Octogésimo segundo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.
Dia 15 de Julho de 2014
Companheiros de viagem, este é o resumo do vigésimo
quinto dia
Eles viviam no atual Colorado, viviam do que a natureza
lhes dava, eram os “Arapahos”, os “Cheyennes”, os
“Kiowas” e os “Pawnees”, na região leste, e os “Utes”, no
oeste, além de milhares de nativos de tribos diferentes do
leste norte-americano que passariam pela região durante
o século XIX, quando foram forçados a sair do leste e
a emigrar em direcção ao oeste.
Já lá vão alguns anos, tivemos um companheiro de
trabalho, oriundo da Colômbia, mais ou menos da nossa
idade, o pai tinha trabalhado na construção do
“ferrocarril”, como ele dizia, que devia ser o caminho
de ferro lá na Colômbia e, quando estava de bom humor,
dizia-me que foi com os documentos do pai, que era uma
pessoa qualificada, que emigrou para os USA, portanto,
nos documentos tinha a idade do pai e, nessa altura já
estava qualificado para a “reforma”, mas como era uma
pessoa de bem, com muito bons sentimentos, queria
continuar a trabalhar por muitos mais anos e, quando
estava zangado, principalmente quando não concordava
comigo, dizia: - Os portugueses e os espanhóis, o que
querem é ouro.
Isto é só uma curiosidade, mas da fama não nos livramos,
principalmente os espanhóis, pois foram eles os
primeiros exploradores europeus na região durante o
século XVI. Chegaram à região vindos do sul, do México,
e andavam em busca de metais preciosos, tais como
prata ou ouro. Os espanhóis, não tendo encontrado
nenhum destes metais preciosos no actual Colorado, não
se interessaram em povoar a região, tendo reivindicado
posse da região somente em 1706, um pouco tarde, pois
24 anos antes já o francês René-Robert Cavelier tinha
reivindicado a posse da região leste do atual Colorado
para a coroa francesa e, assim, ter feito parte da colónia
francesa de Louisiana, de que já falei por diversas vezes.
Mas os espanhóis, talvez pela força de armas, passaram
ao controle desta região em 1762 e, sob os termos do
“Tratado de Santo Ildefonso”, passaria novamente ao
controle dos franceses em 1800, para ser finalmente
anexada, como parte da célebre “Compra da Luisiana”,
pelos Estados Unidos.
Depois dessas datas, muita água correu no rio Colorado,
grandes minas de prata, seriam encontradas, houve
corrida ao ouro, o que manteve em alta o crescimento
populacional do estado, encontraram grandes reservas de
petróleo, embora estas não tenham sido exploradas em
grande escala até o início da década de 1900. Em 1870,
inauguraram uma linha de caminho de ferro, conectando
o Colorado com outras regiões do país, principalmente,
Denver com Cheyenne, no estado de Wyoming e,
finalmente em Agosto de 1876, o Colorado tornou-se o
38º estado norte-americano.
Tanta conversa, tanto blá, blá, blá, para vos dizer que
seguíamos em direcção ao Atlântico pela estrada rápida
número 70, depois de entrar no estado do Colorado, pela
parte oeste, onde encontrámos grandes planícies,
algumas pequenas montanhas, quase sem árvores e sem
qualquer vegetação. Era deserto, aparecia uma ou outra
pequena povoação, onde nem estação de serviço havia,
isto até às proximidades da cidade de Edwards, onde se
inicia uma cordilheira de montanhas que se prolonga até
próximo da cidade de Denver.
Nestas montanhas, principalmente no inverno, existem
grandes áreas que são “estâncias”, onde se praticam
desportos de inverno, sendo algumas pequenas cidades
famosas que atraem celebridades de todo mundo,
passamos por elas, interessando-nos somente a
paisagem, mas não deixámos de ver casas de “Millhão
de Dolares” nas montanhas que circundam a estrada. Parando numa dessas pequenas cidades para comprar
gasolina, o preço era tal alto que usei a gasolina de
emergência, que trazia em dois tanques extras, comprada
no Alaska.
A estrada, que nesta área, por motivo do intenso inverno,
tem muitos “remendos”, faixas mais baixas em algumas
zonas, passa lá no fundo, entre montanhas, junto da linha
do caminho de ferro e do rio, alternando-se em algumas
zonas em que passa o rio em baixo, o caminho de ferro e
a estrada por cima, em outras zonas vão lado a lado,
tendo subidas, em que numa distância de 10 ou 15 km, a
estrada sobe milhares de metros, com três vias, onde a
via da direita, a partir de uma certa distância, vai cheia de
veículos com as luzes de emergência. Mais à frente já
estão veículos parados, com problemas no motor e, ao
descer, passado uns quilómetros, já se sente no ar aquele
cheiro que vem dos travões,
embora recomendem usar o motor para ajudar os travões,
onde existem diversas saídas de emergência, com areia,
onde já estão alguns veículos pesados.
Nós, tanto nas subidas como nas descidas, usando
sempre a linha do meio, fomos andando devagar, mas
passámos estas zonas sem dificuldade, chegando à
cidade de Denver, que passámos, olhando a cidade que
fica no lado sul, sempre com a ajuda do GPS, pois como
devem calcular, o nosso destino era o Atlântico. A
cidade de Denver é uma grande metrópole, não passa
despercebida, muitos cruzamentos de estrada, muito
cimento, muito trânsito, todos procurando o seu norte, sul,
leste ou oeste, que muitos de nós nunca conseguimos
encontrar.
Passando a cidade de Denver, depois de algum tempo na
estrada, aparece a planície, quintas, poços de petróleo e
moinhos de energia, pastagens de gado,
muitas quintas transformadas em zona de caça,
plantações de trigo, milho e aveia, zonas desertas e,
assim atravessámos a fronteira para o estado de Kansas,
continuando com a mesma paisagem até à cidade de
Hays, onde dormimos.
Neste dia percorremos 647 milhas, com o preço da
gasolina a variar entre $3.44 e $3.57 o galão, que são
aproximadamente 4 litros.
Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor
Último poste da série de 4 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14116: Bom ou mau tempo na bolanha (81): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (22) (Tony Borié)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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