Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
domingo, 30 de novembro de 2008
Guiné 63/74 - P3544: O segredo de... (2): Santos Oliveira: Encontros imediatos de III grau com o IN
Guiné 63/74 - P3543: O segredo de ... (1): Mário Dias: Xitole, 1965, o encontro de dois amigos inimigos que não constou do relatório de operações
"De cócoras, a partir da esquerda: Domingos Ramos; um outro cujo nome não me lembro mas que também foi para a guerrilha; Laurentino Pedro Gomes.
"De pé: não me recordo o nome mas também foi para a guerrilha; Garcia, filho do administrador Garcia, muito conhecido e estimado em Bissau; mais um de cujo nome não me recordo; eu, [Mário Dias]; e mais outro guerrilheiro. Como se pode concluir, o recrutamento de 1959 do CIC [Centro de Instrução de Civilizados] , foi um autêntico alfobre [de quadros ] para o PAIGC.
Foto e legenda: © Mário Dias(2006). Direitos reservados
1. Volta a reproduzir-se, agora na II Série do nosso blogue, uma das mais fabulosas histórias da guerra da Guiné, o encontro algures nas matas do Xitole, em 1965, entre dois amigos inimigos, o português, comando, Mário Dias, e o chefe de guerrilha, o guineense Domingos Ramos (*).
Em 1959 , tinham feito a recruta juntos, com início em 8 de Maio de 1959, numa unidade que então se chamava Centro de Instrução de Civilizados (CIC), destinado a naturais da Guiné considerados civilizados. O comandante era o capitão Teixeira, pai do historiador Severiano Teixeira, actual Ministro da Defesa. (No anos seguinte, passaria a chamar-se Centro de Instrução Militar (CIM), tendo sido transferido para Bolama).
Em 10 de Agosto de 1959, prestam juramento de bandeira, uma semana depois dos sangrentos acontecimentoss do Pidjiguiti.
Em 14 de Agosto desse ano, os dois estão no 1º Curso de Sargentos Milicianos e estreitam a sua amizade. Em 29 de Novembro de 1959, são promovidos a 1ºs cabos. O Mário fica em Bissau a dar recruta, enquanto o Domingos segue para Bolama.
Quem era o Domingos Ramos ? Era filho de um quadro local da administração colonial portuguesa, com o estatuto de assimilado, expressão cínica usada na época pelas autoridades portuguesas.
O Mário tem palavras de grande apreço e admiração pelo Domingos Ramos, reveladoras da sua grandeza como homem e como português. Escreveu ele: "Se um dia tiver a oportunidade de regressar à Guiné, é meu firme propósito ir visitar a sua campa e prestar-lhe merecida homenagem. Não é pelo facto de termos combatido em campos opostos que deixei de ser seu amigo e de o admirar".
Para o Mário, que ira depois seguir a carreira militar, como furriel do quadro, "o Domingos Ramos era um indivíduo bem constituído fisicamente e, sobretudo, moralmente. Aquilo que se pode chamar, um bondoso gigante. Desde o início da nossa vivência comum que por ele tive uma especial estima. Tornámo-nos bons amigos em todas as situações e na caserna, nas horas de descanso, trocávamos opiniões sobre os mais variados assuntos, com especial interesse da minha parte por tudo relacionado com os usos e costumes dos guineenses. Muito aprendi com ele. Recordo ainda com saudade e emoção as paródias, próprias da irreverência da nossa juventude. E da célebre água pú que ele me ensinou e a que aderi com entusiasmo".
O Mário tem sempre palavras de grande apreço e respeito pelo seu amigo:
"Na verdade, enquanto com ele convivi em Bissau, nem o mais leve indício de descontentamento, nem o mais pequeno sinal de revolta ou discordância com o status quo existente demonstrou. Se algo havia na sua mente, disfarçava muito bem, o que não creio, dada a sua rectidão de carácter. O mesmo já não se passava com outros como, por exemplo, o Rui Demba Jassi, que tinha atitudes incorrectas para com os europeus sem que houvesse razões para tal e não conseguia disfarçar animosidade contra nós".
Mário Dias sugere que ele ter-se-á alistado nas fileiras do PAIGC, em Novembro de 1960, depois de ter sido vítima de uma grave injustiça enquanto 1º cabo miliciano. Domingos Ramos morreu em combate em Madina do Boé, em 1966. Os seus restos mortais repousam hoje na Amura, no panteão nacional.
O Mário já nos contou aqui que um dia, próximo da sua passagem à situação de licença registada, que ocorreu em Outubro de 1960, seguindo-se a disponibilidade em Fevereiro de 1961, o Laurentino lhe mostrou "uma espécie de memorando que o Domingos Ramos havia escrito em Bolama respeitante a uma tremenda injustiça por parte de um superior hierárquico que o levou à prisão durante uns dias".
"Foi uma daquelas situações tão frequentes, infelizmente, na vida militar que levam a que muitos inocentes sejam punidos apenas porque a corda parte sempre pelo lado mais fraco e a máxima de que 'palavra de oficial faz fé' é uma realidade. Nesse memorando, era bem patente o desgosto que ele sentia por ter sido vítima de tal injustiça e, mais do que um desgosto, notava-se o destruir das convicções que até ali o tinham norteado".
Nos primeiros dias de Novembro [de 1960], juntamente com o Rui Jassi, Constantino Teixeira e outros antigos camaradas do Mário Dias, Domingos Ramos "partiu para Pequim, Praga, Moscovo e demais escolas de guerrilha tornando-se um dos primeiros e mais importantes chefes de guerrilha daquele movimento".
2. O encontro de dois amigos inimigos, no Xitole, em 1965
por Mário Dias
Estando com o meu grupo de comandos no Xitole, sensivelmente em meados de 1965, fomos fazer uma patrulha de reconhecimento pois o inimigo há muito mostrava sinais de intensificar a sua actividade na região. Porém, as informações eram escassas. Desconhecia-se com precisão por onde andavam os guerrilheiros e as possíveis localizações dos acampamentos. Por tal facto, foi-nos dada a missão de efectuar um reconhecimento ofensivo, tentando localizar o destruir o inimigo.
Por volta das 3 horas da madrugada saímos no maior silêncio, a pé, pela estrada que liga o Xitole a Mampatá, Aldeia Formosa, etc. Alcançada a bifurcação da picada para Amedalai, internámo-nos no mato, constituído quase só por palmeiras mas bastante denso, e aí aguardámos o romper do dia.
Reiniciada a marcha, com as habituais cautelas e as indispensáveis medidas de segurança, fomos progredindo pelo mato, acompanhando de perto o traçado da picada.
Andar um pouco, parar, escutar, analisar pistas e vestígios de presença humana, consumiu uma boa parte da manhã. Era quase meio dia quando ouvimos, vindos da nossa esquerda, alguns tiros. Não foram muitos. Por não terem sido dirigidos com precisão e sobretudo com intenção de nos atingir, concluímos que se tratava de tiros de reconhecimento (eles também os faziam). Devem ter pressentido algo mas não tinham a certeza da nossa posição nem, possivelmente, da nossa presença.
Desta forma, e como nos interessava obter informações sobre a actividade do inimigo, deixei o grupo instalado defensivamente e fui, com a minha equipa (5 homens) em direcção à zona de onde os tiros tinham partido fazer o reconhecimento. O que essa progressão teve de cautelas, expectativas e adrenalina é fácil de imaginar para quem viveu situações semelhantes.
De repente, ouvimos pessoas a conversar e o ruído característico de movimentação. Querendo observar melhor o que se estava a passar, ergui-me acima do arbusto que me ocultava. Foi então que aconteceu. Do outro lado, a cerca de vinte ou trinta metros, um vulto se ergueu também e olhou na minha direcção. Espanto dele! Espanto meu! Era o Domingos Ramos.
