sábado, 6 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18180: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte VII: Perdidos no rio Cacheu, em maio de 1968 (2)


Foto nº 805A > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio... Memorial aos mortos da CCAÇ 1684...  Força comandada pelo alf mil SAM Virgílio Teixeira, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69), aguardando instruções do seu comando, em São Domingos...




Foto nº 805 > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  O alf mil SAM, CCS/ BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69), junto ao memorial aos mortos da CCAÇ 1684, tendo ao fundo o edifício do comando da subunidade ali estacionidade.



Foto nº 814 > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... No meio do grupo, o alf mil SAM, CCS/ BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69).


Foto nº 814 A> Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... No meio do grupo (, lado esquerdo(, o alf mil SAM, CCS/ BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69).


Foto nº 814 B > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe (lado direito)... 



Foto nº 811 > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... Havia um indígena morto (1)


Foto nº 811 A > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... Havia um indígena morto  (2)

o
Foto nº 811 A > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... Havia um indígena morto  (3)




Foto nº 812 > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... Havia um indígena morto  (4)


Foto nº 812A > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe... Havia um indígena morto  (5)-



Foto nº 813 > Guiné > Região de Cacheu > Susana > Maio de 1968 > Perdidos no rio...  Algures numa aldeia felupe...

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69):


As fotos, de 801 a 817 fazem parte da minha colecção especial e do capítulo ‘perdidos no rio’ [, de iremos publicar  três postes].

Foi uma missão que o nosso novo comandante, após a evacuação do meu comandante inicial, tenente coronel Saraiva, ter sido evacuado por ferimentos em combate, não encarou bem comigo, nem eu com ele, e então deu-me como missão ir comandar um sintex até Susana para carregar alguns mantimentos, pois o nosso aquartelamento [, em São Domingos,] estava sem nada, após uma tempestade tropical ter destruído quase tudo o que era perecível.

Até uma vaca viva veio no pequeno barco. Só que no regresso, e após uma visita a Varela, uma praia lindíssima mas abandonada, quando regressamos passados uns dias, o piloto perdeu-se naquele emaranhado de dezenas de rios e braços de rio, e sem rádio – nem telemóvel, naquele tempo... – fomos parar a uma aldeia indígena felupe, muito atrasada, nem sei o nome, e por lá ficamos.

Até ser dada a nossa falta por lá ficamos a esperar até de manhã. Veio um heli e localizou-nos e fomos encaminhados para um local onde o piloto já conhecia melhor, e assim chegamos a São Domingos, a salvo, de sermos comidos vivos, pelos felupes ou pelos jacarés…

Este episódio não consta na História da Unidade, pois soube mais tarde que o comandante, coronel Renato Xavier, ficou aflito, por ter dado esta responsabilidade a um oficial não operacional, e assim, apesar de todos tomarem conhecimento, nunca foi divulgado nem escrito, foi um sonho ou pesadelo. Mas não me lembro de ter ficado amedrontado.

Ficaram as várias fotos que tenho desta aventura no Norte da Guiné, e na fronteira com o Senegal até Cabo Roxo, que visitamos também. Não foi tudo mau, mas poderia ser!

Deu tempo para conhecer também o estuário e foz do rio Cacheu, muito maior do que o Tejo. Uma coisa deslumbrante, pois estamos quase em cima do Atlântico e o clima é muito melhor.

(Continua)

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Guiné 61/74 - P18179: Parabéns a você (1369): Paulo Santiago, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 53 (Guiné, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18174: Parabéns a você (1368): João Meneses, ex-2.º Tenente FZE do DFE 21 (Guiné, 1972); Ricardo Figueiredo, ex-Fur Mil Art do BART 6523 (Guiné, 1973/74) e Valentim Oliveira, ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 489 (Guiné, 1963/65)

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18178: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte VI: Perdidos no rio Cacheu, em maio de 1968 (1)



Foto nº 816 > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968 > Perdidos no rio... mas encontrando por fim uma saída... com regresso a casa, sãos e salvos, a São Domingos... Força comandada pelo alf mil SAM Virgílio Teixeira, CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)... Não sabemos como é que cabiam num sintex, com 2 potentes motores, uam secção (9/10 homens), além dos mantimentos (incluindo uma vaca!) trazidos para São Domingos...



Foto nº 801 > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968 > Perdidos no rio: o sintex...


Foto nº 801 A > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968 > Susana > Perdidos no rio: o sintex... Detalhe: em primeiro plano, o alf mil SAM Virgílio Teixeira,  cmdt da força (CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69


Foto nº 802  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968  > Susana > Perdidos no rio: o sintex... Detalhe: em primeiro plano, o alf mil SAM Virgílio Teixeira,  cmdt da força (CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)... Apreensivo mas não amedrontado...



Foto nº 815  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968 > Perdidos no rio:  aguardando ajuda em Susana...


Foto nº 803  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968  > Susana > Perdidos no rio: o sintex... Detalhe: em primeiro plano, o alf mil SAM Virgílio Teixeira,  cmdt da força (CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)..., bebendo uma cerveja Cristal.


Foto nº 804  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968  > Susana > Perdidos no rio: o sintex... O pessoal dormitando (1)...


Foto nº 817  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968 > Susana > Perdidos no rio: o sintex... O pessoal dormitando (2)...


Foto nº 813  > Guiné > Região de Cacheu > Rio Cacheu > Maio de 1968  > Perdidos no rio: estuário e foz do rio Cacheu...


Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do  nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69):


Fotos, de 801 a 817: Fazem parte da minha colecção especial e do capítulo  ‘perdidos no rio’ [, de iremos publicar dois ou três postes].

Foi uma missão que o nosso novo comandante, após a evacuação do meu comandante inicial, tenente coronel Saraiva,  ter sido evacuado por ferimentos em combate, não encarou bem comigo, nem eu com ele, e então deu-me como missão ir comandar um sintex até Susana para carregar alguns mantimentos, pois o nosso aquartelamento [, em São Domingos,]  estava sem nada, após uma tempestade tropical ter destruído quase tudo o que era perecível.

Até uma vaca viva veio no pequeno barco. Só que no regresso, e após uma visita a Varela, uma praia lindíssima mas abandonada, quando regressamos passados uns dias, o piloto perdeu-se naquele emaranhado de dezenas de rios e braços de rio, e sem rádio – nem telemóvel, naquele tempo... – fomos parar a uma aldeia indígena felupe, muito atrasada, nem sei o nome, e por lá ficamos. 

Até ser dada a nossa falta por lá ficamos a esperar até de manhã. Veio um heli e localizou-nos e fomos encaminhados para um local onde o piloto já conhecia melhor, e assim chegamos a São Domingos, a salvo, de sermos comidos vivos, pelos felupes ou pelos jacarés…

Este episódio não consta na História da Unidade, pois soube mais tarde que o comandante, coronel Renato Xavier, ficou aflito, por ter dado esta responsabilidade a um oficial não operacional, e assim, apesar de todos tomarem conhecimento, nunca foi divulgado nem escrito, foi um sonho ou pesadelo. Mas não me lembro de ter ficado amedrontado. 

