quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13855: Efemérides (177): A guerra, a água e o nosso 1.º de Novembro de há 50 anos… (Manuel Luís Lomba)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), com data de 28 de Outubro de 2014:

Olá, Carlos Vinhal:
A faculdade de mudança será um atributo da idade, incluindo a de esquecer e eu entrei numa estratégia de embargo à ameaça do aparecimento da "doença do alemão", como lhe chama o Luís Graça, com as abatises das actividades mentais.
Assim, sujeito mais um texto evocativo à tua paciência beneditina, para lhe dares o destino que melhor entenderes.

Com um grande abraço,
Manuel Luís Lomba


A guerra, a água e o nosso 1.º de Novembro de há 50 anos…

Na mais remota antiguidade, a água e o leite materno eram mobilizados como bens estratégicos de guerra: aquela, porque a água é a vida; este, porque havia mais vida, para além da guerra. Na segunda quinzena de Outubro de 1964, a nossa CCav 703 recebeu a missão de desimpedir a estrada Mansabá-Farim, obstruída há mais de um ano pela malta do PAIGC do Oio e do Morés, logo na primeira onda da subversão no Norte da Guiné. A tropa invejava o livre-trânsito do médico Dr. Maurício, incansável combatente, mas contra lepra dos guineenses, e dizia-se que os guerrilheiros apareciam a desimpedi-la de minas e abatises, logo que a sua carrinha Peugeot 403 era avistada. O Dr. Maurício era avesso às colunas militares e a tropa “lerpava”…

Saímos da Amura, atravessámos Bissau adormecida, fizemos a cambança do Geba na vetusta jangada de João Landim, rodámos em velocidade de cruzeiro e o asfalto terminou em Mansoa, (era exemplar único, na Guiné!), onde nos dividimos em “coluna, vanguarda de segurança e guardas de flanco”, no sentido de Mansabá.

O Estado-Maior determinara a nomadização em Bironque, onde levantámos as tendas cónicas de lona, modelo dito de colonial. Nos tempos em que as guerras eram feitas por homens e bestas, os chefes determinavam os bivaques em locais com água; como aquela era feita por homens com amparo de máquinas, tal preocupação foi negligenciada.

Troço da estrda Mansabá-Farim. Vd. Carta de Farim 1:50.000

Em Bironque, os patrulhamentos sucediam-se mas não contactavam – nem água, nem IN; e os ”sintrep” chegavam ao QG em conformidade. Até que o Brigadeiro Sá Carneiro, Comandante do CTIG, veio pelo ar num Allouete II de evacuações sanitárias, característico pelas duas macas acopladas no exterior, a simular uma inspecção ao bivaque e a prevenir o capitão da iminência de um ataque; e, ao apressar-se de regresso o zingarelho, não teve como se furtar às queixas gerais, não da falta de guerra, mas da falta de água para beber, cozinhar, lavar as marmitas… Aquele segundo soldado da Guiné (o primeiro era o General Schulz) providenciou apenas a última:

- Na guerra, as marmitas lavam-se com terra e não com água! - retribuído com a “boca”, dirigida ao piloto:
- Não precisávamos de um brigadeiro; precisamos de gerricans de água!

Na Frente Norte do IN pontificava o comandante Osvaldo Vieira, ex-furriel do Exército Português e, duas noites depois, dirigiu-nos prolongada flagelação; teremos sido a primeira tropa a levar com morteiradas de 82. E sem dispor de abrigos cobertos, do nosso equivalente (de 81) e sem água.

Eu fora escalado para substituir o vaguemestre, de baixa ao então HM 241. Chegámos ao dia 1 de Novembro, o capitão mandou-me formar uma patrulha com o pessoal da cozinha e voluntários, constituída por 10 atiradores, um condutor e um apontador de morteiro de 60 e ir buscar água a Mansabá. Esfalfámo-nos a fazer parapeitos de sacos de areia na caixa de carga do camião Mercedes novinho em folha e fizemo-nos ao caminho, que havíamos desimpedido, levantando uma nuvem de pó. Os “Águias Negras” de Mansabá foram malta fixe: atestaram-nos o atrelado-tanque, facultaram-nos os chuveiros e as suas toalhas de banho, partilharam comida e bebida fresca. A minha já longa vida jamais experimentará satisfação idêntica à daquele banho, daquela cerveja gelada e daquela conserva de perdiz, da marca Brandão!

Fazia-se tarde, o comandante deles ajuizou-nos de temerários e mandou um pelotão num Unimog escoltar-nos até certo ponto do caminho, que avariou, e o tempo gasto a removê-lo da estreita via, colocou-me perante um dilema: retroceder para Mansabá ou prosseguir para Bironque. A nossa malta veio em meu auxílio:
- P´ra frente é que é o caminho! - expressão em voga, atribuída ao capitão Henrique Galvão, quando do assalto ao paquete Santa Maria.

Fizemo-nos ao caminho, mas o malvado do ex-camarada Osvaldo Vieira continuava por ali, aprontou-nos uma emboscada na margem direita, a misturar insultos às nossas mães com rajadas de metralhadoras, a cravejar os sacos de areia, a cabine do camião e as granadas de mão a explodir, afortunadamente, do lado oposto da estrada. O condutor Pardal (Domingos, estou a corrigir o erro do livro!), estirou-se sobre os bancos, cabeça de fora da porta, uma mão no volante, outra no acelerador e saiu da zona de morte, enquanto 5 dos nossos reagíamos à sua retaguarda e outros 5 à sua frente. Pude acompanhar todo o filme, a cabeça de encontro a um providencial poste telefónico, que eles deixaram derrubado na valeta, quase a sentir a respiração do IN e tive a noção do momento da sua manobra de retirada.

Corremos em zigue-zague até todos subirmos para o camião, que se aguentou até Bironque, com o motor a verter os seus líquidos e os sacos a espalhar a sua areia.

Fomos protagonista de duplo “ronco”: regressamos ilesos, nós e o atrelado-tanque; e, com metade do pessoal que pegara pela primeira vez numa G3, demos troco e escorraçamos o ex-furriel Osvaldo Vieira e os seus turras, que tinha dois anos do Exército Português, mais dois anos de especialização na Academia Militar de Pequim, ao passo que eu fizera a recruta e saíra “especializado” em guerra convencional, revolucionária e no seu comando em apenas 4 meses – de Agosto a Dezembro de 1963, no CISMI, em Tavira!

Novembro é o tempo de toda a Cristandade evocar os fiéis defuntos.

Evocamos a memória dos únicos derrotados da guerra da Guiné - os seus mortos, porque a(s) pátria(s) não os mereceu…
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Nota de editor

Último poste da série de 15 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13739: Efemérides (176): A primeira Operação da CART 494 foi em 11 de Outubto de 1963 (Coutinho e Lima)

Guiné 63/74 - P13854: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXV: (i) o final da comissão em Farim, com os últimos mortos e feridos na zona de Lamel;: (ii) humilhados e ofendidos: regressados á Pátria, somos obrigados a ir a Chaves, num comboio ronceiro, entregar meia dúzia de trapos desfeitos, os restos das nossas fardas ! (Agostinho Evangelista, 1º pelotão)


1º encontro do pessoal da CCAÇ 2533, depois do regresso da Guiné... Foi em 1986...  Foto da página do Facebook do Agostinho Gomes Evangelista, um rapaz que eu já convidei para integrar a Tabanca Grande: (i) ndou na escola Escola Industrial e Comercial de Viana do Castelo; (ii) vive em Viana do Castelo; (iii) é natural da Ponte da Barca; e (iv) é Casado. (Foto reproduzida com a devida vénia; edição de LG).

Talvez o Luís Nascimento nos possa identificar estes bravos da CCAÇ 2533. Já se passaram quase 3 dezenas de anos...