Ficámos ambos como petrificados. Não falámos, apenas nos limitámos a sorrir e houve como que uma espécie de telepatia. Mas, mesmo sem falar, as expressões de contentamento de ambos (espero que ele tivesse entendido que também eu estava contente com o inesperado mas feliz encontro) tornaram mágicos aqueles breves momentos que jamais esquecerei.
Mas era preciso regressar à terra. De imediato ouvi as suas ordens:
- Nó bai, nó bai -. E internou-se ainda mais, desaparecendo na densa mata. Voltei para trás, para junto do resto do grupo:
- Não há problema. Era um pequeno grupo mas já fugiram.
E continuámos a patrulha sem mais percalços. Claro que este episódio não constou do relatório. E foi assim.
Um abraço
Texto: © Mário Dias (2006). Direitos reservados
_______
Nota de L.G.
(*) Originalmente publicado na I Série do nosso blogue em 2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIII: Domingos Ramos e Mário Dias, a bandeira da amizade (Luís Graça / Mário Dias)
Vd. outro postes do Mário Dias sobre o Domingos Ramos, seu amigo e camarada do Curso de Sargentos Milicianos de 1959:
2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCI: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)
Vd. ainda:
2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCIV: O segredo do Mário Dias, ex-sargento comando
12 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2343: PAIGC - Quem foi quem (5): Domingos Ramos (Mário Dias / Luís Graça)
20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2461: Blogoterapia (38): Dois heróis, dois homens com valores, Domingos Ramos e Mário Dias (Torcato Mendonça)
24 de Julho de 2008 >Guiné 63/74 - P3090: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação do cubano Ulises Estrada
Sinopse: Neste excerto [vídeo], Ulises Estrada que chega à Guiné em meados de 1966 - não fazendo parte, por isso, do primeiro contingente cubano, que era composto por 3 médicos e 3 artilheiros, chegados a 29 de Abril de 1966 - relata o esforço dos voluntários cubanos na luta de libertação, ao lado dos guerrilheiros do PAIGC.
Faz referência a ataques em que ele próprio participou, desde o Olossato a Farim, desde Buba ao Morés, incluindo uma emboscada na estrada de Enxalé-Portugole, e um ataque ao destacamento de Missirá, no Cuor, a norte do Rio Geba (em Dezembro de 1966), a nossa conhecida Missirá onde estiveram, em épocas diferentes, os nossos camaradas Beja Santos (Pel Caç Nat 52, 1968/69) e Jorge Cabral (Pel Caç Nat 63, 1970/71).
Evoca também a figura e Domingos Ramos, chefe da Frente Leste e comissário político do PAIGC, que morre a seu lado a 10 de Novembro de 1966, num ataque de artilharia (1 canhão s/r) e infantaria ao quartel de Madina do Boé. O Ulises disse-me pessoalmente, em Bissau, que o Domingos Ramos foi morto por um estilhaço de morteiro, quando o tentava proteger. O seu corpo foi resgatado pelo cubano, "para que não caísse nas mãos dos portugueses" (sic), e levado a seguir para a base de Boké, na Guiné-Conacri, onde foi entregue a Aristides Pereira. Ulises diz do seu camarada guineense que era um grande homem, um grande combatente, e um grande líder político.
sábado, 29 de novembro de 2008
Guiné 63/74 - P3542: Memórias literárias da Guerra Colonial (11): Cristóvão de Aguiar na Biblioteca-Museu República. (José Martins)
Sou um dos milhares de cidadãos portugueses que pertencem à chamada geração da Guerra Colonial. Estive tentado a escrever o verbo no pretérito, mas, como tantos outros camaradas meus, ainda sofro, e sofrerei, as sequelas psicológicas que, durante os quase dois anos da minha estada no inferno da então chamada província portuguesa da Guiné, para sempre me machucaram a mente e o íntimo. Assim, a geração da Guerra Colonial só terminará quando o último ex-combatente cerrar os olhos ao mundo… Depois, talvez essa geração destruída, fique registada, em nota de pé-de-página, num capítulo da História do século XX português…
Existem, porém, milhares de outros que tiveram menos fortuna e continuam a padecer violentamente: os chamados deficientes das Forças Armadas – mutilados, cegos, doentes do foro psiquiátrico e orgânico… Muitos deles viram as suas vidas familiares desmanchadas, tornando-se em seres viventes cuja vida pouco sentido tem. E há ainda os milhares que tombaram na mata ao serviço de uma pátria apodrecida por um regime que, durante mais de quarenta anos, constituiu uma nódoa e uma desonra histórica.
Como escreveu um conterrâneo meu, já falecido, companheiro de República em Coimbra e camarada na Guiné, José Noronha Bretão (1), num livrinho intitulado "Três Tristes Tempos e o Regresso do Melro Preto". Passo a citar:
Esperávamos em silêncio
mastigando a memória das coisas
e a Morte claramente apercebida
aguardava o seu quinhão
Pensávamos:
Cada coice de Mauser no ombro
é uma carícia da Pátria agradecida.
Puta de Pátria que agradece aos coices.
De ambos os lados da barricada, a guerra colonial foi intensamente cruel e ainda está a sê-lo para muitas centenas, ou milhares, que por lá andaram a esmigalhar os melhores anos da juventude. Isto de se falar em terrorismo apenas do lado dos guerrilheiros tem muito que se lhe diga. As nossas tropas também o praticavam em grande escala e com muito engenho e sadismo. Sobre tudo isso, porém, era expressamente proibido falar. Havia ouvidos atentos à escuta, e existia medo, ignorância, e a censura a compor o resto do ramalhete, torcendo a verdade para construir a mentira oficial.
Nem sequer havia guerra, afirmavam os donos e cabecilhas do regime. Andávamos tão-só em missão de vigilância nas províncias ultramari nas, flageladas pelos chamados “turras”, e que, como se devem lembrar, constituíam (as tais províncias) o prolongamento natural da pátria, que ia do Minho a Timor, refrão patrioteiro, que então se entoava e que alguns ainda gostariam de continuar a solfejar.
Havia, pois, uma mantilha de silêncio caída sobre o que ocorria nas três frentes de batalha. Pouco ou nada se sabia. As razões são múltiplas e não serão despiciendas as que já apontei: censura, medo, vigilância da PIDE, desinteresse do povo em geral, que só lhe importava como passavam os familiares que por lá combatiam – adeus, até ao meu regresso – e, quanto à esmagadora maioria dos soldados, não sabiam, nem queriam saber, das razões que os haviam levado a ir matar e esfolar negros para um Continente que, segundo lhes martelaram desde a catequese da escola primária, constituía um património tão português como as suas aldeias da Metrópole – “Angola é nossa”- tocavam as bandas regimentais, nas cerimónias militares, por vezes acompanhadas por um coro de vozes tremelicantes de patriotismo…
Havia quem estivesse a par das causas da situação bélica em África: Intelectuais esclarecidos e muitos dos oficiais milicianos, saídos das Universidades directamente para as fileiras, alguns por castigo por terem intervindo activamente nas crises académicas de 62 e 69; os que haviam desertado antes que fosse demasiado tarde e seguissem para as cadeias políticas do regime; outros ainda que, mesmo na clandestinidade ou em plena guerra colonial, procuravam passar informações de todas as maneiras e feitios, que viriam a constituir matéria importante para a rádio “Voz da Liberdade”, aos microfones da qual Manuel Alegre desempenhou um papel relevante de informação e formação.