Ficaram as várias fotos que tenho desta aventura no Norte da Guiné, e na fronteira com o Senegal até Cabo Roxo, que visitamos também. Não foi tudo mau, mas poderia ser!

Deu tempo para conhecer também o estuário e foz do rio Cacheu, muito maior do que o Tejo. Uma coisa deslumbrante, pois estamos quase em cima do Atlântico e o clima é muito melhor.

(Continua)

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Guiné 61/74 - P18177: In Memoriam (310): Álvaro Andrade de Carvalho (Lourinhã, 14/8/1948 - Lisboa, 4/1/2018): médico, psiquiatra, gestor de saúde, meu conterrâneo, meu condiscípulo, meu amigo de infância, meu amigo para sempre... O funeral é no sábado, às 14h00, na sua terra natal (Luís Graça)


Álvaro Andrade de Carvalho (Lourinhã, 14/8/1948 - Lisboa, 4/1/2018). Diretor do Programa Nacional de Saúde Mental, desde 2011.



1. Soube esta noite, por esse novo mensageiro da morte que é o Facebook, do já esperado (mas sempre temido) desfecho da tua luta, desigual, contra a doença (oncológica)... 

Acabas de atravessar o rio Caronte, nessa viagem sem regresso para qualquer mortal. Todos já temíamos o pior, a tua família e os teus amigos do peito, quando em 14 de agosto de 2017 nos juntámos na tua casa da Lourinhã para celebrar a vida, o amor, a amizade  e... a esperança. Fazías então 69 anos. 

Foi uma luta desigual, mas digna e corajosa, a tua, contra a morte anunciada.  Não tenho cabeça, às cinco da manhã do dia seguinte, para te escrever a "oração fúnebre" que te é devida.  Outros farão muito melhor do que eu o elogio do homem público, do cidadão, do português e sobretudo do médico, do psiquiatra, do psicanalista, do professor, do chefe de serviço hospitalar, do gestor e reformador da saúde mental. Infelizmente, já não estarás cá, em 2019, quando se comemorar os 40 anos do serviço nacional de saúde, para cuja génese e desenvolvimento também deste a tua quota parte, decisiva.  Mas o teu exemplo, em termos de ação e pensamento, continuará a ser inspirador para todos nós,

Deixa-me reproduzir aqui, meu querido Alvarinho,  as palavras que eu te disse, no teu dia de anos.  É uma pequena, singela, homenagem de um dos teus amigos de infância que ficaram, discretamente,  amigos para sempre. Estas palavras,  ditas num círculo íntimo em 14/8/2017, passam a ser públicas, se não me levas a mal, do outro lado da margem do rio.  E espero que possam ser também um lenitivo para a perda devastadora que é a tua morte, extemporânea, aos 69 anos, para todos nós, a começar pelos teus filhos, Miguel, Joana e Sara, e os teus netos, demais família e amigos, sem esquecer a grande comunidade da saúde mental (e da saúde pública), o teu país, a tua terra. E as mulheres que te amaram. Sim, tu foste feliz entre os homens e as mulheres. Foste feliz no amor e na amizade,

2. Soneto de amizade, dedicado por Luís Graça ao Álvaro de Carvalho no seu 69º aniversário:

Meu caro Álvaro,
meu bom e velho amigo,
querido Alvarinho:

Raramente me esqueço de te dar os parabéns,
no teu dia de anos,
desde há mais de sessenta anos.
A data, de resto, coincide com um dia glorioso da nossa história,
o da batalha de Aljubarrota, em 14 de agosto de 1385.
Se o nosso exército não tem derrotado o dos nossos vizinhos,
hoje estaríamos aqui a “hablar en castellano de la amistad entre nosotros”…

Nasceste num sábado, em 14 de agosto de 1948,
que foi de alegria para os teus pais,
pessoas de quem tive o privilégio de serem minhas amigas.
O dia, em termos metereológicos, não terá sido muito diferente do de hoje, 
talvez um pouco melhor,
pelo que pude ler na 2ª edição do “Diário de Lisboa”
(, edição de 8 páginas, de que te mando um exemplar em formato digital).

Na costa norte e centro, o céu estava limpo, 
por vezes com algumas nuvens, 
vento norte bonançoso a fresco, 
visibilidade boa, 
ondulação norte noroeste moderada.

Foi um ano de estiagem, o de 1948… 
Tinha havido, ao menos, umas chuvadas fortes uns dias antes…

E pelo mundo, as notícias eram aparentemente as de rotina: 
acabavam os jogos olímpicos em Londres, 
chovia torrencialmente em Berlim, 
afetando a ponte aérea anglo-americana, 
estávamos em plena guerra fria 
e chegavam também ao fim, depois de 3 anos, os julgamentos de Nuremberg…

Em Portugal, na ponta mais ocidental e acidental da Europa, nada de novo… 
Ah!, éramos bicampeões europeu e mundiais de hóquei em patins… 
E claro comemorava-se o 14 de agosto, “dia da infantaria”…
Não quero ser maçador, e abusar do meu tempo de antena,
em dia que é teu, da tua família, dos teus filhos e netos,
e todos aqueles que te querem bem
e  que fazem votos para ver-te de novo em boa forma, 
ativo, produtivo e saudável…
Estamos aqui para darmos graças à vida 
e festejar o amor, a amizade…e a esperança!
Mas tenho que te dizer, com ternura, algumas palavras
na tua festinha das 69 primaveras…

Não sei se alguma vez houve um poeta ou uma poetisa
que te tenha escrito um soneto…
Aceita aquele que eu te acabo de escrever,
e que é uma singela declaração de amizade,
em meu nome, e em nome da minha família,
a Alice, a Joana e o João.

Foste importante para mim,
por muitas razões que tu e eu sabemos,
na minha infância, adolescência e juventude,
e já depois de ter vindo da Guiné, ter casado e voltado a estudar…
Mas também foste importante para eles.
Foste, mais do que visita da nossa casa,
também um médico, um conselheiro e um grande amigo.

A Alice e eu estamos-te muito gratos,
a ti e à Ana Jorge,
pelo João que também ajudaste a nascer,
e que hoje é teu colega, psiquiatra.
Músico, seguiu esta manhã para Espanha, para um concerto,
e manda-te um xi-coração de parabéns.

Separados por duas ruas,
vivemos a nossa infância, adolescência e parte da juventude
na mesma terra, Lourinhã.
Estudámos na mesma escolinha do Conde de Ferreira,
brincámos no mesmo largo do coreto,
uma e outro há muito vítimas do camartelo camarário.
Lemos, na tua casa,  os mesmos livrinhos aos quadradinhos,
dos cobóis às séries do “Cavaleiro Andante”…

Depois da 4ª classe e do exame de admissão (que fizemos juntos em Lisboa),
seguimos caminhos diferentes,
mas encontrávamo-nos nas férias grandes.
Desde cedo mostraste espírito de líder
(aquele que vai à frente mostrando o caminho),
criando o “Alvorada” juvenil,
e depois colaborando intensamente na redação do jornal.