Foto de perfil do Agostinho Gomes Evangelista, na sua página do Facebook. (Editado por LG; reproduzida com a devida vénia...)











1. Continuação da publicação das "histórias da CCAÇ 2533", a partir  do documento editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (*)

Desta vez  ex-sold Agostinho Gomes Evangelista, do 1º pelotão, descreve-nos as emboscadas que sofreu já em Farim,  perto do fim da comissão, na famigerada zona de Lamel, Um dos mortos  companhia foi o alf mil Ambrósio (pp. 86/87)..

O Evangelista foi, apesar de tudo um dos felizardos que voltou, vivo, mas ainda teve que ir a Chaves, fazer a entrega do material, num comboio ronceiro... Material ?  Meia dúzia  de trapos desfeitos, os restos das fardas destes heróis, humilhados e ofendidos... LG

Guiné 63/74 - P13853: Da Suécia com saudade (43): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte IV): Rússia e Suécia, vizinhos e inimigos fidalgais, foram os dois países que mais auxiliaram o partido de Amílcar Cabral (José Belo)


Guiné-Bissau > PAIGC > s/l> Novembro de 1970 > Algures, nas "áreas libertadas", foto do norueguês Knut Andreasson, com um grupo de homens, jovens adultos, possivelmente balantas e guerrilheiros, a maioria deles descalços, ostentando todos eles o livrinho de leitura da 1ª classe, o primeiro em uso nas escolas do PAIGC (e que, se não erro, foi oferecido por estudantes noruegueses e impresso na Suécia, num total de 20 mil exemplares).

Fonte: Nordic Documentation on the Liberation Struggle on Southern Africa  [Com a devida vénia]

[As fotos podem ser usadas, devendo ser informado o Nordic Africa Institute (NAI)  e o fotógrafo, quando for caso disso. Este espólio fotográfico  de Knut Andreasson (, relativo à visita ao PAIGC  e, alegadamente,  às áreas sob o seu controlo, em novembro de 1970,  de uma delegação sueca) foi doado pela viúva ao NAI.]


Imagens da capa de "O NOsso Livro Livro da 1ª Classe", o primeiro livro de leitura, usado nas escolas do do PAIGC... Exemplar capturado pelo nosso camarada Manuel Maia no Cantanhez, possivelmente em finais de 1972 ou princípios de 1973. Vê-se que esse exemplar tinha uso. A capa teve de ser reforçada com uns improvisados adesivos (aparentemente autocolantes, que acompanhavam embalagens de apoio humanitário, vindas do exterior).

Foto: © Manuel Maia (2009). Todos os direitos reservados

José Belo

1. Continuação de alguns dados e notas de contextualização sobre a ajuda sueca ao PAIGC, a partir de 1969, e depois à Guiné-Bissau, a seguir à independência (*):


Data: 3 de Novembro de 2014
Assunto:   O exemplo sueco é seguido por outros países


Resumo: 

Durante a guerra o governo sueco enviou para o PAIGC um total de 53,5 milhöes de coroas, ao valor actual [c. 5,8 milhões de euros]. Destinaram-se a financiar a maioria das actvidades civis do partido: alimentacäo, transportes, educação, saúde, incluindo um vasto número de avultados fornecimentos às Lojas do Povo. 

A Guiné foi posteriormente incluída (como único país da África Ocidental) nos chamados "países programados" para a distribuicäo da assistência sueca ao desenvolvimento. Recebeu durante o período de 74/75 a 94/95, um total de  2,5 mil milhões de coroas suecas [c. 270 milhões de euros], colocando a Suécia entre os 3 maiores assistentes económicos da Guiné-Bissau. 

A Suécia nunca deu nenhum cheque em branco ao PAiIGC, tanto mais que Portugal era um dos seus importantes parceiros comerciais no âmbito da EFTA - Associação Europeia do Comércio Livre, a que ambos os países pertenciam, e de que foram membros fundadores. Ainda em vida de Cabral, em abril de 1972 o Comité ds Nações Unidas para a Descolonizacäo tinha adoptado uma resolução reconhecendo o PAIGC como o único e legítimo representante do território da Guiné-Bissau. Foi um tremendo sucesso político-diplomático para o PAIGC. Isso em nada alterou o pragamtismo da diplomacia sueca. A Suécia só irá reconhecer a Guiné-Bissau como país independente, em 9 de agosto de 1974, ano e meio depois da  morte de Amílcar Cabral (que também era um político pragmático).


1. O auxílio sueco ao PAIGC abriu caminho a um cada vez maior número de apoios de outros países ocidentais.

A Noruega estabeleceu em 1972 uma assistência oficial e directa,semelhante ao modelo sueco, que veio a ter grande repercussão política internacional pelo facto de ser um país membro da NATO.

Neste período eram a Suécia e a Uniäo Soviética  (URSS) os países que mais apoiavam o PAIGC.

Um apoio de modo algum coordenado mas... real, numa divisäo "de facto" de funções entre os dois países, que mais tarde se veio a manter em relação aos outros movimentos de libertação africanos.

Apesar de tanto os Estados Unidos como outros países ocidentais acusarem a Suécia de fazer causa comum com o bloco comunista, isto não veio impedir que o Parlamento Sueco e o Governo Social Democrata continuassem a aumentar gradualmente a assistência não militar.

Deve-se no entanto ter o cuidado de colocar estas acusações dentro de uma perspectiva realista da história local.

O "inimigo histórico tradicional" da Suécia é a Russia,  e para tal basta abrir um qualquer livro de 
história da instrução primária sueca.

Isto independentemente de ser a Rússia do séc XVII, a Rússia dos comunistas ou...a Rússi actual.

José Belo

(continua)
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Nota do editor


Guiné 63/74 - P13852: Agenda cultural (350): Apresentação do livro "O 25 de Abril e o Conselho de Estado, a questão das actas", de Maria José Tiscar Santiago, dia 13 de Novembro de 2014, pelas 15h00, na Messe dos Oficiais, Praça da Batalha, Porto (Manuel Barão da Cunha)

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Nota do editor

Último poste da série de 31 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13830: Agenda cultural (349): Primeira sessão de divulgação da Colecção Literária "Fim do Império", dia 5 de Novembro de 2014, pelas 15h00, na Fundação Marquês de Pombal, Palácio dos Ciprestes, Linda-a-Velha (Manuel Barão da Cunha)

Guiné 63/74 - P13851: Parabéns a você (811): Jorge Cabral, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 63 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 de Novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13840: Parabéns a você (810): TGen António Martins de Matos, ex-Tenente Pilav, BA 12 (Guiné, 1972/74)

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13850: (Ex)citações (246): Ainda o rebentamento de uma granada no meio da população de Ganturé, durante um batuque (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 31 de Outubro de 2014:

Camarada Luís Graça e Carlos Vinhal,
Não fui, não sou, nem nunca serei uma pessoa de guardar rancores. Não tenho, felizmente, inimigos, mas sim amigos, alguns a quem costumo designar “amigos à distância”, isto porque vivem longe. Eles estão bem presentes no dia-a-dia na minha vida. Recordo-os sempre.

Como exemplo dou o Lançamento do meu Livro, num dia chuvoso, no Forte do Bom Sucesso, local lindo mas distante, e a um horário (17H30) não convidativo. A sala estava repleta de amigos que vieram até do Porto.

Sucede que no Livro “O Corredor da Morte” – no Capítulo 9, com o título “O Rebentamento durante o Batuque”, descrevo esse acontecimento. Sucedeu que foram poucos os camaradas do Blogue que leram o Livro. Em Monte Real vendi 24 exemplares, e fizeram-me mais umas 12 encomendas. Vendi portanto 36 livros aos Camaradas.

[Capa do  livro "O Corredor da Morte", edição de autor, Lisboa, 2014; encomendas através do endereço: 
mariovitorinogaspar@gmail.com ].