O silêncio, porém, era a regra e prolongou-se em demasia. Ninguém, por mais ousado politicamente, se atrevia, em público, a falar de guerra colonial. A primeira vez que ouvi gritar “abaixo a guerra colonial” foi numa Assembleia Magna da Academia de Coimbra, cuja ordem do dia era a greve académica que se realizou depois com tal êxito, que havia de abalar o regime. Mas, o estudante que deu aquele grito de alma, sincero e lancinante, foi depois admoestado pelos próprios companheiros, por ter dado razões aos elementos da DGS, infiltrados entre a multidão estudantil e que nos acompanhavam na gritaria de vivas e morras, para que ninguém desconfiasse da sua presença, o que não era muito difícil...
Até onde chegava a censura interior! Os jovens de hoje não poderão compreender essa atitude de uma prudência tal, que poderia, facilmente, confundir-se com cobardia…
Foi na poesia, e ainda durante no regime salazarista, que a guerra colonial principiou a ser “cantada” e denunciada. Os dois primeiros poemas conhecidos sobre a guerra colonial foram publicados por Fernando Assis Pacheco, no seu livro "Cuidar dos Vivos".
A seguir, Manuel Alegre e a sua "Praça da Canção", um dos mais sérios casos editoriais que neste país jamais aconteceram. A PIDE, como lhe competia por ofício, “vocação e amor à pátria”, ainda tentou retirar a obra do mercado, mas já não chegou a tempo. Esgotara-se num ápice. Mas não tardou que corresse, copiado à mão, por esse país fora. Outro livro do mesmo autor, com a guerra em fundo: "o Canto e as Armas"…
Uma das maneiras de escapar à censura, que, por vezes, e felizmente, se mostrava estúpida, era escrever ou poetar sobre a guerra colonial como se fosse a do Vietname ou de Hiroshima, trocando-se as voltas aos vigilantes da ordem e dos bons costumes morais, cívicos e políticos...
A editora tomarense Nova Realidade publicou antes de 74 vários livros considerados à época perigosos: "Cantares", de José Afonso; "o Canto e as Armas", de Manuel Alegre; "Hiroshyshima" e Vietname", duas antologias, cujos poemas se referiam, nas entrelinhas, à guerra colonial portuguesa…
Tenho dado tratos de polé ao pensamento a ver se consigo deslindar as razões por que, logo após a Revolução do 25 de Abril, e já com as colónias tornadas países independentes, se continuou a silenciar a guerra colonial e os seus efeitos traumáticos que ela exerceu sobre milhares de jovens portugueses. Dir-se-ia que tudo ficou encarcerado no seio das famílias que tiveram seus filhos e parentes a combater e voltaram, que morreram ou ficaram mutilados. Talvez o medo, que ainda se não desvanecera por completo, seja uma das razões; quem sabe se o pudor de falar sobre uma ferida ainda não sarada; quiçá a explosão da festa revolucionária, após a qual se silenciaram as armas, ou ainda o facto de a Guerra Colonial ter sido travada contra o regime português e não contra o seu povo, dando deste modo uma achega para o êxito da Revolução de Abril… São causas possíveis, mas que estão longe de explicar tudo. Um dia há-de saber-se, ou se calhar não, pelo menos na sua real profundidade…
Cristóvão de Aguiar
O texto aqui apresentado foi lido, em versão mais ampla,na Biblioteca-Museu da República e da Resistência/Espaço Grandella, em 27 de Novembro de 2008, seguido de um aceso debate entre os presentes.
Notas de vb:
1. Julgo estar a referir-se ao alf mil António José Orlando Bretão que, segundo consta na História do BCav 490, se apresentou em 19 de Dezembro de 1963 e foi destinado à CCav 488/BCav 490 , em substituição do alf mil António N. Coelho Brasil (ferido em combate em 08Out63).
Guiné 63/74 - P3541: 28 Novembro de 1968: Vão-se os nervos e a vontade de mijar...(Torcato Mendonça, CArt 2339, Mansambo, 1968/69).
Meus Estimáveis Editores
Há 40 anos atrás, este e muitos outros militares de empréstimo, mais dois profissionais(um com um ataque de hemorroidal; outro com um cisco numa perninha) andaram por terras distantes, pertença do nosso glorioso império, a fazerem e a fazerem-lhes tropelias.
Apareceu na memória. Melhor, perguntei que dia é hoje? É vinte e oito? É, hoje é vintôito...e recordei...daí passei o anexo, muitas horas depois ao papel. Gaita à tecla. Aí vai o meu vinte oito de Novembro, quarenta anos atrás.
Bom fim de semana.
Abraços do TM
Novembro, 28: quarenta anos atrás.
por Torcato Mendonça
A noite a fugir. Barulho habitual da preparação de mais uma “operação”, olhares vazios, gestos de autómatos, rostos fechados, a última trinca no pão ou bolacha a ser engolida a custo.
Pressente-se o levantar do dia, ajeitam-se uniformes, armas e munições. Formatura para rápida revista, as perguntas sempre iguais e a inevitável resposta – pronto.
Vão-se os nervos e a vontade de mijar, vai-se o sentir da vida. Já seguem em “bicha de pirilau”, guias e picadores à frente, o resto da maralha, nos sítios certos, atrás.
A madrugada a vir, as sombras a tomarem formas de homens e da mata. Olhares mais atentos, armas mais aconchegadas, marcham, entrando e saindo do trilho já bem conhecido.
Param de quando em vez, posicionam melhor o material, olham mapas, bússola e relógio, alguns ainda mijam. Olham, com olhos tamanho de cabaças a tudo quererem ver e olham-se, entre eles e, por sinais, dizem tudo.
O objectivo era perto do aquartelamento deles. Demasiado perto, demasiado incómodo para lá estar. Até afrontava. Agora iam lá partir, destruir, aniquilar tudo o que bulisse.
Raios. Puta de vida a destes homens, quase ainda meninos. Ou já velhos?
Seguem atentos, rostos fechados, silêncios a nada quebrarem. Sabiam a possível localização do objectivo, as sentinelas adiantadas e as cautelas com o trilho armadilhado ou não. Iam sempre em frente, repetindo os mesmos procedimentos. Mais uma paragem, breve consulta e mudança de Grupo a ir à frente. O acampamento inimigo devia estar perto. Progressão ainda mais cuidada, os ruídos da mata a manterem-se, sinal que iam bem. De repente, de forma inesperada tudo se precipita, parece que o apocalipse aí estava: rebentamentos, tiros, gritos. O inferno ali á mão.
Param. O inimigo reage e, conhecendo o trilho, faz bastante fogo e manda algumas morteiradas a tentar acertar. Chuva de folhas a tombarem da mata serrada. Continua forte o tiroteio. Em redor daquele local, quilómetros em redor não existem seres humanos. Ali há feras, somente feras em luta terminal. Tentam reagir os detrás mas era difícil. Esperam.
- Deite-se, deite-se meu Alferes grita o Sargento do outro Grupo.
- Espere porra. Vê se mandas morteiradas por ali. Tu, uma bazucada além, mas longe. Merda assim não dá. Pára.
De repente um estoiro, o rebentamento de uma morteirada In, sente a terra a bater-lhe, o sopro a levar o quico. Cabrões, filhos de puta…
- Estou ferido - grita o Sargento.
- Calma caraças. Isso não é nada porra.
Acalma e pára o tiroteio. Os do assalto regressam, o Seco do Xime à frente, o resto atrás com três ou quatro feridos.
Fomos vistos pela sentinela. Gritou tuga, tuga pela última vez. O resto foi com as bazukas, a MG e o habitual… partiu-se aquilo tudo…os tipos aguentaram porque tinham lá mulheres e putos…diz-me o Manuel.
- Enfermeiro, trate aqui do nosso Sargento.
- Isto tem que ficar no relatório - diz o Sargento.
- O quê?
- O ferimento, meu Alferes, o ferimento…
- Fo...que merda esta. Está bem. Mas não é comigo. Aguentem isto que vou lá atrás saber o que querem fazer.
Dois oficiais já tinham decidido.
