Guiné > Zona leste > Sector L1 > Bambadinca > Mansambo > CART 2339 > 1969 > "Chegada do Braimadicô. Veio de helicóptero de Bissau. Era um Quadro do PAIGC (Comandante e correio entre Conacri e a Frente Leste). Tive que assinar a papelada da entrega Vinha para servir de guia na operação Lança Afiada, pois tinha sido capturado na zona de Mina" (TM).
Foto e legenda: © Torcato Mendonça (2006). Todos os direitos reservados.
Foto e legenda: © Torcato Mendonça (2006). Todos os direitos reservados.
1. Texto do nosso camarada Albano Gomes, ex-1º Cabo Op Cripto, CART 2339 (Mansambo, 1968/69) (1):
Caro L.G.
Um Cripto tinha de comer tudo o bom e mau, mastigava, engolia e não podia vomitar e uma falha nossa poderia ser fatal.
As coisas do passado, nos dias de hoje, deixaram de ter o seu grau de segurança, fossem elas Confidenciais, Secretas ou Muito Secretas.
Assim sendo passo a contar algo que pouca malta sabe sobre a captura de Braimadicô que posteriormente veio para Mansambo, recebido pelo Torcato (Homem de antes quebrar que torcer), e sobre o qual ele já escreveu e anexou foto (2).
Um certo dia é apanhada e descodificada uma mensagem IN que referia o seguinte: Próximo 24 09 H chega a esse Major Braima.
Esta mensagem era enviada via rádio com emissão fraca, e recebida por outro rádio mas este de emissão bastante melhor.
Nós sabiamos que o rádio mais potente que tinha o IN no Sector L1 [, correspondente grosso modo ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole,] se encontrava em Mina, daí que não fosse dificil prever que no dia 24 às 9 horas possivelmente alguém chegaria à zona de Mina.
É enviada mensagem com grau de urgência Relâmpago, segurança Secreto e como Noticia A1, para o Com-Chefe - Bissau, Agrupamento - Bafatá e Batalhão - Bambadinca.
Nada mais se soube sobre o assunto, mas o certo é que dia 24 [de Fevereiro de 1969 ?] (3) quando ninguém esperava vários helicopteros, lançam sobre a zona tropas especiais numa intervenção muito rápida. Toda a malta desconhece o que se passa, excepto eu e, como é logico, o Cmdt da Companhia e possivelmente alguns Alferes.Pouco tempo após, chega a todas as Unidades uma mensagem, que refere a captura de Braimadicô.
O Braimadicô quando veio para Mansambo e ficou nas Transmissões, como refere o Torcato, contou algumas coisas da sua vida num francês bem falado e que recordo uma delas:
Fazia o contrabando entre o Mali, Guiné e Senegal, tendo sido um dia atacado por um animal selvagem que o deixou bastante ferido, e a prová-lo estavam as enormes cicatrizes que tinha a atravessar-lhe o peito. Foi encontrado muito ferido por pessoal do PAIGC que o socorreu e o tratou, onde passado algum tempo ficou como guerrilheiro, atingindo qualidades de chefia, até ser posteriormente feito prisioneiro.
Recordo-me ainda que a primeira refeição que comeu connosco nas Transmissões, foi uma feijoada de feijão vermelho e que, a meio da refeição desmaiou, possivelmente pelo facto de ser um prato demasiado forte, ao qual ele não estaria acostumado.
Deixou-me a ideia de se tratar de um homem bastante calmo.
L.G. para ti e para todos os Camaradas um Abraço
Albano Gomes
_________
Notas de L.G.:
Caro L.G.
Um Cripto tinha de comer tudo o bom e mau, mastigava, engolia e não podia vomitar e uma falha nossa poderia ser fatal.
As coisas do passado, nos dias de hoje, deixaram de ter o seu grau de segurança, fossem elas Confidenciais, Secretas ou Muito Secretas.
Assim sendo passo a contar algo que pouca malta sabe sobre a captura de Braimadicô que posteriormente veio para Mansambo, recebido pelo Torcato (Homem de antes quebrar que torcer), e sobre o qual ele já escreveu e anexou foto (2).
Um certo dia é apanhada e descodificada uma mensagem IN que referia o seguinte: Próximo 24 09 H chega a esse Major Braima.
Esta mensagem era enviada via rádio com emissão fraca, e recebida por outro rádio mas este de emissão bastante melhor.