Foi aqui, no jornal "Alvorada", que eu tive a minha primeira atividade remunerada. 
Foi aqui também nosso colega de escola, amigo e teu primo,
o saudoso Rui Tovar de Carvalho (Lourinhã, 1948-Lisboa, 2014), 
começou a dar os primeiros passos na sua carreira de jornalista desportivo.

À criação de uma secção, ou de uma página, 
a que chamámos "Alvorada Juvenil", 
seguiram-se outras: 
abrimos espaço ao correio dos soldados do ultramar,
 e demos voz aos nossos emigrantes. 
No "Alvorada Juvenil", abrimos um inquérito aos jovens lourinhanenses 
e alimentámos o "cantinho dos poetas"...

Tu e eu, assinámos em conjunto diversas reportagens, 
para além de artigos de opinião que subscrevemos individualmente. 
Havia alguma irreverência e inquietação, 
próprias da idade e da época que vivíamos.

Acabei por exercer as funções de redator chefe deste jornal, quinzenário regionalista,
que ainda hoje se publica. 
Foi fundado ao em 1960, como sabes, 
pelo padre António Pereira Escudeiro (Tomar, 1917-Lisboa, 1994), 
um homem a quem a Lourinhã muito deve 
e que fez uma aposta forte na formação das elites, ou seja, na educação. 
Foi igualmente fundador do jornal "Redes e Moinhos" (1954-1960). 
Antes de vir para a Lourinhã como pároco, em 1953, 
esteve em Alcanena onde fundou o jornal quinzenário "O Alviela", 
entretanto suspenso pela censura por ousar publicar um artigo 
sob o título "A fome em Alcanena"... 
Estava-se em plena campanha do general Norton de Matos. 
Retomou a publicação depois de ser autorizado a versar também "assuntos sociais"...

À frente do "Alvorado", como redator-coordenador, de 1964 a 1966, 
"fiz-me esquecido" 
e deixei de mandar o jornal à censura...
A entrada de jovens fora uma pedrada do charco da pasmaceira e do conformismo
em que se vivia nesta terra do oeste-estremenho. 
Estava-se em plena guerra colonial 
mas já na fase de fim de ciclo...
"Cadáver adiado", o regime do Estado Novo ainda estrebuchava 
e metia medo a muitos. 
Não admira que o diretor do jornal tenha recebido 
um intimidatório ofício da direção geral de censura 
a perguntar porque é que se permitia o luxo de ultrapassar a lei... 
Metade do ofício, que era apenas de duas linhas, 
correspondia a uma assinatura em letra garrafal, 
símbolo máximo da arrogância de quem se sentia dono e senhor deste país... 
Tudo "a bem da Nação", pois claro.

O pobre do padre vigário, já com ficha na PIDE (por causa do "Alviela"),
lá teve que arranjar uma desculpa esfarrapada aos senhores coronéis da censura 
e, a mim, puxou-me as orelhas... 
Doravante, tínhamos que mandar os artigos em duplicado para a tipografia 
que por sua vez submetia uma cópia à censura... 
E no entanto nunca nenhum de nós escreveu o que quer que fosse 
que pudesse pôr a causa a sacrossanta trilogia Deus, Pátria e Família...

Eu acho que os censores embirravam sobretudo com os nossos jovens poetas.
Não entendiam nada da poesia moderna 
e receavam à brava que os jovens lourinhanenses e outros, 
que colaboravam connosco, 
escrevessem também nas "entrelinhas"... 
Nunca se sabe o que se passa na cabeça irrequieta dos poetas 
nem muito menos na mente perversa dos censores...

Um dia vais gostar de rever este período das nossas vidas, 
em que fomos jornalistas amadores 
e ganhámos o gosto pela escrita, pela ação cívica e pela animação cultural…. 
Prometo fazer-te uma seleção dos teus e dos nossos escritos de adolescência…

Está na hora, por fim, de te ler o poema que te fiz esta noite. 
E que te dedico com todo o meu apreço, gratidão, amizade e fraternidade. 
É o meu pequeno contributo para a tua festa.


Soneto de amizade

por Luís Graça


Alvarinho, deixa-me te dizer,
Hoje, este soneto de amizade:
Amigo é um irmão, podes crer,
Para lá do sangue e da idade.

Nada tem de declaração senil:
Amigos para sempre, desde a infância,
A escola e o “Alvorada” juvenil,
Somos irmãos em última instância.

Amigo é partilhar dor e alegria,
Nos bons e maus momentos da vida,
É cumplicidade, é empatia.

E que mais, meu irmão e meu amigo ?
É saber dar-te a valia devida,
É ter tempo, afinal, para estar contigo!



Lourinhã, 14 de agosto de 2017.

PS – Parabéns, muita saúde e longa vida,
Porque tu mereces tudo!


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Nota do editor:

Último poste da série >  28 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18149: In Memoriam (309): Alf inf QP Augusto Manuel Casimiro Gamboa, CCAÇ 1586 (Piche, Nova Lamego, Canjadude, Madina do Boé, Béli, Bajocunda, 1966/68), nascido em São Tomé , morto em combate, em 14/12/1967, em Uelingará, entre Canjadude e Nova Lamego (José Martins / Virgílio Teixeira / António J. Pereira da Costa / José Corceiro)

Guiné 61/74 - P18176: O cruzeiro das nossas vidas (26): Ementa do navio N/M Uíge aquando do transporte do Pel Mort 4580 para a Guiné em Abril de 1973 (Carlos Vieira, ex-Fur Mil)

 
1. Mensagem do nosso camarada Carlos Vieira, ex-Fur Mil do Pel Mort 4580 (Bafatá, 1973/74), com data de 15 de Dezembro de 2017:

Caros camaradas: 

Em continuação da minha colaboração, envio apenas por curiosidade algumas ementas da nossa messe de sargentos durante a viagem no paquete Uíge. 

Qualquer semelhança entre esta viagem e um cruzeiro no Mediterrâneo é pura coincidência. 


Cumprimentos, 
Carlos Vieira 
Pel Mort 4580








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Nota do editor

Último poste da série de 11 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16587: O cruzeiro das nossas vidas (25): O meu regresso a casa, no N/M Uíge (Manuel Resende (ex-alf mil art, CCAÇ 2585/BCAÇ 2884, Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, 1969/71)

Guiné 61/74 - P18175: Notas de leitura (1029): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (16) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Outubro de 2017:

Queridos amigos.
Antes de mais venho renovar a minha profunda gratidão pelo amparo que tenho recebido no Arquivo Histórico do BNU por parte dos seus desvelados técnicos, incansáveis a vasculhar tudo o que existe sobre o período em análise, ajudando-me com imagens, umas completamente desconhecidas outra não tanto. São tão exímios que é para mim impensável continuar esta aventura que se prolongará até 1975, sem a sua proficiência e brio profissionais.
Temos aqui o documento que relata os acontecimentos do movimento revolucionário que se estendeu de Abril a Maio de 1931, descrito minuciosamente. E relata-se um psicodrama cujo desfecho foi um homicídio. Virá a seguir um psicodrama incomparavelmente maior, a chamada revolta dos Felupes, em 1933, que René Pélissier investigou em vários arquivos, tudo começou com um avião que saiu de Dakar e desapareceu.
Era uma vez...

