quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19135: Efemérides (293): Homenagem aos paraquedistas que completaram 50 anos de brevet (1968-2018): Tancos, 27 de setembro de 2018 (Jaime Bonifácio Marques da Silva, ex-alf mil pára, 1ª CCP/BCP 21, Angola, 1970/72)


Tancos, Regimento de Paraquedistas > Monumento aos mortos em combate > Inaugurado em 3 de julho de 1968... O conjunto arquitetónico é da autoria do arquiteto Aleixo Terra da Mota; a  escultura é de Domingos Soares Branco; e a pintura e a decoração são de Hernani de Oliveira.

Foto (e legenda): © Jaime Silva (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem, com data de ontem, de Jaime Bonifácio Marques da Silva, membro da nossa Tabanca Grande, natural de (e residente em) Seixal, Lourinhã, preofessor de educação física, docente reformado do ensino superior politécnico, ex-alf mil pqdt, BCP 21, Angola, 1970/72 [, foto à esquerda]


Caro Luís
Vai aqui o texto de que te falei.
Vê se se adequa ao espírito do blogue.
Vai foto, se bem que poderás encontrar melhor na Net.
Abraço, Jaime.



Regimento de Paraquedistas, Tancos,- 27 de setembro de 2018


HOMENAGEM AOS PARAQUEDISTAS QUE COMPLETARAM 50 ANOS DE BREVET 1968 – 2018: Cursos 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, e o 8.º de Enfermeiras Paraquedistas.


No passado dia vinte sete de setembro o Regimento de Paraquedistas e a União Portuguesa de Paraquedistas homenagearam os paraquedistas que completaram 50 anos de Brevet (Cursos 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, e o 8.º de Enfermeiras Paraquedistas).

Esta cerimónia realiza-se anualmente desde que o 1.º Curso (1955) comemorou os seus 50 anos (2005).

Este ano tive o privilégio de estar presente a convite do meu camarada e amigo Joaquim Maria Inácio. Fizemos parte do 3.º Pelotão da 1ª CCP do BCP 21 em Angola e durante os dois anos de comissão cimentámos a nossa amizade nas dificuldades que fomos ultrapassando nas operações de combate realizadas no Norte e Leste de Angola.

HOMENAGEM AOS PARAQUEDISTAS MORTOS DO 46.º e 47.º CURSO

O programa do encontro incluiu uma cerimónia de grande significado cívico e de recolhimento junto ao monumento erguido no Regimento em memória dos Paraquedistas mortos durante a Guerra do Ultramar pertencentes ao 46.º e 47.º Curso de paraquedistas: A “chamada dos mortos” em combate, respondendo os participantes na cerimónia – PRESENTE – sempre que cada um dos nomes era “chamado”.

Relação dos paraquedistas que tombaram na guerra
i) Curso n.º 46:

BCP 31: 

Alf. Mili. Pára Luís Filipe Corte Real – 19.12.19 (CBT)

Sol/Pára Engrácio de Jesus Meio Tostão rato – 21.2.1970 (ACV)

BCP 21:

Sol/Pára Ernesto Rocha Casaca – 20.2.1971 (CBT)

Sol/Pára Joaquim Ferreira Fonseca – 17.6.1970 (CBT)

Sol/Pára Vitalino da Silva Gomes – 16.6.1970 (CBT)

Sol/Pára António da Silva Ramos – 25.6.1970 (CBT)

ii) Curso n.º 47:

BCP 12

1.º Cab/Pára Gabriel Parreiras Campilho- 26.3.1970 (CBT)

Foi um momento de grande emoção para todos os presentes que têm bem viva na memória os amigos que tombaram a seu lado.

O primeiro nome a ser “chamado” foi o do Soldado Paraquedista António da Silva Ramos do 46.º Curso e que tombou em combate a 25.6.1970. Pertencia ao meu Pelotão – 3.º Pelotão da 1ª  CCP do BCP 21.

O Ramos foi abatido numa operação que decorreu nos Montes Mil e Vinte, na região do Onzo, no Norte de Angola. Recordo-me dessa operação como se fosse hoje: Dois aviões da FAP (Fiat G91) lançaram quatro bombas de Napalm sobre o acampamento IN, ao mesmo tempo que o helicóptero SA 330 se aproximava do objetivo e largava o meu grupo de combate nas imediações do mesmo.

