1. Mensagem do nosso tertuliano António Rosinha, com data de 21 de Agosto de 2010:
ELES SÃO BRANCOS, SE ENTENDEM
Esta expressão popular que se ouve com frequência no Brasil, é usada por quem assiste a uma contenda entre dois amigos e ele não se quer intrometer e diz na velha ortografia brasileira: eles são brancu'sintendi.
Logicamente a origem desta expressão teria sido criada e popularizada pela maioria negra brasileira dentro de algum espírito de distanciamento em relação às questões dos brancos (patrões, chefes...).
Era com curiosidade mas com distanciamento, que milhões de angolanos que não tinham sido baptizados nem registados, nem tinham calçado sapatos, olhavam e perscrutavam o que se passaria com os brancos. À espera que se entendessem.
Para esses angolanos e para mim, tanto os brancos da metrópole, como os brancos de segunda, como os mulatos, eram todos portugueses (brancos). E também a tropa vinda da metrópole. Assim como todos os dirigentes do MPLA, FRELIMO e PAIGC eram tão portugueses como eu, pois além do BI, muitos até tinham sido da Mocidade Portuguesa, e eu nem a cor da farda conhecia.
Também na Guiné, vi milhares de guineenses, já com uns anos de independência, passivamente olhando os carrões de vidros escuros dos dirigentes do PAIGC, bem como milhares de brancos (estrangeiros), esperando que se entendessem. Porque achariam que eles, povo, não foram chamados para a contenda.
No caso de Angola, alguns arranjaram uma guerra de 27 anos, mas ficou a independência... e as riquezas. Embora conste que muitos angolanos continuem na expectativa, passivamente.
E os dirigentes do MPLA, que aliás governam, dão a ideia que cumprem com a governação que apregoavam antes de começar a guerra em 1961.
As grandezas e exibição das riquezas angolanas, que os caputos escondiam, estão a começar a aparecer. Conversas com mais de 50 anos que não ficaram esquecidas.
Havia outra conversa dos futuros candidatos a governar angola, e que parece ser verdadeira: Que os tugas não sabem governar-se, quanto mais governar esta terra tão rica e grande.
Pena que grande parte dos angolanos de mais valor tenham ido para o Brasil e mesmo para cá, assim como imensos guineenses de valor terem dado o fora.
Agora, porque está tão difícil a sobrevivência da Guiné? Será que alguém andou mentindo aos guineenses?
Será que o que se passou em Madina do Boé, em 24 de Setembro de 1973, foi o Grito de Madina do Boé imitando o Grito do Ipiranga, em que os índios do Brasil não ouviram esse grito?
E também os fulas, papéis, mandingas, balantas e felupes e todos em geral, também não ouviram esse grito até hoje? Apenas foi ouvido na ONU? Ou esse grito interessava mais aos ouvidos dos angolanos?
Ou será mesmo verdade que o que os guineenses pensam que Angola deve a eles a sua independência, e nós, portugueses, devemos a eles a nossa liberdade de Abril e para tal não foram avisados com antecedência?
Ou seja, "fomos nós os mais sacrificados, porquê?" esta ideia foi-me transmitida por um balanta de Kiev.
Depois de ter trabalhado com tantos guineenses, angolanos, cabo-verdianos, indianos e até macaenses, e de ouvir durante 5 anos os discursos de Alberto João Jardim, muito parecidos com os discursos do falecido Nino Vieira, penso que o 25 de Abril não foi o fim de nada, apenas um pequeno episódio da nossa aventura de sermos portugueses.
Nós não somos apenas 10 milhões, se soubessem os cabo-verdianos e guineenses e angolanos com direito a voto em Portugal, somávamos bastantes mais.
Pena que estejamos à espera "que os brancos de Bruxelas se entendam".
Um abraço,
Antº Rosinha
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 8 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6835: (Ex)citações (89): As elites e a formação dos movimentos nacionalistas (António Rosinha)
Vd. último poste da série de 17 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6862: (Ex)citações (93): A Guerra Colonial, todos querem ser heróis (António J. Pereira da Costa)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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8 comentários:
Valente António,
Abre! Abre mais o livro!
