segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7111: Memórias dos Lugares: II Parte - CART 730/BART 733. Bolama e um pouco de história. (João Parreira, 1964/66)


1. O nosso Camarada João Parreira, ex-Fur Mil Op Esp / RANGER / COMANDO da CART 730 / BART 733 e do Grupo “Fantasmas”, Bissourã e Brá, 1964/66, enviou-nos uma mensagem, solicitando-nos a divulgação da notícia da próxima festa do BART 733:
Camaradas e Amigos,

Junto envio a segunda parte da história da CArt 730, referente ao período de cerca de um mês em que a Companhia esteve aquartelada em Bolama.

Dado não ter havido muita actividade militar fora do aquartelamento intercalei alguns dados que julgo serem interessantes.
Original - II Parte - CArt 730 - BArt 733 (Bolama e um pouco de história)



O ARQUIPÉLAGO BIJAGÓS

Da minha parte pouco há a relatar sobre a actividade militar da CArt 730 na Ilha de Bolama pelo que, para complementar, envio alguns dados que julgo sejam de algum interesse para os nossos camaradas Tertulianos, e não só.
Estes dados foram recentemente compilados, sendo alguns deles extraídos de várias fontes, bem assim como algumas fotos de camaradas, aqui usadas com a devida vénia, apenas por se inserirem na descrição dos edifícios.



É constituído por um grupo de 88 pequenas ilhas e ilhéus na costa de Bissau, muitas delas desabitadas. O Rio Geba, o maior da Guiné, desagua no Oceano Atlântico por um largo estuário junto de Bissau,  tendo o Arquipélago dos Bijagós frente à sua foz.

A sudoeste da Ilha de Bolama fica situada a Ilha da Galinhas, para onde eram levados prisioneiros feitos ao do PAIGC. Bolama é a mais perto do continente, e é onde estava localizado o CIM (Centro de Instrução Militar).


Bubaque, tem imensos palmeirais e bosques e a magnífica Praia Bruce.
Outras ilhas: Caravela, Formosa, Maio, Ponta, Roxa, Orango (a mais afastada do continente) etc.

ILHA DE BOLAMA

Em 1964 tinha como Administrador Jorge de Carvalho, e Mártires Lopes era o director do Centro de Informação e Turismo (!!!) da Guiné.
Vista aérea da cidade de Bolama
Cais de Bolama

A Companhia de Artilharia 730, da qual eu fazia parte, sob o comando do Capitão de Artilharia Amaro Rodrigues Garcia,  esteve aquartelada no CIM (Centro de Intrução Militar) em Bolama, de 15 de Outubro a 11 de Novembro de 1964.
O quartel do CIM  era comandado pelo Capitão Câmara Tavares.

Vista aérea do Centro de Instrução Militar

Durante a nossa curta estadia os Oficiais do Agrupamento deram auxilio e prestaram conselhos e manifestaram a sua experiente orientação e até cederam material para a Companhia poder ter eficiente preparação.

Foi assim nesta Ilha que tivemos um terreno mais propício para nos podermos preparar para os combates que se avizinhavam. Desde os locais com alguma densidade, um pouco semelhantes à parte Continental, até ao verdadeiro tarrafo na passagem da Ilha de Bolama para a Ilha das Cobras, conhecemos e experimentámos as dificuldades na progressão e manobra, num terreno totalmente distinto do metropolitano.
Esta preparação tinha ainda a grande facilidade de poder culminar todos os exercícios com fogos reais, numa carreira de tiro improvisada e dificiente, é certo, mas que satisfazia a finalidade a atingir.


Com camaradas no campo de futebol

O campo de futebol ficava no recinto do quartel, pelo que organizávamos muitos jogos que nos mantinham ocupados e davam boa disposição.
Era intenção da Companhia proporcionar-nos restabelecimento rápido de algum cansaço que surgisse, com a visita a uma praia (Ofir) que,  segundo o Comandante,  nos auxiliava na preparação para o combate.
Na realidade apenas nos deram autorização para nos deslocarmos uma única vez a Ofir para “irmos conhecer” a praia. Dado o pouco tempo que nos foi determinado, e por ninguém estar cansado,  julgo eu, ninguém foi preparado para ir tomar banho, nem sequer deu para passear pela praia, ficando-se apenas com a vista.

Praia de Ofir


Visita praia de Ofir: Furs. Parreira; Cruz; Passos; Tavares; Vira; Almeida; Venda; uma criança local, Bragança e Alcides. Em cima: condutor, Fur. Caldas; ? ; Fur. Prates e 3 camaradas

O pouco tempo de permanência não nos permitiu que se verificassem grandes resultados na acção psicológica junto das populações, mas pode-se dizer que os naturais sentiram a saída de uma das primeiras Companhias junto deles, que os apoiou e ao mesmo tempo lhes garantia a segurança numa altura em que o IN que se encontrava tão próximo lhes podia atraiçoar as intenções de paz.

Bolama, “capital” do Arquipélago dos Bijagós,  é composta por vários edifícios de 1º andar, brancos, compridos com longos varandins, com um imenso jardim ao centro e comércio estendendo-se por toda a área.

A igreja situava-se nas traseiras do quartel , ao lado da residência do administrador. Nas proximidades da igreja ficava a escola primária. Havia ainda o liceu,  só para raparigas, onde estudavam as futuras professoras.
Os locais mais frequentados pelos militares, onde se tomava café e bebia cerveja,  ficavam junto ao cais e eram o restaurante do Zeca Azevedo e o bar do Ti Augusto, este devido às duas sobrinhas bonitas e simpáticas que com ele trabalhavam.
A ilha tem vegetação tropical, palmares, imbondeiros seculares, extensos matagais de tarrafo (arbustos duros e baixos). Existem muitos pássaros, cobras venenosas (muitas cospem o veneno para os olhos das vítimas) e um lagarto enorme com cerca de 2 metros a que dão o nome de linguana.

O Administrador de Bolama era o guineense Jorge Garcia de Carvalho que estudou no Liceu Sá de Miranda,  em Braga.

Palácio de Bolama (sede da antiga Câmara Municipal)

Tinha um Hospital, onde um dos médicos era o Dr. Apresentação Fernandes, natural de Goa. Existia também o Parque Infantil do Jardim Teixeira Pinto, o Jardim Honório Barreto, com a Piscina Municipal ao lado.