Esse capítulo foi um dos mais difíceis que tive quando pensei passar para o papel esse drama, iniciado pelas 20h00 do dia 4 de Julho de 1967, até às 09H00 do dia 5. Minutos antes abandonei o batuque e fui jogar poker.

Foi um dos dias mais terríveis da minha Comissão.

Segundo consta na História da Unidade: “Trata-se do atentado cometido em Ganturé, contra a população, em 4 JUL67, através do lançamento de uma granada que explodiu durante um batuque de que resultaram dez mortos e cerca de vinte feridos”.

Quanto a mim o número é superior. Disseram-me que o Tenente de 2.ª Linha, o Régulo Abibo Injasso, afirmou que eu tinha planeado esse atentado em reuniões com os meus camaradas do Pelotão e uma Secção, junto ao cemitério de Ganturé. Íamos para esse  local de vez em quando onde dava instrução. Nem sequer tínhamos conhecimento tratar-se de um cemitério.

Respondi a dois Processos:  um Processo Civil, executado pela PIDE (eram uns três Agentes), e outro Militar a cargo do Comandante da Companhia de Sangonhá, penso que Capitão Cardoso.
Nos dois casos afirmaram logo no início do inquérito que sabiam que eu estava inocente.

Depois deste atentado fomos substituídos e destacados para Gadamael Porto. Devido às mortes que assisti nessa longa noite, e às mortes de camaradas – estou em guerra com a sociedade e comigo – e costumo dizer: “A Guerra Continua Dentro de Mim”.

Fui à Torre do Tombo, ao Arquivo do Salazar e da PIDE, quatro vezes, e nada, embora possua Processos que nada têm a ver com o caso. Fui ao Arquivo Geral do Exército, até solicitei o meu Processo Individual, onde nada consta, e o próprio Arquivo informou-me não existir sequer indicações de ter respondido a um Processo Militar. Fui ao Arquivo Histórico-Militar e coisa nenhuma e ao Balcão Único da Defesa e continuei na mesma.

Mas no meu Processo Individual vem algo que me intriga. Onde consta: “As Condições para o Posto Imediato”, julgo que a 28 de Junho de 1967 está escrito que reúno as condições para a promoção a 2.º Sargento Miliciano. Isto devido a ter sido Monitor no RI 14, em Viseu, e ter dado várias recrutas e uma Especialidade igualmente como Monitor e inclusive ter dado uma pequena Instrução de Minas e Armadilhas a uma CART que foi para a Guiné. O Oficial e três Cabos Milicianos por terem chumbado no XX Curso de Minas e Armadilhas recusaram fazê-lo.

Foi pena que o Carlos Vinhal não me tivesse enviado um mail a contar-me esta situação, porque gostaria muito de ter o contacto do Camarada Luís Guerreiro. (1)

Sucede que podem ver,  no Blogue, num dos textos em falo desse atentado. E mais não avancei na conversa porque é um capítulo grande do Livro “O Corredor da Morte”.

O Abibo também era uma bela peça, “jogava com um pau de dois bicos”. Controlava os informadores que eram pagos (é verdade que essas informações eram verdadeiras, exceptuando um caso ou outro). Parecia mais a guerra do Raul Solnado: “Fiz um prisioneiro mas ele não quis vir!”.... Quando íamos ao “corredor da morte”, depois da informação que o PAIGC passaria pelas tantas horas, seguíamos para Guileje, dormíamos um pouco e seguíamos para a zona indicada pelo informador.

E lá estava o PAIGC a passar à nossa frente, e nós a deixarmos passar os primeiros, e depois de estar a maioria à frente era carregar em força. Todos os anos o Régulo Abibo Injasso, Tenente de 2.ª Linha ia a Meca pago pelo nosso Exército. Conheci-o bem, e no caso do rebentamento da granada no batuque ele tem toda a razão, em denunciá-lo.

Como era Atirador e Especialista de Minas e Armadilhas, ia quase sempre com as Praças “U” e Caçadores Nativos montar minas e armadilhas. Depois de montadas e ao fim de pouco tempo já o PAIGC sabia a sua localização. Cheguei a dizer o que deveríamos fazer mas não me ouviram, dei uma solução. Sucede que nos casos em que montei armadilhas, por exemplo nas imediações de Gadamael nem as Praças “U” nem os Caçadores Nativos conheciam a localização e o PAIGC, nunca lá foi.

Em Mejo o PAIGC chegou ao ponto de levantar as minas “bailarinas” da NT na zona onde iam à água, que conheci bem, e montarem-nas noutro local.

Camarada Luís Guerreiro, segundo dizes o Abibo focou a gravidade do rebentamento da granada durante o batuque, nisso com toda a razão. Mas essa de “Segundo o régulo, um ataque ao destacamento foi simulado por esse grupo de combate, e uma granada de mão”, nem sequer tive conhecimento dessa afirmação, que me acusou disseram-me, mas também não sei se é verdade.

Não existe uma simulação, porque nesse caso eu sabia-o. Quem cometeu o atentado fê-lo sozinho ou acompanhado por um ou outro. O 2.º Pelotão, e uma Sessão da CART 1659 não o fez, fique claro. Que a granada foi “lançada para o meio da população”, antes dizia batuque, é verdade. Mas quem foi o causador do atentado? Considero que houve um atentado, gostava de saber quem foi, e é isso mesmo que me leva a viver nessa dúvida. “Faleceram algumas bajudas, ferindo outras que foram evacuadas para Bissau devido à gravidade”. Essa da “cavilha da granada foi encontrada no local do Batuque”, é mentira, andámos a vasculhar tudo. Não tenho conhecimento de tal. O que se encontrava no solo eram estilhaços.

Espero que o camarada Luís Guerreiro, até porque pertenceu a uma Companhia que rendeu a CART 1659, entre em contacto comigo. Nos mails que ontem enviei indirectamente falei desta catástrofe.

Não posso ficar calado, e conheço outros casos graves. Aliás, na manhã das evacuações apareceu um suspeito negro, não conhecido que foi apanhado, e o que se passou a seguir, o Régulo Abibo sabia de certeza. Eu queria muito conhecer a verdade.


A granada rebentou à esquerda, continuando em frente havia um abrigo e uma “barraca” onde eu dormia. Ao fundo, à direita o palácio do régulo Abibo. Quando lá estava à esquerda era a “tasca” e a seguir do mesmo lado a Messe


Recordo estas bajudas

Fotos: © Jorge Guerreiro

Cumprimentos do Ex-Furriel Miliciano de MA da CART 1659, Mário Vitorino Gaspar
Mail: mariovitorinogaspar@gmail.com


2. Aqui vai um cheiro de parte do Capítulo 9 – "O Rebentamento Durante o Batuque” do meu Livro “O Corredor da Morte”.

(…) Sacudi o copo e lancei os dados…

- Uma sequência!

E era uma sequência que via sobre a mesa quando os dados estremecem, ouvindo-se um forte rebentamento.

- São eles…

- Disseram todos, quando saltámos dos bancos, cada um na direcção do abrigo do qual era responsável. Ouviam-se gritos angustiantes acompanhados por gemidos. Em corrida, passei junto do local donde há pouco se dançava.

Nem um tiro escutara. As nossas armas estavam caladas quando cheguei ao meu abrigo. Alinhadas as camas do lado direito e esquerdo, com quatro paus do mesmo tamanho, dois à cabeceira e dois nos pés que seguravam um mosquiteiro cada.
Ninguém estava nas camas, todos estavam junto da vigia do abrigo, empunhando as G3. Só o apontador de armas pesadas se encostava à “sua menina”, como ele lhe chamava.

- O que é que se passa, meu furriel?