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (16)

Beja Santos

Em 14 de Maio de 1931, a filial de Bolama envia para o governador em Lisboa a seguinte carta intitulada “Situação da praça – movimento revolucionário”:
“Por notícias oficiais daqui expedidas, calculamos que V. Exa. terá tido conhecimento que eclodiu nesta cidade, no dia 17 de Abril próximo pretérito, pelas 3h30, o movimento revolucionário constituído pelas tropas da guarnição desta capital e elementos civis, na sua maior parte deportados políticos.
Numa cidade sem exigências, em que o trabalho ocupa primacial lugar, a revolução não poderia deixar de surpreender, e até mesmo aterrorizar, a sua pacífica população.
E foi por isso mesmo que, nos dias que se seguiram ao do movimento, em Bolama o êxodo era manifesto.
Alheios à política militante, nada podemos dizer sobre a finalidade do movimento insurrecional. Mas os factos demonstram iniludivelmente que o seu objetivo era provocar a queda da Ditadura, uma vez que o governo na metrópole não dispusesse de meios necessários para dominar os revoltosos dos Açores e da Madeira, e simultaneamente acudir à situação da Guiné.
Os indígenas, por índole assustadiços, e agora com justificada razão de o serem, entrincheiraram-se nas suas palhotas de onde não mais saíram; outros elementos nativos, igualmente apavorados, refugiaram-se no interior, cujas relações com o litoral estavam cortadas. Seguiram-se as medidas de segurança e consolidação do regime em vigor na colónia.

Foi destituído das funções de Governador o Tenente-Coronel Leite de Magalhães, ficando a superior administração da colónia entregue a uma Junta Governativa.
O Governador foi preso, com homenagem, no Palácio do Governo. Os oficiais, que se supunham afetos à situação política anterior, incluindo o Chefe de Estado-Maior, também foram detidos e embarcados no Maria Amélia, conjuntamente com o Governador, este com destino a Lisboa e aqueles em direção à Madeira.
Como é fácil de calcular, nos primeiros dias da revolução a cidade tinha um aspeto bélico, o que todavia não prejudicou grandemente a sua vida normal. Foi estabelecida a censura telegráfica e postal, por virtude da qual não comunicámos a V. Exa. em devido tempo o que vinha sucedendo.
Da nossa filial de S. Tiago recebemos dois telegramas em um dos quais nos perguntavam se o Governador da Província se achava preso. A nenhum destes despachos nos foi dado consentido dar resposta, tendo os telegramas ficado em poder da Junta Governativa.

Por escrutínio secreto, o comité executivo da Junta Governativa elegeu para o cargo do governo interino da Guiné o Tenente-Coronel Médico Dr. Gonçalo Monteiro Filipe, que tomou posse em 24 de Abril último.
Muitas vezes fomos procurados, depois de encerrar o expediente, e até a desoras da noite, para fazer pagamentos, uns da conta do banco, outros de conta da Caixa do Tesouro.
Estes pedidos eram-nos feitos em nome da Junta Governativa, razão porque sempre os atendemos com a maior prontidão, afastando portanto a ideia de poder contrariar a acção de quem governava.

Vieram finalmente dias de mais calma. Apesar disso, aproveitando a estadia do vapor Silva Gouveia, nos portos da colónia, foi este mandado a Cabo Verde com a missão especial de corromper a sua população, lançando-a igualmente na revolta. Tal tentativa não obteve êxito, e por isso os revoltosos limitaram-se a subtrair da Ilha de Maio, trazendo para a Guiné os deportados políticos que ali se encontravam, em número não superior a oito.
Entretanto chegava a notícia da rendição dos Açores e pouco depois da Madeira, que veio pôr termo às operações.
Nasce então a ideia de deserção. Para ocorrer às despesas da Junta Governativa, abriram-se créditos no valor de 250.000$00, pouco mais ou menos, segundo o que nos foi dito pelo senhor Director da Fazenda.
Os últimos dias foram de intranquilidade. É que, com a partida dos revoltosos havia receio de represálias. As pessoas mais em evidência não pernoitaram em suas casas.

Na tarde do dia 5, fechámos na Casa Forte todos os livros e valores, ainda os mais insignificantes. Para maior segurança, e com a necessária discrição, refugiámo-nos na casa do Cônsul da Alemanha, com quem de há muitos anos mantemos boas relações, até ao dia seguinte, quando a debandada já era um facto.

O Dr. Monteiro Filipe no momento de se ausentar dirigiu uma carta ao Vice-Presidente do Conselho do Governo, Dr. José Alves Ferreira, convidando-o a tomar conta do governo, o que este fez ao abrigo das disposições da Carta Orgânica vigente. Neste meio tempo chegava a notícia da nomeação do senhor Major João José Soares Zilhão, para desempenhar as funções de Governador da Colónia, cuja posse teve lugar no dia 9 deste mês. Eis, a traços largos, o que foi o movimento revolucionário na Guiné.
Espera-se a todo o momento a vinda de tropas do continente e de um vaso de guerra”.

É patente que há uma tensão entre as agências de Bolama e Bissau. Neste mês de Maio de 1931, Bissau reponta com Bolama que não se devem duplicar as despesas, que em casos semelhantes ou parecidos com o que se telegrafou para a sede acerca do movimento revolucionário, Bolama deve enviar tudo para Bissau, é daqui que os telegramas seguem para Lisboa, e surge claramente uma crítica: “Não compreendemos o motivo porque se refugiaram no consulado alemão, depois das precauções que tomara”.


Em Novembro, Bissau pede a Lisboa para fazer despesas com móveis e utensílios:

“Dentro em pouco será necessário mobilar, sem luxo mas com decência, o primeiro andar do edifício da agência. A mobília existente não corresponde às necessidades, embora mandemos restaurar, como é lógico toda a que possa ser aproveitada. Nestas condições pedimos e agradecemos a V. Exa. a fineza de autorizar a compra e remessa da seguinte mobília:
- Uma mobília de sala completa com o mínimo de doze cadeiras; 
- Uma mobília de sala de jantar com doze cadeiras; 
- Uma mobília de quarto; 
- Dois tapetes grandes para sala; 
- Um dito, para sofá; 
- Seis ditos para camas.

A necessidade destes tapetes é flagrante, porque o pavimento é de mosaico. As mobílias terão de ser também grande dado o espaço dos aposentos a mobila. Não podemos deixar de frisar a V. Exa. que ao pedirmos estes artigos de mobília não temos em vista rodearmo-nos de luxo – que bem dispensamos – mas tão-somente prover o edifício com aquilo que julgamos indispensável”.