Neste dia de Outubro o periquito foi visitar uma morança, e pelo sim pelo não de arma na mão


Arredores de Bolama

Monumento a Ulisses Grant (antigo Presidente dos EUA)
(O Monumento foi erigido em 1955 no espaço fronteiro aos Paços do Concelho de Bolama, é da autoria do escultor Manuel Pereira da Silva, natural do lugar das Portelas, Vila Nova de Gaia).
Nos primeiros três séculos após o descobrimento, a ilha de Bolama não suscitou a fixação dos portugueses que se limitaram à extracção de madeiras. Só em 1753 o capitão-mor Francisco Roque Sotto Maior assentou na ilha de Bolama um padrão com as armas de Portugal.

A questão de Bolama
O capitão da marinha inglesa Philip Beaver, seduzido pela descrição de Bolama, constitui uma sociedade para estabelecer em África uma colónia de gente livre “(...) como meio de civilizar os negros (...)” (1); para atingir o seu objectivo desembarcou 275 colonos britânicos em Bolama, no ano de 1792, vindo a abandoná-la dezasseis meses mais tarde.
Posteriormente, a Inglaterra, prevendo a incapacidade de Portugal dominar o território (apesar de saber que o Régulo de Serra Leoa lha tinha dado em 1753), não hesitou em tomar posse da Ilha, tanto em 1814 como em 1827.
É neste contexto que, em 1827, Sir Neil Campbell, Governador das possessões inglesas na África Ocidental, impõe aos régulos de Bolola e Guinala dois tratados para a cedência: um de Guinala e outro da ilha de Bolama e respectivas ilhas adjacentes.
A Inglaterra surge assim com pretensões à posse de Bolama, fundamentadas em acordos e aquisições feitas por Beaver (1792).
O 1º Tenente Francisco Muacho, Governador de Bissau em 1828, conhecedor das intenções inglesas, conseguiu negociar com os reis de Canhabaque e com os Beafadas, a cessão da Ilha à Coroa de Portugal e no ano seguinte, o Coronel de milícias Joaquim de Matos obtinha, por sua vez, do régulo dos Bijagós a cedência da ilha das Galinhas.
No ano de 1835, com a criação do cargo de Governador Geral, com todos os poderes civis e militares, a Guiné passou a constituir um distrito destacado da Província de Cabo Verde.
Em 5 de Novembro de 1836, o Governador da Província, Coronel Joaquim Marinho, num relatório, referia igualmente as intenções dos países vizinhos, face ao território:
“Na Guiné nem a nossa bandeira nem as nossas fortalezas eram respeitadas pelos estrangeiros (...), a ocupação de Casamansa, de Bissau e de Bolama eram sonho dourado dos nossos ambiciosos vizinhos (...) a permanência constante de vazos de guerra ingleses (e franceses) na Guiné, espreitando o momento próprio para dar o assalto (...) onde era efectiva já a nossa ocupação, demonstra a evidência que estes dois países França e Inglaterra estavam combinados a repartirem entre si aquele rico torrão”.
Várias foram as tentativas estrangeiras, nomeadamente britânicas, de intervir a cada passo na Guiné, fazendo, entre 1838 a 1869, larga ostentação de poderio naval nas respectivas águas.
De todas essas tentativas consideramos que as mais graves ocorreram em 1859 e em 1861, quando o Governador da Serra Leoa mandou arvorar a sua bandeira em Bolama e quando os Ingleses consideraram a Ilha parte integrante da colónia de Serra Leoa, respectivamente.
Portugal reagiu, apresentando uma proposta para que a Inglaterra desistisse das suas pretensões ou, então, poder-se-ia recorrer a arbitra
gem. A Inglaterra, como já se tinha estabelecido na Ilha, não só recusou a proposta, como ainda, desencadeou violentas pressões e ataques armados à colónia do Rio Grande.
Como resposta, o Governo de Cabo Verde decidiu libertar do domínio inglês a ilha de Bolama; fê-lo pela força e sem esperar ordens do Governo Central.
Razão para a existência do monumento em Bolama:
Perante este acontecimento, a Inglaterra não protestou e resolveu aceitar a proposta anterior, tendo sido designado para árbitro o Presidente dos Estados Unidos da América, Ulisses Grant, que, no dia 21 de Abril de 1870, proferiu a Sentença, atribuindo a Portugal plena razão, tendo por fundamento a descoberta da Ilha e do “(...) território fronteiriço na terra firme (...) por um navegador português em 1446 (...)”, pela ocupação de “(...) toda a costa na terra firme defronte da Ilha (...)” (3) e pela da própria Ilha.
As intenções inglesas não se reduziam a Bolama. Sá da Bandeira, no seu livro “O tráfico da escravatura e o Bill de Palmerston”, escreve que Lord Palmerston recebera um relatório, em 1836, onde era apresentada uma proposta útil para reduzir o tráfico da escravatura e promover o comércio britânico, baseada na ocupação imediata das colónias portuguesas ao norte do Equador, entre as quais Bissau e Cacheu.
A França, por seu lado, celebrou com a Inglaterra, em 1845, uma Convenção para assegurar a completa supressão do tráfico da escravatura, na qual se previa a fiscalização das águas das costas orientais e ocidentais da África, desde Cabo Verde até 16 graus e 30 minutos de latitude meridional, tendo o Governo Português aceite a referida Convenção, a coberto da qual era inegável a ocupação pela força de toda a Guiné, sem que Portugal tivesse direito a reclamar.
Com a sentença arbitral, referente à ilha de Bolama, a “(...) fronteira sudoeste estava, pois, demarcada; as restantes acabaram por ser delimitadas com a França (...)”.
A 18 de Março de 1879, o território é proclamado “Província da Guiné”, passando a sua administração a ser independente de Cabo Verde, e sendo a capital da nova Província estabelecida em Bolama. (Fonte:. Francisco Proença de Garcia).
A povoação de Bissau foi elevada a vila em 1859 e a cidade em 1914, passando, em 9 de Dezembro de 1941, Bissau a ser a capital da Guiné Portuguesa. Esta mudança de capitais tornou-se necessária devido,  entre outras dificuldades,  à falta de água potável em Bolama.