Ouvi, não respondendo, quando me aproximava da vigia. Não conseguia entender o que realmente se estava a passar quando chega o corpo de uma mulher grande, que gritava, nas mãos de um civil negro, com algumas dificuldades em transportá-la.

Três militares seguraram-na e o vermelhão do sangue tingia as cores também garridas do vestido. As vísceras soltavam-se-lhe do corpo quando a colocaram sobre uma cama. Via-se o sangue brotar cada vez mais abundantemente, fugindo do corpo, como numa correria. Cobria já os lençóis brancos para a terra batida do abrigo, aumentando a mancha do líquido viscoso que mais parecia uma nascente. Sem querer pisei aquela poça e, sem pensar nascem pensamentos.

- Está morta!

Estava mesmo morta. Tudo continuava na mesma, não existindo o mínimo sinal físico do PAIGC, quando o soldado que transportara aquela mulher se afastava, gritei para os onze elementos da minha secção. 

- Só fazem fogo se virem algo de anormal! Ouviram?

Chegam mais dois corpos, uma mulher e uma criança que são levados para as primeiras camas. Saber o que realmente se passava era difícil se não desse uma volta. Alguém com uma voz angustiante, olhando a miúda que ainda há pouco dançava, diz:
- Esta miúda está morta!

- Ponham os dois corpos fora do abrigo, junto da enfermaria! Se é que aquilo era alguma enfermaria, era antes uma barraca.

Disse tão baixinho que julgava ter falado para mim, mas ouviram-me. Só depois, olhei a outra mulher grande e corri para o exterior, sem estar convicto se ela estaria ou não com ferimentos graves. O enfermeiro não parava…
Escutava vozes de todo o lado, súplicas que me afundavam. Uma amálgama de sofrimento e angústia. Um mar de sangue a meus pés à saída do abrigo, empurrou-me para o centro do aquartelamento para obter as respostas, e apoio.
Deparei junto da enfermaria, após ter ultrapassado a zona do batuque, com uma velha preta e, na linguagem que não entendia, mas mirando a depois de parar, percebi. Segurava com ambas as mãos os intestinos, que escorriam do corpo, pretendendo nada perder daquele corpo que era o seu. A vida bem segura nas mãos e eu quase a vomitar tudo o que tinha no estômago.

Presa à vida, quando a via morta, ou quase morta, amparo-a e noto estar pior ainda que julgava. O sangue colou-se-me às mãos sentindo o cheiro e a presença da morte. Necessitava de algo que lhe acalmasse as dores. Um comprimido?

Os gritos, qual buzina das fábricas, a chamarem pelos operários, rompiam daquele ser. Eu não estava preparado para tal missão. Comecei então a ver negros saídos de vários pontos do aquartelamento, nascidos de abrigos e da paliçada onde se haviam escondido. Um civil segurava a negra. Ajudámos a transportá-la para a enfermaria.

– Temos aqui um caso! – Temos aqui mais um caso.

O enfermeiro, cansado, deve ter pensado não ser um caso, mas mais um caso.
Apercebi-me entretanto ser a situação mais complicada ainda, quando olhei para o enfermeiro, e a enfermaria com muito más condições, e vejo umas sete macas improvisadas, com uns tantos feridos. Os mortos à parte.

- Meu furriel, retirei dois corpos!

- A miúda está morta!

- Ponham-na junto da outra mulher que já morreu! – Disse-lhes afastando-me para fora do abrigo.

Cá fora ouvia os gritos de todo o lado. Uma amálgama de sofrimento e de angústia, era um mar de sangue que se enfiava numa fresta de terra batida. Era sangue de vida, sangue que cheirava a morte. E interroguei-me, enquanto corria para a enfermaria: 
- O que se teria passado realmente?

Uma mulher velha mirou-me e falou-me. Não entendi o que dizia mas senti o sofrimento.

Vi uma imagem que jamais vou esquecer. Uma “mulher grande”, muito velhinha, segurava com ambas as mãos as vísceras que escorriam do corpo. Pretendia não perder nada daquilo que segurava. Pregava-se à vida, e a vida estava presa em ambas as mãos. Encostou-se a mim. Segurei-a e vi a morte e senti-lhe o cheiro. Ela necessitava de muito mais, de algo que a aliviasse das dores. Comprimidos? Dei-lhe vários LM’s (Laboratório Militar), que aliviam todas as dores. Sou um estúpido, dar um comprimido, não serve de nada! Os indivíduos da “banha da cobra”, que tão bem conhecia, diziam nas Praças Públicas: – “Não estou aqui para enganar ninguém, estou aqui porque a casa quer e a casa manda”. E a casa, a Pátria mandava, e nós obedecíamos. Os gritos saídos daquelas goelas, misturavam-se com os choros convulsivos de mulheres e crianças. Aquilo mordia-me o corpo. O enfermeiro disse-me havia feito bem em dar à velhinha os comprimidos.

Alguma população civil ia surgido, assim como alguns militares. Encolhiam os ombros, como que a perguntarem o que se passara. Segurei a velha, já muito velha, ajudando a transportá-la para uma maca. 
- Temos mais aqui um caso! – Ouviu-se.

Olhei para o interior daquela barraca a que denominavam de enfermaria. Estavam seis ou sete pessoas. Foi algo que aprendera naquela guerra, surgia o número na mente sem contar. Um outro sentido. O enfermeiro contara, eu tinha razão.

-  Isto é uma calamidade. Ainda há bem pouco, que dançavam.

Fui dar uma espreitadela ao local onde se efectuara o batuque, perguntando a mim próprio: – O que se teria passado?

Alguém fez a mesma pergunta novamente.

- No meu abrigo também há mortes e feridos.

O enfermeiro mirou-me com os seus olhos de 21 anos, enquanto chegavam mais corpos. Entre eles, um já sem vida.

(Continua no Livro “O Corredor da Morte”)

No final do Capítulo 9 – “O Rebentamento Durante o Batuque”

Na História da Unidade consta:

“Não queremos também deixar de assinalar neste Relatório um facto que nos causou profunda impressão e desgosto, já pelas consequências que dele resultaram, já porque apesar de todos os esforços desenvolvidos pelas autoridades militares e civis, não lográmos vê-lo esclarecido inteiramente para apuramento das responsabilidades e aplicação da Justiça. Trata-se do atentado cometido em Ganturé, contra a população, em 4 JUL 67, através do lançamento de uma granada que explodiu durante um batuque de que resultaram dez mortos e cerca de vinte feridos”.
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Notas do editor

(1) Vd. poste de 21 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13777: Em busca de... (249): A verdade sobre um ataque simulado por um Grupo de Combate da CART 1659 a Ganturé (Luís Guerreiro)

Último poste da série de 1 de Novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13835: (Ex)citações (245): Dia dos Fieis Defuntos: o povo sabe que nas campas no final fica só terra sobre terra mas para ele essa terra é sagrada (Francisco Baptista, Brunhoso, Mogadouro)

Guiné 63/74 - P13849: Da Suécia com saudade (42): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte III)... Pragmatismos de Amílcar Cabral e do Governo Sueco, de Olaf Palme, que só reconheceu a Guiné-Bissau em 9 de agosto de 1974 (José Belo)


Guiné-Bissau > PAIGC > Novembro de 1970 > Um bigrupo (em geral, constituído por 30/40 elementos).  Repare-se que na sua generalidade os guerrilheiros usam sandálias de plástico e há uma grande indisciplina no vestuário.  Imagem do fotógrafo norueguês Knut Andreasson (com a devida autorização do Nordic Africa Institute, Upsala, Suécia). A fotografia não traz legenda. São alegadamente tiradas em "regiões libertadas" (sic) (*).

