cair na cama e, em silêncio, de olhos no tecto, pus-me a pensar. Ou melhor, a “ver o filme” de uma visita que tinha feito àquela zona.
Foi em princípios de 1958.
Eu ainda não tinha 15 anos quando o meu tio de Trás-os-Montes (Boticas) veio visitar-nos. Depois da devida autorização paternal para o acompanhar na visita a “uma pessoa amiga do Porto”, seguimos num autocarro da Feirense, directamente para junto do Café Derby.

Edifício onde esteve o Café Derby na Rua Chã. 

Logo ali verifiquei o à-vontade do meu tio no relacionamento com aquelas mulheres.
Ele, um rapagão de bom aspecto e cheio de saúde, já tinha perto de 40 anos e não mostrava namorada nem intenção de casar. Parecia que aquele ambiente o satisfazia plenamente.
Na Sé, descemos por umas ruas estreitas em direcção à Ribeira.
Enquanto descíamos, eu ia ficando pasmado pelos “polícias” de humanos, de cães e de outros animais que via pelos cantos da rua. A dada altura, passámos por duas miúdas (aparentando cerca de 10 anos) que conversavam em voz alta. Uma delas pôs-se de cócoras, sem cuecas e começou a mijar, ao mesmo tempo que ia falando.
Como me demorei a olhar para a cena, a miúda perguntou:
- Oube cá, ó morcon, nunca bistes uma c____ sem pelos?

Quando me viu meio aparvalhado, o meu tio aproveitou para me dizer que aquela gente era igual à da minha aldeia e que fazia aquilo porque, normalmente, não tinha casas de banho, e que, ao contrário de nós, não tinha mato, pinhal ou campo para nos imitar. Como bem me lembram aqueles momentos de arejar o “material”! Quem é que não gosta de dar uma mija (ou mais) e deixar o “badalo” sacudido lentamente a observar a natureza e a absorver aquela límpida aragem rural?
Ah, e daquelas mulheres de carrego à cabeça, na conversa, que abriam as pernas, puxavam as saias para a frente e deixavam cair o mijo direitinho, sempre no mesmo sítio!

Logo que entrámos na casa da Micas fixei os olhos nas suas exuberantes mamas, pouco escondidas debaixo de uma blusa muito desapertada. Enquanto ele falava para uma moça, a quem pediu uma cerveja, a D. Micas puxou-me e disse:
- Anda aqui que eu arranjo-te outra “coisa”.

Não sei o que deixou cair. Vergou-se demoradamente, possivelmente para me mostrar o traseiro e o pername. De seguida foi-se aproximando, tocando-me e aconchegou-me a cara ao centro daqueles peitos avantajados. E eu, que nem sou muito de leite, quando me apercebi, já estava com vontade de mamar.

Nove anos depois, vejo-me com vontade de repetir o percurso.
Estava uma linda tarde de sol daquele mês de Janeiro de 1967 quando descemos do RAP2, da Serra do Pilar. Seguimos o tabuleiro superior da Ponte D. Luís em direcção a Vila Chã.

A Ponte Luís I, hoje dedicado ao Metro e a peões

Depois, chegados à Sé, fui aconselhado pelo meu adjunto de que deveríamos seguir pela Rua Escura, em direcção à Bainharia e Ribeira, zona mais frequentada pelos militares.
Era bem visível o trânsito lento dos magalas, a divagar e a observar tudo e todos mas mais focados no mulherame. Entravam e saíam dos tascos ou de portas manhosas, vindos não sei de onde.
De repente, cai uma penicada mesmo na nossa frente. Então, oiço de lá de cima, em voz alta:
- Ai Birgem Nossa Senhora de Fátima, que ia molhando a Ronda da Tropa! Descuuuuulpem! Descuuuulpem!

Rua Escura - Pormenor

Não percebi que aquilo era um aviso (não só para nós), continuámos a descer e, enquanto observávamos se acaso teríamos sido atingidos com a dita penicada perfumada, surge nova remessa. Desta vez, fomos atingidos ligeiramente. Ficámos atordoados e sem saber o que fazer.
Foi, então, que um sujeito (talvez o Júlio) saiu de um bar e veio ao nosso encontro para nos acalmar, elucidar-nos e pedir desculpa. E logo uma catraia, bem boa, por sinal, encostando-se exageradamente à minha pistola, pousou as mãos no meu ombro esquerdo e melosamente acrescentou baixinho:
- Senhor Meleciano, num benha p’ráqui assim armado porque a tropa gosta de estar à buntade e as donzelas querem trabalhar. Por fabor deixem-nos trabalhar! Deixem-nos trabalhar!

Forçados a regressar ao Quartel, rapidamente me lavei e mudei de roupa.
Quando ia a atravessar a rua, em frente do Café Mucaba, parou um carro de onde me chamaram.

Avenida de Gaia. Antigo Mucaba à direita 

Era o Neca Folhetas, que namorava uma vizinha e que insistiu para ir com ele para o Porto. Mal entrei, disse-me que queria ir dar uma volta pela zona do métier. Disse-lhe que não ia. Só se fosse lá para os lados da Cadeia, Clérigos, cimo dos Caldeireiros, etc.
Corremos três ou quatro bares e viemos para o cimo dos Caldeireiros.

Perante um aglomerado de gente, aproximámo-nos e constatámos que lá dentro do bar havia confusão. Abeiramo-nos da porta e perguntei a um militar o que se passava. E ele respondeu:
- É o caralho do Mirandela. Anda apaixonado por uma gaja e não a larga.
- E não o conseguem trazer? - perguntei.
- Foda-se!!! É que ele já está com os copos e de naifa é um perigo! Ninguém se aproxima dele.

Ouve-se, então, uma mulher a lamentar-se:
- Uma galdéria cheia de bida, podia ganhar umas coroas e o gajo não ajuda nada. É mesmo morcon!

E logo outra acrescenta:
- Filha da puta da Ronda que nunca mais chega! Assim, não temos condições para trabalhar! Ó meu Deus, o que mais pedimos é que nos deixem trabalhar. Deixem-nos trabalhar!!!

Silva da Cart 1689

 -*-

Zona histórica do Porto

Fotos: © Jorge Teixeira (Portojo)

ADENDA
Significado de palavras usadas no texto, tal como extraído do “Manual do Morcon”, integrado no “Dicionário da Lingua Romontica Portuense”:

- À maneira – De longe a mais portuense de todas as palabras e expressões e que significa: “como debe ser”, “com categoria”,”com qualidade”, enfim, “à maneira mesmo”.
- Foder – Bocábulo pouco utilizado na región e raramente referido a sexo. No caso da expresson “Bouta foder” ou “touaqui toutafoder” pode significar: “Bou-te esvaziar dois pneus da biatura e tu só tens uma roda sobressalente”.
- Donzela – Qualquer baca que f__a mais de dez vezes ao dia.
- Fdp – Expressón raramente usada. Usa-se mais “grande filha da puta”. Na zona de Campanhã acrescenta-se sempre “bouta foder”.
- Galdéria – Tola. Que podia ganhar muito mais se tivesse juízo (para o “negócio”).
- Garina – Debe ser de Lisboa, a puta.
- Puta – Palabra que se emprega em manifestações de amizade e carinho, tais como: “Meu belo filho da puta”.
- “Deixem-nos trabalhar!” – Frase muito bulgarizada entre as putas e, também, entre os políticos, quando nos querem endrominar.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 26 DE AGOSTO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11981: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (30): O Jorge Ribeiro era um "gentleman"