Nós sabiamos que o rádio mais potente que tinha o IN no Sector L1 [, correspondente grosso modo ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole,] se encontrava em Mina, daí que não fosse dificil prever que no dia 24 às 9 horas possivelmente alguém chegaria à zona de Mina.
É enviada mensagem com grau de urgência Relâmpago, segurança Secreto e como Noticia A1, para o Com-Chefe - Bissau, Agrupamento - Bafatá e Batalhão - Bambadinca.
Nada mais se soube sobre o assunto, mas o certo é que dia 24 [de Fevereiro de 1969 ?] (3) quando ninguém esperava vários helicopteros, lançam sobre a zona tropas especiais numa intervenção muito rápida. Toda a malta desconhece o que se passa, excepto eu e, como é logico, o Cmdt da Companhia e possivelmente alguns Alferes.Pouco tempo após, chega a todas as Unidades uma mensagem, que refere a captura de Braimadicô.
O Braimadicô quando veio para Mansambo e ficou nas Transmissões, como refere o Torcato, contou algumas coisas da sua vida num francês bem falado e que recordo uma delas:
Fazia o contrabando entre o Mali, Guiné e Senegal, tendo sido um dia atacado por um animal selvagem que o deixou bastante ferido, e a prová-lo estavam as enormes cicatrizes que tinha a atravessar-lhe o peito. Foi encontrado muito ferido por pessoal do PAIGC que o socorreu e o tratou, onde passado algum tempo ficou como guerrilheiro, atingindo qualidades de chefia, até ser posteriormente feito prisioneiro.
Recordo-me ainda que a primeira refeição que comeu connosco nas Transmissões, foi uma feijoada de feijão vermelho e que, a meio da refeição desmaiou, possivelmente pelo facto de ser um prato demasiado forte, ao qual ele não estaria acostumado.
Deixou-me a ideia de se tratar de um homem bastante calmo.
L.G. para ti e para todos os Camaradas um Abraço
Albano Gomes
_________
Notas de L.G.:
(1) Sobre o Albano Gomes, vd posts de:
30 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2390: Albano e Ferragudo, gente de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339, 1968/69)
28 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2387: Tabanca Grande (46): Albano Gomes, residente em Chaves, ex-1º Cabo Cripto da CART 2339 (Fá e Mansambo, 1968/69)
26 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2384: Mansambo: a árvore dos 17 passarinhos, baptizada por mim (Albano Gomes, ex-1º Cabo Cripto, CART 2339, 1968/69)
(2) Vd. post de 5 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1152: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (3): Braimadicô, o prisioneiro que veio do céu
(...) Veio de helicóptero de Bissau. Como era um Quadro do PAIGC (Comandante e correio entre Conacri e a frente Leste) tive que assinar a papelada da entrega. Isso responsabilizava-nos por tudo o que viesse a acontecer-lhe. Teríamos que justificar em auto. Vinha para servir de guia na operação Lança Afiada, pois tinha sido capturado na zona de Mina.
Foi mal recebido pelo meu grupo. Pouco tempo antes tínhamos sofrido o primeiro morto (Soldado Bessa). Para evitar aborrecimentos foi para a zona das transmissões e perto do cripto. Não era o melhor local. Ficou ao cuidado de um soldado e da malta das transmissões. Boa gente.
O prisioneiro não comeu, bebeu ou falou. Parecia mudo ou desconhecer qualquer língua – português, crioulo, francês ou qualquer dialecto. Sabíamos quem era, que línguas falava. Não colaborar era com ele, por enquanto, claro. Quando fosse necessário, fá-lo-ia. Agora mudo e quedo estava melhor.
Iniciámos a Lança Afiada e ele acompanhou-nos. Fui evacuado no 2º dia e regressei no 4º dia. Soube que se alimentava e pouco mais. Curiosamente, passado pouco tempo, cumprimentou-me em francês e saudou o meu regresso. Além de francês, falava português, crioulo e vários dialectos. Era do Norte, de etnia Bramame. Colaborou e bastante a partir daí. Levou-nos a uma arrecadação de material e não só. Falamos bastante, talvez demais porque, tempos depois Bissau fez perguntas sobre mim! A relação entre nós era boa. Eu queria ter determinados elementos, preciosos para nós além da curiosidade pessoal. Se ele fugisse ou era abatido por nós (apesar do futuro auto) ou era fuzilado pelos seus camaradas do PAIGC. Ambos o sabíamos. Por isso chegou a ter a minha arma na mão.