Fonte: Nordic Africa Institute (NAI) / Foto: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a autorização do NAI)



José Belo

1. Continuação de alguns dados e notas de contextualização sobre a ajuda sueca ao PAIGC, a partir de 1969, e depois à Guiné-Bissau, a seguir à independência (**):



Data: 3 de Novembro de 2014
Assunto:  Pragmatismos de Cabral e do Governo Sueco


Resumo: 

Durante a guerra o governo sueco enviou para o PAIGC um total de 53,5 milhöes de coroas,ao valor actual [c. 5,8 milhões de euros].  Destinaram-se a financiar a maioria das actvidades civis do partido: alimentacäo, transportes, educação, saúde,  incluindo  um vasto número de avultados fornecimentos às Lojas do Povo. 

A Guiné foi posteriormente incluída (como único país da África Ocidental) nos chamados "países programados" para a distribuicäo da assistência sueca ao desenvolvimento. Recebeu  durante o período de 74/75 a 94/95  2,5 mil milhões  de coroas suecas [c. 270 milhões de euros], colocando a Suécia entre os 3 maiores assistentes económicos da Guiné-Bissau.

A Suécai nunca deu nenhum cheque em branco ao PAiIGC, tanto mais que Portugal era um dos seus importantes parceiros comerciais no âmbito da EFTA - Associação Europeia do Comércio Livre, a que ambos os países pertenciam, e de que foram membros fundadores. A Suécia só irá reconhecer a Guiné-Bissau como país independente... em 9 de agosto de 1974. 


Em Abril de 1972 o Comité ds Nações Unidas para a Descolonizacäo adoptou uma resolução reconhecendo o PAIGC como o único e autêntico representante do território da Guiné-Bissau. Para o PAIGC foi um enorme sucesso político-diplomático.´

Baseando-se neste documento o Comité podia agora sugerir o reconhecimento dos movimentos de libertação, näo como peticionários, mas antes numa situacäo de observadores. Havia pela primeira vez na história das Nacöes Unidas a possibilidade de um representante de um movimento de libertação discurssar perante a Assembleia Geral da ONU, isto em Novembro de 1972.

Esta honra deveria caber a Amílcar Cabral. Este foi informado pelo Secretário do Comité da Descolonizacäo das Nações Unidas (Salim Ahmed Salim) de que tanto a Suécia como os restantes países nórdicos näo estavam satisfeitos quanto às implicacöes legais deste tipo de intervenção (sem precedência na Assembleia Geral) por parte de um representante de um movimento de libertação.

Salientou existirem mais do que suficientes votos e apoios de países africanos, asiáticos e sul americanos,  caso ele estivesse disposto a discurssar, independentemente da opinião dos nórdicos.

A diplomacia de Cabral era caracterizada por um pragmatismo realista que foi entäo amplamente demonstrado. Cabral näo discurssou,  afirmando: "Os países nórdicos têm sempre demonstrado serem nossos amigos.Recebemos o seu apoio em todas as situacöes. Não desejo de modo algum causar quaisquer problemas de ordem político-legal".

Já em 1971,   durante visita ao Ministério dos Negócios Estrangeiros,  em Estocolmo,  Cabral apresentou a hipótese de um reconhecimento "de jure" da independência da Guiné.

Tanto nesta ocasiäo como mais tarde em 1973,  aquando da proclamação da Independência da Guiné-Bissau como Estado dentro das fronteiras da entäo Guiné Portuguesa, a Suécia mostrou-se relutante a reconhecer o novo Estado.

Mesmo depois da Guiné-Bissau já ter sido reconhecida por mais de sessenta países...."inter allia" , o governo sueco  aplicou o princípio da necessidade de o PAIGC controlar TODO o território,  não reconhecendo assim a independência.

Esta atitude provocou fortes reacções nos partidos da esquerda sueca. nos inúmeros grupos de de suporte às lutas de África, e mesmo no seio do próprio partido governamental (Social Democrata).

O golpe militar de Abril de 74 veio facilitar o problema político-legal ao governo sueco.

Foi só 10 dias depois da publicacäo por parte de Portugal de uma "declaracäo de intencöes" quanto ás independências das colónias que o governo sueco reconheceu a Guiné-Bissau como Estado independente (9 de Agosto de 1974).

Portugal reconheceu a independência da Guiné em setembro de 74.

José Belo

(continua)
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Notas do editor:

(*) Vd. a página, em inglês,  sobre a Guiné-Bissau (não do  Nordic Africa Institute, Upsala, Suécia,  mas sim da Nordic Documentation on the Liberation Struggle on Southern Africa / Documentação dos Países Nórdicos sobre a Luta de Libertação na África do Sul):

Aqui vão traduzidos alguns excertos:

(...) Guiné-Bissau > Knut Andreasson eBirgitta Dahl em viisita a  zonas libertadas da Guiné-Bissau, no mês de novembro de 1970  

(...) O fotógrafo norueguês Knut Andreasson  e a ex-presidente do parlamento sueco Birgitta Dahl , juntamente com uma delegação sueca,  visitaram as regiões libertadas da Guiné-Bissau, em novembro de 1970. Esta visita deu-lhes a oportunidade de falar com Amílcar Cabral no seu próprio ambiente e ter uma compreensão mais profunda da luta pela independência, contra  Portugal.. Andreasson e Dahl depois fizeram um livro * em sueco  a partir das  suas impressões e observações  no ªambito desta viagem. 

Andreasson também organizou uma exposição de fotografia com o objetivo de informar o público dos países nórdicos sobre o PAIGC e  a Guiné colonizada . Não só a exposição, como também a maioria das fotos deste período foram posteriormente doadqs ao Instituto Nórdico de África pela viúva de Andreasson . A exposição, por sua vez,  foi oferecida à Fundação Amílcar Cabral pelo Instituto  e apresentada por Birgitta Dahl  por ocasião das celebrações do 80º aniversário do nascimento de Amílcar Cabral, em setembro de 2004.

As imagens que o Instituto disponibiliza mostram como era a vida nas zonas libertadas . Como é que a população fazia a sua sua vida diária, mas também mostram o lado militar, os guerrilheiros com as suas armas.. Como a Guiné-Bissau tem muita rios,  a canoa era   um importante meio de transporte, tanto mais que os portugueses fizeram explodir a maior parte das pontes.  Mais de 99 % da população era analfabeta quando a luta começou em 1963, por isso a educação era importante e o PAIGC montou escolas no mato para crianças e adultos,  Existiam cerca de 75 dessas escolas, uma das primeiras foi a Escola Piloto em Conacri . O primeiro livro de leitura foi financiado por estudantes noruegueses e impresso na Suécia. As fotos mostram também eventos culturais e serviços de saúde do PAIGC.

Algumas das imagens seguintes estão publicados no livro* de  Knut Andreasson e Birgitta Dahl, onde é possível ler mais sobre a situação na Guiné-Bissau naquela época  

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13848: Memórias da CCAÇ 2616 (Buba, 1970/71) (Francisco Baptista) (6): Uma consulta no HM 241 interpretada como um abandono do pelotão que comandava

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 25 de Outubro de 2014, com mais uma memória de Buba:


Memórias da CCAÇ 2616

6 - Uma consulta no HM 241 interpretada como um abandono do pelotão que comandava

Camaradas e amigos

Após a reforma li muitos livros para me reconciliar com um velho prazer que tinha descurado bastante tempo. Ler é melhor do que escrever pois a leitura enriquece o espírito enquanto a escrita... o acto de escrever é em si uma tarefa empolgante como desafio como paixão mas depois de concluído, o seu resultado deixa de entusiasmar o autor.

O acto de escrever será parecido com outros actos que praticamos com muita euforia, com muita adrenalina enquanto os praticamos e depois nos deixa na boca um sabor amargo a fim de festa e a desengano. Quantos escritores já não ouvimos dizer que não mais releram o livro que tinham escrito. Os grandes escritores naturalmente pensam num público, tal como os cantores, pintores e outros artistas mas julgo que escrevem também porque têm a cabeça cheia de palavras e essa foi a forma que encontraram para se libertarem do seu excesso.