- Objectivo destruído. Os tipos foram-se. Temos feridos. Regressamos com eles. Pedimos evacuação se piorarem.
Respondeu:
- Vou lá ver aquela merda. Quero…
- Não. Não há nada para destruir mais ou pilhar. Cobre a retirada e agora passas para o fim da malta.
- Tudo bem, levem os feridos….
Voltou para junto do Grupo. Regressaram calmamente, devagar, um ou outro problema aqui ou acolá. Talvez duas horas depois entraram no aquartelamento.
- Então o que se passou para este atraso, questionava o Capitão. Tinha ficado de cama devido a doença “dolorosa”. Ouvimos tiros.
- Viemos a cobrir a retirada sem pressas. Depois dizem lá pelo Alentejo: as cadelas apressadas têm os filhos cegos, sem ofensa para ninguém.
- O pessoal da outra Companhia já saiu. Você e o outro Alferes vão amanhã ao Batalhão, têm umas questões a resolver.
Foi. Primeiro apresentou-se o outro Alferes ao Major de Operações e ao Comandante de Batalhão. Enquanto esperava bebeu um ou dois uísques no bar.
- Logo de manhã nosso alferes? - Dizia o Capitão.
- O uísque? Não estou doente meu Capitão. Limpa a bicharada…
Entrou na sala, pouco depois, onde estava o Major e o Tenente-coronel, com um bigode de galã dos anos quarenta.
- Viu se ficou tudo destruído?
- Não meu Comandante.
- Porquê?
- Cumpro ordens.Depois de responder ao nosso Major vá ter comigo.
O Major escreveu algumas palavras num papel, levantou o olhar para ele e disse:
- Vemo-nos à hora do almoço.
Saiu e foi falar com o Comandante.
- Não gostei, Alferes.
Olhou aquele “guerreiro de parada” por quem tinha estima e respeito. Esperou.
- Não diz nada?
- Não meu Comandante.
Um mês depois o Comandante, no dia que fazia 51 anos, foi ver e constatar a destruição feita a 28 de Novembro.
E já passaram, ou fazem hoje, quarenta anos.
Ah o ferimento do Sargento ficou no relatório...precisava...coisas...
__________
Notas de vb:
1. Torcato Mendonça foi Alf Mil da CArt 2339, Mansambo, 1968/69.
2. Artigos do Autor em
28 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3538: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CArt 2339) (2): De Évora a Mansambo...instrução, viagem...Adeus ao meu País.
Guiné 63/74 - P3540: Tabanca Grande (101): Joaquim Pinheiro da Silva, CCAÇ 3566 "Os Metralhas" (Empada e Catió, 1972/74)
UM ABRAÇO QUE ATRAVESSOU O OCEANO ATLÂNTICO
1. Mensagem de Joaquim Pinheiro da Silva, da CCAÇ 3566, Os Metralhas, com data de 25 de Novembro de 2008
Assunto: Cumprindo o desejo do falecido marido
Amigo Luís Graça
Desculpe mandar este e-mail em duplicado... porém neste, anexo duas fotos.
Penso que vale a pena o registo... Uma amizade que nasceu na tropa.
Estive na Guiné entre 1972 e 1974 na CCaç 3566 "Os Metralhas". Como aconteceu com todos nós, sempre temos um companheiro especial... alguém com quem partilhamos nossos momentos de alegria, de tristeza... enfim, um companheiro de todos os dias.
Após terminar a tropa, regressei ao Brasil, país onde eu vivia anteriormente.
Após alguns anos no anonimato, graças ao trabalho constante de um ex-companheiro da nossa Companhia, o Xico Allen, que se empenhou em tentar localizar os antigos combatenttes d´Os Metalhas, fui localizado aqui na cidade de São Paulo. Após o que, mantive contacto com alguns dos meus antigos camaradas de farda, inclusivé com o meu mais fiel companheiro de mato e de paródias, o António Joaquim Rosa Gonçalves, apelidado de Alentejano, que Deus chamou prematuramente para perto de si.
O que quero dizer (e para que todos saibam), é que o Alentejano, devido ao alto grau de amizade que tinhamos, programou, ele e a esposa Maria Clarinda, virem ao Brasil para me reverem O Brasuca, apelido pelo qual eu era conhecido, mas infelizmente ele partiu.
Dito pela esposa dele, Maria Clarinda, três dias antes de falecer, ele teve algumas melhoras, e a Maria Clarinda disse-lhe que assim que tivesse alta, tratariam de tudo para cá virem.
Ele, pressentindo o fim, pediu à esposa que caso não sobrevivesse, ela lhe prometesse que tão logo pudesse, cumprisse o seu desejo, de abraçar o Brasuca.
Eis que ao escrever esta mensagem, tenho aqui atrás de mim, na cidade de Itanhaém /SP, a Maria Clarinda, 9 anos após o falecimento do Alentejano.
Foi emocionante a sua chegada ao aeroporto! Entre lágrimas, dela, minhas e de minha esposa, ela exclamava em voz alta:
- Agora posso morrer descansada, consegui realizar o desejo do meu marido.
Estou escrevendo isto, como forma de agradecimento à esposa do meu amigo/irmão, que não mediu esforços para concretizar o desejo de seu amado marido, e para que todos o saibam e valorizem esses laços de amizade que contraímos no tempo de tropa, que criam raizes para o resto da vida.
Sei que o Alentejano está noutro patamar, mas sua presença será perpétua entre nós.
Um bem haja a todos os antigos companheiros de farda, independente de patente ou arma.
Um obrigado especial ao Xico Allen, porque sem ele não teria tido estes momentos de tanta alegria.
Joaquim Pinheiro da Silva - O Brasuca
CCaç 3566 "Os Metralhas"
GUINÉ 72/74
Eu e a Maria Clarinda no alto de um prédio no centro de São Paulo
Na casa de meu filho... Maria Clarinda, eu, minha esposa, meu filho Fabiano e nora Raquel
2. Comentário de CV
Graças à iniciativa do Xico Allen de tentar reunir Os Metralhas da CCAÇ 3566, o Rosa Gonçalves, nos seus últimos anos de vida, e o Joaquim Pinheiro (O Brasuca), voltaram a contactar-se.
Quis o destino que não fosse possível trocarem um abraço de reencontro, mas mais uma vez é um familiar que cumpre um desejo não realizado em vida, desta feita uma viúva que se desloca ao Brasil, para em nome de seu marido, abraçar um camarada de guerra que tinha como irmão, laço este que perdurará até à morte do último.
Os nossos parabéns à D. Maria Clarinda pelo seu gesto.
Ao nosso camarada Joaquim Pinheiro, desejamos as maiores felicidades por terras do Brasil. Sempre que queiras, caro Joaquim, dá notícias.
Um abraço da Tertúlia.
CV
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Notas de CV:
Vd. postes de:
16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXVI: O Xico de Empada, grande amigo dos guinéus (Albano Costa)
15 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLIV: Que maravilha de trabalho (Joaquim Pinheiro, CCAÇ 3566, Empada/Catió, 1972/74)
7 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1054: Agradecimento da viúva do Rosa Gonçalves (CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada/Catió, 1972/74)
19 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1087: Rosa Gonçalves, o alentejano (CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972) (Quim Pinheiro)
27 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1320: Humor de caserna (1): O soldado paga com sangue a fama do capitão (Maria Gonçalves, viúva de Rosa Gonçalves, CCAÇ 3566)
Vd. último poste da série de 28 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3539: Tabanca Grande (100): Carlos Filipe Coelho, Radiomontador da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro 1971/74
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
Guiné 63/74 - P3539: Tabanca Grande (100): Carlos Filipe Coelho, Radiomontador da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro 1971/74
Carlos Filipe Coelho, Radiomontador da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74
1. Mensagem de Carlos Filipe Coelho, com data de 28 de Novembro de 2008
Caros Srs e Amigos.