Edifício utilizado na altura em que Bolama era a capital


Estátua Honório Pereira Barreto
(É de destacar nesta época a figura do Guineense Honório Pereira Barreto, provedor do Cacheu em 1834, o qual teve uma acção notável à frente do governo da Guiné)

Os três furriéis lisboetas da Companhia
Expressões artísticas
Os Bijagós dançam dois motivos que lhes são peculiares: A dança do “Vaca Bruto” e do “Peixe Verga” sinónimo de tubarão. As classes de idades que intervinham na dança era “cabaró” e “canhocame”.

Vaca Bruto é a Máscara mais divulgada. Muito frequente nas festividades, representa uma cabeça de boi. É talhada em madeira, com chifres autênticos, olhos de fundos de garrafa. Há máscaras que representam ainda tubarões, porcos, hipopótamos e outros animais.

Peixe Verga – A dança do tubarão-martelo
Cabaro são os jovens dos 18-27. Período de liberdade, festas, danças e conquistas amorosas. Algum trabalho regular (limpar os caminhos da aldeia e participar em todos os trabalhos que exigem boa condição física e capacidades), apoio às actividades agrícolas e à produção do óleo de palma.

Canhocám são os adolescentes dos 12-17. Participação nas actividades produtivas. Subir às palmeiras, artesanato e iniciação às regras sociais (segredos das plantas).
Guarda da aldeia.
As espécies utilizadas para alimentação e muito apreciadas são as gazelas e os gansos do mato.


Armado de máquina fotográfica numa rua de Bolama

Convívio entre homens “grandes”

Hotel


Com duas africanas seus bébés e camaradas
História da Imprensa da Guiné:

A Imprensa Nacional da Guiné,  a mais importante da Província,  tinha uma escola de artes gráficas onde trabalhava há 34 anos o linotipista Macedo.

O primeiro jornal da Província, propriedade de Francisco Veiga, que acumulava o cargo de editor e redactor principal, tinha o título Pró Guiné , orgão do partido republicano português, era impresso e composto na Imprensa Nacional de Bolama, mas com redacção e administração em Bissau. A publicação não ultrapassou a dezena de números.

No ano de 1930,  Manuel Pereira Manso montou uma tipografia em Bissau, e assim apareceu um novo jornal, Comércio da Guiné,  tendo como director, redactor e administrador, o Engº. Júlio Carlos de Faria e Lapa, Honório Sampaio e Artur Nunes Tiago, respectivamente.
O seu último número, o 20 do jornal, ocorreu em 18 de Abril de 1931, coincidindo com o movimento insurreccional, no qual o corpo director tomara parte activa.
Entretanto havia publicações efémeras, como o número único 15 de Agosto,  da Missão Católica de Bolama,  dirigido pelo Cónego Miranda de Magalhães e datado de 1932.

Nesse mesmo ano a polícia de Bolama editava o número único 5 de Outubro,  com o noticiário das cerimónias realizadas naquela data.

Em 1938 o Sport Lisboa e Bolama publicava outro número único que para lá do noticiário desportivo inseria um artigo do Padre A. J. Dias com uma resenha histórica da Ilha.

Noutro número único está Guiné Agrária,  publicado quando o Governador Viegas foi agraciado com a Legião de Honra.

Até que em 17 de Dezembro de 1947, tendo como director o Padre Afonso Simões, surgiu o Arauto,  tendo como divisa Dilatando a fé e o império.
Neste ano de 1964 a tiragem andava à volta de dois mil exemplares. Era dirigido pelo franciscano José Maria da Cruz, auxiliado por outros padres franciscanos.
Tinha um noticiário actualizado que a Onda Curta da Emissora Nacional enviava para o Ultramar

Foram extintos, o Boletim Cultural que era publicado irregularmente, bem como os Ecos da Guiné, a Voz Académica e o Bolamense.
Assim, O Arauto era o único jornal diário que então se publicava  na Guiné.

Além do O Arauto neste ano de 1964, existia o jornal dos alunos da Escola Industrial e Comercial de Bissau, Terra Ardente , o Sempre em Frente (do exército) e o Mantanhas do BCaç 507, sediado em Bula, do Ten Cor Hélio Felgas.
Em 3 de Novembro de 1964, foi executada a primeira missão na Ilha de Bolama, já que chegara ao Comando do Agrupamento 17 a notícia de que foram ouvidos tiros suspeitos no campo de aviação de Lala, situado a 6,7 kms da cidade.

Saiu de imediato o 3º. Grupo de Combate que se encontrava de piquete, e em “batida em linha” ao local não reconheceu a presença de qualquer elemento IN, mas sim de caçadores da população.

Tendo chegado a Bolama tive contacto pela primeira vez com algumas notas e moedas que circulavam na Guiné: Notas de 50$00; 100$00; 500$00 e 1.000$00; Moedas de 5, 10, 20, e 50 centavos, 1$00, 2$50, 5$00, 10$00 e 20$00.

O 1º. Sgto. Maurício Clemente pagou-me 2.490$00 (de D. Port.?) e 800$00 (Econ.?) não me tendo explicado a que se devia, penso eu, daí o motivo das minhas dúvidas...



Curiosidades postais:
1) A primeira emissão, conhecida por "Guiné Grande" designação que se deve à sobrecarga Guiné em letras grandes aplicada nos selos de Cabo Verde , foi segundo John Marsden, comerciante e filatelista britânico, que viveu na Guiné pelo menos desde 1881 até 1885,  emitida no dia 1 de Abril de 1881; nos arquivos da Casa da Moeda de Lisboa, consta que uma primeira remessa com selos de 25, 50 e 100 Réis, e já sobrecarregados, fora enviada para a Guiné em 6 de Outubro de 1879. Estes selos chegaram à Guiné em fins de Novembro desse ano 1879.
O Sr. Pedro Inácio Gouveiã declarou que fora ele quem,  por meados de 1882, tendo faltado em Bolama selos de várias taxas dos de sobrecarga GUINÉ em grandes caracteres, mandara sobrecarregar com a mesma palavra, em caracteres mais pequenos, na imprensa do Governo da Província alguns selos de Cabo Verde que existiam em cofre, ainda do tempo em que a Guiné não era província autónoma".
Estamos assim perante a 24 emissão de selos da Guiné, os chamados "Guiné Pequena".
Nesse ano e com data de 2 de Maio de 1885 publica no Boletim Oficial uma notícia de despedida, anunciando a sua partida para Lisboa. É também a partir de meados de 1885, que se conhecem as famosas cartas com os Guiné Pequenas, dirigidos a Marsden, em Lisboa.
Da terceira emissão da Guiné (com as novas cores), sabemos que os primeiros selos foram enviados para Bolama no dia 18 de Agosto de 1885, sendo a remessa constituída pelas taxas de 10, 25 e 50 réis, as restantes taxas tendo sido posteriormente remetidas.