Acabei de ler há poucos dias o livro "Das Trincheiras com Saudade" da Isabel Pestana Marques.
O livro descreve a vida quotidiana dos militares portugueses na 1.ª Guerra Mundial. Está muito bem escrito com grande preocupação de objectividade e com muito trabalho de pesquisa da autora.

Neste tempo em que os nossos políticos, a reboque dos políticos europeus, segundo opinião do camarada Luís Graça, e ele costuma estar bem informado, resolveram relembrar esses pobres camaradas das trincheiras, tão maltratados pela República, mal vestidos, mal armados, mal alimentados, mesmo se por suspeita foi encomenda deles, não deixa de ser um bom livro sobre o tema, segundo a minha opinião que não é de um critico de literatura e muito menos de livros histórico-militares.

Entre muitos assuntos recordo de falar em problemas entre soldados e graduados, já que as diferenças de regalias e tratamento eram chocantes, ainda por cima se se pensar que o regime político desse tempo se proclamava defensor das virtudes republicanas.
Conta nomeadamente como através de cunhas de vários tipos, familiares, amigos, médicos, etc. muitos graduados, sobretudo oficiais, fugiam à frente de combate. Muitos passavam longas férias em Portugal e outros havia que regressavam por qualquer doença e não mais voltavam.
A par disso havia companhias inteiras que por falta de rotação chegavam a passar mais de um ano na linha da frente das trincheiras, muitas vezes à chuva, à neve a ter que suportar temperaturas inclementes sem roupa nem alimentação adequada.

Tudo isso provocava sentimentos de grande revolta, chegando a haver algumas vezes sublevações de companhias inteiras e até de batalhões. Ainda é cedo para se escrever a história da guerra do ultramar e de retratar conflitos semelhantes que lá se terão gerado. Este blogue também não é o sitio próprio para se falar desse assunto. A organização militar já é em si uma pirâmide em que os postos ou escalões inferiores têm que obedecer, sem discussão, sempre aos superiores.
Os exércitos foram concebidos como máquinas de guerra, normalmente alheios a regras democráticas pela sua própria finalidade. Quarenta anos de ditadura e obediência cega à autoridade devem também ter contribuído bastante para retirar à maioria dos portugueses a vontade de praticar actos de indisciplina e rebeldia.

Num convívio recente da CCaç 2616, muitos anos já anos passados e com outra liberdade e abertura de espírito, foi interessante ouvir o que uns e outros tinham a dizer sobre o comportamento e a personalidade de cada um nessa época. Procurei falar bastante com os camaradas do meu pelotão e criar um ambiente descontraído que pudesse dar lugar a críticas da personalidade de cada um, nesse tempo. Gostaram do desafio e disseram-me que ficaram surpreendidos porque eles recordavam-se de mim como um tipo mais fechado, menos comunicativo.

Nesse ambiente de cordial e descontraído houve um soldado, o mais falador, que me disse o seguinte: "Passados poucas dias daquela emboscada na Bolanha dos Passarinhos, o alferes foi quinze dias para Bissau, alguém do pelotão se queixou várias vezes que nos tinha abandonado nesses tempos difíceis em que chegámos a ter três emboscadas no mesmo dia".

Eu fui a Bissau a uma consulta já marcada antes dessa emboscada em que comandava o pelotão, sem prever que as condições de guerra se iriam agravar. Quando regressei de Bissau soube que a companhia tinha passado por um período difícil, mas não me recordo de ouvir dizer que o meu pelotão tivesse tido três emboscadas no mesmo dia. Esse camarada que me terá criticado pela minha ausência, além de ser muito competente, era muito frontal e não me lembro de alguma vez me pôr essa questão. Também esteve no convívio mas não lhe cheguei a falar nisso.

Por outro lado, o camarada que me contou isto acredito que não foi por má fé ou por querer fazer intriga. Tanto por um como pelo outro tenho e sempre grande estima e consideração.
Nada disto é importante e grave, interessante é analisar aquilo que à distância de mais de 40 anos recordamos de muitas formas diferentes, mais vivas, já esquecidas, mais apagadas, mais fantasiadas.

Reconheço também que eu pela proximidade com o alferes médico tive a possibilidade de ir passar 15 dias a Bissau e a maior parte dos camaradas não a tinham. De resto garanto-vos que passei toda a minha comissão no mato, em Buba ou em Mansabá.

Um abraço a todos os camaradas
Francisco Baptista
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de Abril de 2014 > Guiné 63/74 - P13064: Memórias da CCAÇ 2616 (Buba, 1970/71) (Francisco Baptista) (5): Pequenas estórias de medo, pesadelo e apanhados do clima

Guiné 63/74 - P13847: Da Suécia com saudade (41): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte II)... Um apoio estritamente civil, humanitário, não-militar, apesar das pressões a que estavam sujeitos os sociais-democratas, então no poder (José Belo)

José Belo 
1. Mais alguns dados sobre a ajuda sueca ao PAIGC, a partir de 1969, e depois à Guiné-Bissau, a seguir à independência (*):

Data: 3 de Novembro de 2014 às 22:17
Assunto: Sobre a Guiné-I ( alguns números).


Resumo: Durante a guerra o governo sueco enviou para o PAIGC um total de 53,5 milhöes de coroas,ao valor actual.  Destinaram-se a financiar a maioria das actvidades civis do partido: a limentacäo, transportes, educacäo, saúde,  incluindo  um vasto número de avultados fornecimentos ás Lojas do Povo. 

A Guiné foi posteriormente incluída (como único país da África Ocidental) nos chamados "países programados" para a distribuicäo da assistência sueca ao desenvolvimento. Recebeu  durante o período de 74/75 a 94/95  2,5 mil milhões  de coroas suecas [c. 270 milhões de euros], colocando a Suécia entre os 3 maiores assistentes económicos da Guiné-Bissau.


O programa sueco de cooperacäo civil-humanitária foi, durante largo período, não igualado por qualquer outro país.


"Apoia o PAIGC" (em, sueco).
Cartaz de finais dos anos 60, 
Uppsala South Africa Committee 
(mais tarde, Africa Group).
Cortesia de  
.
A importância da colaboracäo com o PAIGC,  
quanto ao envolvimento futuro da assistência sueca aos movimentos de libertacäo da África Austral, 
näo pode ser subestimada.

Foi em relação ao PAIGC que a Suécia estabeleceu o primeiro programa de assistência directa e oficial a um movimento de libertação africano, estando este envolvido numa luta armada com uma nação europeia (Portugal) que mantinha formais ligações comerciais com a Suécia.

[Recorde-se que faziam ambos parte da EFTA - European Free Trade Association, Associação Europeia de Comércio Livre, fundada a 4 de Janeiro de 1960 na cidade de Estocolmo, por 6 países: Áustria,  Dinamarca,  Noruega, Portugal, Reino Unido, Suécia e Suíça; Portugal foi membro da EFTA até à sua entrada para a CEE, em 1986].

Este facto veio a determinar o carácter e os limites da assistência sueca, apesar dos contínuos apelos por parte dos movimentos de solidariedade não governamentais em conjunto com os partidos políticos da esquerda, e de um vasto número de membros do partido social democrata que então governava.

Todos eles exigiam um tipo de apoio incondicional, ou seja, que o PAIGC determinasse quais as aplicações dos auxílios económicos recebidos.

Apesar de todas estas pressões, foi mantida a decisão  de o apoio ter como base única o seu aspecto de assistência civil, humanitária....e não militar.

De qualquer modo,e de acordo com Stig Lövgren, responsável pelo programa de cooperação entre a Swedish International Development Authority (SIDA em Sueco) e o PAIGC, em encontro tido com Amilcar Cabral em 1969,  este lhe terá dito ser este  tipo de assistência civil o desejado pelo partido.