A comunicação mudou de diapasão, tornou-se cerimoniosa, tão ao estilo do Estado Novo, “cada um no seu lugar”.


Tem-se referido que ambas as filiais não perdem oportunidade para dar informações de diferente índole, como idas e vindas e até psicodramas. É o que acontece em Outubro de 1932 quando se Bissau comunica para Lisboa que o Director dos Serviços das Obras Públicas, Engenheiro Ferreira Chaves feriu mortalmente com um tiro de pistola, em Bolama, no dia 24 de Agosto findo, o Capitão Reformado António Augusto Parreira, Chefe da Repartição de Agrimensura e Cadastro, depois do que se entregou à prisão do Sr. Dr. Juiz. Constava que o Engenheiro Chaves e o Capitão Parreira, ambos da comissão urbana de Bolama depois de uma troca de ofícios em termos ásperos tinham cortado as relações. Surgira um diploma legislativo que o Capitão Parreira julgava obra do Engenheiro Chaves para o ferir. Parreira foi a casa de Chaves para ter com ele um desforço:

“Diz-se que este dormia a sesta quando o Capitão Parreira lhe entrou pela casa dentro numa atitude desvairada, e o agrediu.
Depois de uma breve luta entre ambos, no quarto de cama, junto ao toilette onde o Engenheiro Chaves tinha a pistola, parecendo-lhe, declara o arguido, que o Capitão Parreira pretendia deitar a mão à arma ou com receio desse gesto, o Engenheiro Chaves teria pegado nela para a arremessar para longe e, nessa altura, segurando-lhe a mão o Capitão Parreira obrigou-o a disparar sendo este atingido na cabeça, falecendo horas depois. Deste facto não há testemunhas e nós limitamo-nos a reproduzir, em síntese o que nos têm contado. O Engenheiro Chaves já foi pronunciado sem fiança e suspenso do exercício das suas funções”.

Nada disto é comparado com outro psicodrama que se avizinha, a chamada revolta dos Felupes.

(Continua)
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Nota do editor

Poste anterior de 29 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18153: Notas de leitura (1027): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (15) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 1 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18163: Notas de leitura (1028): “Dinâmica da arte Bijagó, Guiné-Bissau – contribuição para uma antropologia da arte das sociedades africanas”, por Danielle Gallois Duquette, editado pelo Instituto de Investigação Científica e Tropical, 1983 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18174: Parabéns a você (1368): João Meneses, ex-2.º Tenente FZE do DFE 21 (Guiné, 1972); Ricardo Figueiredo, ex-Fur Mil Art do BART 6523 (Guiné, 1973/74) e Valentim Oliveira, ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 489 (Guiné, 1963/65)



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Nota do editor

Último poste da série de 2 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18165: Parabéns a você (1367): Carlos Marques Santos, ex-Fur Mil Art da CART 2339 (Guiné, 1968/69)

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18173: (In)citações (114): Amigo Cherno, meu irmão, com homens como tu, a Guiné-Bissau ainda se vai tornar uma grande pátria (Francisco Batista [ex-alf mil inf, CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72)]

1. Comentário do nosso grã-tabanqueiro Francisco Baptista, transmontano de Brunhoso (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72),  ao poste P18170 (*)

Amigo Cherno Baldé, gosto de te ler e admiro-te porque tu tens o humanismo e a universalidade para estabelecer pontes entre as gentes e entre os povos, que muitos ex-combatentes como eu apreciam.

A tragédia do soldado Sissé que tu contas com arte e sabedoria é uma consequência de os estrategas militares quererem fazer de jovens, máquinas de guerra através de treino militar duro e desumano, para serem lançados nos piores e mais bárbaros cenários de guerra, sem se importarem com os efeitos nefastos a nível psicológico que irão provocar na personalidade desses jovens. 

Estava eu em Buba, em 1971, quando um destacamento de fuzileiros africanos regressou lá depois da operação a Conakry [Op Mar Verde]. Sobre isso um subtenente dos fuzileiros falou-me. Estava em Mansabá em 1971, quando duas companhias de comandos africanos, foram lançadas na mata do Morés, depois de fortes bombardeamentos da aviação e de obuses levados para Cutia. O major,  comandante do COP de Mansabá, quando regressou de helicóptero depois de visitar a zona intervencionada, encontrou-me no bar e falou-me dessa operação. 

O subtenente dos fuzileiros e o major do exército já morreram, eram ambos bons amigos dos camaradas e dos copos. Falámos e bebemos uns copos, mais do que falámos, a guerra não é heróica, é miserável. 


Guiné-Bissau > Bissau > c. 1995/1997 > O Cherno Baldé com a sua querida mãe, Cadi Candé (c. 1927-2017), aqui com c. 70 anos. A foto foi tirada depois do primeiro regresso do Chermo Baldé, de Lisboa, onde frequentou, um mestrado (ou curso de pós-graduação, não sabemos ao certo) no ISCTE-IUL  (1993/95). Licenciou-se em economia  na Universidade de Kiev, Ucrânia, tendo assistido ao desmantelamento da URSS. Trabalha como gestor de projetos no CAON - FED, em Bissau [Cellule d'Appui à l'Ordonnateur National du Fonds Européen de Développement]. Andou no Liceu Nacional Kwame N'Krumah. Aprendeu as primeiras letras em Fajonquito com os militares portugueses ali estacionados durante a guerra colonial. É casado, pai de 4 filhos. É sportinguista. Vive em Bissau. Tem página no Facebook.

Fotos (e legendas): © Cherno Baldé (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Depois da descolonização, após essa guerra cruel suportada por essas tropas especiais que, quando
são mandadas para as zonas de combate mais duras, vão morrendo senão fisicamente, psicologicamente porque vão matando a sensibilidade própria a todo o ser humano, o Estado Português, sobre a bandeira de quem eles combateram. abandona-os à fúria dos seus inimigos africanos, com promessas hipócritas das autoridades do novo Estado da Guiné Bissau.

Uma velha nação da Europa e uma jovem nação da África que deram uma lição miserável de hipocrisia e covardia a todo o mundo.

Amigo Cherno, meu irmão, acredito que, com homens como tu,  a Guiné-Bissau ainda se vai tornar uma grande Pátria, com muitos homens bons e muitas etnias a viver em paz e harmonia. Os meninos da tua terra com tantas esperanças nos seus olhos tão delicados e doces merecem. (**)

Um grande abraço para ti e para toda essa terra de florestas, água e bolanha, que continuo a amar. Um Bom Ano. 

Francisco Baptista
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Guiné 61/74 - P18172: Memória dos lugares (369): Fajonquito (1961) ou... Gam Sancó (1940, 1914, 1906, 1889)? (Armando Tavares da Silva)


Capa do Atlas Colonial Português, 1914


Capa do Atlas Colonial Português, 1914  > Mapa da Guiné > Posição relativa de Gam Sancó, entre Cambaju e Bafatá.