Gostei!
Mário Fitas
Antº Rosinha
Tenho um defeito, tenho muitos claro, mas um é acreditar que só há uma raça: a humana. Li mais este texto, estes teus pensamentos, estes relatos de reflexões fruto de vivências e tive que voltar a reler. Não quer dizer que concorde ou discorde. Talvez antes sinta necessidade de aprender e apreender a vida, em paz ou guerra,vista e relatada por quem viveu na África,dita portuguesa. Não só, por quem, após a independência por lá trabalhou. Essa informação, quanto a mim e com toda a subjectividade, enriquece o conhecimento dos que por África se interessam. Caso dos ex combatentes como nós.Tenho uma visão diferente,vivências diferentes e saberes adquiridos em circunstancias de guerra e não só. Um exemplo de não guerra: -em 63,talvez, houve os campeonatos da FISEC (creio ser este o nome)e vieram atletas, como convinha ao regime, de Angola.Os encontros eram na Cruz Quebrada e tinham como apoio o então INEF, Estádio Nacional e Centro da Mocidade Portuguesa. Um dia num jantar qualquer com chefões e muita gente, atletas e de outras actividades, cantaram uma canção em voga: Angola é nossa. Como não sabia a letra e não estava ali para cantar, fui observando a galhofa, comedida é certo, de muitos angolanos brancos como dizes e não sei se algum negro. Ri para dentro e, se não acreditava em certo País pluricontinental e multiracial, menos fiquei a acreditar. Só que haviam soldados do meu País espalhados pelo dito Império, lutando e morrendo por essa Pátria. Só que eu, passado meia dúzia de anos fui para lá.
Para eu compreender melhor África, as antigas colónias preciso de testemunhos como os teus. Eu também me interrogo muito sobre o antes, a guerra, e o depois...a paz. Questiono-me sobre tanto acontecimento. Porquê? Ou leio aqui neste blogue tanto pensamento diverso. Respeito claro e apoio a pluralidade de opinião. Vamos sempre aprendendo e,para melhor o fazermos, são necessários homens como tu e outros que passaram por vários lados e em tempos e situações diferentes. Alonguei-me e é pena.Nem devia escrever assim. Já tenho idade para ser mais comedido.
Escreve e vai relatando as tuas experiências e vivências. Um abraço do Torcato
Delicioso e inteligente texto com raízes de e para um próspero intercâmbio de opiniões e conhecimentos. Obrigado Antº Rosinha.
São de facto questões com muitas ramificações, que só um trabalho intelectualmente honesto, mas trabalhoso, nos pode levar à compreenção do que foi a guerra colonial, produto do estado novo na história passada/recente de Portugal.
Permita-me que opine o seguinte:
O desconhecimento de e sobre as independências deve-se à apertada censura e analfabetismo do antes, e agora em grande parte devido ao chamado "segredo de estado" com resultados similares aos do "segredo de justiça". Só que estes com efeito e objectivos imediatos, e o anterior com efeitos permanentes e por longo prazo para manter as pedras do xadrês politico, que por vezes muda para Damas dando a sensação de plena democracia.
Um abraço para si e para cada um
Carlos Filipe
ex- CCS BCAÇ3872 - Galomaro
galomaro@sapo.pt
António Rosinha.
Talvez tenha havido um mal entendido entre nós os dois, a propósito da palavra "Guerriheiros".António é na verdade um mal entendido.O que nos une é mais importante.A vivência em Angola e na Guiné, deu-nos algo que trazemos dentro de nós, ha 39 anos.No que é importante estamos em perfeita sintonia.Subscrevo na íntrega, a totalidade do teu texto.Aliáz, como afirmei na resposta que dei ao primeiro comentário que fizeste á minha Estária de infância em Angola, tenho lido tudo o que tens escrito, com muito interesse e agrado.Este texto em especial, merece os meus parabens.
"O dedo na ferida certa!"
Um abraço do
Jorge Fontinha
Camaradas,
Sobre a matéria tenho uma visão com algumas diferenças.