Na opiniäo de Cabral, os fornecimentos de armas e outros equipamentos militares por parte da União Soviética e outros países aliados  tornavam desnecessários qualquer apoio nesta área.

José Belo

(continua)
____________

Nota do editor:



Guiné 63/74 - P13846: X Encontro Nacional da Tabanca Grande (1): Foi já feita a reserva para a nossa festa de 18 de Abril de 2015 no Palace Hotel de Monte Real (Joaquim Mexia Alves / Carlos Vinhal)

Monte Real, 14 de Junho de 2014 > Foto da Grande Família do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
Foto: © Manuel Resende  (2014). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem da Organização à Tertúlia:

Uma pequena nota para comunicar que o nosso camarada Joaquim Mexia Alves já confirmou a reserva do Palace Hotel de Monte Real para o X Encontro Anual da Tabanca Grande que se realizará no próximo dia 18 de Abril de 2015.

Esta data foi escolhida para evitar a sobreposição do nosso Encontro com as dos Convívios das Unidades, normalmente a terem lugar a partir do mês de Maio.

Mais informamos que os preços dos anos anteriores se mantêm, tanto para o almoço, 30€ por pessoa, lanche ajantarado incluído, assim como para as dormidas, 55€ single e 60€ duplo.

As inscrições serão abertas oportunamente, talvez fins de Fevereiro, princípios de Março de 2015.

Os organizadores ficam ao dispor dos interessados para qualquer esclarecimento adicional.

Luís Graça
Joaquim Mexia Alves
Miguel Pessoa
Carlos Vinhal

Guiné 63/74 - P13845: In Memoriam (201): Coronel Piloto Aviador Manuel Bessa Rodrigues Azevedo (1938-2014): "Blé, eu sei que, lá por onde andas, estás em boa companhia, com os amigos pilotaços Brito, Moura Pinto, Mantovani, Gil e as enfermeiras Manuela e Piedade" (António NMartins de Matos, ten gen pilav). …


Cor pilav Manuel Bessa Rodrigues de Azevedo (1938-2014)


1. Mensagem do nosso camarada da FAP e membro da Tabanca Grande António Martins de Matos

Data: 3 de Novembro de 2014 às 23:42
Assunto: Coronel Piloto Aviador Manuel Bessa


A notícia apanhou-me de surpresa, … morreu o "Blé" [, no passado dia 30 de outubro; tinha 76 anos].

O "Blé" era o Coronel Piloto Aviador Manuel Bessa Rodrigues de Azevedo, amigo de longa data e companheiro de muitas das missões mais arriscadas que executei na Guiné.

Para a maior parte dos militares que combateram no Ultramar o seu nome não deve dizer nada de especial e no entanto alguns devem tê-lo visto em voos picados, alguns dos que regressaram à Metrópole sãos e salvos certamente a ele o devem.

Eis a sua história da Guiné:

Quando em Abril de 1973 o aparecimento repentino dos Strelas produziram os efeitos que são do conhecimento geral, constatou-se que apenas restavam 4 pilotos aptos a voar o FIAT-G91, 2 na Esquadra 121-Tigres e outros 2 com o estatuto de "adidos", o Comandante da Zona Aérea e o Comandante da Base, ambos Coronéis.

Pelas suas funções, estes últimos apenas podiam participar em voos pré-planeados, não assegurando as missões de pedidos de apoio aéreo.

Nesta situação de emergência, a solução encontrada pelo Estado Maior para minorar a escassez de pessoal foi nomear 2 pilotos da Base de Monte Real para um destacamento imediato e de 2 meses.
O então Cap Pilav Bessa foi um dos escolhidos, tinha regressado de uma comissão em Moçambique, estava qualificado em FIAT G-91 mas nunca tinha estado na Guiné.

Um segundo piloto foi igualmente nomeado mas …. nunca chegou a aparecer.

No meio de toda aquela situação crítica em que nos encontrávamos,  ainda havia um pouco de "humor" que nos fazia sorrir e avançar no dia-a-dia, os 2 pilotos da Esquadra (o Pipoca e o Batata) foram esperar o "Blé" ao aeroporto de Bissau mesmo à porta do Boeing da FAP:  eu levava um "braço ao peito", o outro piloto tinha a "cabeça entrapada", logo lhe dissemos que a guerra não podia esperar, havia um alerta imediato para sair e naquele momento nós estávamos inoperacionais, tinha que ser ele a efectuar a missão.

Completamente atrapalhado,  ainda balbuciou algumas desculpas, não conhecia o terreno, logo lhe aprontei um mapa, a missão era lá para o Leste, "vais sempre a direito, não há nada que enganar", não tinha capacete, demos-lhe um (que nem lhe servia…), …..

Passado o efeito desta praxadela com muitas risadas e palavrões à mistura, logo nos dias seguintes o "Blé" passou a acompanhar-nos em todas as missões, sempre a número 2 não fosse o caso de se perder, ainda estávamos na época seca e de visibilidade reduzida, depois de largarmos o nosso armamento era só dizer-lhe onde ele devia largar a sua carga, mais à frente, atrás, direita, esquerda, aos poucos lá se foi começando a ambientar com o território, com as manobras anti-míssil e com o armamento (bem diferente do que tinha usado em Moçambique).

Foi assim que, apenas chegado a terras da Guiné, logo o "Blé" executou missões em todos os locais onde a intervenção dos FIAT-G91 foi solicitada, no Guidaje, Cufeu, Choquemone, Cantanhês, Guileje, Gadamael,…

Foi ele que inúmeras vezes me protegeu a retaguarda…

Foi ele que me alertou de 2 dos mísseis com que o PAIGC me quis presentear…

Foi ele um dos que presenciou (ao vivo) os acontecimentos de Guileje, até ficou registado num livro que escreveram sob o tema.

Foi ele que, com o seu espírito alegre e brincalhão, transformou os nossos jantares até então tristes e monótonos,  em alegres cavaqueiras, capazes de nos fazer esquecer todos os maus momentos daquela época.

- Blé, eu sei que, lá por onde andas, estás em boa companhia, com os amigos pilotaços Brito, Moura Pinto, Mantovani, Gil e as enfermeiras Manuela e Piedade. … Um dia, os do grupo que ainda estamos cá "em baixo", vamos visitar-te. Vamos recordar todas aquelas aventuras, desventuras e travessuras que fizemos! Prepara-te, vai ser uma festa de arromba!!!! (*)

Até sempre,  companheiro! (**)

António Martins de Matos [ex-ten pilav, BA 12, Bisslanca, 1972/74]

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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 28 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13815: In Memoriam (201): Bruna Durães (26/3/2003 - 28/10/2014), a neta mais velha do nosso querido amigo e camarada Benjamim Durães, ex-fur mil op esp. CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)... O corpo estará ao fim da tarde em câmara ardente, na capela do Socorro, junto ao Mosteiro de Jesus, em Setúbal. O funeral será amanhã às 11h.

(**) Vd. aqui a sua biografia na página da Associação de Combatentes de Avintes > 31 de Outubro de 2014 > BLÉ - aqueles que da lei da morte se vão libertando

(i) Nasceu no lugar de Montes, freguesia de Olalhas, concelho de Tomar, distrito de Santarém, a 21 de Junho de 1938:

(ii) O "nickbname" Blé foi-lhe pela mana, ligeiramente mais velha;.

(iii) Por volta dos cinco anos, os pais, professores do ensino primário, mudaram-se para Avintes, concelho de Vila Nova de Gaia;

(iv) Depois do liceu no Porto, frequentoui a Academia Milita em Lisboa onde tirou o curso de aeronáutica;

(v) Foi escolhido para integrar o grupo dos Falcões, elite dos pilotos da FAP,  localizado na Base Aérea de Monte Real, voando então no F-86 Sabre, caça supersónico, monolugar e monomotor, avião da Nato;

(vi) Com a giuerra do do Ultramar, teve de mudar para o Fiat G 91, "similar ao Sabre mas não tão bom":

(vii) A sua primeira comissão foi no Norte de Moçambique, seguindo-se a Guiné e depois Angola; estava destacado em Cabinda quando ocorreu o 25 de Abril.