Em Dezembro de 2005, contactei o Blog. Ver por favor o Post com a data de 31 Dezembro 2005 (*).
Contactei mais uma ou outra vez, entretanto acontecimentos graves com a saúde de minha esposa me tiraram todo o tempo e agora tenho-o todo do mundo infelizmente.
Recentemente o meu ex-camarada Juvenal, Post 3067 (**), teve a gentileza de escrever sobre a minha pessoa, o que provocou o entusiasmo para participar (embora o meu espólio de recordação seja reduzido) de qualquer forma... estou cá.
Assim sendo gostaria que os amigos me considerassem tertuliano do nosso Blog Camaradas da Guiné.
Envio esta foto actualíssima (7 meses) e para outra militar, poderão talvez extrair do post 3067 com algum pequeno redimensionamento.
Obrigado pela atenção. E bom trabalho (de preferencia pouco complicado)
2. Recordando o Poste CDIV da primeira série
Chamo-me Carlos Filipe, fui radiomontador, formei Batalhão em 20 de Novembro de 1971 em Abrantes.
O Batalhão de Caçadores 3872 desembarcou em Bissau no dia 24 Dezembro de 1971.
A minha CCS ficou sediada em Galomaro, mas antes estive aproximadamente um mês no QG em Bissau.
Depois fiz o velho percurso do rio Geba, e depois estrada, do Xime… até Galomaro.
Claro que ainda tenho recordações de Dulombi, Cancolim, Bafatá, Bambadinca, Saltinho, Sete Fontes (fonte de água para abastecimento), Bolama (onde passei as minhas “férias”)...
3. Recordando o poste 3067:
O longo abraço
Tem cuidado, deixa essas conversas para a Metrópole. O africano veio fazer queixa de ti.
Por Juvenal Amado
(**) - Em dada altura que o Filipe, assistiu à saída de camaradas para os postos avançados e patrulha nocturna, desatou a fazer barulho e a protestar contra o facto.
O barulho chegou aos ouvidos do Comandante, que mandou averiguar o que se passava. Dessa vez o anjo protector chamou-se Dr. Pereira Coelho, que abraçando-o, disse-lhe ao ouvido que se fingisse bêbado e assim o salvou.
Por vezes o Filipe, era mal compreendido e se não vejamos o episódio das bajudas;
Ao fim da tarde, os soldados iam ter com as lavadeiras, que se acercavam do destacamento. Eram momentos em que os soldados, davam por vezes largas a alguma falta de respeito para com as lavadeiras. Alguns por graça e para as ouvir dizer de uma enfiada só, todos os palavrões que conheciam em português e no seu dialecto. Apalpavam-nas e diziam-lhe que não lhes pagavam, por elas lhes terem partido os botões todos, ao lavarem as camisas como hábito, batendo com as ditas em pedras pois sabão, era coisa que não entrava nos seus apetrechos.
Tínhamos chegado a Galomaro, quando o Filipe se insurgiu contra uma dessas cenas, que verdade se diga não eram muito dignificantes, pois algumas bajudas eram muito novas. Resultado foi ele se envolver em briga, com um dos participantes dessa tertúlia, indo parar ao chão com o estalo que recebeu.
Carlos Filipe com a sua lavadeira
Carlos Filipe, em Galomaro, no exercício das suas funções.
4. Comentário de CV
Caro Carlos Filipe
Obrigado por contactares de novo connosco.
Lamentamos profundamente a adversidade que te atingiu recentemente. A vida reserva-nos esta provação, que mais tarde ou mais cedo toca a todos. Em nome da Tabanca Grande, transmito-te a nossa solidariedade e aliamo-nos à tua dor.
Falando de nós e do Blogue, vamos combinar que aqui não há senhore nem você. Na Tabanca, como deves saber, tratamo-nos todos por tu como verdadeiros camaradas que somos.
Agora desafio-te a contar-nos mais algumas coisas da tua vida militar, especialmente, quando, como e onde foste ferido, acontecimento que te levou ao Hospital Militar.
Em nome da Tertúlia dou-te as boas-vindas, esperando que contribuamos para ocupar o teu tempo o mais possível.
Um abraço
Carlos Vinhal
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 31 Dezembro 2005
Guiné 63/74 - CDIV: Batalhão de Caçadores 3872 (Galomaro, 1971/74)
(**) Vd. poste de 17 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3067: Estórias do Juvenal Amado (12): O longo abraço (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 27 de Novembro > Guiné 63/74 - P3526: Tabanca Grande (99): Manuel Moreira, ex-1.º Cabo Mec Auto da CART 1746, Ponta do Inglês e Xime, 1967/69
Guiné 63/74 - P3538: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CArt 2339) (2): De Évora a Mansambo... instrução, viagem... Adeus ao meu País
2 - Instrução, embarque e viagem até á GUINÉ da CArt 2339
2 -1 - O 2º GrComb
Concentração em Évora
RAL 3, Setembro de 1967, local de concentração dos graduados da Companhia Independente 2339.
Dias depois chegariam os soldados, a maioria saída da recruta, para receberem a especialidade de atiradores. As outras especialidades seriam dadas noutras Unidades Militares e mesmo no RAL.
Nos primeiros dias as habituais reuniões de graduados, a constituição de grupos para ministrar a instrução e outros assuntos.
Os Cabos Milicianos escolhiam os aspirantes para a formação dos quatro pelotões de instrução. O meu era, devido á classificação, o 2º Grupo. Fui escolhido pelos futuros Furriéis – Rei, Rodrigues e Sousa. Todos tínhamos tirado, na mesma altura e local, Vendas Novas, a especialidade: Atirador de Artilharia.
Vieram os soldados, foram integrados nos vários grupos, creio que de forma aleatória, ou mais pelo conhecimento, que tinham entre eles, da recruta ou vida civil.
Com os graduados era metade, metade: O Alferes era algarvio, criado no Alentejo e um Furriel natural de Vila do Bispo, algarvio portanto. Os outros dois Furriéis eram da zona do Porto.
Já na Guiné houve mudanças. O Sousa (Fernando Luís, desportista e professor conhecido) foi ao segundo ou terceiro mês para a 3ª ou 5ª de Comandos. Ficou nos Comandos, mudando de Companhia, até ao fim da comissão. Não perdeu o contacto connosco e regressamos juntos. Foi substituído pelo Sérgio, natural de Angola. Estudou e trabalhava na zona do Porto. O Rei, ficou sempre, felizmente, no grupo a corrermos Guiné fora.
Um outro devia ter sido evacuado mas nunca o foi.
Mas estes relatos, estas estórias para reproduzirem, o mais fielmente possível o que se passou têm, tanto quanto possível, ser vistas com os “olhos” de outrora. Era um grupo, a procurar união, a mais ou a melhor preparação para “ a guerra colonial”, um espírito próprio e coeso. Não procurava ser melhor, pior ou diferente dos outros. Tinha, isso sim a auto estima, a vontade de contribuir para uma Companhia unida, onde todos fossem solidários com todos e os Viriatos fossem um conjunto forte e coeso. Parece-me que isso foi conseguido. Creio mesmo que se mantém até hoje.
Ordem de embarque
Terminada a instrução, depois de curtas férias aparece a ordem de embarque. Numa gélida manhã de Janeiro, que certamente ninguém esquece devido aos gritos, choros e ao dramatismo de uma despedida, para muitos a ser vivida como final, embarcámos no Ana Mafalda, rumo á Guiné.
Ao quinto dia aportámos, por horas, em Cabo Verde. No dia seguinte, aí estava a Guiné. Fizémos o treino operacional no Xime. A
Nunca o Grupo ou a Companhia sentiu o peso da derrota.
Regressámos. Despedimo-nos, aos poucos, num fim de tarde e princípio de noite de Dezembro, novamente, de onde, cerca de dois anos antes havíamos saído: Évora.
Partimos por esse País fora, á procura da Vida interrompida. Só que antes já tinha partido o melhor da nossa juventude, o tempo perdido, as transformações em nós operadas, a visão da violência sofrida. Aos poucos recuperamos, talvez ou certamente nem todos o tenham conseguido. Mas certamente tentámos esquecer e viver outras vidas.
Voltámos a encontrar-nos, creio que em 1991, num restaurante da cidade de Aveiro no habitual almoço convívio. Emocionámo-nos. Todos os anos se repetiram os almoços em convívio-terapia. Só voltei, há dois anos a Évora. Julgava ser uma despedida. Ainda por cá estou e talvez volte um dia. Gosto demasiado da malta.
Mas sinto muito a despedida, a falta de brancos e negros que já partiram…e algo de “raiva surda” por certo passado… aos poucos passa…aos poucos encontrarei certamente a paz ou o saber esquecer e perdoar… talvez não…talvez sim…talvez alguém leve os meus fantasmas…
2 – 2 - Breve síntese, desde a formação e instrução em Évora, á Comissão na Guiné e finalmente o regresso. Parece estar tudo dito. Mas não está. Só focar mais dois ou três pontos: a instrução, a preparação e o embarque, a viagem.
Assim:
- A instrução foi em Évora e arredores, tendo o RAL3 por base. Procurou ser a mais consentânea com a guerra que nos esperava, com os conhecimentos adquiridos e com os homens que formavam cada pelotão. A Guiné, o destino não desejado, estava sempre presente. Era muito pouco tempo para ministrar uma instrução adequada.
Carência de meios postos á disposição, alguma falta de conhecimentos dos graduados (excepto dois ou três Sargentos do Q.P., com anteriores comissões) e os militares, os instruendos da especialidade que, uma breve recruta, não tinha sido suficiente para lhes dar a devida preparação para a especialidade.
Tínhamos a vantagem, muitas vezes isso é esquecido, da qualidade do homem português. A origem, da maioria daqueles homens era camponesa, trabalhadora da construção civil ou dos têxteis, a darem duro desde tenra idade. A rusticidade deles, o hábito á dureza da vida era uma enorme vantagem. Alguns eram homens que nunca tinham sido crianças. Outros já eram casados e pais de filhos. Muitos não eram bons ginastas, devido á dureza dos músculos travar a flexibilidade ou a dificuldade na coordenação motora. Relembro três casos: um que não era capaz de saltar o muro de terceira. Não me atrevo, dizia ele. Foi excelente combatente. Outro, casado e camponês, foi o “ bazokeiro” do Grupo. Ao segundo mês de comissão recebeu a noticia que era pai de uma menina. Nunca a conheceu. Faleceu pouco antes do embarque e num acidente em Bissau. Era a brutalidade daquela guerra. O terceiro caso é sobre a dignidade de um homem. Já na Guiné recebeu a noticia que ia ser pai, só que não tinha casado com a mulher a quem prometera, certamente depois do regresso, casar. Assim que pode, não eram permitidas férias ao segundo ou terceiro mês, veio para casar. Era esta, felizmente, a massa humana do segundo Grupo. Estes três casos podemos estendê-los a todo o grupo ou à Companhia.
Terminou a especialidade depois de uma semana de campo.
Antes de um merecido período de férias, veio a notícia do destino: Guiné.
Preparação para o embarque
- A preparação e o embarque tinham que ser feitas com certo cuidado. A notícia da ida para a Guiné, não foi recebida com entusiasmo pela maioria. Até os Militares do Q.P., estranharam nova ida para lá, pois a última fora lá passada.
As praças receberam o fardamento, meteram-no em dois sacos cilíndricos, também fornecidos, puseram-nos ás costas e foram de férias. Passaram o Natal e o Ano Novo em casa e apresentaram-se nos primeiros dias de Janeiro. Os graduados receberam um subsídio, creio que foi isso, e foram ao Casão Militar comprar o fardamento apropriado. Se bem me lembro, o 1º Sargento Clemente ou outro, Silva ou Moura Gomes, fizeram uma listagem e fui com ela ao Casão. Comprei a mala mais feia que encontrei – cinzenta e de plástico duro – e meti lá todo o material constante da lista. Mais tarde em minha casa foi, tanta e esquisita roupagem, posta á medida. Curiosamente até certos pormenores os Profissionais nos indicaram.
Embarque
Passaram rápidas as férias e, no dia indicado, parti para Évora. Não tinha a certeza do dia de embarque. Para a Guiné partiram antes de nós um Oficial e um Sargento. Nós iríamos depois. Não me recordo o dia da apresentação ao certo. Sei que tivemos duas baixas; um alferes que espatifou um pé e o furriel mecânico que, talvez devido ao calor e excesso de humidade guineenses, preferiu a Europa ou a América. Gostos…Os restantes apresentaram-se todos.
Esperámos pelo embarque, adiado pelo menos uma vez. Um dia soubemos: embarque a 14 de Janeiro. Telefonei para casa e pedi a meu pai para ninguém ir a Lisboa. Despedidas não.
No dia 12 recebi a ordem de ir, no dia seguinte para Lisboa tratar do embarque. O resto da Companhia iria depois.
Viagem
Deixei as malas no camarote e vim até à amurada. Ali estive, não sei quanto tempo a pensar, a ver o meu País a afastar-se. Ainda o Cabo São Vicente se via ao longe, senti o Rodrigues, Furriel do meu Grupo, ao pé de mim. Disse-me: será que voltamos a ver o nosso Algarve? (lembras-te camarada? Não me deves ler… tentas esquecer…tens esse direito). Respondi-lhe: eu vejo e você também. Com “ganas”e a raiva do não querer estar ali. Porquê? Porque não devia estar ali! Não era guerra minha e devia acabar o curso. Além disso tinha 22 anos e queria viver…mas já estava transformado…
Continuou a viagem, com enjoos de alguns e os dias a escorrerem devagar. Na terça dia 16, ao longe as luzes das Canárias e na madrugada de sexta dia 19, aí estavam o porto de Pedra Lume, Ilha do Sal, Cabo Verde. Carga e descarga de material e nova largada rumo a Bissau.
cont.
__________
Notas de vb:
1. Continuação e reescrita das Estórias de Mansambo.
2. Artigo anterior em
18 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3474: Estórias de Mansambo (Torcato Mendonça, CART 2339) (14): De Évora a Mansambo...
Guiné 63/74 - P3537: Histórias engraçadas (António Matos) (5): Formigas baga-baga...e um capitão em apuros. (António Matos)
Os Baga-Baga que também serviam de abrigos
Não tendo ainda dado uma vistoria exaustiva ao blogue (faço incursões pontuais quando o assunto me toca mais de perto ou se a curiosidade do tema a isso me leva) já notei referências ao Baga-Baga.
Na convicção de que este tipo de informação interessa como peça da imensa reportagem que aqui estamos a fazer, junto um texto, também ele "apimentado" com uma peripécia da altura, para mais agradável "digestão".
O Alferes Matos em cima de um pequeno monte de baga-baga.
Uma constante no cenário da Guiné é a existência de formações tipo arenoso mas duma consistência à prova de bala, formado pelas formigas.
À semelhança das abelhas, também aquela espécie de formiga (baga-baga) trabalha "em manada" e comandadas pela formiga mestra.
São verdadeiros exércitos deste animal estupidamente feroz (a avaliar pelas dentadas onde deixavam parte da carcaça espetada na vítima - falo do que sei!) que constroem estes formigueiros enquanto o diabo esfrega um olho pelo que, aquando da construção das estradas, a engenharia começava pela destruição desses ninhos.
Porém, não raras eram as vezes em que a estrada acabava de ser construída e já despontavam essas pragas destruidoras!
Mas não há bela sem senão e essas mesmas edificações serviram amiudadas vezes de abrigo pela sua resistência à fogachada quando nos encontrávamos debaixo de fogo.
O Alferes Matos na canal bazooca.
Um capitão em apuros
Por curiosidade vos conto que uma noite, numa progressão em direcção a Ponta Matar, com um luar altamente comprometedor, tivemos que parar durante escassos segundos para consultar a carta e eis senão quando, o capitão entra em desvairado desatino começando a despir-se sob o olhar atónito de toda a gajada.
O seu guarda-costas, o corneteiro, de seu nome Reis, foi imediatamente incumbido de o ajudar sem no entanto saber muito bem o que se estava a passar.
Finalmente percebeu-se que o capitão tinha parado exactamente em cima do trilho das amigas formigas que seguiam em bichinha pirilau à sua vida.
Escusado será dizer que o acontecido poder-nos-ia ter sido fatal tal o chavascal que estava a ser feito mesmo nas barbas do IN.
Resolvida a questão, com o capitão repleto de ferrões espetados desde os pés às virilhas, quisemos pensar que o IN foi compincha e bastou-lhe o gozo da situação para não nos atacar.
Uma vez fora da zona complicada, houve lugar ao humor ainda que os inchaços e as comichões do capitão tivessem sido de alguma gravidade e a requerer cuidados médicos.
António Matos
ex-Alf Mil da CCaç 2790
Bula 1970/72
___________
Notas de vb:
19 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3482: Histórias engraçadas (António Matos) (4): Quando os serviços de oficial de dia passaram a ser feitos pelos oficiais da CCS...
Guiné 63/74 - P3536: Bibliografia de uma guerra (39): Nó Cego, de C. Vale Ferraz. (Cor Matos Gomes)
de Carlos Vale Ferraz (Carlos Matos Gomes)
Meu caro Luís Graça e camaradas
Com os habituais cumprimentos e reconhecimento pelo vosso trabalho que, no meu caso, se traduzem em prazer pelas lembranças e proveito pelo que aprendo, aqui me têm a enviar um convite para a sessão de lançamento do meu romance Nó Cego, que foi editado há mais de 25 anos e que entretanto amadureceu.
Embora situado em Moçambique, a guerra era a mesma e ajuda a perceber como os homens podem influenciar e determinar o modo de fazer a guerra. Neste caso com as interpretações de Kaúlza de Arriaga e de Spínola.
Mas estas são as minhas interpretações, porque o que verdadeiramente queria transmitir aos editores e a todos os membros da Tabanca é o prazer de vos convidar e de vos ter neste momento em que se falará dos tempos que a nossa geração viveu em África.
Recebam os melhores cumprimentos e um abraço de camaradagem do
Carlos Matos Gomes
__________
Notas de vb:
1. Carlos Matos Gomes
(i) Nasceu a 24 de Julho de 1946 em Vila Nova da Barquinha.
(ii) Fez os estudos secundários no Colégio Nun’Alvares de Tomar e o curso de Cavalaria da Academia Militar.
(iii) Fez três comissões, em Moçambique, Angola e Guiné, nas tropas comando.
(iv) Foi ferido e condecorado, participou em grandes e pequenas operações de guerra um pouco por toda a parte.
(v) É actualmente coronel na situação de reserva.
(vi) Paralelamente à carreira militar tem desenvolvido desde 1983, data da edição do romance «Nó Cego», uma continuada actividade literária. Como romancista, com o pseudónimo de Carlos Vale Ferraz, publicou, além do referido "Nó Cego", os romances «ASP - De Passo Trocado», «Soldadó», «Os Lobos Não Usam Coleira», adaptado ao cinema pelo realizador António-Pedro de Vasconcelos com o título «Os Imortais», «O Livro das Maravilhas», «Flamingos Dourados» e ainda este ano «Fala-me de África».
Tem sido editado pelas editoras Bertrand, Nova Nórdica, Circulo de Leitores, Editorial Notícias e Casa das Letras.
A sua obra consta das antologias de literatura portuguesa organizadas por João de Melo e foi tema da tese de doutoramento do Professor Rui Teixeira na Universidade de Colónia.
(vii) No cinema foi autor do argumento do filme «Portugal SA» do realizador Ruy Guerra, colaborou com Maria de Medeiros no filme «Capitães de Abril» e com Joaquim Leitão nos filmes «Inferno» e «20.13 – Purgatório».
(viii) Escreveu para a RTP a série «Regresso a Sizalinda», baseada no romance «Fala-me de África», a exibir proximamente e que é a primeira co-produção entre as televisões públicas de Portugal e de Angola na área de ficção.
(ix) Participou ainda na área dos áudio visual na ficção «Conta-me Uma História» de João Botelho.
(x) No âmbito da história contemporânea é co-autor, com Aniceto Afonso, das obras «Guerra Colonial» e «Portugal e a I Grande Guerra» editadas em fascículos pelo Diário de Notícias.
(xi) É co-autor, com Fernando Farinha, da obra «Repórter de Guerra», da Editorial Notícias.
(xii) É autor da obra «Nó Górdio – Moçambique 1970», da Colecção Batalhas de Portugal editada pela Tribuna da História.
(xiii) É autor de textos para a História de Portugal dirigida por João Medina para o Ediclube e da História Militar Portuguesa, dirigida por Themudo Barata e Nuno Severiano Teixeira para o Circulo de Leitores.
(xiv) Foi consultor da série de três documentários para televisão «Isto Aconteceu» produzidos por Pedro Efe e da série a “Guerra” de Joaquim Furtado.
(xv) Participou nas séries documentais da SIC e da RTP sobre o Século XX.
resumo elaborado por Luís Graça e publicado em
30 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3251: Em Busca de ... (41): Notícia sobre o ataque a Sedengal, em 21/12/1970 (Cor Carlos Matos Gomes)
2. Artigos relacionados em
5 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3272: A novíssima literatura da Guerra Colonial (Leopoldo Amado)
3. Artigos "Bibliografia de uma Guerra" em
Guiné 63/74 - P3535: Blogues da Nossa Blogosfera (8): Portal Guerra do Ultramar, do António Pires, de novo em velocidade de cruzeiro
1. Às 4h47 da manhã, o António Pires mandou-nos uma mensagem a dizer que o portal Guerra do Ultramar: Angola, Guiné e Moçambique, estava de novo on line... O que já hoje de manhã confirmámos... Foram seguramente muitas horas de sono que o António Pires (a eu...quipa do Terraweb) perdeu, para poder pôr de novo a 'máquina' em movimento... Reproduz-se aqui a sua mensagem:
Caros Antigos Combatentes, Companheiros, Camaradas e Amigos,
Depois de termos procedido à reparação de algumas 'mazelas' no sistema informático, voltámos ao nosso posto, pelo que ficamos a aguardar as vossas notícias.
Aproveitamos para agradecer a todos aqueles que expuseram nos seus blogues ou sites o nosso problema e, também, àqueles que nos escreveram ou nos telefonaram a manifestarem a sua solidariedade e nos incentivaram a continuar.
Obrigado e um Bem Hajam.
A equipa do Terraweb
Da nossa parte, resta-nos dar-lhe os parabéns e desejar que o portal entre rapidamente em velocidade de cruzeiro, em segurança. (Convém aqui lembrar que a segurança inmformática é um problema de todos nós, utentes, e não apenas dos criadores e editores de páginas e de blogues na Internet; também aqui é preciso usar camisinha, perdão, ter nos nossos computadores um bom software de segurança; no caso dos blogues, é preciso ter cuidado com o IN que usa software do tipo com adware, malware ou spyware)...
Reproduzimos a seguir mais algumas mensagens que nos chegaram, de solidariedade (*) com os camaradas do Ultramar Terraweb.
2. Mensagem do Albano Costa, com data de 26 de Novembro:
Caros Editores
Hoje levei um murro no estômago!... Mas que grande maldade!...
E eu sempre a teimar comigo mesmo, que nada era como dantes!...
Não vou discutir as razões que levaram o autor a suspender o seu, e nosso «terraweb», mas que fiquei muito defraudado, aí isso fiquei, só tenho pena que a história ainda ia no princípio, e já teve que se ir embora, lamento muito o sucedido, mas meus amigos estou esperançado que estas coisas não podem morrer assim, a história sobre a guerra (do ultramar ou colonial) vai ter de continuar, afinal andamos nela e mesmo obrigados não tivemos medo de morrer.
Desejo-vos boa saúde para todos, Albano Costa
3. Do José Martins, com data de hoje, de manhã:
Caro António Pires e restante equipa
Foi com imensa alegria que tomei conhecimento do REGRESSO DA PÁGINA.
Como te disse, telefonicamente, estou solidário contigo e com a equipa. Ainda ontem falei no caso da Ultramar.Terraweb, no encontro que houve na Biblioteca Museu Republica e Resistência sobre o livro Braço Tatuado de Cristóvao de Aguiar.
Mais uma vez saúdo o regresso da página que agrega, não só TODOS OS COMBATENTES, mas tambem os amigos da verdade.
Força e em frente.
Um abraço
José Martins
________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores:
24 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3513: Blogues da nossa blogosfera (5): Quem quer calar o portal Guerra do Ultramar ? (José Martins / Luís Graça)
26 de Novembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3523: Blogues da Nossa Blogosfera (6): Solidários com o portal Guerra do Ultramar, do António Pires
27 de Novembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3530: Blogues da Nossa Blogosfera (7): Intervalo na democracia, já?...(António Matos)
Guiné 63/74 - P3534: Braima Galissá, grande representante da cultura guineense na diáspora (1): Djidiu e tocador de corá
Lisboa, Museu da Farmácia, 11 de Novembro de 2008. Cerimónia de lançamento do livro Diário da Guiné: 1969-1970: O Tigre Vadio, da autoria do nosso camarada Mário Beja Santos (Lisboa: Círculo de Leitores, e Temas & Debates, 2008, 440 pp.).
Excerto da actuação do mestre Braima Galissá, guineense, mandinga do Gabu, nascido em 1964, a viver em Portugal desde 1998, tocador de kora, e cantor (djidiu). Reprodução autorizada pelo mestre a quem dirigi um convite para integrar a nossa Tabanca Grande. (LG)
Vídeo: © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo (3' 50'') alojado em: You Tube >Nhabijoes.
(No caso de dificuldade de visionamento do vídeo, clicar em watch in high quality).
Filho, neto, bisneto e tetraneto de tocadores de kora, um instrumento inventado no Gabu pelo seu tetravô, o mestre Braima Galissá vive na diáspora, em Portugal, onde tem sido, nos últimos dez anos, um generoso, competente e empenhado defensor da cultura musical mandinga.
Da sua página, oficiosa, na Net, consta que o José Braima Galissá foi compositor do Ballet Nacional da Guiné-Bissau, responsável instrumental do mini Ballet Nacional e professor de Kora na Escola Nacional de Música José Carlos Schwarz durante 11 anos. Já participou em actividades culturais em vários países. Fugido da guerra civil de 1998, está em Portugal desde então, executando vários projectos culturais.
Braima Galissá nasceu em 1964, no Gabú, no Leste da Guiné-Bissau, capital do antigo império do Gabú que por sua vez sucedeu ao antigo império do Mali.
Começou a aprender o Kora com 5 anos de idade pela mão do seu pai, também ele músico, tocador de kora e didjiu, uma profissão que é hereditária, de acordo com a tradição mandinga. Em meados de 1979 iniciou a sua carreira, primeiramente cm os pioneiros Abel Djassi. Com eles teve acesso à escola e com eles participou em acampamentos da juventude na Guiné e no estrangeiro, tendo então portunidade de conhecer outras culturas. Deixou a casa do pai, e por isso foi para Bissau onde se dedicou ao estudo da música. "O Kora envolve misticismo e simbologia. É o instrumento que o acompanha nos espectáculos e é o suporte principal do género musical que interpreta. Desde que começou a actuar em público houve um momento que o marcou, que foi quando com mais 11 crianças estava a representar a Guiné-Bissau num acampamento em Cabo-Verde em 1979. As pessoas gostaram porque o kora nunca tinha chegado ao arquipélago. As pessoas seguiam-no por todo o lado, faziam-no perguntas sobre o instrumento, queriam tocá-lo, queriam saber tudo. Nessa altura apercebeu-se do 'peso' do Kora. A partir daquele momento em Cabo-verde decidiu que devia continuar nessa vida. Nos anos seguintes participou em vários eventos." (Continua) Contactos do artista:
(i) Telefone: 938325723 / 964660125 (ii) Email: braimagalissa@gmail.com (iii) Endereço postal: José Braima Galissá Rua Cidade de Manchester nº6 - cv 1170-100 Lisboa
Guiné 63/74 - P3533: (Ex)citações (7): A reciclagem das garrafas de cerveja na Ponta do Inglês (José Nunes / Manuel Moreira)
Foto: © Hugo Costa / Albano Costa (2006). Direitos reservados
Quem disse que a fome e a sede, aos vinte anos, não eram boas conselheiras ? Na Ponta do Inglês, o melhor soldado do mundo (que era o nosso, pois claro!) reciclava tudo, a começar pela garrafa da cerveja, a bazuca mais desejada do mundo, e que vinha de lancha. E ainda não se falava, nesse tempo e nesse lugar, em crise energética, economia do lixo, ecologia, ecopontos, economia sustentável, e por aí fora... (Se calhar queriam uma estância balnear, não?!).
Na Ponta do Inglês (que nada tinha a ver com o Ultimato Inglês de 1890!), nada se perdia, tudo se transformava... Claro que eram todos voluntários e patriotas, os rapazes que heroicamente defendiam a Ponta do Inglês, na Foz do Corubal... Eram gajos com brio, porra! Tugas dum carago!
1. "Ponta do Inglês, local onde estive 2 a 3 horas, o tempo da maré... Na altura a iluminação do quartel era feita com garrafas de cerveja, cheias de petróleo, e o alarme era as ditas quase juntas para tilintarem e darem o alarme, só que os macacos davam p'ra se agarrar ao arame farpado e tilintar as garrafas... Pelo sim pelo não, o melhor era uma rajada"
José Nunes,
ex 1º Cabo Mec Electri Centrais
Beng 447
1968/70
Comentário de 27 de Novembro de 2008 ao poste do memso dia > Guiné 63/74 - P3526: Tabanca Grande (99): Manuel Moreira, ex-1.º Cabo Mec Auto da CART 1746, Ponta do Inglês e Xime, 1967/69
2. Da Canção da Fome:
(...) Quando o nosso coração bole,
Passamos tardes ao Sol
Junto ao Rio, a esperar
De cerveja p'ra beber
E batatas p'ra comer
Que na lancha hão-de chegar.
Poste de 27 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3526: Tabanca Grande (99): Manuel Moreira, ex-1.º Cabo Mec Auto da CART 1746, Ponta do Inglês e Xime, 1967/69
3. (...) "Se não queriam ir que não fossem, mas não venham, agora velhos, lamentarem-se e quase pedir desculpa por terem sido soldados... Tenham brio, porra!"
Jorge Fernandes
Extracto de poste de 27 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3529: Controvérsias (13): Se não queriam ir que não fossem...(V. Briote)