O Pelotão atuou de acordo com Ordem de Operações que tinha recebido: assaltar, destruir, capturar. Enfim, o trivial para as circunstâncias. Percorremos parte do acampamento (um dos maiores que já tinha visto) e decorrido pouco tempo, o grupo foi atacado, resultando daí a morte do Ramos (o único morto do pelotão em toda a comissão).

Depois da evacuação do corpo do Ramos pelo Helicóptero (Aluette 3), percorremos a zona, montámos nova emboscada e pernoitámos no local. No dia seguinte, quando nos preparávamos para abandonar a mata a fim de preparar o local para o Heli nos recolher, fomos fortemente atacados pelos guerrilheiros que nos tinham emboscado. Foi um dos momentos mais delicados que o 3.º pelotão teve para resolver durante a comissão, no confronto com os guerrilheiros.

Sem qualquer réstia de tiques de heroísmos injustificáveis hoje, como sempre, estou seguro que nesse momento veio ao de cima toda a mentalização psicológica e o resultado do treino duro a que os paraquedistas foram sujeitos durante a instrução. Lembro-me do comportamento de dois homens nesse momento: Um, homem com “H” grande,  e outro (e não era soldado) com “h” bem pequeno. O primeiro foi o Cruz, o HOMEM da HK 21 (o outro!).

Enfim, memórias vivas que só a morte se encarregará de levar!

Ainda hoje me interrogo, como responsável por aquele grupo de jovens como eu, o que poderia ter feito para que o Ramos não tombasse e o Santos não pisasse a mina que lhe levou a perna!


MONUMENTO AOS MORTOS EM COMBATE
REGIMENTO DE PARAQUEDISTAS EM TANCOS


Não posso deixar de registar o quanto significa para nós Paraquedistas, aquele Monumento. Vi-o, pela primeira vez, em julho de 1969 quando entrei no RCP para fazer provas de acesso ao curso de paraquedismo, vindo da EPI [, em Mafra,] e reparei que todos os militares, quando passavam na sua frente, faziam a continência. Foi- me explicado o seu significado e simbologia pelo Diretor do meu Curso o, então, capitão António Ramos.

No entanto, a apreensão do seu verdadeiro significado só foi interiorizado quando regressei a Tancos após ter cumprido a minha comissão de serviço. Nessa altura, sim: quando olhei para aquele monumento senti que podia ser eu, também, um dos que tombaram. Só a vivência da guerra e a morte dos camaradas ao nosso lado no mato, nos fazem fazer compreender verdadeiramente a essência do seu significado.

Aquele monumento, ao evocar a memória daqueles que tombaram, honra os Paraquedistas e lembra a todos os que por ali passarem, o sacrifício de uma juventude que deu o melhor de si mesmo à sua Pátria - a sua vida. E não foram, assim, tão poucos os que tombaram em cada um dos três teatros de operações onde combatemos:

Durante a Guerra do Ultramar morreram 210 Paraquedistas.  Guiné – 67. Angola 65. Moçambique - 78.

O Monumento aos Mortos em Combate foi inaugurado em 3 de julho de 1968 com a presença do Presidente da República Almirante Américo Tomás. À data, o Comandante do RCP era o Coronel Paraquedista Mário Monteiro Robalo que, a determinada altura do seu discurso, disse:

“(...) Ficaram mais pobres as suas famílias, com a sua morte.
Ficou mais rica a terra portuguesa, com o seu sangue.
Mas ficou-nos, sobretudo, a todos o exemplo da grandeza do seu sacrifício.
Sacrifício que não podemos permitir que se venha a tornar inútil, que não poderá ser, jamais, traído!

(…)Há que fazer opções sobre a aplicação mais rentável de, pelo menos, uma parte da nossa juventude.” (in: “BOINA VERDE” – Setembro de 1968)



Até parecia que o Comandante adivinhada o desfecho da inutilidade daquela guerra!

Como nota final: O conjunto arquitetónico foi da autoria do Arquiteto Aleixo Terra da Mota. A escultura de Domingos Soares Branco. A pintura e decoração de Hernani de Oliveira.

Na base do monumento a inscrição: “AQUELES EM QUEM PODER NÃO TEVE A MORTE”

Jaime Bonifácio Marques da silva

(Ex- Alf. Paraquedista - 1ª CCP / BCP 21, Angola, 1970/72)

5 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Jaime: obrigado!... Nunca visitei Tancos nem sabia da existência deste monumento... Muito menos dos "beneméritos" que custearam a sua conceção e execução... Cito aqui um excerto do discurso do comandante do RCP, o então coronel paraquedista Mário de Brito Monteiro Robalo:

(...) "Graças a alguns homens generosos e bons, figuras grandes do trabalho português, que sentindo, vivendo e apoiando o esforço das Forças Armadas, inteligentemente, compreendem que não bastam os simples apelos e incentivos, mais ou menos patrióticos, a uma juventude que, generosamente, dá o melhor de si mesma, na defesa do Portugal Euro-Africano e de interesses que não são, apenas, os seus e que, nalguns casos, mesmo, a transcendem, podemos, hoje, aqui, perpetuar na pedra e no metal a memória de «AQUELES EM QUEM PODER NÃO TEVE A MORTE» como dizia o épico.

Memória de todos, sejam eles da Marinha, do Exército ou da Força Aérea, já que, para os caídos no campo da honra, tal como para os que, vivos, continuam a sua gesta, não pode, nem deve haver distinção ou separação. Todos eram portugueses, todos eram militares, todos pertenciam a uma só organização – as FORÇAS ARMADAS.

E, muito embora sabendo que vou ferir a vossa modéstia, permitam-me V. Exas.,

Sr. D. António da Cunha
Sr. Eng.º. Armando Guimarães
Sr. Dr. Jorge de Mello
Sr. D. José Saldanha
Sr. Manuel de Queirós Pereira
Sr. Dr. Manuel Espírito Santo Silva
Sr. Dr. Manuel Ricardo Espírito Santo Silva que embora, em Angola, cumprindo serviço militar, em espírito, aqui, está connosco.
Sr. Rogério Cândido da Silva

que, em nome de todos nós, em nome dos companheiros presentes e ausentes daqueles que, de armas na mão e consciência pura, à Pátria, deram o seu maior bem e, em nome das Famílias e dos Professores que, tão bem, os souberam criar e educar em vida, no culto da honra, e do dever, vos diga, do fundo do nosso coração agradecido. Bem hajam, Senhores, pela vossa grandeza de alma, pela vossa fé, pelo vosso portuguesismo." (...)

Fonte: Operacional > CINQUENTENÁRIO DO MONUMENTO AOS MORTOS EM COMBATE: 03JUL1968 – 03JUL2018

Por Miguel Machado • 1 Jul , 2018 •

http://www.operacional.pt/cinquentenario-do-monumento-aos-mortos-em-combate-03jul1968-03jul2018/

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Cito outra fonte, disponível na Net, o sítio dos "Boinas Verdes e Pára-quedists"

https://boinasverdeseparaquedistas.wordpress.com/monumento-aos-mortos-em-combate-tancos/

CUSTO DA OBRA

O custo financeiro da obra cifrou-se em : 631. 343 $ 00 ( € 3.149. 13 )

sendo este montante suportado exclusivamente por doadores da sociedade civil e do sector empresarial Português, também de doações de pessoal Pára-quedista , Oficiais , Sargentos e Praças que generosamente e com entusiasmo se envolveram neste esforço .

As doações eram depositadas em conta criada prepositadamente para este efeito no Banco Espiríto Santo e Comercial de Lisboa

Nas doações civis realce para :

Dr. MANUEL RICARDO ESPÍRITO SANTO SILVA; Dr. MANUEL RIBEIRO ESPÍRITO SANTO SILVA; ROGÉRIO CÂNDIDO DA SILVA; D. ANTÓNIO DA CUNHA; Dr. JORGE DE MELLO; MANUEL DE QUEIRÓS PEREIRA; D. JOSÉ SALDANHA; e ENGº. ARMANDO GUIMARÃES. "(...)

Atenção: o cálculo para a equivalência em euros, em valores de hoje, está errado:

631.343 $ 00 em 1968 não representavam "apenas" 3.149,13 €, mas sim 207.853,20 €... Ou sejam, 66 vezes mais!

Uitilizámnos o conversor da Pordata:

https://www.pordata.pt/Portugal

Hélder Valério disse...

Caro amigo Jaime

Li com interesse o relato e as memórias.
Quanto ao "evento", se assim se pode chamar, pois acho que é imprescindível que essas homenagens se vão fazendo pois é uma forma de "não apagar a memória".
Quanto ao "remoer" a pensar no que eventualmente se poderia ter feito para evitar a tal morte é justo que tal se faça mas também é necessário que se assuma que tal já é "passado" e que por isso, hoje, não há solução para uma irreversibilidade.

Abraço
Hélder Sousa

Fernando Ribeiro disse...

(Citação)

O Ramos foi abatido numa operação que decorreu nos Montes Mil e Vinte, na região do Onzo, no Norte de Angola. Recordo-me dessa operação como se fosse hoje: Dois aviões da FAP (Fiat G91) lançaram quatro bombas de Napalm sobre o acampamento IN, ao mesmo tempo que o helicóptero SA 330 se aproximava do objetivo e largava o meu grupo de combate nas imediações do mesmo.

O Pelotão atuou de acordo com Ordem de Operações que tinha recebido: assaltar, destruir, capturar. Enfim, o trivial para as circunstâncias. Percorremos parte do acampamento (um dos maiores que já tinha visto) e decorrido pouco tempo, o grupo foi atacado, resultando daí a morte do Ramos (o único morto do pelotão em toda a comissão).

Depois da evacuação do corpo do Ramos pelo Helicóptero (Aluette 3), percorremos a zona, montámos nova emboscada e pernoitámos no local. No dia seguinte, quando nos preparávamos para abandonar a mata a fim de preparar o local para o Heli nos recolher, fomos fortemente atacados pelos guerrilheiros que nos tinham emboscado. Foi um dos momentos mais delicados que o 3.º pelotão teve para resolver durante a comissão, no confronto com os guerrilheiros.


(Fim de citação)


1 - A região do Mil e Vinte (assim chamada por ter três montes exatamente com a mesma altitude, de 1020 metros) não fica propriamente na região do Onzo, próxima de Nambuangongo (e onde estava aquartelada uma bateria de Artilharia), mas sim na região de Zemba, onde eu mesmo passei quase um ano de comissão. O Mil e Vinte era um vespeiro de guerrilheiros da UPA/FNLA e era considerado inexpugnável. Qualquer tropa que lá entrasse levava "porrada" de certeza absoluta. Nunca falhava. O quartel de guerrilheiros mais importante da zona era por nós chamado Mufuque, mas a UPA/FNLA chamava-lhe Boa Esperança. Era sede da companhia nº 9 do ELNA (Exército de Libertação Nacional de Angola, o "braço armado" da UPA/FNLA), comandada por um tal Pierre Malunji, que alguns diziam ser zairense e não angolano. Mas havia mais quartéis IN e acampamentos na zona do Mil e Vinte, para além do Mufuque. Julgo que nunca tropa portuguesa alguma conseguiu entrar no Mufuque, por muitas tentativas que se tivessem feito, e muitos militares terão deixado lá a vida ou parte do seu corpo (pernas, etc.). O Google Maps mostra a região do Mil e Vinte aqui: https://www.google.com/maps/place/Zemba,+Angola/@-8.1550382,14.5744383,13926m/data=!3m1!1e3!4m5!3m4!1s0x1a4f18e397a381e1:0xb5f886c8493b87d2!8m2!3d-8.1!4d14.616667 (o ponto assinalado a norte é Zemba, tal como se apresenta atualmente e onde eu estive colocado; para oeste fica Santa Eulália (não identificada pelo Google) e muito mais para oeste fica o Onzo).

2 - Eu sinto-me um bocado constrangido por desmentir um ex alferes paraquedista a respeito de aviões, mas estou quase completamente seguro de que em Angola nunca atuaram aviões Fiat G91. Só atuaram na Guiné e, a partir de 1973 ou 1974, em Moçambique. Os caças a jato que atuavam em Angola eram aviões Thunderjet F-84, completamente ultrapassados, que tinham tido uma atuação destacada na guerra da Coreia, ao serviço da USAF. Tinham as asas perpendiculares à carlinga, e não oblíquas como os Fiat G91, o que dificultava a sua manobrabilidade.


Fernando de Sousa Ribeiro, ex alferes miliciano da C.Caç. 3535 do B.Caç. 3880, Angola 1972-74

Anónimo disse...

Cabe-me agora -com o devido cuidado- corrigir o camarada F Ribeiro
1 O F84, embora 'antiquado' era muito adequado à nossa operação em Angola e uma das razões disso era o facto de as asas não serem 'em delta' o que lhe dava uma maior capacidade de manobra a baixas velocidades;
2 O Fiat G91 operou em Moçambique a partir de 1968 e de facto, nunca 'esteve' em Angola…

S.Nogueira