Para saber mais clicar aqui


Guiné 63/74 - P13844: (Ex)citações (246): Encontros imediatos do 3º grau... Eu e o roqueteiro, cubano, de Ponta Varela, na véspera de ir de férias para Lisboa... (Jorge Araújo, ex-fur mil op esp, CART 3494, Xime, 1972/74)


Guiné > Bissau > Aeroporto de Bissalanca > 5 de fevereiro de 1973 > O Jorge, depois de um encontro imediato do 3º grau... "Momento de descontração, antes do embarque na TAP para gozo do segundo período de trinta e cinco dias de férias. A mala vermelha, outra companheira que me acompanhou durante o serviço militar de três anos, está hoje cheia de histórias e de memórias". (JA)

Foto: © Jorge Araújo (2010). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]

1. No dia 30 de outubro passado, mandei ao Jorge Araújo a seguinte mensagem:


Jorge: Antes de mais, e falando do futuro: boa continuação dos teus altos estudos...

Voltando ao passado, dá uma vista de olhos a este poste com mais um capítulo da história do BART 3873 (*)... Onde se fala em: (i) "desmoralização" da CART 3494, explorada pelo IN em Mansambo; e ainda de (ii) cubanos na Ponta Varela...

Ouvi dizer (, o Espírito Santo de orelha,) que tiveste um encontro imediato do 3º grau com um destes "revolucionários internacionalistas"... Es verdad ?

Bj para  tua senhora doutora. Um abraço fraterno para ti, Luis

PS - Vou abrir uma série "Postos Escolares Militares"... Excelente o teu álbum... Dei um "retoque" às fotos, como deves ter reparado... Ob


2. Resposta imediata do Jorge:


Caro Luís; Quanto aos estudos (actividade académica), estou a precisar de reforma (...)

Relativamente ao assunto mais polémico... si, es verdad...

O último texto que te enviei (...), com o título «A Actividade Operacional da CART 3494...» (**), relata a minha última missão no Xime [, antes de irmos para Mansambio] , ocorrida em 3 de fevereiro de 1973.

Como podes confirmar, refiro que estive frente a frente com um elemento IN. Não está explicito (não podia estar) o desenvolvimento da "coisa", mas de certo modo está implícito. Quando dei de caras com ele, hesitei, pois a cor da pele era semelhante à minha. Deixei de ter dúvidas quando tomei consciência do modelo de camuflado e da arma (RPG7). Depois... aconteceu!

Deste episódio, decidiu o cmdt do BART [3873] dar-me um louvor, que consta na minha caderneta  militar, com todos os detalhes, mas sem fazer referência às origens do IN, nem tampouco me informaram ou consultaram, uma vez que estava de férias em Lisboa. Depois, o meu louvor foi atribuído pelo Brigadeiro, comandante militar.

Por isso, quando na HU, do mês de abril, se refere a presença de cubanos em Ponta Varela, já eu tinha confirmado tal... em 3 de fevereiro de 1973. Mais detalhes... é só pedires. (...)



Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Xime >  CART 3494 (1972/73) > Os segredos das matas...

Foto: © Jorge Araújoi (2010). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


 3. Transcrição do relato desse encontro imediato do 3º grau (**)

(...) A Acção Guarida 18 –– Xime, 3 de fevereiro de 1973: a minha última missão, entre a Ponta Varela e Lisboa

Reza o documento dactilografado da História da Unidade [BART 3873], no 10.º fascículo, fevereiro de 1973, ponto 74 (...) o seguinte:

(...) “Acção Guarida 18,  de 030500 a 031130 com patrulhamento, emboscada e montagem de armadilhas na região de Pta Varela. Intervieram 03 Gr Comb da CCAÇ 12 e 03 (-) da CART 3494. O IN teve 02 mortos e 01 ferido confirmados e as NT 01 ferido ligeiro” (...)

O que seguidamente se relata traduz a verdade dos factos vividos na primeira pessoa, e é nessa qualidade que tomei a iniciativa de os tornar públicos, com o objectivo de ampliar os elementos historiográficos da minha CART 3494 / BART 3873.

Tomei conhecimento desta (...) operação na véspera, dia 2 de fevereiro de 1973, 6.ª feira, de modo informal (...), directamente do meu  Cmdt de Companhia. Registei a informação e,  na sequência do diálogo que estabelecemos,  recordei-lhe que tinha sido combinado entre nós que pela manhã do dia seguinte, sábado, seguiria para Bafatá com o objectivo de apanhar transporte aéreo para Bissau e depois para Lisboa, esta viagem agendada para o dia 5 (...) , data do início do meu segundo período de férias.

Entretanto, para minimizar eventuais prejuízos que pudessem vir a ocorrer por redução do tempo útil até ao embarque para Lisboa, foi acertado novo compromisso. Este sugeria que antes do início da operação, deixasse tudo preparado com “mala feita” para que, após a sua conclusão, seguisse de imediato para Bafatá ainda a tempo de se concretizar o plano anterior. E foi isto o que veio a acontecer.

No sábado de madrugada, dia 3 (...), do aquartelamento do Xime saiu uma força mista de cerca de cento e trinta militares, entre guineenses e continentais, operacionais da CCAÇ 12 e CART 3494 (,,,)

(...) Em determinado momento do itinerário utilizado pelas NT, na zona da Ponta Varela, na parte inferior (sopé) de um terreno com declive acentuado, avistei um elemento do PAIGC, com farda escura, vagueando por ali aleatoriamente. Ainda lhe fiz sinal do cimo do declive mas não sei se me viu, uma vez que a progressão continuava o seu curso… e ele por lá ficou.

Com este facto na memória, e sem certezas quanto ao que deveria ter feito e não fizera, eis que,  percorrida uma vintena de metros (. mais ou menos), ao contornar uma zona de vegetação com passagem por uma clareira, aqui fiquei diante de um outro vulto humano, de camuflado amarelado e portador de um RPG7. 

Ficámos frente a frente a uma distância a rondar os dez metros, havendo ainda tempo para trocarmos olhares, num lapso de tempo que não é possível contabilizar, mas que impunha uma decisão pronta. Ao meu primeiro sinal [tiro] iniciou-se o «jogo de sobrevivência» que caracteriza estes contextos, e de que o episódio anterior me tinha servido de alerta.

Ao ficar sem munições naquela situação [na clareira] ou devido à arma ter-se encravado (?!) [não houve oportunidade para saber a verdadeira razão], procurei proteger-me atrás de uma árvore ali próxima para trocar de carregador, tendo-me caído nas costas, alguns segundos depois, um pequeno tronco dessa árvore, mas sem consequências físicas para além do natural susto. À minha frente, mas próximo da vegetação, o cabo Miranda, especialista de dilagramas, contemplava os acontecimentos em perfeito estado hipnótico [?], pois não saiu da sua posição vertical enquanto decorreu o combate.

A vida na guerra tem destas coisas. Chegado ao aquartelamento, são e salvo, dei cumprimento ao plano pré-definido, seguindo para Bafatá e depois para Bissau, onde pernoitei.  No dia 5 de fevereiro de 1973, lá estava eu no Aeroporto de Bissalanca (...), aguardando, ansiosamente, por outro momento pleno de significado: gozar o segundo período de férias em Lisboa, até ao dia 10 de março de 1973, em família. Era a última etapa do itinerário iniciado na Ponta Varela (Xime) e concluído em Lisboa, quarenta e oito horas depois. (...). (***)