Guiné > Atlas de João Soares (c. 1940) > Posição relativa de Gam Sancó (a azul)... Escala: 1/2 milhões


Guiné > Mapa geral da províncía (1961) > Escala 1 / 500 mil > Posição relativa de Fajonquito, a noroeste de Contuboel.

Infogravuras: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Armando Tavares da Silva, com data de hoje:

Caro Luís Graça,

O Post P18170,  do Grã-Tabanqueiro Cherno Baldé (*), fiz-me apressar o envio da carta da “Província da Guiné” inserta no Atlas Colonial Português da Comissão de Cartografia do Ministério das Colónias, de 1914. Esta carta, que tem 100 anos, ajuda a conhecer as mudanças que sofreu a toponímica da Guiné.(**)

Para além da imagem de toda a carta (ocupa 2 páginas e tem a dimensão de 43 x 32 cm), envio ainda a mesma carta mas dividida em quatro partes para melhor identificação das povoações.

Uma das povoações que nela figura é Gam Sancó, povoação que não figura nas cartas mais recentes. Esta povoação figurava também nas cartas da Comissão de Cartografia de 1889 e 1906, e ainda no atlas de João Soares, que teve várias edições nos anos 1940, e era utilizado no ensino liceal. Para melhor identificação da povoação segue ainda uma parte ampliada daquela mesma carta, com a região a norte de Bafatá.

Eu penso que esta povoação [, Gam Sancó,], que era a terra de origem do ex-soldado comando Cissé Candé (**), se por acaso não desapareceu, pela sua localização, é a actual Fajonquito, e gostava que me confirmassem, ou não, esta hipótese.

O Cherno Baldé, natural de Fajonquito,  talvez possa dar alguma informação relevante.

Abraço do
Armando Tavares da Silva

PS: As imagens seguem por WeTransfer


2. Mensagem do nosso editor acabada de enviar ao Cherno Baldé:

Amigo e mano Cherno:

Além dos votos de bom ano (, a nível pessoal, familiar e profissional), mando-te aqui uma pequena prenda (coletiva)... do nosso grã-tabanqueiro Armando Tavares da Silva: o atlas da Guiné de 1914... Segue um outro mail com o link para poderes transferir as imagens até ao dia 11 deste mês... São pesadas: mais de 24 MB... Vou também publicar no blogue [neste e noutros postes]... Mas gostaríamos de ter o teu douto comentário sobre a toponímia dessa época, em especial a da tua região natalícia: será que Fajonquito poderá ter-se chamado no passado "Gam Sancó" ou "Gã Sancó"?  [Gã Sancó  não consta da Portaria nº 71, de 7 de julho de 1948, do Governo da Colónia da Guiné: Primeira relação de nomes geográficos da Guiné Portuguesa, escritos segundo a ortografia oficial]

Já em 7/10/2017. tu perguntavas o seguinte (**):

"Caro Luís,

A tal aldeia de "Pejungunto" na região de Farim, bem poderia ser uma grafia alternativa a de 'Fajonquito',  isto antes da normalização com o Governador  Sarmento Rodrigues."


E o prof Armando Tavares da Silva comentava:

" E a aldeia de "Gam Sancó" que aparece no Atlas de João Soares (Sá da Costa, 1949) e que desapareceu na relação de nomes geográficos de 1948, e ausente nas cartas de 1/50 000, o que será? Poderá ser a actual 'Fajonquito'? E 'Gam Sancó',  o que foi/é?"

Mantenhas!...
Luís (***)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de  3 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18170: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): três balas de kalash para uma missão suicida: o trágico fim do ex-soldado 'comando', Cissé Candé, em abril de 1978

Guiné 61/74 - P18171: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (6): Petição enviada para o Ministro da Defesa Nacional e envio do Relatório para o Presidente da Assembleia da República para agendamento da discussão em Plenário (Inácio Silva)

1. Mensagem do nosso camarada, e meu particular amigo, Inácio Silva (ex-1.º Cabo Apontador de Armas Pesadas da CART 2732, Mansabá, 1970/72), fundador e editor da página Relembrar para não esquecer, com data de 3 de Janeiro de 2018, trazendo notícias da Petição que ele próprio colocou em 2011 no site "Petição Pública":

Caro Carlos Vinhal
Envio-te, em anexo, o ofício que recebi hoje mesmo da Assembleia da República, com o Relatório Final da Comissão de Defesa Nacional, a propósito da Petição que coloquei no site "Petição Pública", já há alguns anitos[1], e que foi profusamente divulgada pelo blogue de que és co-editor.
Como poderás verificar, na última folha, para além de estar referido o envio da Petição para o Ministro da Defesa Nacional, está, também, referido o envio do Relatório para o Presidente da Assembleia da República, para agendamento da discussão em Plenário.
Mais uma vez venho pedir-te que a divulgues no teu blogue e do Luís Graça.

Aquando da discussão na Assembleia da República, gostaria que estivessem presentes alguns camaradas nossos, se possível, de todos os ramos das Forças Armadas.

Ofício e Relatório Final da Comissão de Defesa Nacional

Os meus sinceros agradecimentos.
Inácio Silva


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Nota do editor:

[1] - Sobre esta petição vd. postes de:

11 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7591: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (1): Meta, recolha de 4000 assinaturas (Inácio Silva)

17 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7625: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (2): Informação e incentivo (Inácio Silva / Amaro Samúdio)

19 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7641: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (3): Alerta aos camaradas que subscreveram, mas não confirmaram a assinatura (Inácio Silva)

1 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7703: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (4): "Eu servi a minha Pátria. É justo que a minha Pátria reconheça isso" (Cândido J. R. Pimenta)
e
30 de maio de 2017 > Guiné 61/74 - P17410: Ex-combatentes da Guerra Colonial lançam uma Petição Pública On Line (5): A petição "Os ex-combatentes solicitam ao Estado Português o reconhecimento cabal dos seus serviços e sacrifícios", foi admitida (Inácio Silva, ex-1.º Cabo Ap AP da CART 2732)

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18170: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): três balas de kalash para uma missão suicida: o trágico fim do ex-soldado 'comando', Cissé Candé, em abril de 1978


Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > Junho de 1972 > CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, Fajonquito, 1972/74> Equipa dos Condutores e Faxinas: da esquerda para a direita: José Maria, Vasconcelos, Carvalho e Fernando Mandinga. Na primeira fila: Jorge Suleimane, Barbosa (Mamassaido), Braima Banassé e o Francisco (Cherno-Dabo).

Foto (e legenda): © Cherno Baldé (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Cherno Baldé, foto atual. Gentileza
da sua página no Facebook.
I. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Cherno Baldé, com data de ontem:

Caros amigos Luis e Carlos Vinhal,

Antes de tudo, espero que tenham entrado com o pé direito neste ano novo, com votos de saúde e felicidades junto dos seus entes queridos. Também aproveito o ensejo para desejar, a todos os meus amigos reais e/ou virtuais do Blogue da Tabanca grande, votos de festas felizes e prosperidade no ano novo que agora inicia.

