
Queridos amigos,
Já que se permanece num dos mais belos museus de toda a Alemanha, convém apresentá-lo. O museu goza do nome do seu fundador, Johann Friedrich Städel (1728-1816), ao tempo um opulente banqueiro da cidade de Frankfurt. Apresentou a sua fortuna para estabelecer a mais antiga fundação museológica da Alemanha, o Instituto de Arte Städel, dando a possibilidade ao público de conhecer a sua coleção de pinturas, desenhos, estampas e pequenas esculturas. O foco principal da sua coleção pictórica compreende cerca de 500 obras do barroco germânico e holandês. A ideia da fundação museológica contextualiza-se no espírito do Iluminismo e do Humanismo. Este novo instituto de arte também foi posto ao serviço da educação estética, passou a promover jovens artistas, e ao longo do tempo a coleção foi aumentando com compras e doações. O edifício que alberga o museu é do século XIX, foi severamente atingido pelos bombardeamentos, mas toda a sua coleção não sofreu danos, a tempo e horas foi posta a recato. O que hoje se mostra neste apontamento é uma súmula de obras de grandes mestres da primeira metade do século XX e uma visita à exposição "Amesterdão no tempo de Rembrandt", com impecável apresentação.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (205):
Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 4
Mário Beja Santos
Continuo a minha visita no Museu Städel, confesso que tomei previamente a decisão de me orientar para as salas que acolhem os movimentos artísticos predominantemente dos séculos XIX e XX. No apontamento anterior referi os movimentos do século XIX, vou agora embrenhar-me no século XX, lá para meio desta incursão acabei por entrar na exposição “Amesterdão do tempo de Rembrandt”, dela também aqui se fará uma pequena referência. Nunca entendi como as correntes estéticas alemãs aparecem nos múltiplos livros da História de Arte do século XX, a um nível de meras referências, no entanto houve um conjunto de movimentos genuinamente alemães que estiveram no topo das revoluções artísticas, e não foi só o expressionismo. Como é evidente, não pretendo aqui mencionar esses diferentes movimentos, destaco algumas dessas obras que vivamente me impressionam, aparecem em salas onde também se realçam outros génios da pintura, como é o caso de Picasso. Vamos então continuar o percurso.
Porta de Brandemburgo, Ernst Ludwig Kirchner, 1929. Kirchner é um dos artistas que está em franca reabilitação, foi autor de várias experiências, esta porta de Brandemburgo é muito naïf, essa ingenuidade perpassa não só nos volumes e formas como na alteração das cores, exige simultaneamente uma leitura mais atenta e uma emoção estética a apontar para o gracioso que é dado aos conteúdos, este local mítico de Berlim é um sonho do artista.
Retrato de Fernande Olivier, Pablo Picasso, 1909. Retrato marcado pelo cubismo, dentre em breve o génio aderirá a tons azuis e rosas, modificará as formas, vai emergir no estudo das condições sociais, e depois partirá para a distorção completa das figuras, já atraído pelo abstracionismo.
Vaso Verde, Fernand Léger, 1926. Artista muito peculiar, obteve a conjugação de uma pintura um tanto hiper-realista, formas futuristas e um tratamento de organização pictórica com apelos a mecanismos; não será o caso neste quadro, uma natureza morta, sem qualquer conteúdo político, onde prevalece é uma composição quase em mosaicos e peças geométricas.
A Família do Artista, Otto Dix, 1927. Só é novo o que foi esquecido, a alteração de formas, estes olhos amendoados, um riso afetuoso mas intrigante do pai não pode fazer esquecer as distorções na pintura de El Greco ou de Bosch, com base em mensagens do que o que se passa no corpo e na mente do artista tem impacto na organização cénica, e o que parece torcido ou distorcido acaba por ser um outro modo de visualizar o real.
Kallmünz - Montanhas em Verde Claro, Wassily Kandinsky, 1903. Já vimos, no decurso desta visita ao Städel um Van Gogh que se diria improvável, ainda distantíssimo do expressionismo, o que dizer deste Kandinsky na sua primeira fase, também tão distante das gramáticas que o irão impor como uma das figuras cimeiras do abstracionismo.
Brinquedos do Walter, por August Macke, 1912. Outra peça ingénua, outro primeiro ciclo artístico, Macke, figura de proa do movimento Der Blaue Reiter (O Cavaleiro Azul) com inspiração expressionista, corrente original que teve a sua sede em Munique.
Faço agora uma pausa, mudei de andar e vou visitar uma exposição correspondente a um período áureo de Amesterdão, ao tempo de Rembrandt.
Cartaz da exposição “A Amesterdão de Rembrandt”, no Museu Städel, exposição patente até março de 2025
Interior da Bolsa de Amesterdão, Job Adriaensz. Berckheyde, ca. 1670
A grande praça e o edifício da nova câmara em construção, Johannes Lingelbach, 1656
Em Amesterdão, mais do que em qualquer outra cidade, os retratos de grupo eram o espelho do orgulho do poderoso grupo da elite de cidadãos, particularmente os membros das novas instituições sociais. Contudo, a prosperidade da cidade teve custos elevados porque lançou raízes nas políticas de comércio colonial e uma severa ordem social. Esta exposição mostra os lados altos e baixos deste período em imagens e histórias de uma sociedade plural onde se mostra a riqueza e a pobreza, a fortuna e a ruína, o poder e a sua destituição.
Volto agora ao século XIX e depois a uma pintura muito mais antiga.
O Apaixonado pelas Rosas, Carl Spitzweg, ca. 1847-1850. Outro nome original da pintura alemã, uma ingenuidade sofisticada, uma atmosfera romântica, Spitzweg está permanentemente a surpreender-nos, força-nos a pôr muita emoção no olhar, e veja-se esta composição, a forma como ele enche de luz a tela, só falta ao espetador ir cheirar a rosa.
Ramo florido de uma macieira, Henri Fantin-Latour, 1875. Quando, há uns bons anos, o Museu Gulbenkian organizou exposições sobre a natureza morta na pintura, Fantin-Latour foi um dos nomes convocados, acresce que Gulbenkian adquirira pintura deste requintado artista francês, este assombro de ramo florido quase a saltar de uma tela enegrecida é uma verdadeira obra-prima. A viagem continua, vamos recuar a finais do século XV na companhia de Albrecht Dürer.
(continua)
_____________
Nota do editor
Último post da série de 10 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26788: Os nossos seres, saberes e lazeres (680): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (204): Algures, na Renânia-Palatinado, em Idstein, perto de Frankfurt – 3 (Mário Beja Santos)
Sem comentários:
Enviar um comentário