2) Nos anos de 1908 e 1909 na Estação Postal de Bissau havia falta de inteiros postais (selo impresso sobre uma banda de papel, um sobrescrito ou bilhete postal) o que causava grande transtorno aos habitantes, pois que na falta deles e principalmente os de 10 reis destinados ao serviço interno, não lhes deixava outra alternativa senão enviar uma carta cujo porte era de 25 reis, por muito pequena que fosse a mensagem a enviar.
Tal situação era extremamente lesiva aos interesses da população, mas muito lucrativa à estação postal de Bissau que assim aumentava as suas receitas.
Os custos inerentes ao transporte e distribuição de um inteiro postal eram os mesmos que os de uma carta, porém em vez de arrecadarem como receita 10 reis dos inteiros postais acabavam por arrecadar 25 reis equivalentes ao porte da carta.
Havia portanto uma mais-valis de 15 reis, o que na época era significativo.
Cansado desta situação o cidadão António Neves de Castro Júnior, farmaceutico, resolveu criar os seus inteiros postais particulares.
Não havendo papel cartolina, recorre a papel almaço e corta uma pequena folha de 14 x 9 cms e faz desse pedaço de papel um presumível inteiro postal.
Na frente afixou um selo de 10 reis da emissão de D. Carlos I no canto superior esquerdo, ao centro a legenda manuscrita “Bilhete Postal” assim como o endereço do destinatário Carlos Costa Carvalho, farmacêutico em Bolama.

Na frente do pseudo-inteiro postal aparece uma alimária (asno) com uma insignificante e envergonhada genitália exposta, apelidada pelo funcionalismo como “Appendice Immoral”.

Texto do postal : 

"Como sabes há tempos illustrei um postal da collecção deste que vae juncto, com uma lua cheia, para o Campos e aqui não aceitaram porque podia offender alguém! O que tive que a mandar dentro da tua carta. Vae agora este (ou por outra não sei se irá porque talvez o correio o achem offensivo também) para começares a tua colecção e para os teus amigos saberem em que estado está a repartição dos correios; ora como não estou para gastar 25 rs e não quero ser explorado, pois há já 2 anos quando aqui estive, não havia postaes, eis o motivo porque me sirvo d`este bocado de papel.
"Para outro postal te explicarei as misérias que n´este correio há e que eu tenho notado.
"Peço-te que me mandes na volta da canhoeira o condensador, encomenda do enfermeiro. E do Campos o preço das ampolas".
Este inteiro foi presente ao balcão da estação postal de Bissau que a aceitou, não tendo o funcionário de serviço feito qualquer reparo, obliterando-o com a marca de dia da estação (Estação Postal/Bissau/-3SET09.
No entanto o chefe da estação postal de Bissau não se conforma e remete-o por ofício, que a seguir se transcreve, à Repartição Superior dos Correios para apreciação.
Estação Postal de Bissau – Nº. 153 – Série 1909
Urgentissimo, Bissau 3 de Setembro de 1909.
À Repartição Superior dos Correios da Guiné em Bolama.
Da estação postal de Bissau Julgando o signatário melindroso o presente bilhete-postal para os empregados do quadro a que pertence visto que os correios não têm culpa de não possuirem bilhetes, porque este serviço pertence à Repartição de Fazenda, deixa ao alto critério de S.Exa. o Director a apreciação do referido bilhete. O Chefe (ass) Alfredo Nunes de Carvalho.

Em resposta a 10Set1909, a Repartição Superior dos Correios em Bolama não se pronuncia sobre a validade ou não do bilhete-postal, mas convida a estação a requisitar os inteiros postais de que carecia, uma vez que existiam aos milhares no cofre central (aut. Elder Manuel Pinto Correia).

A história postal das nossas ex-Províncias está recheada de muitos casos semelhantes, com contornos pitorescos e hilariantes.
Documentos históricos sobre Bolama


A colecção de livros sobre Bolama dos Arquivos Históricos Nacionais da Guiné-Bissau consiste em cerca de 80 mil; estes documentos foram primeiro registados em fins de 1980.
Inicialmente foram arquivados em 279 caixas. Os documentos que se encontravam em salas abandonadas e degradadas foram transferidos da Câmara de Bolama, pelo seu Director e o respectivo pessoal, para os Arquivos de Bissau em 1988. Antes dessa data, o arquivista ou historiador Guineense provàvelmente nunca mexeu no material.
Inclui todos os documentos da administração pública que foram encontrada em Bolama em 1988. Cobre o período de Bolama, como capital (1879 a 1941), sendo alguns documentos relativos a 1870, e outras secções continuam até 1960.
Esta colecção foi duramente afectada pela guerra de 1998/99. O primeiro registo foi completado em 1990 e foi publicado como Catálogo Sumário.
Uma renovação física dos Arquivos Históricos Nacionais no INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa) teve lugar em 2007 e 2008.