"Eles são brancos, se entendem!". Pela explicação da origem da frase, sabe-se que aconteceu no sec.XIX, num contexto diferente, quando os colonos brancos do Brasil declararam a independência e, entre si, partilharam a riqueza.
Quanto ao resto:
A origem do MPLA é diferente da do PAIGC.
O MPLA congregava vontades de diferentes tendências, e juntava pretos e brancos, praticamente sem descriminações entre si. O PAIGC congregava apenas africanos, guinéos e cabo-verdeanos. O PAIGC, desde o inicio adoptou uma ideologia de timbre socialista, e foi na órbita da URSS que obteve os principais apoios para desencadear e manter a luta armada.
O MPLA não era benquisto em Moscovo, e a desconfiança recíproca durou até 1976, data da celebração do Tratado de Amizade e Cooperação entre a URSS e a RPA (vide, Angola - O Princípio do Fim da União Soviética, de José Milhazess, Vega).
Em Angola, esteve para acontecer uma proclamação de independência por parte da comunidade branca. Na Guiné, a comunidade branca era irrisória.
Em Angola, as potências ocidentais tratavam de marcar zonas económicas de influência. Na Guiné, não.
Na Guiné, a luta pela independência esteve sempre sugeita a uma orientação centralizada. Em Angola, nunca!
Além disso, factores como o território, as populações e as riquezas naturais, de tão diferentes entre si, também condicionaram e determinaram caminhos diferentes para cada região.
Por isso contesto a afirmação pós-independências: "fomos nós os mais sacrificados", dita por um Guinéo, a propósito da independência de Angola (e das restantes colónias), e do 25 de Abril. É verdadeira, mas não significou a melhoria de condição para o povo angolano, nem a democracia para os portugueses. Só que os guinéos viverão com mais limitações.
Muito boa é a frase do António Rosinha: "penso que o 25 de Abril não foi o fim de nada. Apenas um episódio".
Abraços fraternos
JD
--#Depois de ter trabalhado com tantos guineenses, angolanos, cabo-verdianos, indianos e até macaenses, e de ouvir durante 5 anos os discursos de Alberto João Jardim, muito parecidos com os discursos do falecido Nino Vieira, penso que o 25 de Abril não foi o fim de nada, apenas um pequeno episódio da nossa aventura de sermos portugueses.--#
A frase está contida neste parágrafo.
"penso que o 25 de Abril não foi o fim de nada. Apenas um episódio".
Esta a frase que retiras do texto.
Não. Assim não. O António Rosinha diz algo mais. Concordemos ou não mas não podes amputar o que ele diz.
Poder podes; não deves.
Um abraço do Torcato
Olá Torcato, boa noite.
Que mais é que o Rosinha disse que altere substancialmente o que eu destaquei?
Há diferenças? Há!
Mas há democracia em Portugal? (apesar dos actos eleitorais, verdadeiros cheques em branco); e os angolanos viverão hoje a vida que alguma vez sonharam? (eu sei que alguns angolanos, sim senhor, vivem muito bem).
Um abraço
JD
Olá José Dinis
Não devia ter comentado. Por vezes é preferível. Aqui estou, e bem,limitado por regras felizmente colocadas á forma como escrevemos no Blogue. Mesmo assim é um espaço de liberdade e de diversidade opinativa. Respeito e aceito o que outros camaradas dizem. Posso, como foi o caso descuidar me e comentar.Aconteceu.
Mas:
- sobre Angola nada digo. Sei o que sei e, aqui nada direi.
- sobre Portugal digo que há Democracia. O nosso viver colectivo é quotidianamente o aprofundar dessa democracia. Acrescento,certamente vou arrepiar e, porque não, levar alguns a pensar "cobras e lagartos",mas vou dizer que sou Republicano e Socialista...mais, militante já na reforma do partido que governa o meu País...infringi as regras...infringi.
-concordando ou não com o que o Rosinha e tu dizem e pensam respeito e aceito.o Comentário á frase foi descuido...era redutora ao pensamento dele...penso eu.
Nada mais acrescento. Aqui não. Um dia podemos falar. Acrescento só que, mesmo reformado, entristece-me ver como por vezes somos governados. Mas posso escrever livremente...e viver...
Um abraço do Torcato
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