Juntamente envio um texto para vossa apreciação e posterior publicação, caso assim o decidam.

Eu passei as festas de Natal na minha aldeia de Fajonquito e a passagem do ano em Bissau com a família.


Um grande abraço de estímulo e de encorajamento para mais um ano de luta e de trabalho para uma vida melhor.

Cherno A. Balde



Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Fá Mandinga > 1970  > Grupo da 1.ª CCmds Africanos, em formação. Vê-se na segunda fila, sentado, o cap 'cmd' graduado João Bacar Jaló. Não temos nenhuma foto do Cissé Candé, natural de Fajonquito,  que pertencia à 2.ª CCmds Africanos, tal como o nosso saudoso Amadu Djaló.

Foto: © Virgínio Briote / Amadu Djaló (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagen: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


II. Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): 

Três balas para uma missão suicida (*)

por Cherno Baldé

Fajonquito, Abril de 1978

Os dias sucediam-se normalmente nessa época seca. As mulheres continuavam a levantar-se cedo para pilar o milho que seria utilizado para matar a fome das crianças que passavam os dias em casa durante o dia e no período da noite quando os homens voltassem dos trabalhos da preparação dos terrenos no campo para a época das chuvas que se aproximava e das pastagens longínquas situadas para lá das bolanhas de Berecolóm e Sunkudjumá.

A vida na aldeia decorria calmamente, entrecortada aqui e ali por questões mundanas, de querelas por mulheres e roubos de gado num contexto em que, cada vez mais, a autoridade de Estado deixava de se fazer sentir nas zonas mais periféricas do pais.

A contrastar com o sentimento de alguma insegurança e de incerteza politica, eram os festejos ligados à independência recente do país com danças frenéticas, acompanhadas de tambores e cânticos das mulheres nos seus trajes multicolores, embora o entusiasmo fosse cada vez menor, assim como a adesão das multidões. “Bhê-Tchebhiríma-ey!” (estamos fartos desta gente) diziam em surdina os mais ousados. Manifestações de apoio seguidos de reuniões intermináveis, todos os dias, era demais para os pobres camponeses que não podiam desperdiçar seu precioso tempo em futilidades.

Para o jovem Cissé (1), todavia, a preocupação era outra. Desmobilizado dos Comandos Africanos, tinha regressado à aldeia havia pouco tempo e, sem problemas de maior, tentava reintegrar-se na vida e nos trabalhos da aldeia na companhia do seu grupo de idade e dos irmãos mais novos, esperando poder mostrar aos mais velhos da aldeia que a vida militar não mudara em nada a sua aptidão e afinco no trabalho que aprendera desde os primórdios da sua juventude.

Ao mesmo tempo, as informações que circulavam não o deixavam sossegado. Os rumores davam o tenente Djamanca, o Carlos Bubacar Djau (2), o Sedjali Embaló (3) e outros, antigos oficiais e colegas do Batalhão dos Comandos, como presos algures em lugar incerto, talvez mortos, e havia que encontrar uma solução o mais rápido possível.

Uma noite decidiu falar com a mulher sobre o assunto. Deviam emigrar para o Senegal, afastar-se por algum tempo, deixar a poeira assentar. Que não, respondera a mulher, emigrar agora e deixar a família com um bebé nos braços, não podia ser, que esperassem ainda um pouco, talvez depois da próxima campanha agrícola.

Os olhos de Cissé emudeceram de lágrimas contidas, pois a mulher não compreendia o desespero da situação e ele sabia que não podia mostrar sinais de fraqueza. Precisamente, ele planeava passar as chuvas já no outro lado da fronteira. Nos dias que se seguiram falou com os seus pais, em especial com o tio paterno sobre o assunto, pedindo-lhes que intercedessem para convencer a mulher no maior sigilo possível, pois o assunto não podia ser do conhecimento público.

Entre outras coisas, chamou-lhes atenção sobre a presença assídua do homem da segurança do Estado que aos olhos de todos não passava de um idiota qualquer, animador da vida social na aldeia em promiscuidade constante com as mulheres, mas que, na realidade, trabalhava para a sua perda. Era ele que controlava a situação na aldeia e arredores, transmitindo as informações ao mais alto nível do Partido e da região. Passava todos os dias nas moranças como se viesse simplesmente cumprimentar os homens grandes, mas o objectivo era outro e Cissé sabia-o, sentindo-se vigiado por olhos e forças invisíveis cujo cerco se apertava de dia para dia.

Sentindo-se incompreendido e encurralado, não podendo aguentar mais, o jovem ex-comando começou a ser violento nas suas atitudes e numa tarde quente do mês de Abril [de 1978], por da cá aquela palha, passou mesmo a vias de facto com a mulher, tendo-a agredido e provocado alguns ferimentos na cabeça. Chegados ao posto sanitário para tratamento e, pela sua gravidade, o caso foi levado junto das autoridades que lhe deram ordem de prisão, sendo encarcerado dentro da residência do responsável pela segurança. Na solidão do cárcere, concluiu que aquilo que ele temia há muito, tinha finalmente chegado e agora estava nas malhas dos agentes da segurança, donde nunca poderia sair.

Por volta das 20 horas, já a noite se tinha abatido sobre a aldeia e, no desespero da causa, forçou a
janela do pequeno quarto que lhe servia de cela, saiu para a varanda da casa e reentrou, pelas traseiras, no quarto do homem da segurança e, como previa, estava ali a Aka (HK-47)  [foto à direita], pendurada na parede da casa. Inspeccionou e viu que a arma continha somente três balas. Abanou a cabeça de tristeza. O que poderia fazer com três balas num momento tão decisivo!?... Teria pensado. Saiu, contornando a área e dirigindo-se ao posto sanitário situado na zona central da aldeia, onde, nesse preciso momento e com a ajuda de um candeeiro petromax, estavam a suturar os ferimentos que ele tinha causado à sua esposa durante a briga da tarde. 

Apontou a arma para o circulo iluminado, não se sabendo bem se para matar a esposa desobediente, se o responsável da segurança que o tinha preso ou alguém do grupo dos curiosos que, entretanto, se tinham amontoado. O tiro da Kalash ecoou no ar e o candeeiro foi projectado pelos ares, aterrando-se a uma dezena de metros de distância. Entre gritos e gemidos de aflição, a multidão dispersou-se na noite escura, espalhando a noticia de um ataque a aldeia…, de mortos e de feridos…

Tudo leva a pensar que o Cissé ficou convencido ter cometido um acto tão irreversível quanto imperdoável e que poderia determinar o seu destino final, destino esse que, durante muito tempo na sua vida de soldado comando e em inúmeras ocasiões, durante as arriscadas missões em que participara, teria pensado, sem conseguir descortinar as suas reais formas. Quantas vezes perguntara a si mesmo quando e como seria a sua morte. Por bala ou por acidente? A única certeza que tinha era que não seria por doença.

