Texto do do Carlos Vinhal, ex-furriel miliciano da CART 2732 (Mansabá, 1970/72):
O homem é o resultado do seu tempo e das suas ideias. Não há democratas sem democracia nem ditadores sem ditadura. Ambos estão manietados se não estiverem integrados no seu tempo e meio.
O que acabei de escrever será discutível, muito, mas conheci alguns democratas e ditadores que pacientemente esperaram pela queda da ditadura. Muitos a milhares de quilómetros. Conheci outros que lutaram pelos seus ideais, mas as suas lutas eram pouco produtivas face ao que lhes custava, a eles pessoalmente e às suas famílias. A estes últimos as minhas homenagens. O nosso colega Rui Felício reforça a minha ideia da capacidade que o homem tem de adaptar as suas ideias e acções ao seu meio, conveniências e momento da sua vida.
Os militares do QP que fizeram múltiplas comissões em África, mais não fizeram que alimentar o regime que não queria, ou não sabia, dar a liberdade de escolha aos povos das Províncias Ultramarinas, mas muitos deles depois do 25 de Abril foram essenciais para a consolidação da democracia. Assim de momento, e sem pensar muito, lembro os nomes Salgueiro Maia, Melo Antunes e Ramalho Eanes a quem tanto devemos.
Os militares recrutados por imposição por sua vez, independentemente das suas convicções políticas ou posição face à guerra, tinham que alinhar ou destruiam o seu futuro. Eramos apanhados na idade em que iniciávamos os cursos superiores ou consolidávamos os nossos conhecimentos profissionais.
Ainda hoje me pergunto se o 25 de Abril, que foi feito pelos capitães (classe mais explorada pela guerra), teve como fim principal derrubar o regime ou se se aproveitou do estado de podridão do mesmo, para acabar com uma guerra sem solução.
Felizmente correu tudo bem; a guerra acabou, o regime caiu e a democracia foi imposta (no melhor dos sentidos) para nosso bem. Pode-se discutir os diversos modelos de democracia (se os há) que as diversas facções do MFA preconizavam e nos queriam impor.
Lá voltamos ao artigo do nosso camarada Felício (1) que em palavras directas retrata essas pessoas e esses tempos, imediatamente antes e depois do levantamento militar. Havia militares adaptados (ou inadaptados?) ao seu meio e ao seu tempo. A História falará deles com menos paixão do que nós o fazemos hoje. Há-de discutir-se no futuro o 28 de Setembro, o 11 de Março e o 25 de Novembro e, dependendo dos ideais de cada observador, os resultados serão considerados negativos ou positivos.
Saudações para todos os camaradas e amigos.
Carlos Vinhal
____________
Nota de L.G.
(1) Vd. post de 5 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 : DCLXXV: O outro Carlos Fabião (3) (Rui Felício)
"(...)Ficaria sossegado no meu canto, a observar as opiniões dos tertulianos a propósito da morte do CARLOS FABIÃO, sem nenhuma intenção de intervir, se não acabasse neste mesmo momento de ler um e-mail do Zé Teixeira em resposta a um outro do J.Vacas de Carvalho (meu contemporâneo na E.P.I. em Mafra).
"O Zé Teixeira afirma que o Carlos Fabião que conheceu na Guiné não é o mesmo que o Vacas de Carvalho retrata no seu e-mail. E eu acredito que o Zé Teixeira fale verdade. Mas não precisava que o Vacas de Carvalho escrevesse o que escreveu para saber que o que este diz também é verdade... Ou seja, ambos retratam o mesmo homem, em tempos diferentes mas próximos, com dois comportamentos completamente antagónicos!" (...)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário