segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Guiné 61/74 - P20035: Notas de leitura (1205): "O Mouro da Praia da Foz e Outras Vidas de Outras Gentes", romance de António Lúcio Vieira (Chiado Editora, Lisboa, 2014, 22pp.)

Título: O Mouro da Praia da Foz e Outras Vidas de Outras Gentes
Autor: António Lúcio Vieira
Data de publicação: Janeiro de 2014
Número de páginas: 229
ISBN: 978-989-51-0763-6
Colecção: Viagens na Ficção
Género: Ficção
Editor: Chiado Editora, Lisboa.
Preço de capa: 12 €




Sinopse

António Lúcio Vieira (*)
Nasci na Rua da Cova, naquela baixa e discreta casinha de piso térreo, que se anicha, timidamente, ao canto do patamar. Não há, ainda agora, naquela ribatejana vila de Alcanena, mais poético recanto.

Perco-me nas voltas do tempo. Sei, ainda assim, que residimos quase sempre nesse romântico casulo, que então me parecia um casarão, até ao início da viagem, que me havia de resgatar àquele ninho e àquela rua - com a casa avarandada da ti’ Ludovina por atalaia - e lançar nos braços do sonho, das utopias e das escarpas da vida.
Por algum tempo, após a viuvez de minha tia Maria, os meus pais tomaram as rédeas da padaria da família. Durou pouco o deslumbre. O meu pai não era, decididamente, homem de prisões. Aquele quotidiano espartilho, entre as quatro paredes do forno e da sala da amassadeira, não cativava aquele serrano, nascido para as bandas de Alvados, nas abas da Serra d’Aire. O homem sonhava com o mundo, os caminhos, os espaços e as paisagens. Queria andar por aí, por longes terras. Não tardou que a padaria se tornasse rotina do passado e o determinado aventureiro retomasse o apaixonado percurso de desbravador de estradas e fronteiras, geradores de estórias e imagens, que ainda agora me marcam a existência. Herdei-lhe isso, pois herdei!

Nasci no Ribatejo. Nasci no povo e do povo. Os primeiros e decisivos dezoito anos, na minha Alcanena natal, foram, sei-o hoje, muito mais do que uma vida. Mergulho as minhas raízes, desde o início, nos alcatruzes dos dias, nos sonhos dos homens e nos socalcos desta orgia de existir. Guardo, desse tempo, a ânsia de cavalgar impulsos, a alma da cigarra, que por vezes segrega a formiga, a vontade de partir em eterna aventura pelos mundos, que cada vez se tornam mais remotos e guardo, desde então, um gritante desprezo pelos ouros e lantejoulas que vestem a sociedade.

Era o embrião do incorrigível paladino e sonhador que, pela mão do avô, se intrusava na tertúlia do Facão e escutava, surpreso, os desalentos dos operários, a luta diária pelo pão, os reveses e frustrações, as doenças dos filhos, as lágrimas das esposas e o cansaço precoce dos braços e do sangue.

Sou assim. Da infância retenho a plenitude dos mágicos momentos, a paixão pela vida, pela terra e, sobretudo, pelo mar, “de quem cedo fui amante”. Desse remoto despertar conservo as palavras urgentes que me vestem os poemas, os gritos de revolta e os sangues sacrificados de tantos irmãos que apenas clamaram vida. Da infância desperto as prédicas, avisadas e sábias, do avô António, os mundos por descobrir, que se derramavam dos olhos do meu pai e as ferramentas forjadas pelos malhos da esperança, que haviam de permitir o cerne e a seiva e a alma e os anseios, deste aprendiz de alquimista, mal refeito do acto de ter nascido, que tanto quis amar e a quem tão pouco foi dado ver amor.
Fonte: Chiado Books (com a devida vénia...)

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Recorte de imprensa (**):




Fonte: Adapt de Almonda,  14 de fevereiro de 2014, p. 5 (com a devida vénia...)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20031: Escritos do António Lúcio Vieira (1): A suprema mas vã glória de afundar um submarino inimigo... no Rio Mansoa, nas imediações de João Landim... Ou os delírios de um alferes de engenharia que não ficou na História Pátria!

(**) Último poste da série > 2 de agosto de 2019 > Guiné 61/74 - P20028: Notas de leitura (1204): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (17) (Mário Beja Santos)

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