Saiu da sua trincheira improvisada, contornou de novo a aldeia, seguindo por um trilho de cabras que atravessava a barreira dos arames farpados, entre o bairro mandinga de Morcunda e as ruínas do antigo quartel, embrenhando-se na escuridão dos arbustos à volta da pista de aviação, onde teria passado parte da noite, mergulhado na convulsão dos seus pensamentos confusos e de lembranças antigas da sua curta mas agitada carreira militar que agora subiam à tona.

Enquanto os guerrilheiros vindos em reforço andavam à sua procura no mato adjacente, durante a madrugada, qual animal ferido, ele teria voltado, sorrateiramente, junto a sua casa e, não tendo encontrado a esposa, ficara emboscado nas suas traseiras à espera dos primeiros raios do sol para finalizar a sua operação.

De manhã cedo, estavam os pais (o pai propriamente dito e seu tio, irmão do pai), sentados no “bentem” dos homens grandes, no centro da morança, a falar sobre os acontecimentos do dia anterior e, certamente, a reflectir sobre as possíveis consequências e medidas de precaução a tomar já que o problema se transformara, perigosamente, num caso de segurança de Estado com toda a região militar Leste em prevenção e de alerta máxima e, eis que surge, de repente, o vulto longilíneo de Cissé à porta da sua cubata, a poucos metros, com uma arma nas mãos e que os intimida nos seguintes termos:
- Olhem para o sol, seus velhacos, porque esta é a vossa última oportunidade em vida!!!

Todas as opiniões convergem no sentido de que ele dirigia estas palavras especialmente ao seu tio, com o qual nunca se dera bem, e que, na sua opinião, tinha contribuído negativamente para as difíceis relações com a sua mulher. Caçador profissional experiente, foi o primeiro a reagir, atirando-se ao chão num instinto de defesa. O mais velho, não sabendo ou não podendo reagir a tempo, ainda ficou petrificado e incapaz de reagir até sentir o assobio do projéctil perto das suas orelhas, para a seguir, também, imitar o irmão mais novo e estender o seu corpo esquelético e comprido no chão vermelho de poeira da sua morança como se estivesse morto, pensando na ousadia e atrevimento daquele garoto que ele criara com todo o amor de pai, antes de crescer e se transformar naquela máquina de Guerra insensível que os brancos apelidavam de Comandos africanos.

O Cissé tinha feito bem as contas, e pensando ter morto a esposa e os pais e, na certeza de que agora só lhe restava uma única bala, virou a Aka e meteu-a dentro da sua boca, premindo o gatilho. Era o fim…

Era o fim de um homem, de um jovem que tinha escolhido ser militar, um soldado da elite, que tinha participado e saído ileso nos assaltos as barracas de Oio e Morés em 1971; da invasão de Conakry em 71; que tinha visto com os seus olhos o cenário dantesco de morte e destruição na bolanha de Cufeu, em Maio de 73, durante o cerco a Guidage; da missão suicida e fratricida de Kumbamory em Junho do mesmo ano, dos raides e emboscadas sofridas naquele regresso lento e doloroso até à fronteira… E que tinha concluído que a vida sem honra e sem a dignidade, por que sempre lutara, não valia a pena ser vivida.

Foi assim o fim de um Comando africano, filho da aldeia de Fajonquito no Regulado de Sancorla, que no momento decisivo da sua vida, sentindo-se encurralado pelas estranhas circunstâncias da vida e incompreendido pela própria família, não querendo ser humilhado pelos Comissários do PAIGC pelos quais não nutria nenhuma simpatia e cuja legitimidade não reconhecia, só tinha três balas para cumprir a sua derradeira e última missão. Estava assim escrito que morreria de uma bala do inimigo, atirada pelas suas próprias mãos. Que a sua alma possa repousar em paz.

Nesse mesmo dia, quando chegaram os guerrilheiros, o Comandante da segurança, olhando para o corpo inerte de Cissé e o rio já escurecido de sangue que esvaíra da sua garganta esventrada, disse seca e asperamente aos homens e mulheres ali presentes:

- Este corpo que estão a ver é o de um cão nojento dos colonialistas que nos poupou o trabalho do seu fuzilamento.

Agora pergunta-se: Quantas vidas, quantos jovens ex-soldados, Comandos e não só, enganados e abandonados a sua sorte após a independência, terão sido obrigados a viver dramas semelhantes ou, dito por outras palavras, quantos terão sido imolados no altar dos quiméricos acordos e tácitos entendimentos entre o exército Português e os guerrilheiros do PAIGC, durante o processo da descolonização?

Feito em Fajonquito, aos 25 dias de Dezembro de 2017.

Com os testemunhos de Suleimane Pendo Baldé (o Camões); e de Mamadu Saido Candé (o Barbosa); com a autorização de publicação de Sambaro Candé (o João Henriques), irmão mais novo de Cissé Candé; tradução e texto de Cherno Abdulai Baldé (o Chico de Fajonquito).
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Notas do autor:

(1) Cissé ou Sissé Candé (as duas formas são utilizadas tanto para grafar nomes ou apelidos; no caso dos Mandingas é um apelido e para os Fulas de Gabu é um nome próprio mas de origem Mandinga). Desconheço como era escrito o nome do ex-comando que, pelas informações recolhidas, pertencia a 2.ª  Companhia dos Comandos Africanos.

(2) Carlos Bubacar Jau era natural de Fajonquito, foi alferes cmd da 2.ª Companhia e teria sido ele a patrocinar a entrada do Cissé nos Comandos.

(3) José Manuel Sedjali Embaló, natural de Fajonquito, era 2.º Sargento e pertencia à 1.ª  Companhia de Comandos.

Informação complementar  do editor:

Elementos recolhidos  a partir da pesquisa do cor inf ref Manuel Bernardo:

Abdulai Queta Jamanca: tenente“Cmd”, Cmdt CCaç 21 > Fuzilado em março de 1975, em Bambadinca. Incoprado em 12-1-1956, nasceu em 5/1/1937, em Farim; pertenceu originalmente à 1.ª CCmds Africanos. Era de descendência nobre ("príncipe fula").

Carlos Bubacar Jau: Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Africanos; fuzilado no Cumeré; incorporado em 7-11-1971; nasceu em 13-3-1946, no concelho de Bafatá.

Sijali Embaló; furriel “Cmd” 1.ª CCmds Africanos. Fuzilado em 1974 no Cumeré: foi incorporado em  24/10/1966; nasceu em  7/5/1946, em Bafatá (concelho).
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 3 de janeiro de  2017 >  Guiné 61/74 - P16913: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (52): à semelhança da França (em relação aos seus "tirailleurs sénégalais"), quando é que Portugal reconhece aos seus antigos soldados guineenses a nacionalidade portuguesa?

Vd. primeiro poste da série > 19 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão