Guiné > Estrada de Bambadinca - Mansambo - Xitole > 1969 > Efeitos da explosão de uma mina anticarro (I) © Humberto Reis (2006)
Guiné > Estrada Nhabijões-Bambadinca > 1971 > Efeitos da explosão de uma mina anticarro (II)
© Humberto Reis (2006)
Dos cadernos (1) do Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-furriel miliciano de operações especiais, da CCS do BCAÇ 4612, que teve o seu momento de glória em Mansoa, em 9 de Setembro de 1974 (2).
POR AÍ NÃO... ESTÁ TUDO MINADO!
A mina era a mãe de todos os pesadelos,
Um temor... quando nos deslocávamos na picada,
Um flagelo constante para a nossa tropa
Qu’assim era traiçoeiramente estropiada.
O progresso na modernidade
Nas sociedades normais e sadias,
Evoluindo em paz e liberdade,
Seria a perfeita das harmonias.
Mas os ódios no mundo radicados,
Racismos, ditaduras, religiões,
Quezílias de terras e políticas
Geram conflitos e confrontações,
Que por vezes degeneram em guerra!
Entram os militares em acção!
Soldados, armas, estratégias...
Até que haja uma rendição!
Por vezes, os fins justificam os meios
E os métodos que são utilizados
Nem sempre respeitam as regras,
Tornando-se mesmo animalizados.
Bem no meio desta salgalhada
Existe uma raça, os guerreiros,
Aqueles que primam pela luta leal
Que no combate são os primeiros.
Formam uma estirpe elitista
A quem dá Honra e Orgulho pertencer
E pautam o seu ser pela divisa…
O firme Antes quebrar que torcer!
Amam a Pátria, a Paz, a Família
E s’algum dos três é posto em perigo
E eles têm que recorrer às armas,
Cuidem-se de tamanho inimigo.
Detestam tudo o que denote
Indícios de cobardia e traição
E esgotam todos os seus recursos
Para atingir a sua supressão.
Uma das traições mais frequentes
Qu’estes audazes querem derrotar
São as armadilhas sujas e desleais!
Das quais as minas são primeiro lugar .
Na Guerra do Ultramar, em África,
De todos os temores, o mais terrível
Era a mina dissimulada no chão,
Traiçoeira... funesta... invisível.
Dizem: - É uma arma de baixo custo!,
Que causava grande devastação
Entre as pessoas e as viaturas,
Podendo ser de sopro ou fragmentação.
Existem no mundo vários modelos
E por todas as Nações são usadas,
Aqui vou falar das antipessoal,
Criminosas e desumanizadas.
Montam-se com bastante facilidade,
Estuda-se no terreno um ponto,
Uma cova... põe-se a mina... tapa-se…
Arma-se o detonador e... pronto!
Disfarça-se a superfície à volta,
Do melhor modo camuflado,
E deixa-se ali ficar, a ratoeira,
Á espera d’um desgraçado.
É que, por incrível que pareça,
O seu objectivo não é matar...
Mas bem mais tenebroso e macabro
Ferir o corpo humano... retalhar!
Assim, a sua face mais infausta
É o medo dos graus de destruição
Tanto físicos como psicológicos
Que nas vítimas provocarão.
Será uma perna atingida... um pé?...
Enfim, que partes do corpo colherá?
Um ou dois olhos... os braços... as mãos?
Só a sorte ou o azar o dirá!
Basta um pé no sítio errado
E... está accionado o detonador!
Uma explosão, terra e pó no ar...
O resto... são os queixumes de dor.
O sangue na terra, a vida por um fio
Quanto sofrimento e agonia,
Corpo dilacerado... pedaço de vida,
Qu’ali deixa morto, sonhos e alegria.
Uma mina!... É o pânico geral!
Onde está uma, podem estar mais!
Quantas, duas, três?... uma incógnita!
Uma incerteza qu’arrasava os demais!
No cuidadoso planeamento das operações
Era tudo extremamente bem delineado,
Nos mapas evidenciavam-se zonas riscadas,
A vermelho, com avisos: - Local Minado! (3)
Ranger Magalhães Ribeiro
Furriel Mil.º da CCS do Batalhão 4612/74 - Mansoa/Guiné
______________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts anteriores:
1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVI: Cancioneiro de Mansoa (1): o esplendor de Portugal
1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVII: Cancioneiro de Mansoa (2): Guiné, do Cumeré a Brá
7 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXLVI: Cancioneiro de Mansoa (3): um mosquiteiro barato para um pira...
10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLIV: Cancioneiro de Mansoa (4): a arte de ser 'ranger'
(2) vd. post de 21 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCIV: Eu estava lá, na entrega simbólica do território (Mansoa, 9 de Setembro de 1974)
(3) Alguns dos nossos posts sobre minas e armadilhas:
20 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XXII: O inferno das colunas logísticas na estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho (Luís Graça)
23 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXV: Minas e armadilhas (David J. Guimarães)
11 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXX: As heróicas GMC e os malucos dos seus condutores (CCAÇ 12, Septembro de 1969) (Luís Graça)
23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCV: 1 morto e 6 feridos graves aos 20 meses (CCAÇ 12, Janeiro de 1971) (Luís Graça)
2 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXIX: E de súbito uma explosão (Luís Graça)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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