FRAGMENTOS DE MEMÓRIAS
11 - APROCHEGAVA-SE O FIM DA COMISSÃO MILITAR
Março de 1967
Já vos contei antes, que criei uma equipa de futebol, lá na minha Repartição mas depois convidado fui para dar a preparação física ao Sporting de Bissau, onde o treinador era um 2.º sargento amigo, de Portalegre.
Tive até de treinar a equipa durante um mês. Estudei uma nova táctica que pus em prática de imediato. O importante final é que a bola não chegasse próximo da nossa baliza. Por isso dei ordens aos jogadores que não queria cá fintas ou passagens, de uns para os outros, e disse:
- Quando a bola estiver ao vosso alcance, chutem, chutem de qualquer forma para que ela saia do nosso meio campo. Lá à frente só quero dois à melosa.
Nos quatro jogos disputados, só ganhámos um aos Balantas de Mansoa, (empatámos a zeros os outros três) com um golo monumental meu, jogador nesse dia, metido fora de jogo, mas convém acrescentar que o árbitro era meu amigo e tinha sido ameaçado por mim myself com retaliações... sim... que na altura não se ofereciam cousas boas com'ó milho. E lá diz o ditado: se queres ver um pobre toleirão... mete-lhe quelque chose avec... na mão e eu prometera-lhe ...já se ma não alembra o quê...
A guerra fizera de mim, um xico-esperto mas cheio de força, arrogante qb e desejoso sempre de entrar em conflitos, resolvê-los na boa ordem e acima de tudo ao abrigo da lei do mais forte. E por isso... como eu me identifiquei com umas imagens há dias mostradas num canal de TV !!!
Em qualquer País que não reparei qual, um árbitro de futebol amandou duas galhetas num jogador depois um valente murro noutro que avançava malandrosamente para o agredir. É que eu fui assim e assim fiz, quando regressei da Guiné e reactivei o prazer de andar com um apito na boca, já que não podia andar de G3 dentro do campo.
Vinha cheio de força, sedento de sangue fresco, isento não era, não fui e nem conhecia quem o fosse e por isso, quando o povo do futebol, se atrevia a chamar-me nomes, fazia-lhes frente, acintosa e provocadoramente e se preciso fosse afinfava-lhes mesmo, qu'essa coisa do medo ficara bem lá longe "onde o sol castiga mais" (sic, Paco Bandeira).
Eu era, eu era não... eu sentia-me ou começava a sentir-me um renegado da Pátria, que apenas permitira que a defendesse, mas qu'agora começava a esquecer o que por ela fizera.
Voltei também há vida artística, ou seja a minha voz voltou a fazer as delícias das avós, filhas e netas, que compareciam nos bailes onde o Conjunto musical (Sôr-Ritmo, se chamava) actuava ao vivo... naturalmente e pelos vastos palcos da República Federal do Alto-Alentejo e até nos Países limítrofes do Ribatejo e Beira-Baixa.
Mas... e ainda em Bissau, o Abril aproximava-se e fui convidado para ficar pelo menos mais um ano, naquela função chata mas não perigosa e confesso que tremi entre o ficar ou não. Acabei por vir embora, mas arrependi-me depois. Voltei mas o coração ficou lá. Ficou lá em Mansabá... em Manhau (e aqui para além do coração ficou também a alma)... em Bissorã... no Pelundo... em Jolmete... e no K3.
Os sentimentos desapareceram depois em Bissau, nos horríveis nove meses finais. O Uíge trouxe a CCAÇ 1422, e foram cinco belos dias, de contactos e promessas para encontros futuros, o que não aconteceu. A rapaziada era toda de sítios dispersos, a maioria do Centro do País, gentes pobres que na sua maioria emigrou, mas com os poucos que ficaram sempre nos íamos vendo quando passavam por Lisboa, onde acabei a procurar e consegui, dias melhores, profissionalmente entenda-se.
A Guiné?
Pois foi importante e de tal maneira que ainda hoje vivo tudo o que de bom e de mau por lá passei.
____________
Nota do editor
Último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12605: Fragmentos de Memórias (Veríssimo Ferreira) (10): Fevereiro de 1967 - Aproveitamento dos tempos livres de Bissau
Sem comentários:
Enviar um comentário