Só agora, uma década depois da guerra é que foram providenciadas condições de tratamento e armanezamento dos documentos.
Das originais 279 caixas apenas foram encontradas 85 intactas depois do conflito militar,que podiam ser reconstituídas. As restantes encontram-se misturadas, particularmente os documentos não tratados referentes às autoridades alfandegárias de Bolama.
Cerca de 10% podem-se perder. Aproximadamente 50% da colecção está em condições aceitáveis. Estes documentos estão legíveis e depois de algumas medidas de preparação,podem ser digitalizados sem problemas. Outros 25% da colecção podem ser abertos mas têm bolor.
A salvação desta parte só será possível com um intervenção rápida e subsequente digitalização. Cerca de 15% está em muito más condições.
Só depois de mais análises sobre este projecto e depois de um relatório detalhado se poderá concluir do estado de conservação e valor histórico. Não se pode tocar noutros 10% da colecção pois o papel está a desfazer-se.
Em Janeiro de 2009 foram feitas mais pesquisas em Bolama e foram encontrados mais documentos do período colonial da Ilha, mas encontram-se seriamente vulneráveis à deterioração.
Outros documentos relevantes do Tribunal de Bolama estão arquivados nos imensos e desorganizados arquivos do Ministério da Justiça em Bissau, também em condições alarmantes, devido aos arquivos estarem no sotão do velho Palácio da Justiça com o telhado em péssimas condições.
A colecção de Bolama é de alto valor histórico. Reflete a troca fundamental do regime colonial português da administração “externa” (dirigida das Ilhas de Cabo Verde) a presença política e significativa de Portugal e a penetração económica da Guiné continental.
Nesta fase prometedora da investigação histórica podem ser identificados cinco fases:
1) Laços de comércio externo e relações económicas, vinculados a Portugal; documentos do porto de Bolama, um dos dois mais importantes portos antes de 1941; e autoridades alfandegárias;
2) Documentos relacionados com a campanha de pacificação; os Guineenses continentais foram conquistados em 1915; enquanto os da Ilha dos Bijagós continuaram a resistir até 1936;
3) Estatuto dos “indígenas” e o desenvolvimento das leis racistas, documentos da Administração Pública de Bolama;
4) Organização da administração Portuguesa; funções internas e relações entre o centro de Bolama e os postos da Guiné continental;
5) Personalidades dominantes Luso-Africanas no cruzamento da história pessoal e nacional.
Para tratamento e armazenamento seguro, os documentos da Ilha de Bolama e do Ministério da Justiça serão transportados para os Arquivos Históricos Nacionais do INEP.
O edifício dos Arquivos foram renovados em 2007-2008 e oferecem agora um melhoramento notável com facilidades de armazenamento, bem como com funcionários treinados em examinar cuidadosamente os materiais arquivados.
O Arquivo e o pessoal suplementar serão treinados ainda mais nas técnicas de digitilização e nos aspectos básicos das análises históricas necessário para melhor compreensão dos documentos da colecção de Bolama.
Depois da reorganização e análises preliminares da colecção completa de Bolama no que respeita ao estado de conservação e ao valor histórico será desenvolvido no futuro um maior projecto de investigação.

(continua)

Um abraço de amizade para todos,
João Parreira
Fur Mil Op Esp / RANGER / COMANDO da CART 730 / BART 733



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Notas de JP:
History of Bolama, the first capital of Portuguese Guinea (1879-1941), as reflected in the Guinean National Historical Archives.  Dra. Birgit Embaló, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa 2009 award – pilot project - £9,900 for 6 months 

Período de 11 a 23 Nov64 – A CArt 730 ocupou o “Bivaque” de BIRONQUE

 
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Nota de MR:

Guiné 63/74 - P7110: Parabéns a você (163): Eduardo Campos, ex-1.º Cabo TRMS da CCAÇ 4540 (Editores e Miguel & Giselda Pessoa)

Postal ilustrado:  Miguel Pessoa (2010).

Com direito a um lindíssmo e alusivo postal ilustrado que lhe foi dedicado pelos nossos Camaradas Miguel e Giselda Pessoa, completa hoje, dia 11 de Outubro de 2010, 60 anos o nosso camarada Eduardo Campos, que foi 1.º Cabo Trms da CCAÇ 4540, e andou pelo Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, entre 1972 e 1974.

Assim, ao Eduardo, que está connosco nesta Tabanca Grande desde 19 de Abril de 2008 e já nos demonstrou, em várias oportunidades, que é um bom e amigável Camarada, vimos apresentar neste blogue, os maiores e melhores votos de felicidades, alegria e muita saúde num dia que vai ser com certeza diferente e muito especial, junto da sua querida família e amigos.

Mais desejamos que esta data se repita por muitos e bons anos.

Eduardo Campos e o seu cunhado José Casimiro Carvalho (CCAV 8350,  “Piratas de Guileje”)
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Nota de M.R.:

domingo, 10 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7109: Historiografia da presença portuguesa em África (38): António da Silva Gouveia, fundador da Casa Gouveia, republicano, representante da colónia na Câmara dos Deputados, na 1ª legislatura (1911-1915) (Parte II) (Carlos Cordeiro)




 A Província da Guiné foi criada em 1879, depois de separação administrativa de Cabo Verde. A capital foi instalada em Bolama, até 1941. Em 1903 o Banco Nacional Ultramarino inaugurava a sua agência em Bolama. A cidade começou a ter alguns belos edifícios de traça colonial, mas ainda em 1912 faltava um cais acostável... A falta de infra-estrtuturas portuárias (tanto em Bolama como em Bissau) é aqui evocada pelo deputado republicano António Silva Gouveia, um típico africanista do Séc. XIX que se instalou em Bolama justamente em 1879 e aqui criou a maior empresa daquela colónia africana, a Casa Gouveia (mais tarde, em 1921, adquirida pela CUF - Companhia União Fabril). 

De 1911 a 1915, António Silva Gouveia teve assento na Câmara dos Deputados, como representante da Província. Este homem, de que se desconhecem muitos aspectos da sua vida, e que antes de ser empresário e político, foi  "moço e marinheiro, piloto e capitão de navios", orgulhando-se de conhecer toda a África, ocidental e orienta, mereceria muito provavelmente uma boa história, uma boa biografia, um bom filme... Não sabemos onde nasceu nem onde morreu. Fazia gala de dizer que era "um homem que não tinha o exame de instrução primária" e que acreditava na "iniciativa privada", vociferando contra o estado (lastimável) em que se encontrava a província no início do Séc. XX.


Freixo de Espada à Cinta > 13 de Março de 2010 > Lápide assinalando o local do nascimento de Manuel Maria Sarmento Rodrigues (1899-1979), que foi Governador da Guiné na segunda metade na década de 1940.

Foto: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.

Ainda a propósito de Bolama, é bom recordar que a ilha era conhecida dos navegadores portugueses, desde 1460, mas só em 1753 foi ali colocada um padrão com as armas portuguesas.  Em Maio de 1792, foi estabelecida na ilha uma colónia inglesa, um comunidade  de menos de 300 pessoas, chefiadas por Philip Beaver (1766-1813),  depois de negociação com os régulos beafadas e bijagós que sempre disputaram o controlo daquele território...   Em 1794 os últimos colonos europeus abandonavam a ilha. A grande maioria tinha sucumbido às doenças e aos ataques dos  beafadas e dos bijagós... 

 Em 1823, os portugueses estabelecem um posto militar em Bolama, mas a posse do território passa a ser objecto de disputa com o Governo Inglês. Há inclusivamente ataques militares às instalações portuguesas por parte dos nossos velhos aliados. Em 1860 os ingleses anexam a ilha ao território da Serra Leoa. Finalmente, Portugal e a Inglaterra concordam em submeter o litígio à arbitragem do Presidente dos Estados Unidos, o Gen Ulysses Grant que, em 21 de Abril de 1870, toma uma decisão favorável à causa portuguesa. 

Em 1879 Bolama volta a ser a capital da Guiné. Bissau já existia desde 1687, como praça fortificada e centro de comércio, mas teve igualmente uma história atribulada (e trágica): basta referir que só em 1913 (!) a ilha de Bissau foi finalmente "pacificada", por Teixeira Pinto, o "capitão-diabo"... Em 1914 foi elevada á categoria de cidade, mas o seu desenvolvimento vai acontevcer sobretudo depois da II Guerra Mundial, graças à acção do Governador Manuel Maria Sarmento Rodrigues (Freixo de Espada à Cinta, 1899- Lisboa,1979). (L.G.).

Imagens: Do blogue BNU - Banco Nacional Ultramarino (2010) (Com a devida vénia...)











Lisboa > Diário da Câmara dos Deputados >  Intervenção,  antes da ordem do dia, do representante da Guiné, António Silva Gouveia,  fundador da  Casa Gouveia, com sede em Bolama >  Sessão nº 70, de 11 de Março de 1912.



1. Continuação da publicação de excertos de intervenções do deputado António Silva Gouveia, representante da Guiné na Câmara dos Deputados, na legislatura de 1911-1915. Pesquisa de  Carlos Cordeiro, membro da nossa Tabanca Grande, Professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, São Miguel, RAA (foto à esquerda). 
[Continua]

[ Revisão / fixação de texto / título / edição de imagens: L.G.]
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Nota de L.G.:

Guiné 63/74 - P7108: Lembrando Vicente Passarinho (Piu), Fur Mil da CCAÇ 3520 (Augusto Silva Santos)

1. Mensagem de Augusto Silva Santos*, ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73, com data de 9 de Outubro de 2010:

Camarada Carlos Vinhal
Nas minhas deambulações pelo blogue (curiosidade de "periquito"), tomei infelizmente conhecimento através dos depoimentos do Daniel Matos, do falecimento de um amigo comum, mais propriamente do Vicente "Piu" (Fur Mil da CCAÇ 3520 / Cacine), que nos meus tempos de recruta / especialidade que passámos juntos, era mais conhecido pelo "Passarinho".

Também eu gostaria de prestar uma pequena mas merecida homenagem àquele que nos proporcionou, pela sua boa disposição permanente, tãos bons momentos de amizade e sã camaradagem. Aproveito também a oportunidade para me "reencontrar" com o Daniel Matos, a quem envio aquele abraço.
Deixo à v/consideração a possível publicação.

Um Abraço
Augusto D. Silva Santos


Pequena Homenagem ao Vicente Passarinho (Piu)

Por Augusto Silva Santos

Sendo um recente membro da Tabanca Grande (adesão em 29SET2010/CCAÇ 3306 - P7051) e, tendo agora mais algum tempo disponível, vou aproveitando, sempre que possível, para consultar vários depoimentos de ex-camaradas e, eis que dou de caras (como se costuma dizer), com algo que me sensibilizou bastante.

Primeiro porque fui “encontrar” um ex-camarada de recruta e especialidade, respectivamente em Santarém e Tavira, e agora grande colaborador deste blogue, mais precisamente o Daniel Matos, a quem desde já aproveito para enviar um grande e sentido abraço. Depois, porque vim a ter uma notícia menos agradável. Sei agora Daniel pelo teus depoimentos, que afinal acabámos por também estar os três (já vais perceber o que isto significa) ao mesmo tempo na Guiné, embora em regiões e situações diferentes.

Em Guiné 63/74 – P6211: In memoriam (40): Pequena Homenagem ao Piu, da CCAÇ 3520/Cacine (Daniel Matos), prestas homenagem ao ex-camarada e grande amigo, o Vicente, infelizmente já falecido (que descanse em paz). Em determinada parte desta tua homenagem revelas que já não te lembras bem onde o conheceste, pois eu recordo-te e confirmo que nos conhecemos precisamente no Destacamento (que já não existe) da Escola Prática de Cavalaria em Santarém, onde tirámos a recruta, conforme podes constatar pela foto em anexo (espero que gostes desta recordação).

Passados quase 40 anos não se torna fácil identificar a maioria do pessoal, mas lembro-me perfeitamente de ti, do Vicente “Passarinho” (era assim que na altura era conhecido o grande caçador do Entroncamento), e do Coelho, que embarcou para a Guiné no mesmo dia que eu (28Dez1971), em rendição individual. Pertencemos ao 1.º Turno 71 , 5.º Esquadrão / 5.º Pelotão. No verso da foto datada de Feverereiro 1971, e rubricada por todos os elementos, podes observar a tua rubrica / dedicatória e a do Vicente “Passarinho”, que mais tarde pelos vistos se tornou em “Piu”. É natural que assim tenha acontecido, pois recordo-me perfeitamente de quando ele emitava o piar de um pássaro e depois simulava um tiro. Mais tarde rumámos os três ao Sul, mais precisamente ao CISMI / Tavira, onde igualmente tirámos a especialidade. Aqui, eu e o Vicente fomos mesmo companheiros de camarata e de beliche lado a lado, pelo que podes imaginar as partidas e as situações mais insólitas que se nos deparavam através desse nosso grande amigo (junto igualmente foto desses tempos, Abril 1971).

Pelos vossos depoimentos (teu e do Juvenal Candeias), é fácil concluir que a situação felizmente se prolongou pelos tempos. Era de facto um “fenómeno” de companheirismo e boa disposição. Da vossa faceta musical recordo-me, mas vagamente, porque enquanto vocês “gastavam” o vosso tempo livre nessas andanças, eu aproveitava os fins-de-semana para vir a casa. Quis o destino que mais tarde rumássemos à Guiné, daí este reencontro.


Aqui fica também a minha simples mas sincera homenagem ao Vicente Passarinho (Piu).
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 4 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7079: Operação Vadiagem e Ventana, executada pela CCAÇ 3306/BCAÇ3833 (Augusto Silva Santos)

Guiné 63/74 - P7107: Historiografia da presença portuguesa em África (37): António da Silva Gouveia, fundador da Casa Gouveia, republicano, representante da colónia na Câmara dos Deputados, na 1ª legislatura (1911-1915) (Parte I) (Carlos Cordeiro)


Guiné-Bissau > Bissau > Agosto de 2004 > Ex-Casa Gouveia, com o Rio Geba ao fundo  > Foto do Rui, membro habitual da Expedição anual à Guiné-Bissau, organizada pela Associação Humanitária Memórias e Gentes, de Coimbra, e de que é presidente da direcção o nosso camarada  José Moreira (Ex-Fur Mil da CCaç 1565, 1966/68).


Fonte: Picasa > Galeria do Rui (2008). (Com a devida vénia...)













Lisboa > Câmara dos Deputados >  Excertos de um debate parlamentar em que intervem o representante da Guiné, o deputado António Silva Gouveia, fundador da  Casa Gouveia, com sede em Bolama >  Sessão nº 18, de 26 de Dezembro de 1911 > (...)

(...)O Orador: - O Sr. José Barbosa disse, e muito bem, que nós estamos num estado de atrasamento impossível em toda a costa de África. Eu tenho a felicidade de conhecer toda a África, ocidental e oriental, fui moço e marinheiro, piloto e capitão de navios; só não fui menino de coro. Em Conakri, em 1893 nem uma casa existia, hoje é uma cidade de 1.ª ordem. Bolama [, sede de concelho em 1871, elevada à categoria de cidade em 1913, capital da província até 1941,] 
está mais atrasada do que quando fui para lá em 1879. Do que lá há feito, não quero elogios, mas quero que a Câmara o fique sabendo, é feito por este seu criado. Não imaginam os ódios e rivalidades a que isto tem dado lugar, porque sou português.

Em Bolama não há um relógio que marque as horas oficiais. Sabem V. Exas. qual é o relógio? É uma barra de ferro, a essa barra de ferro chega o soldado e bate, pim, pim, pim; e são assim conhecidas as horas oficiais!

Mas eu não quero desviar-me da questão que desejo tratar. V. Exa. sabe qual é a despesa no orçamento da Guiné? 160:000$000 réis (#)  para o elemento militar, mas não tem soldados; tem mais oficiais do que soldados.

O Boletim Oficial que agora saiu traz posturas municipais que não existem nem em Paris, nem em Lisboa.

Eu quero mostrar à Câmara o seguinte: como disse aqui o Sr. José Barbosa, a Guiné é tão rica, tão produtiva, que o gentio da Guiné trabalha só o suficiente para se embebedar, porque ele tem tudo, tem a banana, a papaia, o caju, tudo o que a terra lhe dá; é um gentio que se faz dele o que se quer; mau só ali há o gentio papel, mas, mesmo esse, sabendo-o levar, com facilidade se amolda. (...).

1. Texto de Carlos Cordeiro, membro da nossa Tabanca, Professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, São Miguel, RAA (foto à direita)

Camaradas e amigos,

Em comentário ao P7083 sobre o ciclo de conferências “A República e as Colónias”, o Luís chamou a atenção para o facto de “a historiografia da nossa presença na Guiné-Bissau parece[r] passar muito ao lado d[aquele] ciclo de conferências”.

Como, por afazeres da minha vida profissional, sou habitual visitante do site da Assembleia da República para consulta dos debates parlamentares* do século XIX e primeira metade do XX, fui lá verificar o que havia sobre a Guiné no período da I República. 

Há muitos diários da Câmara dos Deputados (e também do Senado) em que aparece a palavra “Guiné”. Enviei, como curiosidade, alguns ao Luís, que – sempre persuasivo – me respondeu que seria interessante publicar algumas das intervenções, com pequenas notas de enquadramento. Acedi com gosto. É deste compromisso que estou a tentar desenvencilhar-me.

Algumas notas prévias:

(i) A história da Guiné nunca fez parte das minhas preocupações de investigação. Portanto, não poderei apresentar aqui o conveniente enquadramento histórico.

(ii) Não fiz investigação para o contextualizar as intervenções. Seria importante, por exemplo, pesquisar a documentação da AR [, Assembleia da República,] sobre as eleições de 1911 na Guiné, já que não encontrei nada publicado sobre o assunto (o que não quer dizer que não exista).

(iii) Alguns “panos de fundo” resultam da leitura e interpretação pessoal de diversos debates sobre questões da Guiné. Achei desnecessário apresentar a lista de todos os Diários consultados, até porque estão disponíveis online.

(iv) Para não dificultar a edição, optei por colocar entre parêntesis a data dos Diários da Câmara dos Deputados, (DCD) sempre que tal se justifique.

A 15 de Junho 1911 tiveram início os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte. Depois de intenso debate, a “Constituição Política da República Portuguesa” seria aprovada em 21 de Agosto do mesmo ano, dando-se por findos os trabalhos da Assembleia em 25 do mesmo mês.

Por dificuldades de comunicações e, por na Guiné se ter verificado um surto de febre-amarela (DCD 31/7/1911) (***), a Guiné não esteve representada na Constituinte, o que não deixaria de ser criticado por alguns deputados (DCD 5/7/1911; 24/7/1911; 31/7/1911; 1/8/1911).

Os deputados da Assembleia Nacional Constituinte dividiram-se em dois grupos: para o Senado transitaram 71 deputados; para a Câmara dos deputados, cerca de 160. Os trabalhos da Câmara dos deputados tiveram início logo a 26 de Agosto. O deputado pela Guiné iria, então, participar na Câmara dos Deputados, mas só a partir de 2 de Dezembro de 1911 (DCD 2/12/1911), ou seja, quase meio ano após o início dos trabalhos da Constituinte.
O deputado era, nem mais nem menos, António Silva Gouveia (**), o proprietário da famosa Casa Gouveia (##). 

Como se poderá ver pela sua intervenção (a primeira que fez no parlamento), terá sido uma espécie de aventureiro – só não foi “menino de coro” – com instrução rudimentar, e que enriqueceu não se sabe (não sei, melhor dizendo) bem como.

Sabe-se também, por outras intervenções que fez, que andava por África (e não só pela Guiné) havia mais de quarenta anos, que já em 1911 tinha negócios com a CUF, que foi um dos fundadores (1912) do Partido Republicano Evolucionista, de António José de Almeida, assumindo o lugar de tesoureiro da sua Comissão Directora (Ernesto Castro Leal, Partidos e Programas: o campo partidário republicano português 1910-1926, Coimbra, IUC, 2008, p. 52).

António Silva Gouveia já não integrará o Parlamento na legislatura seguinte, que teve início em Junho de 1915. Seria substituído por António da Costa Godinho do Amaral, que, contrariamente ao seu antecessor, fraquíssima participação teria nos debates. Coutinho do Amaral tomou assento na Câmara dos Deputados em meados de Janeiro do ano seguinte, ou seja, também cerca de meio ano após o início dos trabalhos (DCD 17/1/1916).

Uma nota final em pano de fundo: da leitura, ainda que em diagonal, das intervenções parlamentares sobre a Guiné transparece um ambiente nebuloso e às vezes crispado relativamente à política e administração locais. Há queixas contra as autoridades, boatos que circulam pela imprensa, críticas ao funcionamento da administração, acusações de nepotismo, etc. 

Pela intervenção do deputado Godinho do Amaral na Câmara dos Deputados, fica-se até com a ideia de que o governador da Guiné, Andrade Sequeira, não apreciava o modo como era exaltada, na imprensa portuguesa (e no próprio Parlamento), a figura do capitão Teixeira Pinto (DCD 22/2/1916).

[Continua]

[ Revisão / fixação de texto / título / edição de imagens: L.G.]

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Pode entrar-se pelo Google – “parlamento”. Nos links clicar em “Intervenções e debates”. Abre a página e clica-se em “debates parlamentares”. Depois é só escolher o regime e a câmara parlamentar. O separador “pesquisa avançada” é o mais prático. Entrei por “Guiné” e depois por “Silva Gouveia”.

(**) Nos Diários, às vezes aparece como António da Silva Gouveia

(***) Excerto:

(...) O Sr. Egas Moniz [, médico, futuro Prémio Nobel da Medicina, em 1949]:

- Desejo chamar a atenção do Sr. Ministro da Marinha para o caso das eleições do Ultramar.

Desde que se entende que as colónias devem ter representantes proprios aqui, nesta Assembleia, julgo que essas eleições se devem concluir de maneira a que os eleitos aqui compareçam.

Succede que algumas colónias já teem eleitos os seus representantes ; outras ainda os não elegeram.

É para este facto que chamo a attenção do Sr. Ministro da Marinha.

Numa das colonias - na Guiné - a eleição ainda não se fez, estando só marcada, parece-me, para o fim do mês que vem!

Peço, pois, a S. Exa. que apresse as eleições nas colónias, porquanto convem a todos que as colonias tenham aqui os seus representantes, a bem da Constituinte e da seriedade d'esta Camara.

O Sr. Ministro da Marinha (Azevedo Gomes):

- Sr. Presidente: concordo absolutamente com o exposto pelo Sr. Egas Moniz, mas o facto de não estarem hoje nesta Assembleia todos os representantes das colonias é consequencia de se ter posto logo em execução na metropole o decreto de 14 de março ultimo, com um periodo de revisão do recenseamento muito reduzido, por haver todo o empenho em convocar rapidamente as Constituintes.

O Governo já sabia que só muito mais tarde os Deputados pelas colonias podiam vir á Assembleia.

Devo dizer mais a V. Exa. e á Assembleia que o decreto de 14 de março saiu, com respeito ás colónias, muito incorrecto. Teve de fazer-se uma remodelação em 5 de abril, quer dizer, só depois de publicada a lei eleitoral. Para a Guiné foi em 17 de maio, devido á epidemia da febre amarella que ali grassava. Nestas circunstancias, não admira que seja aGuiné que mais tarde venha a ter representação no Parlamento.

Felizmente recebi hoje um telegramraa do governador da Guiné no qual se diz que o ultimo caso averiguado de febre amarella tinha sido no dia 8 d'este mês. A opinião do medico, que mandei para ali para dirigir os trabalhos de prophylaxia, é de que se pode considerar extincta a epidemia, mas que é necessario continuar os trabalhos de prevenção ainda por muito tempo.

Eram estas as explicações que tinha a dar ao illustre Deputado. (...)
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Nota de L.G.:

(#) Recorder-se aqui que , pelo decreto de 22-5-1911, a República "reformou profundamente, sob o ponto de vista técnico, o sistema monetário que vigorava em Portugal, alterando a denominação de todas as moedas, o material, o peso, e as dimensões das moedas de bronze e substituiu, pelo escudo de ouro, o real. 

"Dividido em 100 partes iguais, denominadas centavos, o escudo correspondia, quer no valor, quer no peso de ouro fino, à moeda de 1 000 réis" (...) . Fonte: Wikipédia.

(##) Elisée Turpin, um dos históricos do PAIGC, seu co-fundador, em 1956, foi empregado de 1958 a 1964, da Casa António Silva Gouveia (mais conhecida por Casa Gouveia), de 1958 a 1964. De 1964 a 1973, exerceu a função de Gerente da ANCAR. Contrariamente a outros nacionalistas guineenses, nunca terá sido descoberto (e importunado) pela PIDE/DGS...

No meu tempo (1969/71), fiz muitas vezes segurança, no Mato Cão, ao barco da Casa Gouveia, que fazia o trajecto Bissau-Xime-Bambadinca (e vice-versa; julgo que também chegava, naquele tempo, a Bafatá; este troço do Geba Estreito está hoje completamente intransitável devido ao assoreamento do rio; destas patrulhas ao Mato Cão, estão bem recordados outros camaradas nossos, que passaram pelo Sector L1 - Bambadinca, como o Beja Santos, o Jorge Cabral, o Humberto Reis, o António Marques, o Joaquim Mexia Alves, e tantos outros). E também viajei, pelo menos uma vez, até Bissau nesse barco. No Leste, a Casa Gouveia tinha estabelecimentos pelo menos em Bambadinca e Bafatá. Mas sei que também tinha em Farim, Fajonquito e noutros sítios...

Por acordo entre o Governo Português e o Governo Guineense, em 1976, a empresa António Silva Gouveia SARL foi integrada na estrutura empresarial denominada Armazéns do Povo da Guiné-Bissau, "mediante a atribuição de uma justa compensação, a estabelecer por uma Comissão Mista Paritária" (sic)