Se escrever sobre a Lança Afiada contarei (3)… Terminada a operação um héli veio buscar o Braimadicô, como gostava de ser chamado. Assinei novos papéis, um singelo abraço e um cumprimento militar. Porque éramos militares, ele por convicção, eu por obrigação.
Fora o que acima referi nunca mais soube dele. Pensem o que terá acontecido!? Sei lá (...).
(3) O prisioneiro foi utilizado como guia no decurso da Op Lança Afiada (8 a 19 de Março de 1969). Sobre esta operação, que bateu toda a margem direita do Rio Corubal no Sector L1, vd. posts de:
15 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLIII: Op Lança Afiada (1969): (i) À procura do hospital dos cubanos na mata do Fiofioli (Luís Graça)
9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXI: Op Lança Afiada (1969) : (ii) Pior do que o IN, só a sede e as abelhas (Luís Graça)
9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIII: Op Lança Afiada (1969): (iii) O 'tigre de papel' da mata do Fiofioli (Luís Graça)
14 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIX: Op Lança Afiada (IV): O soldado Spínola na margem direita do Rio Corubal (Luís Graça)
(...) Veio de helicóptero de Bissau. Como era um Quadro do PAIGC (Comandante e correio entre Conacri e a frente Leste) tive que assinar a papelada da entrega. Isso responsabilizava-nos por tudo o que viesse a acontecer-lhe. Teríamos que justificar em auto. Vinha para servir de guia na operação Lança Afiada, pois tinha sido capturado na zona de Mina.
Foi mal recebido pelo meu grupo. Pouco tempo antes tínhamos sofrido o primeiro morto (Soldado Bessa). Para evitar aborrecimentos foi para a zona das transmissões e perto do cripto. Não era o melhor local. Ficou ao cuidado de um soldado e da malta das transmissões. Boa gente.
O prisioneiro não comeu, bebeu ou falou. Parecia mudo ou desconhecer qualquer língua – português, crioulo, francês ou qualquer dialecto. Sabíamos quem era, que línguas falava. Não colaborar era com ele, por enquanto, claro. Quando fosse necessário, fá-lo-ia. Agora mudo e quedo estava melhor.
Iniciámos a Lança Afiada e ele acompanhou-nos. Fui evacuado no 2º dia e regressei no 4º dia. Soube que se alimentava e pouco mais. Curiosamente, passado pouco tempo, cumprimentou-me em francês e saudou o meu regresso. Além de francês, falava português, crioulo e vários dialectos. Era do Norte, de etnia Bramame. Colaborou e bastante a partir daí. Levou-nos a uma arrecadação de material e não só. Falamos bastante, talvez demais porque, tempos depois Bissau fez perguntas sobre mim! A relação entre nós era boa. Eu queria ter determinados elementos, preciosos para nós além da curiosidade pessoal. Se ele fugisse ou era abatido por nós (apesar do futuro auto) ou era fuzilado pelos seus camaradas do PAIGC. Ambos o sabíamos. Por isso chegou a ter a minha arma na mão.
Se escrever sobre a Lança Afiada contarei (3)… Terminada a operação um héli veio buscar o Braimadicô, como gostava de ser chamado. Assinei novos papéis, um singelo abraço e um cumprimento militar. Porque éramos militares, ele por convicção, eu por obrigação.
Fora o que acima referi nunca mais soube dele. Pensem o que terá acontecido!? Sei lá (...).
(3) O prisioneiro foi utilizado como guia no decurso da Op Lança Afiada (8 a 19 de Março de 1969). Sobre esta operação, que bateu toda a margem direita do Rio Corubal no Sector L1, vd. posts de:
15 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLIII: Op Lança Afiada (1969): (i) À procura do hospital dos cubanos na mata do Fiofioli (Luís Graça)
9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXI: Op Lança Afiada (1969) : (ii) Pior do que o IN, só a sede e as abelhas (Luís Graça)
9 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIII: Op Lança Afiada (1969): (iii) O 'tigre de papel' da mata do Fiofioli (Luís Graça)
14 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXIX: Op Lança Afiada (IV): O soldado Spínola na margem direita do Rio Corubal (Luís Graça)
1 comentário:
Confirmo info esse. Excepto contrabando...IN esperto.
Bateu lingua dentes; 2ª Rep ou Inf Bissau pediu inf sobre este...pqp
Ontem esse 01 01 ou 02 H manga cabeça grande...não...pena
Cifre e Transmita, escuto TM
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