sábado, 23 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17789: Bibliografia de uma guerra (80): “Changing the history of Africa”, por Gabriel García Marquéz, Jorge Risquet e Fidel Castro; Ocean Press, Austrália, 1989 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Setembro de 2017:

Queridos amigos,

Este livro é de 1989, não passa de um panegírico, estamos a caminho do fim da Guerra Fria, sob o impulso da Nações Unidas encontrou-se uma saída nas negociações entre Angola, Cuba e os Estados Unidos: as tropas cubanas retiram de Angola, bem como as sul-africanas e consagra-se a independência da Namíbia, tudo isto se passa no início de 1989, havia que fazer um relato hagiográfico, destacando que a luta em Angola preludiava a derrota do Apartheid.

Só muito recentemente estão a aparecer investigações que escapam ao estafado discurso dos vencedores. Foi por essa razão que se juntaram duas peças que merecem ser lidas em conjugação.

Um abraço do
Mário


Cubanos em Angola, com uma referência ao PAIGC

Beja Santos

“Changing the history of Africa”, por Gabriel García Marquéz, Jorge Risquet e Fidel Castro; Ocean Press, Australia, 1989, é manifestamente um livro apologético, aqui se justifica e glorifica a presença cubana em África, tudo começa com uma entrevista a Jorge Risquet, na altura secretário das relações internacionais do Partido Comunista Cubano, segue-se um artigo intitulado Operação Carlota por Gabriel Garcia Márquez, um rol de discursos de Fidel Castro, até se ter chegado a um acordo que levou à retirada dos conflitos dos cubanos em Angola e na Namíbia.

Todas as revoluções assentam em dados mitológicos, rasuras, interpretações glorificadoras, estabelecimento de verdades feitas e definição irrevogável de inimigos. Logo no prefácio, o organizador da obra panfletária atribui um papel descomunal à resistência angolana, cubana e da SWAPO em Cuito Cuanavale à ofensiva sul-africana, hoje está demonstrado que esse papel determinante não passa de retórica. Na longa entrevista com Risquet também se diz que o MPLA foi crido em 1956, que tem tanta verdade como o PAIGC ter sido criado nesse ano (nunca Amílcar Cabral faz uma referência ao PAIGC antes de 1959, ano em que efetivamente o partido foi criado depois da sua passagem discretíssima por Bissau, ali se assentaram as bases no trabalho clandestino, no interior e no estrangeiro), que Portugal não pertencia à NATO, que o MPLA impulsionou o 4 de Fevereiro de 1961, e muito mais.


Dentro da apologia, omite-se o que Che Guevara escreveu sobre as suas passagens em África, em 1965 e 1966. Conacri recebeu os dirigentes do PAIGC e do MPLA, foi aqui que os dirigentes cubanos encetaram a sua solidariedade. Che visitou uma série de países em 1965, esteve com Agostinho Neto, Lúcio Lara e outros dirigentes do MPLA em Brazzaville. Escreverá mais tarde que achou dirigentes ideologicamente mal preparados e com uma estratégia militar tresloucada. Neste período, havia duas colunas cubanas, pretendia-se atuar no Congo, tudo se esbarrondou em 1966. Os comentários de Jorge Risquet tudo transformam em edulcorante para o MPLA, este é sempre o legítimo, o genuíno representante de todo o povo angolano, a FNLA era um partido tribal e Holden Roberto um agente da CIA, Savimbi um aventureiro cúmplice da PIDE. No diário de Che a referência mais elogiosa a um político africano foi a Amílcar Cabral, para que conste. Este livro australiano aparece profusamente ilustrado e aqui se mostra uma fotografia em que Amílcar Cabral aparece com Agostinho Neto, Marcelino dos Santos e Jorge Risquet no Congo, em 1966, antes de tudo acabar mal.


Esta obra chegou-me às mãos depois de ter lido uma trabalho de grande rigor e baseada em múltiplas entrevistas, “A Guerra Civil de Angola”, por Justin Pearce. Aproveitando este ensejo da história do envolvimento cubano em África, talvez valha a pena ler o que investigou o conhecido académico inglês.
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de Outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15273: Bibliografia de uma guerra (79): Acaba de ser lançado o livro "Nos Celeiros da Guiné - Memórias de Guerra", da autoria de Albano Dias Costa e José Jorge Sá-Chaves, com prefácio do Gen Ramalho Eanes, que conta história da CCAÇ 413

1 comentário:

Antº Rosinha disse...

Talvez este livro descoberto por Beja Santos merecesse um esforço do incansável BS, para um aprofundameno maior da sua leitura.

Deve ter coisas bem interessantes para compreender o que aqueles povos angolanos tiveram que suportar por inqualificáveis invasores internacionais (30 anos)com o beneplácito das Nações Unidas.

Aquele povo não merecia, mas eles e nós (Portugal)não tivemos força suficiente para evitar, eramos nós e eles contra o mundo.

Mas eles e nós lá nos vamos adaptando aos tempos.